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8-Pai Ruim

Pouco depois.

Estou lendo o livro que Victor pediu que eu lê-se, não consigo deixar de martelar aquela frase do café da manhã até agora. Por que me preocupo tanto? É a verdade... eu não significo nada além da cuidadora dele.

— Leila. — Sou tirada dos devaneios pela voz rouca que aguarda a continuação da leitura.

Viro a página do livro e suspiro, os ombros doloridos e a cabeça esquisita.

— O que está lendo Le. — Pergunta a voz gentil de Marcos que acaba de entrar no quarto.

Abro a boca, porém algo impede as sílabas de saírem.

— É a divina comédia. — Responde Victor repudiando a presença masculina.

— Não gosto de clássicos. — Comenta Marcos de modo descontraído e eu sorrio em resposta.

— Claro que não, é um boçal que só pensa em dinheiro e sexo. — Alfineta óbvio demais o irmão dele.

Marcos fecha o punho assim como a expressão suave que tinha.

— Leila, venha almoçar... temos um bom vinho para hoje. — Convida gentilmente o homem de cardigan azul escuro e calça jeans preta.

Victor suspira entediado ao meu lado e tamborila os dedos em seu abdômen.

— É claro, obrigada. — Agradeço sendo simpática e deixo o livro de lado sob o edredom branco.

Marcos sorri acolhedor e sai.

— Por que detesta tanto ele? — Realmente quero saber, não aguento a curiosidade.

— Porque é um abutre interesseiro que segue os passos do desgraçado do meu pai... a única coisa que importa para esse carniceiro é dinheiro. — O modo imparcial que fala do irmão é referente a como falamos do pior inimigo.

— E seu pai? Pode me dizer o porque não suporta que citem ele? — Questiono sem barreiras.

Victor parece disposto a revelar tais informações.

— Otávio Cavalieiri não é meu pai... Sempre suspeitou da minha mãe, acusando ela de traição e me tratando como um fardo, ou seja me considerava um bastardo e fez até Carlota realizar teste de DNA para ter a certeza de que eu era seu filho legítimo como Marcos. — Explica sem nenhum orgulho.

— E tem mais... Agredia ela e a mim, sempre que podia, humilhava com prazer e nunca demonstrou nada por mim, muito menos deixou parte da herança no testamento... dei graças que morreu. — A frieza rancorosa me faz sentir fervura no sangue. Que monstro...como alguém pode ser tão desprezível assim?

— Não imagino como deve ter sido horrível conviver com ele todos estes anos...— Victor põe a mão sob a minha acima do edredom e respira fundo, parecendo aliviado.

— Minha mãe é uma boa mulher... O erro dela é defendê-lo usando a justificativa patética de que não teve preparo quando eu nasci... a situação sempre esteve igual, foi só a rejeição dele mesmo. — A mágoa nítida em tais frases pesa sob mim, absorvo seus sentimentos como se fossemos a mesma pessoa... talvez seja mania ser tão parcial em pouco tempo.

O tanto que Victor certamente sofreu pelas mãos do Otávio... que horror. Agora consigo engolir um pouco melhor o modo como se comporta em certas situações.

— Precisa colocar para fora todo este ressentimento. — Aconselho o par de olhos esmeralda.

— Para que? Não vai mudar o que já aconteceu. — Opina cabisbaixo, ainda mantendo a mão acima da minha.

Não somos nada...

Aquela frase, eu não sou amiga dele... nem nada.

— Mesmo assim, guardar o passado é uma corrente insuportável que só tende a piorar. — Estou usando a sinceridade, mesmo que ele não guarde como relevante.

Victor vira o rosto para o lado e distância a mão da minha.

— Tirei algo positivo da rejeição dele... não esperar mais nada de ninguém. — Articula mais baixo, evitando transparecer o trauma que guarda dentro do seu coração ferido...sequer fazia ideia.

Ele precisa de ajuda...

Hora do almoço.

Cruzo o corredor junto do Victor e sou impedida de continuar por um puxão agressivo no braço que me faz cambalear para trás.

— O que estava fazendo todo este tempo dentro do quarto dele. — Pergunta a loira zangada me fuzilando com as íris azuladas.

— Em primeiro lugar; tire as mãos de mim. — Ordeno em uma vibe ousada.

Victor perdido em relação a situação, pois Júlia falou baixo suficiente para somente eu escutar.

— Atrevida. — Ofende a barbie, retirando os dedos do tecido da minha camisa preta.

— Podem me dizer o que estão cochichando. — Pede a voz rouca impaciente, continuo encarando profundamente a loira.

— Quero saber o por quê de estarem trancados no seu quarto desde que acordou. — Responde afiada a do nariz empinado dirigindo o olhar a Victor.

— Está duvidando da minha fidelidade agora Júlia? — Victor rebate desacreditado e ofendido, Júlia balança a cabeça em negação, ignorando minha presença.

— Confio em você... mas, não conheço a índole da sua cuidadora. — Lança olhar objetivo a mim, querendo sugerir que eu sou o pilar da sua desconfiança.

Contenho a onda de fúria que quer esvair e fecho o punho contando até dez.

Não sou obrigada a aturar esta arrogante mimada.

— Estão começando a me dar dor de cabeça, vamos logo para o droga da cozinha Leila. — Reclama Victor expirando pesadamente, o corredor espreme meu corpo com força.

— Eu e você precisamos conversas...a sós. — Enfatiza a barbie, séria e desafiadora.

— Cunhadinha, não seja chata, deixa meu maninho tomar o café dele para ver se melhora essa amargura rotineira dele. — Marcos aparece abrindo os braços ao vazio do corredor... hora ruim querido.

Aquele sorrisinho irritante e sarcástico estampa abaixo do arco de cupido dele.

Agora não. — Cortamos juntas a sua pretensão de tentar tornar isto uma situação engraçada a si próprio.

Marcos arregala os olhos fingindo surpresa e faz gesto de zíper a frente dos lábios.

Palhaço.

Leila. — Reforça o pedido anterior, seco como galhos da primavera fria que chega.

A barbie cruza os braços indignada e movimenta o corpo magro zangada.

Deixando os dois cunhados permanecem parados lá e eu deixo o corredor sem dizer mais nada.

Sinceramente não sei como Victor suporta estes comportamentos imaturos dela.

Minutos depois.

Tensão, desconforto. Não tenho outras palavras para descrever o clima abaixo do teto deste cômodo.

— Leila, me conta mais sobre você. — Pede Marcos sorrindo casualmente enquanto despeja vinho dentro da taça de vidro.

— O que quer saber. — Devolvo a pergunta conectando o olhar ao dele.

Victor apenas ignora assim como Júlia e Carlota mastiga silenciosa.

— Parece ser bem fã dos esportes, vi que surfa. — Comenta interessado.

Então andou me stalkeando...

— Sim, às vezes gosto de dar um pulinho na praia e pratiquei natação por alguns anos quando era mais nova. — Revelo sentindo o ar pesar menos diante da sala.

— Que legal! Eu sou jogador de basquete, na verdade era... fiquei cuidando dos negócios da família depois da morte do nosso pai. — Conta mexendo em sua correntinha dourada acima da gola.

Seu pai. — Corrige gélido o irmão mais velho que mal tocou sua comida.

Júlia finalmente lhe dirige o olhar com uma mensagem indecifrável sob as íris.

Silêncio absoluto a seguir.

ꨄ︎

Marcos na mídia.

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