²¹|Meias verdades e meias lembranças
— O que é isso? — questiono ao entrar na sala de Khalil com a caixa preta que achei na minha mesa, em cima do meu notebook.
— Um celular.
Semicerro os olhos.
— Eu sei que é um celular.
— Então por que perguntou?
Quantos anos de cadeia eu pegaria por assassinato?
— Por que você me deu um celular?
— O seu está quebrado.
— Eu posso comprar o meu próprio celular.
— Eu sei.
— Então por que você comprou um para mim?
— Por que eu quis.
Suspiro, fechando os olhos por alguns segundos. Minha paciência está no limite e esse idiota só está piorando tudo. Como sempre, porque o trabalho da vida dele é tirar a minha paciência e me irritar até que eu tenha cabelo branco antes dos trinta.
Abro os olhos e forço uma cara simpática, colocando a caixa de telefone na sua mesa.
— Ok, mas eu não quero.
— É um presente.
— Eu não quero presente nenhum de você.
Khalil se recosta em sua poltrona e arqueia a sobrancelha. O tic em sua mandíbula me chama atenção.
— Não pode aceitar a porcaria de um celular, mas tudo bem ganhar um colar de diamantes de milhares de dólares?
Franzo as sobrancelhas. Ele enlouqueceu?
— Do que você está falando?
Khalil inclina o queixo para a caixa achatada que eu não tinha visto em cima da mesa.
— Chegou para você.
Ainda confusa, puxo a caixa para mim e desfaço o laço. Dentro há uma caixa menor, de veludo, e quando abro, encontro, de fato, um colar de diamantes.
Olho para Khalil. Como ele sabia que…
— Você abriu? — pergunto, incrédula.
Ele dá de ombros, sua expressão impassível.
— Deixaram na sua mesa. Achei que podia ser para mim.
Por algum motivo, não acredito nele.
Volto meus olhos para a caixa e para o cartão dentro dela. Não quero ler na frente de Khalil porque ele ainda está me encarando, mas antes que eu me impeça, já estou pegando o pedaço de papel grosso.
Use-o hoje à noite.
20h; Complexo.
— Alex.
Claro. Tinha esperanças de que não fosse dele, mas obviamente fui tola.
Não acredito que ele mandou isso para o meu trabalho. Não estou surpresa com o fato de ele saber onde eu trabalho quando manda seus capangas ficarem me seguindo. Vi aquele mesmo homem do outro dia quando fui almoçar com Anthony e Genevieve, hoje. E mais uma vez, me perguntei se talvez meu perseguidor não seja alguém mandado por Alexander…
Solto um suspiro e pego a caixa depois de fechá-la. Parece que vou descobrir hoje à noite.
— Então? — Ouço a voz de Khalil e ergo os olhos.
— Então o quê?
— De quem é o presente?
Sorrio.
— Do Sr Não É Da Sua Conta.
Seu olhar queima minhas costas conforme caminho para fora da sala. Que se dane ele, tenho problemas maiores que Khalil Intrometido Blackburn para lidar.
☠️
O que você usaria para encontrar o homem que foi sua figura paterna por três anos até você perceber que ele não te via como pessoa, mas sim como uma arma?
Isso mesmo: calça de couro preta e uma camisa preta de botões. E não, aquele colar não combina com essas roupas, mas eu não estava pensando em usar, de qualquer forma. Aquele velho idiota pode até comandar as drogas e as armas, mas ele não manda em mim, então estou muito feliz em decepcioná-lo. Não fui uma ótima aprendiz porque seguia todas as regras cegamente, mas sim meus instintos. E felizmente foi isso que me fez perceber quem Alexander era de verdade.
Uso botas de couro ao invés de saltos e prendo meu cabelo em um rabo de cavalo ao invés de deixá-lo solto. Quando me olho no espelho, me vejo encarando a Kathryn de dezesseis anos e não a de vinte e nove. Essa Kathryn ainda não tem cicatrizes e nunca levou um tiro. Ela também não sabe como usar uma arma, mas dorme com uma todos os dias depois das aulas de tiro que ela sempre fracassa até… Até o dia que ela se arrepende de não ter feito um real esforço para aprender direito…
QUATORZE ANOS ATRÁS
— Não vou mais treiná-la. Ela é uma perda de tempo — Mick, um dos homens de Alexander, diz na hora do jantar.
