⁶⁴|Você arruinou tudo
Eu sei que falei que ele não poderia ser uma miragem, mas ele também não pode estar aqui. Certo? Eu só devo ter bebido demais e...
Ele dá um passo à frente. Um único passo. Então a realidade bate em mim. Khalil é real.
Puta merda.
Ficamos aqui, parados no meio do Central Park, olhando um para o outro. Eu deveria ir embora. Deveria correr para o mais longe possível dele, como fiz ao ir embora de Chicago. Não porque tenho medo dele, pois mesmo sabendo que ele é louco, Khalil não representa um risco para mim. Sei que ele nunca me machucaria. No entanto, ele representa um risco ao meu coração, que está disparado em meu peito
Ele está aqui. Ele está aqui. Ele está aqui, é o que cada batida está dizendo.
Khalil está aqui e apenas olhar para ele dói. Ele parece mais magro do que da última vez, com bolsas debaixo dos olhos. Seu cabelo está maior, como se ele não cortasse há um tempo. Ele não parece bem. Meu coração aperta. Preciso de todas as minhas forças para manter meus pés no lugar e não correr até ele, como todos os meus instintos estão gritando para eu fazer.
Em vez disso, permaneço onde estou quando Khalil dá mais um passo na minha direção. Seus olhos estão brilhando, mas sua expressão faz parecer que ele está com dor.
Seus lábios se movem.
— Kathryn — ele diz e… Deus, sua voz. Senti tanta falta da sua voz. Senti tanta falta dele e…
Não. Não, Kate.
— Como você me achou? — pergunto, minha voz tão baixa que é uma surpresa que ele ouça. — Você me seguiu?
Khalil franze as sobrancelhas. Eu ignoro a dor que essa expressão familiar me causa.
— Não. Não, eu… — Ele dá mais alguns passos. Está há pelo menos dez passos de mim agora. Perto demais. Ele nem mesmo deveria estar na mesma cidade que eu.
Recuo, fazendo-o parar.
Um leve rubor toma seu rosto. Mas como se isso não o abalasse, Khalil põe as mãos nos bolsos do seu sobretudo, seus olhos fixos em mim.
— Cheguei na cidade há dois meses e tenho procurado você desde então. — Um sorriso surge em seu rosto. É pequeno e suave e seus olhos estão brilhando… com lágrimas. — Não acredito que finalmente te achei…
Balanço a cabeça, fechando os olhos por uns segundos. Não posso olhar para ele. Não posso vê-lo chorar e deixar que me convença a perdoá-lo. Não posso.
— Você não deveria ter vindo — digo ao abrir os olhos. — Eu disse para me deixar em paz.
— Vamos conversar. — Ele diminui mais um passo entre nós. — Por favor.
— Você ouviu a garota, rapaz — Frank interrompe, lembrando-me que ele está aqui. Khalil o ignora, avançando, mesmo quando Dino começa a latir.
— Apenas cinco minutos — ele está dizendo, desesperado. — Podemos tomar um café. Qualquer coisa que você quiser.
— Quero que vá embora — disparo, mas minha voz não tem força. Dói tanto. Ele não consegue ver o que está fazendo? Não entende que isso é pior para mim, para nós?
— Você sabe que eu não posso…
— Dino, pega! — Frank grita de repente.
Arregalo os olhos quando o pastor alemão parte para cima de Khalil, pegando-o tão de surpresa a ponto de derrubá-lo.
Por instinto e porque sou uma idiota que ainda se preocupa com o homem que partiu seu coração em pedacinhos, dou um passo a frente, não sabendo exatamente o que fazer, mas sabendo que preciso fazer alguma coisa.
— Vá — Frank puxa meu braço e me empurra de leve para a direção oposta. Olho para ele, confusa. — Vá. Dino e eu vamos segurá-lo.
Não sei se me sinto tocada pelo seu ato ou fico furiosa. Sei que não devo ficar furiosa, é claro. Mas quando olho para Khalil, vejo ele xingando enquanto tenta se livrar de Dino. E se ele o morder?
— Vá! — Frank me empurra de novo.
A leve sacudida me faz despertar. Frank está certo. Preciso ir. Khalil ficará bem. E o que mais importa é que ele fique bem longe de mim.
Então dou as costas a eles e vou embora o mais rápido possível.
