19.
No momento em que a Terra enfrentava o apocalipse nuclear, doze estações espaciais orbitavam ao seu redor. Durante um longo período, essas estações mantiveram-se isoladas, cada uma lutando por sua própria sobrevivência. Contudo, em um fatídico dia, a Mir cruzou o caminho da Shenzhen, e ambas perceberam que a cooperação poderia garantir uma existência mais promissora.
Inspiradas por esse encontro, as demais estações seguiram o exemplo, unindo-se em um esforço conjunto para formar a Arca. O dia 1 de outubro de 2054 foi então consagrado como o Dia da Unidade, um marco que ecoaria ao longo da história da Arca, celebrado com reverência e gratidão por gerações vindouras.
O Dia da Unidade havia chegado. Na Arca, todos comemoravam, conscientes de que esta seria a última vez que celebrariam enquanto habitantes do espaço, pois em breve estariam pisando novamente no solo terrestre. Na Terra, alguns delinquentes observavam com desdém a transmissão enquanto o chanceler Jaha pronunciava solenemente as palavras sobre o Dia da Unidade.
Olivia permanecia imóvel ao lado de uma tenda desconhecida, os braços envoltos em um abraço autoimposto. Em sua mente, uma névoa de pensamentos a envolvia, puxando-a cada vez mais para dentro de suas profundezas. O Dia da Unidade nunca fora do agrado de Olivia; para ela, era uma data carregada de significados sombrios, marcada não apenas pela perda de sua mãe, mas também pelo seu próprio aniversário.
A jovem atingira a maioridade determinada pela Arca: dezoito anos. Se ainda estivesse na estação espacial, estaria destinada à flutuação. Contudo, talvez tivesse sido concedido um último dia, uma indulgência momentânea permitindo-a participar do derradeiro Dia da Unidade ao lado de seu pai.
A garota foi bruscamente arrancada de seus pensamentos quando ouviu o grito de Jasper ecoando pelo acampamento. Parecia que Monty havia preparado uma bebida, meio que alcoólica, para tornar a celebração do Dia da Unidade mais animada.
Quando Olivia recebeu a notícia de que seu pai estaria na primeira nave Exodus, em menos de 60 horas, ela ficou atordoada. Incapaz de se concentrar, ela se viu imersa em um turbilhão de pensamentos, incapaz de imaginar qualquer coisa além do caos que se intensificaria ainda mais em sua mente.
Olivia só conseguiu desviar seus pensamentos quando sentiu alguém tocando sua cintura, interrompendo seu devaneio. Ela se virou rapidamente e se deparou com Bellamy. O garoto exibia um leve sorriso nos lábios. Bellamy estendeu o copo que tinha em mãos em direção a Olivia, os olhos brilhando com uma mistura de expectativa e entusiasmo.
— Vamos lá, Liv. É Dia da Unidade! Relaxe um pouco e aproveite a festa — incentivou ele, o sorriso travesso em seus lábios morenos convidando-a para se juntar à celebração.
— O Dia da Unidade é só uma desculpa, Blake —disse a garota, fazendo uma careta. Seus ombros se relaxaram gradualmente, como se ela estivesse confortável o suficiente na presença do garoto para baixar a guarda.
— Então, use essa desculpa para se divertir — ele continuou insistindo. Bellamy estranhou o comportamento indiferente de Olivia; a garota costumava irradiar mais alegria, mas naquele dia estava visivelmente mal-humorada.
Olivia fixou seu olhar nos olhos castanhos de Bellamy. O garoto sentiu sua postura de líder vacilar na presença dela; de alguma forma, Olivia sempre o afetava. Ele sabia que algo estava errado com ela.
— O que houve, Liv? — Bellamy perguntou, notando a hesitação nos olhos dela enquanto ela desviava rapidamente o olhar, ao ouvir o apelido que seu pai costumava chamá-la.