— Você fará o que eu mandar você fazer — Alex diz tranquilamente enquanto corta o bife em seu prato.
Ao meu lado, Lúcio reprime uma risada. Nós dois não gostamos de Mick. Ele é velho e muito rabugento, além de se achar superior a nós apenas porque é o braço direito de Alex.
— Coloque-a no Palace. Ela ainda é jovem, vai render muito dinheiro para você — Mick diz.
— Eu não serei uma prostituta! — Bato minha mão na mesa, fazendo os pratos e talheres chacoalharem levemente. Minha mão arde, mas não ligo para a dor quando encaro Mick.
— Oh, você se acha superior a elas? — O verme dá risada. — Acho melhor mudar esse comportamento, garota. Uma boceta é uma boceta, você não é especial, mas pode se dar bem se souber se controlar.
— Eu. Não. Serei. Uma. Prostituta! — repito mais alto, minha outra mão segurando a faca com mais força.
Mick vê isso e volta a rir. Odeio sua risada e o motivo por trás dela. Ele sabe que eu tenho fracassado em todas as aulas: defesa, ataque com faca, tiro… Ele está certo ao dizer a Alexander que sou uma perda de tempo: muito magra, muito lenta, muito burra para não saber o jeito certo de segurar uma arma. Não que ele tenha feito muito esforço para me ensinar. Ele só grita comigo e ri quando eu erro. O que é sempre.
— O que vai fazer com essa faca?
— Vou arrancar a sua língua e enfiar no seu rabo — cuspo as palavras. Mamãe sempre disse que sou muito criativa para insultos. Ela me deixaria sem sobremesa se ouvisse isso.
— Se você fosse tão inteligente com uma arma como é com as palavras, eu até acreditaria, mas aquele cara que matou a sua mãe conseguiu ser mais eficaz com uma faca do que você.
As palavras me pegam totalmente desprevenida. Mick é um desgraçado, mas ele nunca tinha falado da minha mãe antes. E o que ele disse… Como ele ousa…
Um barulho estranho ecoa na sala de jantar e eu estou submersa demais na raiva para perceber que veio de mim mesma antes de subir em cima da mesa como um animal. Na nossa primeira aula, Mick disse que pelo fato de eu ser pequena, eu podia ser ágil e atacar meus oponentes antes que eles percebessem. Foi a coisa mais útil que ele já me disse.
Quando Mick me vê chegando, já é tarde demais. Eu não ligo para a comida ou qualquer outra coisa à minha volta conforme me atiro em cima de Mick. Nós dois caímos no chão com o impacto.
Já estou erguendo a faca e não percebo o que estou fazendo até que ela esteja cravada no ombro de Mick e eu erguê-la de novo. Sangue espirra em meu rosto. Não me importo. Começo a descer a faca de novo, esperando acertar seu peito dessa vez, mas algo me atinge no rosto e eu sou atirada para o lado.
— Sua cadela!
Enquanto Mick esbraveja, minha mente gira pelo tapa que ele me deu. Eu sabia que ele tinha a mão pesada porque não foi a primeira vez que ele bateu, mas daquela vez, Alexander o puniu e Mick nunca mais tinha tocado em mim.
— Você quer mostrar suas garras? Você finalmente quer lutar? — Mãos me puxam para cima e eu me recupero o suficiente para me debater quando Mick força a parte superior do meu corpo sobre a mesa, batendo minha cabeça com tanta força na madeira que eu grito. — Vamos ver o quanto você vai gritar agora, vadia.
Mick me imobilizou, prendendo minhas mãos atrás das minhas costas, por isso não posso fazer nada quando ele ergue meu vestido.
— Você vai aprender a nunca mais me desrespeitar.
Luto contra as lágrimas. Eu não vou chorar. Não choro desde o dia que a minha mãe morreu, há seis meses, e não vou voltar agora só porque esse verme quer me ensinar uma lição. Então enquanto ouço o barulho do seu cinto abrindo, mantenho minha boca fechada e meus olhos abertos.