Meus pés batem no chão coberto de folhas do Central Park enquanto eu corro, determinada a escapar de Khalil e de todos os sentimentos tumultuados que ele desperta em mim. Cada batida do meu coração ecoa em meus ouvidos, uma mistura de medo e determinação me impulsionando para a frente.
Não desacelero nem mesmo quando vejo uma multidão reunida a poucos metros. Parece algum tipo de protesto. Eles estão bloqueando a saída pela qual eu planejava minha fuga.
Olho por cima do ombro. Khalil conseguiu se livrar de Dino? Eu deveria voltar?
Não. Siga em frente, Kate. Siga em frente.
Engulo em seco e obedeço a razão, porque se dependesse do meu coração, eu estaria ainda mais fodida.
A multidão à minha frente parece um emaranhado confuso de corpos e vozes, todos convergindo para um ponto único. Sem pensar, mergulho no meio deles, esperando me perder no tumulto e escapar de Khalil se tiver conseguido sair ileso e me seguido…
— Kathryn! — Seu chamado desesperado corta o ar agitado, invadindo meus pensamentos e minhas esperanças de escapar. Olho por cima do ombro e sem sombra de dúvidas, lá está ele, com o cabelo emaranhado e seu suéter rasgado. Eu sabia que ele não desistiria tão facilmente.
Viro novamente e me espremo entre as pessoas gritando com placas nas mãos. Talvez, inconscientemente, elas me deem cobertura e eu consiga chegar a saída. Posso pegar um táxi e Khalil nunca mais vai me ver.
Se é isso que eu quero, porque sinto uma dor em meu peito ao pensar na ideia de nunca mais ver aqueles olhos verdes esmeraldas ou ouvir seus lábios pronunciarem meu nome?
Devo ter me perdido nos meus pensamentos porque nem mesmo o vi se aproximando, apenas quando é tarde demais. No momento em que sua mão finalmente me alcança, tudo parece congelar ao nosso redor e eu sinto um choque de eletricidade percorrer o meu corpo. Khalil me segura firmemente, seus olhos buscando os meus em meio à confusão e ao caos.
Quero me soltar, mas também quero lhe puxar para perto. Quero gritar, mas sinto uma vontade avassaladora de sorrir para ele e dizer o quanto sinto sua falta. Quero exigir novamente que ele me deixe em paz e vá embora, mas tenho medo de que, quando abrir a minha boca, eu diga o contrário, implorando para ficar comigo.
Khalil parece ler minha confusão, porque seu olhar se suaviza. Ele me puxa para si, como se fosse me abraçar, mas algo acontece antes que ele possa.
Ouvimos sirenes uivar ao longe, anunciando a chegada da polícia. Luzes azuis piscam no horizonte, lançando sombras sinistras sobre a multidão agitada. Eu tenho um mal pressentimento sobre isso.
— Merda — Khalil xinga baixinho, segurando minha mão com mais força. Ele começa a andar, como se fosse cortar a multidão para nos tirar daqui, mas é tarde demais: os policiais já estão descendo das viaturas dando voz de prisão para todo mundo.
Khalil passa um braço protetor à minha volta quando confusão nos envolve. Há muitos gritos e alguns policiais até usam da força contra aqueles que se recusam a entrar nas viaturas. Não podemos fazer nada quando também somos levados com os manifestantes.
☠️
— Pela milésima vez, não temos nada a ver com aquela manifestação! — eu explico ao policial, de fato, pela milésima vez. Eles não acreditaram em nós já que estávamos no centro de toda aquela confusão generalizada.
O policial me ignora, fechando a cela.
— Posso pelo menos fazer uma ligação? — peço. Eu sei que posso, é um direito de todo cidadão, mas homens gostam quando as mulheres se fazem de idiotas porque isso os fazem se sentir superiores. Porém eles são ainda mais idiotas ao pensar que nós não sabemos disso.
— Daqui a pouco — resmunga. — Por enquanto, fiquem quietos.
É realmente impressionante como eu consigo me controlar para não lhe mostrar o dedo do meio.
Apoio minha testa nas barras de ferro. Cidade diferente, mas com o mesmo hábito ruim de ser presa. Qual o problema do universo comigo?
— Você está bem? — Khalil pergunta baixinho atrás de mim.
Os policiais nos colocaram na mesma cela junto com mais quatro manifestantes.
Eu ignoro Khalil assim como ignoro os outros.