— O Dia da Unidade simplesmente não me traz boas lembranças, está bem? — disse ela, enquanto afundava as mãos nos bolsos de sua jaqueta, como se buscasse conforto ali. — Vá se divertir, eu estou bem — acrescentou, dando de ombros com uma tentativa frágil de parecer convincente, embora seus olhos ainda traíssem uma certa melancolia enquanto ela fitava Bellamy.
Bellamy balançou a cabeça em negação; ele não estava convencido. Sabia que algo estava errado e desejava poder ajudá-la de alguma forma. A conexão entre a amizade de Olivia e Bellamy era profunda, e ele podia sentir isso. No entanto, relutava em admitir a extensão desse vínculo.
— Não. — ele afirmou, entregando o copo que segurava a um delinquente que passava por ali — Vou ficar com você. Não quero que fique sozinha enquanto todos se divertem. — declarou Bellamy. Com delicadeza, ele segurou o braço de Olivia e a conduziu em direção à nave, buscando um lugar mais privado onde pudessem conversar.
O momento se desenrolou tão rapidamente que Olivia mal teve tempo para processar o que estava acontecendo. Quando finalmente se viu sentada no chão frio e metálico da nave, ao lado de Bellamy, sentiu-se momentaneamente desorientada. Os olhares deles se encontraram, e por um instante, o mundo ao redor pareceu desacelerar, deixando-os mergulhados na intensidade do momento.
Olivia quebrou o silêncio que pairava entre eles, sua voz soando suave, mas carregada de perplexidade.
— Bellamy, por que você se importa? — ela franziu a testa, incapaz de compreender completamente o motivo pelo qual ele estava tão preocupado com o que ela estava sentindo.
Bellamy levou alguns instantes para processar a pergunta de Olivia. Por que ele se importava com ela? Era uma pergunta que o pegou de surpresa, fazendo-o refletir sobre os sentimentos que nutria por ela.
Não era apenas uma questão de camaradagem ou lealdade; havia algo mais profundo ali. Talvez fosse o modo como ela o fazia sentir-se confortável, como se pudesse ser ele mesmo sem medo de julgamento. Ou talvez fosse o riso contagiante dela, capaz de iluminar até os momentos mais sombrios.
Bellamy desejava que ela continuasse rindo, queria ser a razão por trás daquele sorriso radiante. E quando percebeu o semblante abatido de Olivia, algo dentro dele se contorceu, despertando um instinto protetor que ele não sabia que possuía.
Ele se importava com ela porque, de alguma forma, ela havia se tornado uma parte importante de sua vida, e a ideia de vê-la triste ou sozinha o incomodava profundamente.
— Ah, Olivia... — a voz de Bellamy soou irônica, e ela soube que ele estava prestes a fazer uma de suas típicas piadas. — Acontece que eu gosto um pouquinho de você, entende? — ele fez um gesto com a mão, como se estivesse mostrando o quão pouco gostava dela.
Era uma mentira óbvia; na verdade, ele gostava bastante dela. Mas Bellamy preferia manter uma fachada de descontração, mesmo quando se tratava de sentimentos tão sinceros.
— Além disso, sua risada é engraçada, então é legal ouvi-la — ele deu de ombros, como se estivesse minimizando a importância de sua própria admiração.
Porém, no fundo, Bellamy sabia que estava sendo sincero. A risada de Olivia não era apenas engraçada; ele a achava adorável e mal podia esperar para ouvi-la novamente.
Olivia riu pelo nariz, um sorriso discreto curvando seus lábios, embora não mostrasse os dentes. Ela negou com a cabeça suavemente, como se estivesse se divertindo com a brincadeira de Bellamy, mas também demonstrando que não estava totalmente convencida por suas palavras.
— Bellamy, estou falando sério — disse ela, recuperando sua postura e deixando claro que não queria que suas palavras fossem simplesmente descartadas como uma brincadeira.
A garota encostou sua cabeça na parede metálica da nave, expondo seu pescoço de forma vulnerável, como se estivesse buscando conforto na solidez do ambiente ao seu redor.
