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꧁𝚅𝚒𝚘𝚕𝚎𝚝꧂

Semanas depois.

Lucien e Kate estão muito mais próximos, e as atividades da empresa vão bem... Não que eu me importe com o que ele faz da vida, obviamente não me importo.

Como meu secretário pessoal, o pedi para me acompanhar na bateria de exames que tenho hoje.

Rosário estará cuidando de outras coisas e Ramalho ficou doente, lhe permiti ficar em casa o tempo que precisasse para se recuperar, ele está comigo há anos e merece.

Limpo a boca com o guardanapo e deixo o garfo no prato recém-vazio.

A solidão gritante desta sala é um berço que já acostumei a me deitar.

— Por que não convida Lucien para jantar contigo? Aposto que ele gostaria. — Sugere gentilmente Consuelo.

— Lucien está muito bem com Kate, foram até almoçar juntos ontem. — Digo sem muita importância enquanto me afasto da mesa.

— Está com ciúmes, menina? — Seu tom é quase convicto.

— Óbvio que não. — Minha voz sai rude.

Ela me segue até meu quarto.

— Lucien, é um rapaz bonito e tão gentil... poderiam se entender. — Pronuncia lentamente a palavra com um toque de auto-reflexão.

Isto é absurdo.

— Não, de forma alguma, nem no espaço mais amplo da galáxia Consuelo. — Dou ênfase em cada palavra.

Ao cruzar a grande porta branca e com detalhes dourados, adentro meu quarto aonde vou em direção à cama.

Quero ficar descansando hoje.

— Me ajude por favor — Peço retirando o cinto e Consuelo age rápido e me ajuda a sentar na cama.

— Já pensou na possibilidade de ter filhos? Um namorado? É tão bonita e jovem Violet...

— Consuelo! — Repreendo querendo mudar de assunto e ajeito as pernas inválidas sobre a cama.

Ela se cala, sem jeito por que eu a repreendi.

Não está nos meus pensamentos ser namorada ou até ter filhos, eu poderia... Mas não tenho estrutura psicológica e nem tempo para isto.

Fora que não sei se posso, minha condição não deve permitir... Gostaria de ter crianças correndo pela casa, e ser chamada mãe... mas, nem tudo é como queremos.

E outra, quem seria o louco de estar com Violet Maldonado? A criatura mais arrogante e insuportável que já pisou nesta terra... Segundo Lucien e outras fontes.

Faço gesto para mulher baixa de cabelos presos num coque trançado escuros e avental no uniforme preto e branco e ela abre a cortina um pouco mais a frente da janela, permitindo os raios do sol adentrando iluminando o piso de madeira do meu quarto, em fios belos e quentes.

— Ele me odeia. — Movimento os dedos em uma brincadeira.

— Como alguém pode te odiar? — diz tão docemente que acredito quase ser adorável.

Eu sou uma alma arruinada.

— É fácil, só me conhecer — balbucio tocando os joelhos.

Consuelo fica silenciosa por alguns segundos.

Enquanto ajeita roupas no meu guarda-roupas.

— Por que não vem fazer um bolo comigo? — Propõe sorridente, é como minha mãe.

Nunca me tratou como uma inútil e nem me fez acreditar que eu era, e às vezes não me considero também.

— De que sabor? Prefiro chocolate. — Consigo criar o cheirinho do bolo assado saído do forno bem quentinho.

A mulher não muito velha sorri de novo e me dá um beijo na bochecha, como se eu ainda fosse sua doce menina. A menina que cuidou de mim com toda dedicação e amor como se eu fosse da sua própria família.

Esta menina está morta e enterrada num túmulo frio.

— Eu vou lá fazer, te chamo para fazer o recheio. — Acaricia meu cacho loiro e eu sorrio, ela sai devagar e fecha a grande porta do meu quarto.

É bom eles não me invalidarem totalmente, apesar de não me deixaram fazer praticamente nada, nem chamam. Por medo de que eu talvez me machuque.

Não é porque estou nesta maldita cadeira que sou de vidro e posso quebrar a qualquer toque ou colisão com algo.

Enquanto espero que Consuelo me chame, navego pela tela do celular vendo foto e publicações no Facebook, até achar algo que me chama atenção... Uma foto de Lucien e Kate, onde ele postou e marcou ela.

Estão saindo juntos?

Por que estou dando tanta atenção a isto? Não seria surpresa mesmo.

Kate o ajudou e por sua generosidade, fez com que trabalhasse na empresa.

A branca de neve e eu, não temos uma relação muito agradável... Mas também não queremos atirar uma, a outra de um prédio toda vez que nos encontramos.

Admiro-a, é independente, educada e destemida. Além de ótima funcionária.

Todavia, tenho certeza que Kate e seu mistério tem algo escondido por trás disso. Ainda vou descobrir.

Admito que sua presença é forte e marcante, e a respeito por isto.

É algo mútuo. Respeito se adquire, não se impõe... Isto é, dependendo da situação também.

━━━━━━━━ ❆ ━━━━━━━━

Dou uma lambida na colher melada de chocolate e deixo o pote com resquícios de chocolate sob a pia.

— Prontinho. — Indico o bolo coberto de chocolate e Consuelo sorri lavando as mãos ao meu lado.

— Vai ficar delicioso, vamos esperar esfriar. — Abana as mãos na intenção de tirar o excesso de água e fecha a torneira.

Deixo a colher sob a pia, não alcanço para colocá-la dentro.

— O que vamos fazer enquanto esfria? — Penso em alguma possibilidade e Consuelo seca as mãos no pano pendurado no seu avental.

— Podemos assistir a um filme talvez? — Sugere animada, queria pode ajudar a arrumar a bagunça, mas não alcanço.

A cadeira limita muitas coisas.

E se eu insistir em ajudar de alguma forma, Consuelo vai desconversar como sempre faz e arranjar algum passatempo para mim, como se eu fosse uma criança buscando por alguma oportunidade de ajudar a mãe.

Ela se apoia na pia e também os cotovelos, cruzando os dedos.

— Você já ajudou muito, sei que quer arrumar a bagunça... Mas precisa tomar cuidado Violet. — Sua voz tão serena e amorosa.

— Não sou de vidro Consu. — Fico irritada com esta super proteção dela.

Inspiro o ar preenchendo os pulmões para me acalmar - as paredes parecem ficar mais estreitas e me espremer.

— É sim. — Acrescenta Consuelo baixinho, mas acabo escutando.

Suspiro frustrada e vou para a sala a deixando sozinha na grande cozinha.

Antes era eu e Rosário, às vezes tinha o privilégio de juntar ela, Consuelo e Ramalho aqui neste extenso sofá e assistíamos filmes a tarde toda ou até que eu dormisse e perdesse noção de horas.

Não me sentia sozinha, eles se tornaram minha família e a última vez que fizemos isto juntos, foi o melhor dia da minha vida, depois só consegui assistir com um de cada vez, nunca dava para reunir todos juntos num dia só.

Antes, era eu e Raquel.

Antes tínhamos uma união, éramos duas numa só.

Bem antes.

Tenho a sensação de que todos que conheço e amo, me abandonam.

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