Meu olhar encontra o de Alexander. Eu esqueci que ele estava lá. Eu esqueci tudo, na verdade. Mas agora encaro seus olhos azuis frios. Ele vai deixar. Ele vai deixar Mick me estuprar apenas para que eu aprenda uma lição. Não deveria estar surpresa, ele é Alexander Vega, afinal, o cara que manda em Chicago e que construiu sua reputação com sangue daqueles que o desafiaram.
No entanto, ainda dói. Porque eu confiei nele, acreditei que ele me protegeria. Eu sei que não fui a melhor aprendiz nos últimos meses, mas ele disse que respeitaria meu luto. Eu fui idiota. Tão idiota…
Quando Mick começa a puxa minha calcinha, sinto o medo deslizar na minha pele e se infiltrar em meus ossos. As palavras ”Por favor, pare” e "Ajuda" estão entaladas na minha garganta, mas eu não vou implorar. Todo mundo sabe que o que Mick está fazendo é errado, mas se ninguém me ajudará, isso diz mais sobre eles do que sobre mim.
Quando sinto uma coisa dura na minha coxa, expiro fundo, engolindo em seco. Tá tudo bem. Não é nada. Vai doer e depois vai acabar. Está tudo bem.
Está…
Paro de falar quando vejo a arma em cima da mesa. Alex acabou de colocá-la ali. Mick está muito ocupado passando suas mãos em mim e dizendo coisas para notar.
Travo meus olhos com os de Alex.
Faça, ele diz.
Uma chance. Ele está me dando a oportunidade de eu mesma me salvar.
O que foi que ele disse quando eu falei que não sabia lutar ou segurar uma arma? "Aprenda, pois só você pode salvar a si mesma."
Piso no pé de Mick e como imaginei, seu aperto sobre meus pulsos vacila. É o suficiente para eu me soltar. No segundo que isso acontece, agarro a arma.
Não penso duas vezes no que estou prestes a fazer. Não me importo que esse momento irá mudar tudo: quem eu fui, quem eu sou, quem eu serei a partir de agora. Nada disso importa quando eu me ergo e viro para Mick.
Eu não penso. Acho que nem pisco quando aperto o gatilho.
Uma.
Duas.
Três.
Quatro vezes.
Mick está morto.
☠️
Eu vim de Uber. Deveria ter vindo com meu próprio carro, eu sei, mas aqui estou descendo do carro de aplicativo após pagar o motorista.
Meus pés fazem barulho no caminho de pedra conforme caminho até o portão. Encaro a câmera que fica logo acima e espero.
O lugar é chamado de complexo por um motivo: é uma enorme propriedade protegida por muros tão altos quanto os três andares da casa, com esse também enorme portão de aço. A casa em si é uma monstruosidade de sessenta quartos, muitos deles convertidos em academias, clube de tiro, anexo para armas, salas de tortura e uma ala hospitalar. Uma verdadeira fortaleza para um homem.
Não me assusto com o clique do portão, apenas espero ele subir para que eu possa passar. Feito isso, um arrepio atravessa meu corpo. Há onze anos, eu saí por esse portão e não olhei para trás, jurando a mim mesma que nunca mais voltaria.
Você deveria ter mantido sua promessa.
Calo a voz dentro da minha cabeça – minha própria voz – quando subo os degraus de mármore até às portas duplas que se abrem para a mansão quando termino de fazer minha subida.
Assim que entro, as portas são fechadas atrás de mim, sem dúvidas por algum comando por aplicativo já que quase tudo é controlado por tecnologia de ponta.
Não há ninguém para me receber ou indicar o caminho, o que não me incomoda já que eu o conheço e após alguns segundos caminhando, encontro a sala de estar luxuosa. Há lustres no teto, mas toda a decoração tem o mesmo ar sombrio que o Palace, variando entre cores frias e preto. Há três janelas enormes e para cada uma um homem vestido da cabeça aos pés de preto, com armas visíveis na cintura enquanto observam o lado de fora da propriedade. Eles não olham para mim, mas sei que estão cientes da minha presença.
Meus olhos são atraídos para o chefe deles, sentado em uma poltrona bebendo do seu copo de whisky.
— Sempre pontual — Alexander sorri para mim, mas não retribuo ao me aproximar e colocar a caixa com o colar em cima da mesa de centro. — Foi um presente.
