63-Prêmio
𝘿𝙞𝙖𝙨 𝙙𝙚𝙥𝙤𝙞𝙨.
𝙇𝙚𝙞𝙡𝙖.
Como no final de semana a Carlota me dispensou, sem dizer exatamente o porque, fiquei livre os dois dias inteiros. Eu perguntei para ela diversas vezes e insisti que não poderia simplesmente aceitar, pois seria antiético e antiprofissional da minha parte. Entretanto, ela praticamente me expulsou de lá e garantiu que ficaria bem. Aproveitei e fiz as unhas no salão, minha consciência continua pesando até agora? Sim, todavia estou muito contente.
Victor não falou uma só palavra também, talvez eles estejam querendo resolver assuntos de família. Não sei. Não irei me meter, pois família cada uma tem a sua.
Todo ano na minha cidade, fazem uma espécie de confraternização a cada dois meses, para escolher o profissional que mais se dedicou, tanto no ramo hospital quanto no homecare, para dar a ele (a) um pequeno agradecimento.
Todos da minha cidade e do antigo hospital que trabalhei estão aqui.
Tenho que admitir, da última vez que vi tanta gente assim, foi no aniversário do Victor.
Puxo a barra do vestido dourado de uma alça só é tule em cima no decote cruzado elegante, não quero pisar nele e correr o risco de cair no meio do auditório.
Sento numa das penúltima fileiras e cumprimento quem eu já conheço de algum canto.
Retiro o espelho da minha bolsa e observo meu reflexo. Que mulher gata!
Ajeito um pouco a sobrancelha e vejo se o batom preto está em todos os cantos dos meus lábios. Perfeito.
Dourado e preto são uma das minhas combinações favoritas, sem dúvidas.
— Boa noite, Leila. — Essa voz é familiar. Mas, de onde?
— Ruan? — Reconheço assim que dirijo olhar para alcançar o dono da voz grave. O homem negro de paletó cinza abre um sorriso largo e me estende a mão, aperto em cumprimento.
Ele senta do meu lado e permanece sorrindo para mim, sem mover um músculo.
— É bom te ver, como está? Soube que não trabalha mais em nenhum hospital. — Pergunta, não sei se está curioso ou entediado. Porém, este jeito de me olhar já está incomodando. Espero que não pense que vai flerte comigo.
— Estou ótima, e não, sou homecare já faz uns dois anos. — Respondo sem muito engraçamento. Ruan move os lábios, impressionado.
Fomos como namorados quando eu trabalhava num hospital de emergência da capital. Saí de lá e terminamos na mesma semana por motivos bem sérios.
— E como conseguiu todo este luxo? Arrumou um branquelo rico não foi? O ricaço Avelar. — Diz com uma dor de cotovelo que transborda nesses olhos marrom-café que parecem querer me fuzilar. Sorrio forçado, paciência viu.
— Ele poderia ser até laranja, eu não preciso do dinheiro de ninguém, conhece uma palavra chamada trabalho? Significa; serviço que você oferece em um determinado lugar de acordo com a sua profissão e ganha legalmente em troca disto. — Juro que estou sendo o mais educada possível.
Ruan finge que não lhe dei tal resposta e sorri de forma cretina. Vai soltar algum comentário desagradável, aposto.
— Agora é uma mulher casada? Bela aliança... melhor eu me calar, se não posso deixar um branquelo zangado. — Fala, repuxando os lábios grossos com cinismo. Retiro a aliança de noivado e permaneço apenas com o de esmeralda.
— Isso aqui não é nada, é um mero pedaço de ouro, você tem que me respeitar pelo que eu sou, não por quem eu me relaciono. Apenas por essa demonstração de personalidade, já posso ver o tipo de homem que você é, não te dei liberdade Ruan, melhor segurar esse teu ego. — Aviso, sendo clara o suficiente com este sem noção.
— Sabe o que é mais engraçado? Eu te daria o mesmo, mas foi você quem preferiu terminar comigo, por um branquelo aguado, óbvio... — Finjo não ter escutado o resto das coisas absurdas que ele diz.
— Se tivesse me valorizado e sido homem suficiente, poderíamos ter tido algo sério, supere, não seja tão frustrado ao ponto de querer me questionar quem eu escolhi e porque escolhi, além de não te dever satisfações, caráter não é cor de pele ou etnia, isso vem de berço. — Levanto para sair daqui e ir sentar noutro lugar, deixando Ruan boquiaberto, formulando outra asneira para dizer. Ele conseguiu estragar o clima que eu tinha para o evento.
Ruan sempre demasiado imaturo e irresponsável, talvez esta parte tenha mudado, o que não acredito muito porque o comportamento que teve comigo no auditório foi no mínimo, desagradável.
Horas depois.
Mais uma realização como profissional, eu ganhei o prêmio! Ganhei o reconhecimento que almejava, embora não esperasse que ganharia, confesso.
Senti todas as melhores vibrações quando meu nome foi anunciado no palco por uma das administradoras do Conselho regional de Santos.