Bellamy suspirou, erguendo uma de suas sobrancelhas em um gesto de ponderação. Ele observou Olivia por um momento, seus olhos escuros refletindo uma mistura de preocupação e curiosidade. Era evidente que ela estava sendo sincera, e isso o levou a repensar sua abordagem descontraída.
— Olhe, eu gosto de você, Kane — ele falou, sua voz soando firme e sincera enquanto ele encarava o rosto delicado da garota — Eu gosto mesmo. No início, pensei que você fosse apenas mais uma das privilegiadas da Arca, alguém que não sabia se virar aqui. Mas está claro que é o contrário. — Olivia voltou à postura anterior, seus olhos encontrando os dele enquanto absorvia suas palavras.
Para ser sincera, ela também compartilhava dessa visão de si mesma. Nunca realmente acreditou que fosse capaz de sobreviver na Terra, sempre se sentindo como uma estranha no mundo hostil fora da segurança da Arca.
Portanto, Olivia também tinha uma visão diferente de Bellamy, em comparação com o passado. Antes, ela o achava arrogante e, certamente, egoísta. Mas agora ela o via de maneira distinta; compreendia que ele estava apenas tentando se proteger, como todos ali. Bellamy revelava-se protetor e gentil com aqueles em quem confiava e gostava, uma faceta de sua personalidade que ela estava começando a apreciar e admirar.
— Você é uma garota legal, Olivia. No começo, realmente achei que seria tão arrogante quanto seu pai, mas você é melhor do que isso — ele disse, suas palavras provocando um sorriso amplo no rosto de Olivia.
Ela tentou escondê-lo, mas foi impossível conter a felicidade que transbordava por suas feições.
— Você é idiota? — ele riu ao ver a garota abaixar a cabeça para esconder o sorriso bobo.
— Cala a boca! — Olivia riu, colocando a mão na boca para conter o riso, mas não conseguiu evitar que escapasse entre os dedos.
Após esse breve intervalo, o tempo pareceu passar rapidamente. Bellamy foi chamado por um delinquente e teve que sair da nave às pressas, deixando Olivia sozinha por um momento.
Ela saiu depois, sentindo o ar fresco da noite e sendo recebida pelo burburinho animado dos outros colonos. Um sorriso brotou em seus lábios ao ver seus colegas se divertindo e compartilhando momentos de alegria. A atmosfera festiva do Dia da Unidade era envolvente, e Olivia se permitiu relaxar e mergulhar na celebração.
— Ei, Kane! — Jasper chamou pela garota, entregando-lhe um copo. — Beba! — ele insistiu, com um sorriso travesso nos lábios, encorajando Olivia a participar da festa com entusiasmo.
— Ah, não... — a garota fez uma careta e balançou a cabeça. Ela não achava que era uma boa ideia beber naquele momento. — Deixa pra próxima! — declarou, preferindo se abster e continuar aproveitando a celebração de outra maneira.
— Vamos, Olivia. Amanhã você já poderá ser a heroína em ação de novo! — Jasper brincou, fazendo um beicinho e tentando persuadi-la com bom humor.
Olivia encarou Jasper por um momento, sentindo a pressão silenciosa da expectativa em seus ombros. Seu olhar então desviou para o copo em sua mão, enquanto Jasper sorria, aguardando sua decisão. Mesmo relutante, ela acabou cedendo. Com um suspiro resignado, Olivia virou o copo de uma vez só, sentindo o gosto amargo e forte descer pela sua garganta.
Um grunhido escapou de seus lábios após engolir o líquido, seguido por uma careta de desgosto que se estampou em seu rosto. Jasper não pôde conter a risada diante da reação de Olivia.
— Isso aí, garota! — Jasper deu leves batidinhas no ombro de Olivia, como se estivesse comemorando uma pequena vitória — O terror do Kane em pessoa! Quer mais? — ele perguntou, oferecendo outro copo com um sorriso travesso, ignorando os sinais de desconforto de Olivia.
E por incrível que pareça, Olivia aceitou. A garota pensou que poderia ser pior, mas o gosto da bebida era o de menos.