— E eu estou recusando. — Qualquer outra pessoa na minha situação faria tudo o que ele pedisse, mas eu não sou assim e Alexander sabe. Não vou usar esse colar apenas para agradá-lo. — Você me chamou aqui, então deve ter desc…
— Era da sua mãe.
— O quê? — Sinto meu coração parar.
Alexander aponta para a caixa.
— Seu pai mandou fazer especialmente para ela.
Olho da caixa para Alexander, sentindo meu coração bater acelerado em meu peito.
— Meu pai — repito, as palavras saindo estranhas. — Como você… Você conhecia meus pais biológicos?
— Sim. — Ele faz uma pausa. Tenho vontade de pular no seu pescoço e exigir que fale logo, mas aguardo. — Sean, seu pai, era meu irmão.
O que faria de Alex… meu tio.
Talvez eu devesse sentar, mas apenas encaro Alexander sem acreditar no que acabei de ouvir.
— O quê? Que porra você tá falando? Isso não faz sentido. — Dou alguns passos para trás, esperando que eu tenha, talvez, entrado em um universo paralelo, porque isso não pode ser verdade, certo? — Você nunca disse nada. Eu não entendo…
— Sente-se. Eu sei que é muito para assimilar. — Não percebi que Alexander havia levantado, mas agora ele está me fazendo sentar no sofá enquanto se acomoda ao meu lado.
— Por quê? Se isso for verdade, por que você nunca disse nada?
— Prometi a Yuna que nunca contaria. Foi o nosso acordo — diz, se referindo a mulher que me criou e quem eu achei que era minha mãe biológica até então.
— Que acordo?
Mas antes que Alexander comece a explicar, um dos seus capangas se aproxima e diz algo em seu ouvido. Estou meio zonza pelos últimos minutos, mas acho que vejo Alex hesitar antes de assentir.
— Acho melhor falarmos sobre isso enquanto jantamos. — Ele não espera minha resposta ao ficar de pé. Seu capanga se afasta e diz alguma coisa no rádio. — Aliás, seu convidado acabou de chegar.
Provando que ainda estou assimilando a revelação que acabei de descobrir, não presto atenção no que ele diz ou me levanto. Preciso de alguns minutos para pôr minha cabeça no lugar. Se já estou desse jeito sabendo apenas uma pequena parte dessa história, não quero nem pensar quando Alexander me contar tudo.
Se ele estiver falando a verdade.
Eu não sei por que ele mentiria, mas sei que não posso acreditar cegamente nele. Não posso esquecer o homem impiedoso que me treinou, que me ensinou a mentir e a saber quando meus inimigos estão mentindo. Por isso preciso da minha mente limpa e…
Ergo o rosto quando ouço passos na sala. Sabe aqueles momentos que seu cérebro para por alguns segundos igualzinho quando seu computador trava? É assim que eu me sinto agora enquanto observo o homem caminhando até mim. Botas pretas, jeans, camisa e jaqueta de couro pretas. Só conheço uma pessoa que usa tanto preto assim.
Encaro Khalil, um pouco sem acreditar que ele está mesmo aqui. Quer dizer, que porra ele está fazendo aqui?
— O Chefe está esperando vocês na sala de jantar — o homem que cochichou no ouvido de Alexander avisa antes de se afastar.
Eu ainda estou olhando para Khalil. Pelo visto ele não é uma miragem.
— O que você está fazendo aqui? — pergunto calmamente. Eu preciso me manter calma.
— Você esqueceu de me convidar então vim sozinho. — Que ótimo, agora ele está sendo engraçadinho também.
— Estou falando sério, Khalil. Você não pode estar aqui. — Fico de pé e olho em volta. Os homens de Alexander não estão olhando para nós, mas não me deixo enganar.
— Qual o problema?
— Qual o problema? Deus, por onde eu devo começar?
Passo minhas mãos pelo meu rosto enquanto suspiro. Agora além de me preocupar com o que me aguarda naquela sala de jantar, também terei que me preocupar com Khalil. Alexander sabe quem ele é, tenho certeza disso. Seus capangas têm me seguido e aposto que fizeram um dossiê, descrevendo cada passa meu nos últimos dias além de informações sobre todas as pessoas na minha vida no momento.
— Kathryn. — Khalil se aproxima até estar invadindo meu espaço pessoal. Ele usa a ponta dos dedos para erguer meu rosto.