Apesar de não estar nada feliz com essa situação, estou aliviada. A polícia, sem saber, me livrou de fazer uma merda bem maior do que ser presa por engano. Não consigo parar de pensar no que teria acontecido se eles não tivessem chegado. Eu estava quase deixando Khalil se aproximar, não estava? Não falo do sentido físico, mas emocional. Eu quase me deixei levar. Quase esqueci quem ele é. O que ele fez.
Como posso ter pensado que esquecê-lo seria fácil? Isso me assusta, na verdade. Não posso amá-lo para sempre… Certo?
— Sente-se aqui — Sua voz sobressai entre as das outras pessoas da cela – dois homens e duas mulheres.
Olho para Khalil por cima do ombro.
— Não estou falando com você — aviso. Há um tic no seu maxilar, mas ele não diz mais nada por um tempo.
As horas se arrastam. Já deve passar das 20h. Meu pai deve estar preocupado. Ele não viu quando eu saí e deve estar morrendo de preocupação, além de ficar irritado com Gavin. Se eu pelo menos pudesse ligar para eles…
Solto um suspiro, sentindo o cansaço me alcançar. Estou em pé desde que fomos jogados aqui, pois sou teimosa e recusei a sentar ao lado de Khalil. Todos os outros cantos da cela estão ocupados pelos outros. Pelo menos eles estão dormindo, ao que parece. E Khalil não abriu a boca de novo. Melhor assim.
Depois de mais uma hora dizendo a mim mesma que eu já aguentei coisa pior, suspiro novamente e tomo coragem para ir me sentar ao lado dele. Khalil está sentado no chão, contra a parede, com a cabeça apoiada no concreto e os braços descansando nos joelhos dobrados. Seus olhos observadores não perdem nenhum momento meu conforme me sento ao seu lado. Tomo cuidado para não tocar nele ao cruzar os braços e dobrar meus joelhos.
Concentro-me na minha respiração. Tenho medo que ele ouça meu coração acelerado. Preciso me acalmar. Preciso me lembrar de tudo o que nos trouxe até aqui.
— Eles sentem sua falta — sua voz é baixa ao falar, interrompendo meus pensamentos. Não abro os olhos. — Meus pais só deixaram de colocar seu lugar na mesa dois meses depois que você foi embora. Mas de vez em quando eles esquecem. Eros e Anthony ficaram sem falar comigo por um tempo, porque são mais fiéis a você do que a mim, aparentemente. Freya faz cartas para você, porque ensinaram a ela que deve desenhar quando sente saudade de alguém. Há uma pilha delas. Dean também sente sua falta, ele vive me perguntando sobre você e…
— Pare — peço baixinho. — Por favor.
Dói ouvi-lo falar deles. Dói, principalmente, porque ele está jogando na minha cara que eu os abandonei.
Abro meus olhos e viro o rosto para encará-lo. Nem mesmo me assusta o quanto estamos próximos.
— O que você está tentando fazer? Acha que vai me fazer voltar com essa chantagem emocional? — mantenho minha voz baixa, para os outros não ouvirem.
Khalil franze as sobrancelhas.
— Não estou fazendo isso. Eu… — O vinco entre suas sobrancelhas se aprofunda antes de ele balançar a cabeça. — Desculpa.
Ele parece sincero.
Não se esqueça que ele é o mestre da mentira.
Ignoro essa voz. Apenas por esse momento.
— Também sinto falta deles — me sinto na obrigação de confessar. Independente de como as coisas estão entre Khalil e eu, não há motivos para que eu o faça pensar que não me importo com sua família.
Seu olhar percorre meu rosto. Ele não parece estar buscando verdade nas minhas palavras. É mais como se estivesse me vendo pela primeira vez. Como se até então, ele não estivesse acreditando que sou real. E quando seus olhos fixam na minha boca, pergunto que tipo de pensamento está passando pela sua cabeça.
Você sabe exatamente o que ele está pensando.
Eu sei, sim, pois sinto o familiar formigamento na minha boca. O calor. Faz meses que não sinto isso. Estou em uma cidade com mais de oito milhões de pessoas, dentre elas homens, e nenhum outro foi capaz de despertar o que Khalil causa em mim. Será essa minha maldição?
Engolindo em seco, viro meu rosto para a frente. Que diabos? Acabamos de ter algum tipo de momento? Isso só o deixará ainda mais confiante.
