Uma verdade nada agradável
Todos nos sentamos de novo na mesa em um silêncio gritante.
Meus pais tentavam puxar assunto, mas a aura pesada que ficou após a explosão de Alec fazia com que tudo soasse forçado. Os pais dele realmente estavam tristes e eu fiquei com pena deles, mas algo ali não estava certo. O que Alec queria dizer com depois de tudo o que você fez?
A expressão de mágoa estava escondida ali em meio a toda raiva e ódio e eu percebi pois estava olhando bem para ele.
Não sentia um pingo de pena de Alec, muito pelo contrário a notícia de que ele vai ser forçado a algo que não quer me deixa muito feliz. Mas por outro lado, deve ser horrível ter que assumir um compromisso com uma pessoa que ele mal conhece, e o pior, pode ser que venha surgir casamento. Aquilo sim que era castigo.
— Me desculpe pela cena de Alec, eu pensei que ele iria se controlar na frente de vocês. — Raul disse envergonhado.
O que eu achava muito bom pois eu pensava que íamos ignorar o elefante branco em meio a cozinha para sempre.
Carmem olhava o tempo todo para seus talheres, já havia os alinhado diversas vezes durante a refeição como uma válvula de escape desesperada.
— Ele está bem. — Estendi minha mão e peguei na sua para tentar a confortar. Ela me olhou com lágrimas em seus lindos olhos.
— Espero que sim. Alec tende a fazer besteiras quando se vê encurralado.
— Ele não é burro — Falei por falar, era óbvio que eu achava que faltava metade do cérebro dele. — Vai pensar antes de agir.
— Assim espero. — Disse e forçou um sorriso.
Recolhi minha mão e seguimos jantando em silêncio que às vezes era quebrado por meu pai e o senhor Raul discutindo assuntos chatos sobre o trabalho.
Quando terminei, pedi licença e me retirei para o meu quarto disposta a contar a novidade para Lorena. Suspeitava que ela não iria ficar nem um pouco feliz em saber que seu crush não estava mais disponível entre os solteiros mais cobiçados da escola.
Peguei meu celular e liguei para ela que atendeu no segundo toque.
— Você não sabe da maior. — Iniciei sem rodeios.
— Fala logo Liz, nunca se inicia uma conversa assim.
— Sabe que hoje foi o dia da família Durand jantar aqui não é?! Pois então, o pai do Alec disse que o menino problema tem que assumir responsabilidades quando ele terminar a escola.
— Ui, ele deve ter odiado.
— Sim, mas não é só isso— me deitei de bruços e cruzei meus pés no alto. — O seu queridinho não está mais disponível para pegar ninguém.
— O quê? — Lorena berrou em meu ouvido me fazendo afastar o celular a fim de não prejudicar meu canal auditivo.
— Isso mesmo que ouviu. Devo ressaltar que amei a notícia.
— Você é má Liz. Eu estou com pena dele, isso não deveria ser feito com ninguém.
— Pena eu tenho da moça com quem ele vai ter que assumir um compromisso. Imagina quando ela descobrir o quão idiota ele é. Por trás daquele rostinho bonito ele esconde um péssimo temperamento.
— Eu não acho que ele seja tão ruim assim Liz, é um exagero. Pelo o que vejo, Alec é um cara super bacana que se envolve com quem gosta. Você diz isso por boatos que escutou sobre ele ser pegador, mas não procurou nem saber se eram verdadeiros. Está julgando sem saber.
— Pois eu tenho que discordar, e tem mais, acho que ele é uma bomba de Hiroshima prestes a explodir e detonar todos ao seu redor.
Escutei um barulho na porta e vi minha mãe colocando o rosto em uma fresta movendo os lábios dizendo que queria falar comigo.
— Olha Lorena, tenho que desligar. — Escutei ela dizendo tchau e joguei o telefone na cama, me sentando para ver o que minha mãe queria.
Ela se sentou na beirada da cama, pôs uma mecha de cabelo idêntico ao meu por trás da orelha e me olhou.
— Filha preciso te fazer um pedido — continuei quieta a incentivando a continuar. — Quero que mantenha o que escutou para si, nada de pisotear Alec sobre isso.
— Por que eu deveria ter pena dele? Sempre foi um garoto idiota que fazia questão de me pôr para baixo.
— A questão não é essa Liz. É um assunto da família dele que não nos diz respeito. — Minha mãe disse exasperada pela minha teimosia.
— Se fosse assunto de família eles não teriam vindo discutir isso aqui em casa.