— Você não deveria ter vindo. — Abaixo meu tom de voz. — Alexander é um homem perigoso. Você precisa ir embora.
— Como você o conhece? — Claro que iria me ignorar. Se eu não estivesse tão preocupada agora, nós estaríamos tendo uma discussão sobre o fato de ele ter me seguido, pois não há outra forma de ele ter chegado aqui.
Eu não preciso dar satisfação a ele, mas ele precisa saber que estou falando sério sobre Alexander.
— Minha mãe morreu quando eu tinha dezesseis anos e eu acabei vindo morar com Alexander. Eu tinha professores particulares, mas as aulas que realmente importavam eram aquelas que envolviam lutas e armas de fogo. Eu era sua protegida e ele me transformou em um saldado. Fiz coisas para ele. — Engulo em seco quando flashes de memória envolvendo sangue me vêm à mente. — Aos dezenove, eu pedi para sair. Eu não queria mais ser um soldado. Morei na rua por um ano depois disso. Então eu conheci você e um ano depois eu conheci Eros. E aqui estamos.
— Por que estamos aqui?
Balanço a cabeça.
— É complicado.
— Temos tempo.
— Não, não temos. — Solto outro suspiro, pois sei que não vou conseguir convencê-lo a ir embora. — Apenas fique calado e não faça perguntas. Vou estripar você depois apenas por ter vindo aqui.
— Você fica fofa fazendo ameaças vans.
— Não me teste.
Afastando-me dele, sigo para o corredor, ouvindo os passos de Khalil atrás de mim segundos depois. Levo esse tempo para respirar fundo algumas vezes e relaxar meus ombros, esperando que eu não pareça tão tensa quanto me sinto.
Passei anos fazendo minhas refeições nessa sala, mas afasto todas as lembranças conforme ocupo o assento ao lado direito da cabeceira na mesa, onde Alexander está sentado.
Ou estava, pois ela se levanta quando nota Khalil.
— Não fomos apresentados. Sou Alex. — Ele estende a mão para Khalil. — Você é Khalil Blackburn, certo? Chefe da Kate.
— E o namorado dela também.
Se eu estivesse comendo, engasgaria.
Quando Khalil senta ao meu lado, encaro-o de olhos arregalados que gritam "você tá louco, porra?". E minha reação não é por ele ter dito isso a Alexander, mas porque nós não namoramos e estamos muito longe disso.
— Parece que Kate esqueceu de me atualizar sobre algumas coisas — Alexander diz, mas não olho para ele ainda.
Khalil sorri. Não é um sorriso cheio de dentes, mas ainda é um sorriso, algo com o que não estou acostumada vindo dele.
— Ela é um pouco tímida sobre isso. Estou começando a pensar que ela tem vergonha de mim. — Agora ele está fazendo piadas conforme estende sua mão e acaricia minha bochecha.
Forço um sorriso e pego sua mão, deixando minhas unhas cravarem na sua pele ao afastar o seu toque, mas faço isso como se fosse um ato carinhoso, então acho que Alexander não percebe.
— Kate, tímida? Isso é novo. Como vocês se conheceram?
— Isso não importa — finalmente, interrompo essa besteira toda, encarando Alexander. — Vim aqui para falar dos meus pais. Se você está falando a verdade, Alexander, porque não disse nada quando perguntei a você no sábado?
— Já disse: fiz uma promessa à Yuna.
— Ela morreu há quatorze anos.
— Eu sou um homem de palavra.
Reviro os olhos mentalmente. Ele está me enrolando.
Espero mais um pouco quando os empregados vêm servir a comida, mas quando eles saem, não toco no meu prato.
— Como eles morreram? — pergunto baixinho. Talvez aquela lembrança que tive não foi exatamente o que aconteceu…
— Foram assassinados em uma negociação que deu errado.
Encaro meu prato enquanto repito suas palavras em minha mente. Assassinados. Então aquele flashback não foi uma invenção, eu estava presente quando minha mãe morreu, eu a vi ser morta. E mesmo assim essa revelação ainda dói em meu peito, pois meus pais foram tirados de mim e eu nem me lembro deles.
Sinto a mão de Khalil em minha perna, mas não olho para ele, apesar de apreciar o aperto reconfortante.
— Por quem?