Controle-se, Kathryn!
— Achei que não fosse encontrá-la — Khalil é o primeiro a falar de novo. Quero tapar meus ouvidos tanto quanto quero ouvi-lo. A segunda alternativa vence. — Nova York é tão grande. Eu não ia desistir, mas a cada dia sem notícias suas, ficava cada vez mais difícil me manter esperançoso.
Não diga nada. Ignore…
— Como você me achou? — Não olho para ele ao perguntar. Melhor se não mantermos contato visual. — Quer dizer, você só ficou indo ao Central Park todo dia? Como sabia que eu gosto de ir lá?
Pelo canto do olho, vejo-o hesitar. Ele mentiu, então? A verdade é que realmente tem me seguido? Talvez até estivesse aqui desde o início e apenas me deixou em paz para me dar uma falsa sensação de que eu tinha conseguido ir para longe dele.
— Foi Genevieve que me encorajou a vir. Ela… me deu uma lista de lugares que você frequenta. O Central Park está no topo.
Levo um minuto para absorver suas palavras. Minha melhor amiga estava bancando a espiã. Eu deveria imaginar. Na verdade, eu imaginei, sim. E foi por isso que não dei o endereço do apartamento de Gavin para ninguém. Sabia que se tivesse feito isso, em algum momento um deles acabaria deixando escapar a informação.
— Tente não ficar chateada com ela — Khalil pede. — Genevieve só estava tentando ajudar. Ela acha que ainda temos uma chance.
— Não estou chateada. Eu sei que ela com certeza não teria essa atitude se soubesse o monstro que você é.
Eu sinto mais do que vejo quando Khalil se encolhe ao meu lado. Rapidamente abro a boca para retirar as palavras, mas não faço. Não vou me desculpar. Esse homem me perseguiu e fingiu ser outra pessoa. Ele errou, não eu. Não posso ficar sentindo pena dele como se fosse a vítima dessa história.
— Eu realmente sinto muito — seu apelo carregado de dor alcança meus ouvidos.
Concentro-me em uma mancha na parede, fingindo não ouvi-lo. Se eu ignorá-lo, talvez ele fique em silêncio também.
— Eu estava fodido naquela época, Kathryn — Khalil continua, no entanto. — Às vezes eu nem sabia que dia era ou quem eu era. Eu só queria fumar, beber e foder. Essa era a minha vida. Então você apareceu e… — Ele faz uma pausa, suspirando. — Eu fiquei fascinado. Talvez porque eu sabia que você era intocável, talvez porque eu me senti intimidado… Não sei dizer ao certo. Mas, sim, você virou minha obsessão.
Fecho os olhos, sentindo um peso no peito. É isso que eu sempre fui para ele, não é? Uma obsessão doentia que ele nunca conseguiu superar.
Khalil continua sem saber como suas palavras me dão mais certeza de que nós nunca poderíamos reatar:
— Um ano virou dois, depois três, depois quatro… Até que eu não sabia mais porque fazia aquilo. Eu descobri mais de você me mantendo nas sombras do que quando estávamos no mesmo ambiente. Eu comecei a me preocupar com quem você saía e se voltaria em segurança para casa. Até Pax percebeu que havia algo errado. Eu não me importava com as pessoas daquele jeito. — Sinto seus olhos em mim. — Comecei a amar você sem perceber. Foi um início errado e confuso, e eu nem mesmo sabia disso, mas era amor. Você deixou de ser uma obsessão quando fiquei sóbrio e percebi que o que eu sentia por você não foi embora com as drogas e o álcool. Eu sabia que não era mais uma obsessão quando meu coração acelerava toda vez que eu te via e eu não conseguia tirar meus olhos de você pensando o quanto eu queria que você fosse minha. O quanto eu queria que você me amasse também.
Sua mão está gelada ao tocar meu rosto, mas não me assunto. Meu corpo ainda reconhece seu toque.
Abro os olhos, encontrando os seus. Ele está vendo como estou lutando contra as lágrimas? Como meu coração está sangrando agora?
Khalil acaricia minha bochecha com seu polegar, seus olhos tão, tão tristes.
— Sinto muito por ter feito tudo errado, meu amor. Desculpe.
Pisco algumas vezes, tentando afastar as lágrimas, mas uma ainda escorre pela minha bochecha. E eu deixo Khalil enxugar, já que ele é o culpado de eu estar chorando, para início de conversa.