— Olha Liz, já que você insiste nisso eu vou usar a minha autoridade de mãe. Eu não quero que você saia espalhando pela escola sobre o que ouviu aqui. Estamos entendidas?
Fiquei quieta por uns bons cinco minutos. Realmente eu estava testando minha mãe,
Já estava vendo o rosto dela ficando vermelho de raiva e se não me engano uma fumacinha saindo por seus ouvidos.
— Responda Liz.
— Tá bom mãe. Não vou falar nada. — Ela se levantou satisfeita, me deu um beijo na testa e saiu.
Dei um sorriso que poderia ser igualado ao do gato da Alice no país das maravilhas.
Eu disse que não ia falar nada, só não especifiquei sobre o que. Era óbvio que não ia perder a oportunidade de pisar em Alec Durand.
__***__
No outro dia acordei cedo para ir a escola e já chegando nela recebi uma mensagem da minha mãe dizendo que minhas aulas de habilitação iriam começar naquele dia.
— Merda. — Disse para mim mesmo com vontade de jogar meu telefone bem longe.
Eu não estava nem um pouco animada para fazer aquilo. Desde que minha mãe inventou de me ensinar a dirigir para criar prática eu havia tomado horror de ficar atrás de um volante.
Me sentia apavorada só de pensar em todas as regras ao se entrar no carro, as quais eu esquecia assim que me colocava diante de um.
Não, definitivamente dirigir não era para mim. Mas como explicar aquilo para minha mãe?
— Que cara é essa Liz? — Lorena perguntou na entrada ao ver minha expressão consternada.
— Isso aqui. — Mostrei a mensagem para ela que caiu na gargalhada debochando de mim.
— Não me diga que ainda tem medo disso Liz.
— Caçoa mesmo. Eu tenho pavor e não tenho medo de dizer. — Falei enquanto seguimos para a sala de aula.
Quando chegamos nela vi que todos já estavam lá, menos Alec. Pelo visto o garoto iria faltar aula.
Francamente ele não poderia ser mais previsível. Passou pela minha cabeça que ele poderia fazer aquilo o que mostrava que ele não tinha consideração alguma por seus pais.
— Ainda estou chocada pelo o que me disse ontem. — Lorena sussurrou para mim quando nos sentamos.
— Eu acho muito bem feito pra ele, quem sabe assim ele não desce do pedestal que ele mesmo se pôs.
— Como você é maldosa Liz.
— Maldosa? Olha Lorena você esqueceu que aquele resto de aborto disse para mim ontem? O que ele fez no ponto de ônibus? Eu ainda to fazendo é pouco. — Falei determinada.
O professor chegou interrompendo nossa conversa e Alec chegou logo atrás.
A cara dele era de poucos amigos e pelo o que vi ele não havia dormido nada. Seus olhos estavam vermelhos e seus cabelos bagunçados.
Não quero nem imaginar o que ele andou aprontando.
Enquanto que o professor de matemática dizia algo ao qual eu não fiz questão de prestar atenção, Alec mexia em sua câmera fotográfica como se ela fosse mais digna de atenção do que o próprio professor.
— Qualquer dia vou pedir para ele tirar umas fotos minha. — Lorena sussurrou no meu ouvido quando o professor se virou para anotar algo na lousa.
— Diga que quer tirar fotos nua, acho que isso vai interessar muito a ele.
— Credo Liz. O Alec é um artista, já viu as fotos que ele tira? — Lorena disse tentando abafar uma risada com sua mão.
— Só aponto fatos e ele é um idiota e não, não me interesso nenhum pouco de ver. — Falei mexendo no telefone.
Um post no Facebook me chamou a atenção por dizer que um site muito popular de livros estava com uma boa promoção. Então não demorei muito para ir lá e já estar com um carrinho cheio, definitivamente minha mesada iria embora somente em livros naquele mês.
— Já pensou se vai a festa? — Revirei os olhos com o assunto.
Às vezes eu achava que o destino gostava de brincar com as coisas como fazia comigo e Lorena.
Não podíamos ser mais diferentes em questão de personalidade. Enquanto que ela era super popular com outras garotas, espontânea e divertida. Eu era a esquisita que gostava de ficar na minha cercada por livros e bem distante de festas.
Era muito difícil estar diante das tais diferenças e ignorar tudo. Mesmo que eu gostasse de Lorena, era inegável ver o quão diferente éramos e quando essas diferenças se batiam de frente eu acabava me machucando pois Lorena dizia coisas que me deixavam chateada.