— Cedric Sutton.
Por um momento, eu espero que o nome traga outra lembrança, qualquer coisa, mas nada acontece. Poderia ser apenas o nome de um homem qualquer, mas é o nome do homem que matou os meus pais.
— Eu não quero apenas migalhas de informações. Eu quero saber tudo.
Encaro Alexander, deixando claro que não vou recuar. Estou cheia de meias verdades e meias lembranças.
Ele concorda e começa a falar.
— Sean conheceu sua mãe quando ela estava na faculdade e ele fazia negócios em Boston, onde ela morava…
— Que tipo de negócios? — o interrompo, já desconfiando da resposta.
— Armas. Ele era meu braço direito. Eu assumi o lugar do nosso pai muito cedo, mas Sean tinha uma alma de aventureiro, apesar de sempre ter cumprido com seu dever na família.
Não sei como me sentir em saber que venho de uma família de criminosos, mas deixo para pensar nisso depois e foco minha atenção no que Alexander está dizendo.
— Sua mãe ficou grávida um ano depois após ela e seu pai começarem a namorar. Ela largou a faculdade, mas os dois ficaram em Nova York durante os anos seguintes… Até aquele dia. — Alexander faz uma pausa e pela primeira vez vejo algo parecido com tristeza em seu olhar. Se ele estiver falando a verdade, não foi só eu quem perdeu alguém importante. Ele perdeu um irmão. — Sua mãe tinha um amigo. Sean dizia que ele era apaixonado por ela, mas que sua mãe nunca deu bola.
Franzo as sobrancelhas, sem entender o que uma coisa tem a ver com a outra.
— Esse amigo também era filho de um fornecedor de armas, com quem seu pai foi me ajudar em uma negociação de última hora. A última. Ele queria sair dessa vida, por você e sua mãe. Sean iria levar vocês duas para o Japão, porque sua mãe cresceu lá e queria que você fosse criada lá também.
Meu coração se aperta de um modo insuportável e eu entrelaço minha mão na de Khalil sem pensar muito no que estou fazendo.
— Vocês foram conosco porque achamos que seria rápido. Mas era uma armadilha. Cedric, o amigo da sua mãe, estava lá. Ele estava transtornado, disse que não deixaria sua mãe ir embora, que ele era apaixonado por ela. — Outra pausa, dessa vez acompanhada de um suspiro e um leve balançar de cabeça. — Quando ela se negou a ir com ele, Cedric a matou na frente do seu pai.
— Eu lembro — murmuro, na verdade pensando em voz alta.
— Achei que você não tivesse memórias da sua infância — Alex diz.
— Não tenho. Apenas esse flashback da morte dela. O disparo e o sangue… — Um calafrio me percorre e posso jurar que ouço aquele som. — E que aconteceu com o meu… com o meu pai? — Parece estranho chamar alguém de pai mesmo depois de saber que eu tive um.
— Nossos homens chegaram naquela hora e foi uma confusão. Nós trocamos tiros com os homens de Cedric, e Sean acabou sendo atingido. Enquanto Cedric fugia, Sean morria em meus braços.
Meu Deus. Sem reação, eu observo a raiva e a devastação transformarem o rosto de Alex.
— Yuna, ela era sua babá, e conseguiu se esconder com você. Quando tudo acabou, eu trouxe vocês duas para Chicago, mas Yuna disse que não queria ter nada a ver comigo, mesmo você sendo minha sobrinha. Eu pensei no que Sean faria no meu lugar, e por fim concordei com Yuna. Prometi que você nunca saberia sobre mim, que nada faltaria a vocês duas e que estariam sempre seguras.
— Mas ela morreu. — Ouço-me dizer. — Você não estava lá para protegê-la.
Culpa enche o olhar de Alexander e ele estende a mão para pegar a minha em cima da mesa, mas eu me afasto. Eu não quero seu consolo, quero a verdade.
— Não. Eu não estava lá, nem os meus homens. Yuna não queria ninguém rondando o prédio com medo que você percebesse, então combinamos que ela me telefonaria toda semana e foi assim até… ela não telefonar mais.
Anuo, ignorando o aperto crescente em meu peito.
— Pensei em contar a verdade quando eu trouxe você para cá — Alex continua —, mas você estava muito frágil e era muito nova…
— Nova demais para saber a verdade, mas não para saber como usar uma arma.