— Você não pode aparecer aqui e me dizer essas coisas — minha voz soa quebrada, cansada. Estou tão cansada de lutar contra o que meu coração realmente quer. — Você não tem o direito de fazer isso… sua obsessão, parecer uma história de amor. É errado. Você não vê? — Estou ficando sem ar. Como naquela noite, sinto que estou prestes a ter uma crise. — Você me enganou, Khalil. Tem ideia de como dói em mim? — Aponto para o meu peito, procurando desesperadamente seus olhos. — Acredito que você está arrependido, mas como você espera que eu possa te perdoar? — Faço uma pausa quando mais lágrimas rolam pelas minhas bochechas. — Você foi o meu primeiro amor e foi o primeiro a quebrar o meu coração também — sussurro, minha voz falhando. — E essa dor é insuportável. Você me ensinou que eu posso odiar alguém, mesmo que ainda o ame. E eu te amo. Amo tanto que dói. Mas também te odeio por tudo o que fez. Pelo que fez com a gente. Você arruinou tudo. Sinceramente? Eu não sei se um dia vou ser capaz de te perdoar.
Uma única lágrima rola pela sua bochecha antes de Khalil limpá-la, assentindo. É como se, de fato, ele estivesse entendendo o que eu tentei dizer sete meses atrás. Ele balança a cabeça mais algumas vezes, limpando seu rosto uma vez ou outra quando seu autocontrole rompe e mais lágrimas deixam seus olhos. É tão doloroso vê-lo chorar. É tão doloroso saber que ele está chorando por minha causa. Odeio toda essa situação, odeio ele, mas não queria vê-lo sofrer.
— Está tudo bem — Khalil sussurra parecendo se controlar. Seus olhos ainda estão brilhando com lágrimas não derramadas, no entanto.
Quanto a mim, não tenho controle conforme lágrimas silenciosas molham meu rosto e pingam no meu casaco. A dor em meu peito é insuportável. Sinto que não estou respirando rápido o suficiente. Ou talvez esteja e esse seja o problema.
— Shh, está tudo bem, Kathryn. — Khalil passa o braço pelos meus ombros, me puxando para si. Sou grata por isso. E também hipócrita, mas não consigo mais pensar com clareza e o conforto do seu abraço parece certo agora.
Com o meu rosto apoiado em seu peito, tento respirar, ouvindo as palavras reconfortantes de Khalil enquanto ele acaricia minhas costas e meu cabelo.
Depois de um tempo, quando estou mais calma e quase dormindo, ouço-o sua voz.
— Talvez você não consiga me perdoar — ele sussurra contra os meus cabelos —, mas isso não significa que vou parar de tentar. Lembre-se disso, ok?
Não digo nada nem faço sinal de que ouvi. Não sei o que ele quer dizer.
No entanto, preciso dar parabéns ao destino. Aqui estamos nós, dez anos depois, em uma cela de prisão novamente, onde nos conhecemos. Khalil e eu nunca falamos disso e talvez ele até não se lembre, mas é muito irônico que, no fim, tudo acabe exatamente onde começou.
☠️
Meus olhos estão pesados. Não lembro a última vez que eu dormi de verdade. Algumas horas de sono são tudo o que eu consigo ultimamente. Pela aparência de Kathryn, diria que está sofrendo do mesmo problema que eu. Não me entenda mal, ela continua tão linda como sempre, mas seu rosto está mais magro e ela parecia terrivelmente cansada. Aposto que está usando maquiagem para cobrir as olheiras. E é tudo culpa minha.
Com cuidado para não acordá-la, afasto seu cabelo do rosto. Ela pegou no sono há um tempo. Parece calma. Apesar de tudo, me traz um pouco de satisfação saber que ela ainda consegue se sentir à vontade comigo a ponto de abaixar suas defesas e tirar um cochilo. Claro, o fato de ela estar provavelmente muito cansada também deve ter influenciado isso.
Odeio vê-la chorar. Odeio ser o motivo do seu sofrimento. Preciso consertar isso, mas como? Eu entendo agora que talvez ela não consiga mesmo me perdoar, mas eu também não consigo desistir. Preciso lembrar a ela quem eu sou de verdade. Não aquele homem que a aterrizou escondido atrás de uma máscara. Mas eu, Khalil. O seu Khalil.