No entanto, sua decisão começou a parecer questionável quando se viu sentada perto de uma das fogueiras que haviam sido acesas. Com a cabeça apoiada em uma das mãos, ela sentiu uma onda de náusea se formando em seu estômago. Se não respirasse fundo e se concentrasse, provavelmente vomitaria ali mesmo.
Olivia permaneceu na mesma posição por longos minutos, lutando para manter a calma enquanto sentia a náusea se intensificar a cada instante. Se ao menos ela sentisse apenas o cheiro da bebida que Monty havia preparado, estaria encrencada.
Era evidente que Jasper era persuasivo, e Olivia prometeu a si mesma que pensaria muito mais do que duas vezes antes de ceder novamente à influência dele.
— Liv! Bebeu sem mim... — a voz de Bellamy fez Olivia erguer a cabeça lentamente. Ao vê-lo sentar ao seu lado e sorrir, ela sentiu um alívio instantâneo.
— Por favor, nunca me deixe fazer isso de novo — ela resmungou, vendo sua fala arrancar uma leve risada de Bellamy.
— Não se preocupe, na próxima vez estarei agindo como seu guarda-costas — ele piscou, lançando um sorriso travesso para a garota.
As mãos de Bellamy suavemente pousaram nos ombros de Olivia, que estava encolhida, provavelmente devido ao frio, já que não estava usando sua jaqueta. A primeira ideia que veio à mente de Bellamy foi tentar aquecê-la, mesmo que apenas com seu toque.
Olivia desviou o olhar do garoto e concentrou-se no fogo da fogueira. Ela sentiu seus lábios se curvarem em um pequeno sorriso ao perceber o toque reconfortante do polegar de Bellamy acariciando seu ombro.
— Belo jeito de comemorar meu aniversário — ela resmungou, deixando escapar um suspiro de desânimo enquanto observava as chamas dançando à sua frente. As palavras pareciam ter saído sem controle, uma expressão sincera de sua frustração e decepção.
Bellamy pareceu confuso após escutar aquilo; seus ombros caíram ligeiramente, e seu olhar ficou perdido, como se estivesse tentando decifrar o significado por trás da observação de Olivia.
— Hoje é seu aniversário? — ele perguntou, surpreso. Olivia voltou seu olhar para o garoto, e logo assentiu com a cabeça. — Por que não me contou? — Bellamy questionou, sua expressão carregada de perplexidade.
— O que iria mudar? Eu iria assoprar velas e vocês cantariam Parabéns? — ela ironizou, mas sua feição fraquejou, revelando um pouco de tristeza por trás do sarcasmo. Na verdade, Olivia sempre recebia apenas um vago "Parabéns" ou "Feliz Aniversário" de seu pai, nada mais. Ela estava acostumada com o desinteresse.
Bellamy analisou atentamente a expressão da garota, captando a sutileza da tristeza em seus olhos. Mesmo que ela tentasse disfarçar, ele conseguia sentir a dor que ela guardava dentro de si.
Com um gesto de gentileza e empatia, ele envolveu Olivia em um abraço caloroso, oferecendo-lhe seu apoio silencioso. Não havia necessidade de palavras; o abraço era suficiente para transmitir seu cuidado e solidariedade.
— Feliz aniversário, Liv — ele murmurou com suavidade contra o cabelo da garota, enquanto deslizava gentilmente sua mão direita pelas costas dela, transmitindo conforto e afeto através do simples gesto de carinho.
Olivia não sabia o que dizer ou fazer, então permaneceu em silêncio, deixando-se envolver pelo abraço reconfortante de Bellamy.
Um misto de emoções turvava seus pensamentos: gratidão por ter alguém como Bellamy ao seu lado, surpresa por ter encontrado conforto em meio àquele ambiente hostil, e um lampejo de esperança de que talvez as coisas pudessem ser diferentes, mesmo ali na Terra.
Enquanto sorria levemente contra o peito de Bellamy, ela percebeu que, de alguma forma, ele havia conseguido quebrar as barreiras que ela erguera ao seu redor, conquistando não apenas sua confiança, mas também um lugar especial em seu coração.
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