Diante do meu tom cortante, Alexander tensiona a mandíbula.
— Seu pai estava morto. Suas duas mães estavam mortas. Eu não queria que o mesmo acontecesse com você. Eu a ensinei a lutar, eu transformei você…
— Em uma arma — completo. De repente, onze anos de angústia começam a se revirar dentro de mim. — Você chegou a pensar que talvez não fosse isso que eu queria?
— Você estava sob a minha proteção. Eu fiz o que achei melhor.
— E quem você pensa que é para decidir o que era melhor? — Soltando a mão de Khalil, espalmo as minhas em cima da mesa, ficando de pé. — Meu tio? O homem que não fez nada enquanto minha mãe era morta e que depois não foi capaz de proteger a outra?
Seu olhar endurece, mas não recuo. Já vi essa expressão antes.
— Você não sabe do que está falando. Está alterada, e eu entendo…
— Entende?! — Pisco algumas vezes, percebendo que minha visão ficou embaçada. — Eu quase fui estuprada nessa mesma sala enquanto você olhava. Aquele era o seu jeito de me proteger?
— Eu confesso que errei algumas vezes, mas eu queria ver como você lidaria com a situação…
— Eu matei por você! — desespero transborda da minha voz. — Todas aquelas missões, toda vez que eu puxava o gatilho, eu fazia por você. —Pelo canto do olho, percebo uma movimentação, mas mantenho meu foco em Alex. — Como você pôde me transformar nisso; me levar para o mesmo caminho que matou o seu irmão?
— Você tinha potencial, Kate. Eu soube no momento que a vi. E eu estava certo. Você…
— Eu tinha dezesseis anos. Dezesseis, Alex. Eu não queria saber de armas ou onde dar o golpe em uma briga de faca.
— Mas você veio comigo mesmo assim.
— Se eu tivesse dito não, você teria me deixado em paz?
Quando ele não responde, já tenho minha resposta.
— Mande seus homens se afastarem ou irei colocar uma bala na cabeça de cada um.
Alexander pisca, mas depois faz sinal para que os três homens que estavam se aproximando não tão sutilmente, se afastem novamente.
Respiro fundo. Me sinto exausta. Não fisicamente, mas mentalmente. Todas as coisas que Alex contou… Parece que entrei em uma realidade diferente. Ou voltei. Passei os últimos anos achando que tinha deixado essa vida para trás, quando na verdade eu sempre fiz parte dela.
— Você nunca deveria ter me trazido para cá — digo a Alexander, me recompondo. Ao meu lado, ouço a cadeira de Khalil ranger quando ele levanta.
— Quando você esfriar a cabeça, perceberá que fiz o certo. Estarei aqui quando você quiser falar sobre o homem que matou os seus pais.
Quero perguntar o que ele quer dizer com isso, mas minha necessidade de sair daqui é maior.
Ao me virar, no entanto, lembro de algo e me volto para Alex.
— Qual era o nome dela? — Durante todo o seu relato, ele nunca falou o nome da minha mãe biológica.
— Kira.
☠️
— Você está bem?
Desço da moto de Khalil após ele ter me trazido até o meu apartamento. Não ficamos mais que meia hora no complexo, mas parece que passei a noite inteira lá. Achei que estava exausta apenas mentalmente, mas meus ossos estão implorando por descanso.
— Sim. — Não lhe agradeço após lhe entregar o capacete. — Nunca mais me siga. O que tem acontecido entre nós não te dá o direito de se intrometer na minha vida. E eu não sou sua namorada.
— Foda-se isso, Kathryn. Você não está bem. Acredita no que Alexander disse? — Khalil está agora na minha frente e põe o capacete na moto antes de se aproximar de mim.
— Não importa.
— Kathryn…
— Chega — eu não grito, mas minha voz é dura o bastante para fazê-lo obedecer. — Me deixa em paz.
Dando-lhe as costas, ponho o código do meu prédio. Depois que entro, fecho o portão na cara de Khalil e não olho para trás.
☠️
Ooooiiii. Como vcs estão????
Oq acharam do capítulo? Teorias???
Tem capítulo sexta-feira... spoiler:🍸🍓🔥
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2bjs, môres♥
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