Eu sabia que ela fazia aquilo sem querer, mas não deixava de doer menos.
— Não sei se é uma boa ideia. Melhor eu ficar em casa, na minha.
— Tá bom Liz, não vou mais insistir. — Ela disse respirando fundo.
Depois daquilo não falamos mais nada, nem sobre a festa e nem sobre outro assunto.
Aquele meio tempo serviu para me fazer pensar se eu não estava exagerando em não querer me enturmar com ninguém. Caramba eu tinha dezessete anos, estava no último ano do ensino médio e adolescência só se vivia uma vez e lá estava eu, estragando tudo e não vivendo nada.
Eu nem estava tentando, nem experimentando para saber se ia gostar ou não.
Quando abri a boca para dizer alguma coisa para Lorena, dizer que ia pensar no assunto, o sinal tocou e ela se levantou rapidamente.
Juntei minhas coisas as jogando dentro da mochila e corri para fora da sala, mas justamente naquele momento esbarrei em Alec no meio do corredor fazendo com que alguns livros que carregava fossem ao chão.
— Olha por onde anda garota. — Ele disse de mau humor.
— Você que tem que olhar ou será que as notícias de ontem conseguiram corroer a metade do cérebro que lhe restava?
Ele me olhou enviesado e vi seus punhos cerrarem com força. Uma veia pulsou em sua testa e sabia que Alec estava furioso.
Será que fui longe demais?
O sorriso maldoso que ele me lançava e o olhar de desdém que percorreu meu corpo fez com que os pelos que tinha se arrepiarem e meu sorriso sumiu.
— Você se acha muito, não é mesmo Kang? A menina inteligente, a primeira da sala em tudo. A arrogância em pessoa, mas de que adianta isso tudo garota? Você não tem amigos, todos da escola te acham insuportável e sua amiga só está com você por pena — ele se aproximou de mim e dei um passo para trás. — Porque que outro motivo haveria para uma garota super legal como ela estar com uma garota insuportável como você. Antes de julgar as pessoas e se achar superior se olhe no espelho Kang.
Quis correr naquele momento. Ele me humilhou na frente de outros alunos que ficaram ali para ver o show que ele deu.
Eu sei que falei demais e usei algo para o aborrecer, só não imaginava que ele iria fazer aquilo, me humilhar dessa forma.
Tentei correr, mas ele segurou meu pulso. Pelo visto a sessão de golpes ainda não havia acabado.
— Eu tenho razão sobre uma coisa a seu respeito. Você diz que odeia tudo e todos nessa escola, mas você odeia somente a si mesma por não ter capacidade para fazer tudo o que temos coragem de fazer. É covarde. E um dia estará velha e sozinha se arrependendo amargamente por não ter vivido a terça parte do que vivemos, tudo por ser uma covarde.
Alec me largou e corri para longe dele para que não visse meus olhos repletos de lágrimas.
Eu queria ter toda força para responder, mas não o fiz. Tudo porque o que ele disse em grande parte era verdade.
__***__
Cheguei na aula de direção e minha cara parecia que eu tinha acabado de sair de um velório e aquilo se dava por dois motivos: o primeiro era a própria aula. Tentei ligar para a minha mãe e fazer com que ela visse a razão, não havia motivos fortes para eu aprender a dirigir. Eu poderia me virar de outras formas, viver de carona era uma delas.
E o segundo motivo era que as palavras de Alec ainda reberavam por minha mente.
Tentei esquecer e o xingar de diversas coisas em pensamentos, mas nada adiantou e nada fez parar meu coração doer menos.
Eu sabia que tudo o que aquele desgraçado disse era verdade. Eu tentava me fazer ser melhor do que era e me sentir superior aos demais, mas escutar aquilo da pessoa que eu mais odiava era a pior coisa.
Estava sentada na sala de aula sem dar a devida atenção ao que o professor de meia idade dizia.
Mesmo que eu me fizesse de forte era inegável que eu havia ficado magoada com aquilo.
Não me sentia covarde, mas tinha atitudes de uma. Me protegia do mundo me refugiando nos livros com medo de sofrer com a decepção que as pessoas à minha volta poderiam me causar e estava deixando de viver. Precisou de um garoto que odeio me dizer aquilo para fazer eu enxergar o quão boba eu estava sendo. De eu parar de sentir medo como uma criança assustada e encarar o mundo e sabia exatamente o que fazer para deixar tudo aquilo para trás.
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