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27-Filme

Horas depois.

Abro os olhos e o embaçado da minha visão vai sumindo aos poucos, diante dela está um rosto angelical, tão próximo que sinto seu nariz encostar no meu, dormindo feito um anjo, calmo e belo.

Estamos de frente um para o outro e a mão de Victor está na minha cintura.

Me distancio devagar para não acordá-lo e vejo que horas são no meu relógio.

Cacete! É de manhã já!

Essa não...minha mãe e meu pai vão surtar.

— Bom dia Leila. — Ouço uma voz sussurrar, entrando pelas sombras do quarto que a luz do sol invade e arde meus olhos.

— Carlota, me desculpa, eu...

Carlota apenas gesticula com a mão para que eu não diga mais nada, um sorriso brota em seus lábios.

— Não precisa justificar, vocês são adultos e livres para fazerem o que quiser. — O tom sai um tanto subliminar.

— Ah! Não, não, não é o que você está pensando...acabei perdendo a noção do tempo, só isso. — Justifico sem graça demais para encarar ela fixamente, a mulher loira em minha frente acha que eu e o filho dela...com certeza não.

Victor sequer se move, ainda dormindo feito uma pedra a beira mar.

Carlota dá risada baixinho.

— Preparei uma torta e mais algumas outras coisinhas para você tomar café, quando ele acordar vem. — Diz a gentil mulher e sai do quarto a passos discretos.

Me sinto perdida no planeta, minha mãe vai me esculachar, não quero deixá-la nervosa, muito menos meu pai.

Ligação para Mãe:

— AH, FINALMENTE A CINDERELA GÓTICA RESOLVEU DAR SINAL DE VIDA NÉ. — Bel grita do outro lado da linha.

Minha cabeça quase explode com isso.

— Para de gritar Isabel, eu não fiz de propósito...cadê a mãe? — Pergunto o mais baixo possível.

— VOCÊ QUER QUE EU PARE DE GRITAR? FOI MAL ENTÃO...Ela está dormindo, dei o remédio da pressão porque subiu né, preocupação com a boneca. — Isabel vai diminuindo o tom de voz com ironia.

— Olha Le, o que faz com o seu branquelo, realmente é coisa sua tá legal? Mas pelo menos avisa, ela ficou apavorada porque você não chegava. — Explica Bel tentando me dar um conselho amigável.

— Diga para ela que estou bem, intacta, apenas acabei dormindo e esquecendo do tempo...E o Victor não é meu branquelo. — Falo corrigindo a engraçadinha.

— Passou a noite na casa dele porque então? Tô nem aí, só não demora para ligar de novo, daqui a pouco ela acorda e vai querer satisfação. — Bel repreende em tom sarcástico e desliga antes que eu revide a suposição dela.

Me ferrei demais.

— Desculpe por te meter em problemas. — Ouço a voz rouca que arrepia todo meu corpo.

Me viro e distancio da janela.

— Estava acordado? Há quanto tempo? — Cruzo os braços brava.

Que mania ele tem.

Victor sorri ainda mantendo as pálpebras fechadas.

— Relaxa, acordei agora há pouco quando disse para sua irmã que eu não sou seu branquelo. — Ele dá risada e em seguida boceja, hoje é o dia viu...

Poderia ficar brava com ele, mas não consigo.

— Levanta, vamos tomar um banho e comer a torta que sou mãe fez. — Me aproximo da cama e agarro seu pulso, Victor repuxa o lábio inferior reprovando a ideia preguiçosamente.

— Não estou com fome, estou enjoado. — Responde baixinho virando o corpo de barriga para cima, abrindo as pálpebras finalmente.

— Então eu te dou algum remédio, precisa comer alguma coisa fofi...Victor. — Meu deslize é suficiente para fazer Victor dar risada novamente.

— Gostei da tentativa de me elogiar...mas fofinho é broxante Leila. — Ele satiriza rindo mais ainda e me fazendo rir também.

Insisto em pegar seu pulso e o tirar da cama, hoje a preguiça está feroz.

— Podemos ir à praia hoje, o clima parece estar melhor...levanta vai, colabora, estou cheia de dores na coluna. — Resmungo feito velha, Victor faz careta sendo vencido e não resiste mais.

Logo levanta e eu o entrego suas roupas e vou lhe conduzindo para o banheiro.

Estranhamente hoje ele parece mais pesado do que antes.

Logo o chuveiro e retiro qualquer sabonete que possa causar um escorregão terrível e causando assim uma lesão — organizo suas roupas em cima da pia e fico parada.

— Não vai me ajudar? — Pergunta num tom ingênuo ao retirar as meias.