Só não sei como fazer isso ainda.
Não quero dormir, pois eu não sei quando a terei em meus braços novamente, mas não consigo mais manter meus olhos abertos e acabo caindo no sono sem nem perceber.
Não sonho com nada e quando acordo estou mais cansado do que antes que nem parece que cochilei.
As outras pessoas que foram presas conosco, os verdadeiros manifestantes, estão fazendo barulho. Foi o que me acordou. Não fico surpreso quando Kathryn desperta também, se mexendo em meus braços.
— Urgh. Minha bunda está dormente — ela murmura. Isso me tira uma leve risada.
Kathryn olha para cima, parecendo se dar conta de onde está e com quem está. Sorrio para ela mesmo quando seus olhos se arregalam levemente.
— Bom dia, Kit Kat
Seu cérebro dá indícios de ter voltado a funcionar quando ela se afasta, sentando-se ereta longe dos meus braços. Sinto sua falta imediatamente. Mas eu sabia que só tinha apenas mais algumas horas, não foi? No entanto, essa distância ainda dói.
Kathryn pigarreia, passando os dedos pelos fios agora emaranhados do seu cabelo.
— Bom dia.
Para a minha infelicidade, um policial aparece quando estou tentando pensar em um plano.
— Acordem. Vocês serão liberados.
Os outros se agitam, mal vendo a hora de sair. Já eu, me vejo lamentando. Queria ter mais tempo com Kathryn, nem que isso significasse passar mais um dia nesse chão frio.
Mas aparentemente sou o único pensando assim, porque Kathryn também se levanta, com pressa para ir embora. Para se livrar de mim.
O policial nos conduz para uma fila. Após alguns minutos, depois de termos assinado alguns papéis e pegado nossos pertences, somos liberados.
O sol está frio quando saímos e a rua, pouco movimentada. Não deve ser nem cinco da manhã direito.
— Vou chamar um táxi — digo a Kathryn, já pegando meu telefone.
— Não precisa. Eu vou andando.
Ergo o rosto rapidamente.
— Você mora por aqui?
Seu olhar gelado faz com que eu me sinta um idiota. É claro que ela não vai me contar.
— Tem certeza? Está um pouco cedo. — Olho em volta. Nova York pode ser a cidade mais movimentada da América, mas às seis da manhã de um domingo, não há quase ninguém na rua.
— Tenho. — Kathryn hesita. — Por favor, não… Não me siga.
Tensiono meu maxilar e desvio meus olhos, envergonhado. Não posso dizer que isso não passou momentaneamente pela minha cabeça, mas eu rapidamente espantei o pensamento. Não sou mais ele.
— Ok — murmuro, guardando meu telefone e minhas mãos dentro dos bolsos do sobretudo.
Um minuto de silêncio se passa entre nós. Ela também sente dificuldade em dizer adeus? Isso é um adeus? Não pretendo desistir dela, mas Kathryn já está decidida de que “nós” não existimos mais. Não posso obrigá-la a dar mais uma chance. Então, o que farei?
Sentindo que preciso fazer alguma coisa, digo a primeira coisa que passa pela minha cabeça.
— Central Park, Shakespeare Garden, às três da tarde — digo apressadamente. — Se mudar de ideia, estarei lá.
Seus lábios se separam e Kathryn inspira fundo, antes de fechar os olhos por alguns segundos, balançando a cabeça. Ao abri-los, eles continuam tristes, mas aquela resignação de quando nos encontramos ontem à tarde, está lá de novo.
— Adeus, Khalil — Kathryn diz as temidas palavras.
— Até logo — sopro de volta.
Ela parece querer dizer mais alguma coisa, mas muda de ideia e me dá as costas. Eu permaneço no lugar, observando-a ir enquanto todos os meus instintos mais sombrios gritam para que eu vá atrás dela.
Não, digo a eles. Não vai ser assim que eu a terei de volta.
Não sei como farei isso, mas não vou desistir. Nem que eu precise esperar anos pra isso.
☠️
Confesso a vcs que eu chorei muito nesse capítulo. Juro. O Khalil chorando é o meu ponto fraco 😭😭😭😭. Tadinho do meu bebê. Ele errou ,mas tá arrependido, vcs n acham???🥺
Falta pouco pro fim... Não estou preparada😫💔
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2bjs, môres♥
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