Chego em casa e abro a porta. O clima está bem tranquilo, minha mãe cozinhando e meu pai assistindo uma série na televisão. Tranquilo até demais...
— Está acontecendo alguma coisa? — Observo o ambiente, talvez tenha uma pista do que está havendo.
— Não filha, estávamos só esperando você chegar. — Sorri Antônio carinhosamente. Lhe dou um beijo na testa e cruzo o sofá marrom, sentando ao seu lado e vendo minha mãe desvia o olhar. Onde está a Bel?
— Hoje e Carlota não quis que eu ficasse lá, nem me disse o motivo, apenas me dispensou... — Falo, enquanto retiro meus acessórios e colo sobre a mesa de centro. Meu pai pegou no sono, toda vez que senta para assistir algo na televisão, é automático, ele dorme.
— Talvez seja um assunto pessoal deles filha. — Supõe minha mãe, sua voz falha e gagueja quando diz.
— Mãe, a senhora tem algo para me contar? Onde está a Bel? — Sabe quando sentimos que estamos por fora de algo muito importante? É esse o meu clima.
Dirijo olhar para ela por cima do próprio ombro. Esse silêncio é muito estranho.
— Isabel? Cadê minha irmã mãe? — Retiro os saltos que estão ferindo meu tornozelo e sigo rumo ao banheiro.
— Leila! — Sou barrada no meio do corredor mal-iluminado, minha mãe apareceu em minha frente feito o próprio velocista escarlate.
— Não pode ir no banheiro, sua irmã está limpando e tem muito cloro lá. — Justifica apressadamente, apoiando as mãos na parede como se elas fossem cair. Realmente a luz do banheiro está acesa, mas não tem música ligada ou Isabel cantarolando, como sempre faz...
— Ok, vou para o meu quarto me trocar. — Aviso, querendo passar para o outro lado, entretanto Ivone não sai do estreito espaço, os olhos arregalados confirmam que tem sim algo escondido nesse ato repentino e suspeito dela.
— Mãe, preciso passar. — Gesticulo o corredor atrás dela, pedindo que me dê espaço. Ivone solta um grunhido e move os olhos, fingindo não ter entender o qie falei.
— Como está a sua dor? Já marcou uma consulta? E o prêmio, ganhou? — Questiona se enrolando nas próprias palavras, o nervosismo é evidente sobre os olhos escuros. Cruzo os braços e suspiro, pelo visto ela não vai me deixar passar hoje. O por que? Preciso descobrir. Mexo o corpo e simulo uma ultrapassagem, todavia Ivone move o corpo na mesma velocidade e impede.
Safadinha!
— Estou melhor mãe, mas ainda não marquei a cirurgia, e a respeito do prêmio, eu o ganhei. — Sorrio orgulhosamente, isto é motivo de felicidade para mim.
A senhora negra move a cabeça em positividade, com um sorriso tenso sobre os lábios grossos.
— Pode pegar e me mostrar, eu adoraria ver filha. — Sugere carinhosamente, gesticulando a sala por cima do meu ombro. Ok mãe, desisto!
Seja o que for, ela está empenhada em não me deixar ver o que tem no banheiro e no quarto. Aliás, onde é que eu vou dormir?
— Isabel! Vem aqui por favor. — A chamo, dando meia volta e saindo do corredor ao apagar a luz, sendo seguida pela dona segredos aqui.
— Fala. — Isabel surge, despreocupada.
Me viro de costas e abaixo para pegar os chinelos que deixei embaixo da mesa, deixando as duas confabulando algo que não sou capaz de ver.
— Essa semana é aniversário de casamento da gente filha. — Informa Ivone, com orgulho e felicidade estampando o rosto onde rugas sutis começam a tomar espaço.
— Pensam em fazer um churrasco? — Sorrio ao me erguer.
— Merecemos mais que um churrasco, pensamos em viajar de navio, se o bundão do seu pai tiver coragem. — Fala e faz uma expressão engraçada, nós rimos baixinho para não acordá-lo.
— Desde moça eu sonho com isso sabiam? Quando conheci o seu pai, ele trabalhava na montadora de peças automobilísticas, eu era humilde para essas coisas sabe? Classe média, mas sem muito para gastar com luxo. — Revela num tom nostálgico, aconchegada nesta lembrança fofa e romântica.
— Quero um amor como o de vocês, é tão inspirador e puro. — Comento, sendo bem sincera. Um vaga-lume parece percorrer meu coração agora, trazendo luz e calor gostosos de sentir.
Ivone balança sutilmente a cabeça e sorri, dirigindo olhar ao meu pai com muito carinho e admiração, orgulho da relação que construíram.
— Não filha, cada história de amor é única, a sua nunca se irá se comparar com a de outras pessoas, você terá ela, seja clichê ou não, o amor sempre será marcante. — Diz como uma lição de vida, cheia de ternura.
Avançamos alguns passos e abraçamos ela fortemente, todos os dias faço questão de mostrar para minha mãe o quanto a ama e o quanto ela é uma mulher extraordinária.
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