— Hum, acho que para isto, você já não precisa da minha ajuda mais. — Sorrio desconcertada, o banheiro estranhamente está esquentando demais.

Victor solta um sorrisinho de canto.

— Te espero lá fora, se precisar de ajuda, só chamar. — Murmuro trincando os dentes tímida, Victor resmunga em concordância e antes que eu sai, sinto sua mão envolver meu pulso esquerdo.

— Obrigado por ontem. — Agradeço de modo meigo, fazendo algo dentro de mim aquecer em uma forma inocente.

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Sentamos para comer e ele mal tocou no prato, sinto que ainda está de ressaca.

— Filho, você não vai comer nada? — Carlota pergunta sendo sensível e cuidadosa.

— Estou sem fome mãe. — Diz Victor preguiçosamente e suspira pesado em seguida, a comida parece ser algo insuportável a ele neste momento.

— Le, podemos fazer alguma coisa depois? Quero me distrair. — Articula Victor meio desanimado, o peso dos acontecimentos anteriores deixa tudo muito estranho.

Carlota apenas mastiga em silêncio.

— Claro, o que quer fazer. — Pergunto terminando meu pedaço de torta.

— Podemos assistir um filme, ou dar uma volta pelo centro, talvez...não sei, você pode pensar em algo, é criativa demais. — Foi um elogio sincero e doce.

Realmente sou bem criativa, principalmente na culinária, inventei várias sobremesas quando ainda não trabalhava e fiz com minha mãe — os resultados sempre foram fantásticos modéstia parte.

— Acho uma boa ideia assistir filmes, tem algum em mente? — Replico encarando Carlota que também aguarda resposta, mais aliviada por ver o filho disposto a tentar esquecer...Todos sabem.

— Eu não assisto filmes desde o acontecido, então não lembro muito bem o que foi que assisti da última vez. — Informa meio sobrecarregado, não deve ser fácil relembrar este pesadelo.

Carlota fecha o sorriso e bebe um pouco da água em seu copo, parecendo tensa.

— Consegue ir até a sala? Eu vou ajudar sua mãe e já estou indo. — Sorrio para minha amiga e ela sorri de volta gentilmente.

— Consigo, só não vou pegar o cd porque ainda não mexi naquela parte da sala. — Informa Victor, saindo da mesa e seguindo para sala com sua muleta dobrável que o auxília.

Próximo passo: Treinar tal espaço da sala para que ele possa se adaptar.

Treinamos por quase toda casa já, apenas o jardim e a escada ficaram por fora pois não são tão essenciais...usados.

— Ele comentou sobra a Júlia, o que ela tinha? — Sou bem direta com Carlota.

Carlota empalidece um pouco.

— Júlia, tinha transtornos alimentares, mais especificamente bulimia, então forçava e acabava vomitando e tomando laxantes para ficar magra, os dentes foram ficando gastos por causa do suco gástrico...por isto ela virou especialista odontológica e Victor insistiu até que ela começou a se tratar, aquilo o deixava péssimo por não saber muito bem como ajudá-la...ele esteve com ela em todos os momentos ruins. — Carlota fica cabisbaixa ao contar.

Eu não fazia ideia...

— Sabe, tanto na enfermagem quanto na medicina, consideramos um elemento muito essencial; humanidade — tentamos acolher o paciente seja lá o problema que ele estiver passando. — Comento achando coerente com a situação.

— Não duvido que você tenha um coração tão bom e que tenha sido um anjo na vida de várias pessoas. — Ela acaba se emocionando ao dizer.

— E o que houve exatamente com Victor? — Aproveito a oportunidade tentando não ser indelicada.

— Estávamos saindo do cinema e fomos abordados por dois assaltantes armados, um deles ameaçou me bater até...Entregamos o carro sem contrariar e eles acabaram desistindo de repente, Victor estava de mãos para cima e de costas...eles atiraram covardemente na cabeça e nas costas dele. — Meu estômago revira e quase consigo escutar o som dos disparos...que crueldade.

A conversa está longe do alcance dos ouvidos espiões do Victor, porque é muito delicado este assunto.

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Tem uma diversidade enorme de cd's aqui, então não faço ideia do que podemos escolher para assistir.

— Que tal Malévola? — Sugiro pegando o cd do filme, Victor não gosta da opção, fazendo careta infantil.

— Quero alguma coisa de terror, ok? — Resmungo um sim e continuo procurando.

Até encontrar o filme que acredito que ele goste, It a coisa.

— Que tal It? — Sugiro ligando o dvd.

— Um dos meus filmes favoritos. — Victor responde brincando com um fio do cabelo liso escuro.

— Sério? É um dos meus também, depois de Anabelle três. — Respondo empolgada por termos os mesmos gostos, ele sorri de modo charmoso.

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