Capítulo 3
— Mas que merda. — Pisei em um cipó de fungo seco, Joel me puxou para trás e se aproximou para analisar.
— Ta morto. Seja lá o que tiver aqui dentro, ta morto também. — Apontou, passei por ele e entrei direto no prédio.
— Ótimo. — Resmunguei, Ellie apressou o passo para me alcançar.
— Ellie, espera. — Tess pediu, escondi um sorriso singelo.
Subi as escadas do museu analisando cada espaço, cada decoração mofada, haviam ainda mais cipós secos no segundo andar.
— Isso é nojento pra caralho. — Cobri o nariz com a gola da camiseta, Ellie estava logo atrás de mim apreciando tudo com os olhos bem abertos.
— Isso é muito maneiro.
Antes de abrir a porta, Joel segurou meu pulso com firmeza, franzi o cenho confusa e surpresa com sua agilidade. Ele fez sinal de silêncio com a mão e então segurou a maçaneta da porta, recuei sentindo um calafrio na espinha só de pensar em encontrar algum monstro.
Ele entrou primeiro com a arma e uma lanterna posicionadas, empurrei Ellie para trás e entrei logo depois, Tess foi a última a passar. De repente parte do telhado velho despencou bem atrás de nós, ouvimos gritos vindos do outro lado da sala.
Meu coração disparou rapidamente, estaladores, dois ou três bem na nossa frente presos conosco no mesmo cômodo. Joel apontou para um lado, segui devagar, passei por uma vidraça mostrando alguns mapas antigos, do outro lado estava um estalador. Foi quando ouvi algo quebrar no lado oposto ao que estava, Ellie.
O estalador passou tão rápido que bateu em mim me derrubando no chão, puxei minha arma e permaneci no mesmo lugar, ele parou e de uma volta tentando ouvir o que acabara de acontecer. Uma gota de suor escorreu fina feito uma agulha no canto do meu rosto, olhar para o monstro bem na minha frente fazia meu corpo estremecer.
Ouvi o outro estalador gritar, e então vieram os tiros, eles estavam em apuros. Assim que o estalador correu seguindo o som do conflito fiz o mesmo, avistei Ellie no outro lado com Joel, pulei por cima da vidraça retangular expondo pequenos navios e me joguei em cima do estalador. Usei minha pistola para acertá-lo na bochecha, o monstro reagiu me atirando contra a mesma vidraça retangular.
O vidro quebrou gerando um estouro, os cacos saltaram sobre o meu corpo deixando vários pequenos cortes nos meus braços. Minha arma estava longe e meus braços ocupados tentando impedir o estalador de rasgar a minha cara. Alcancei um pedaço grande e pontudo de vidro e o acertei bem no pescoço, mesmo assim o estalador parecia bem resistente. Usei minhas pernas para empurrá-lo para longe, caí no outro lado da vidraça e continuei no chão sem mover um músculo.
Olhei para Ellie e Joel abaixados bem do meu lado, ele sugeriu me ajudar por um segundo, neguei rapidamente impedindo-o de foder com todo o silêncio. Minha arma estava bem em baixo do expositor do outro lado, me estiquei para pegá-la mas o estalador passou chutando-a para o outro lado. Fiz sinal para Joel e Ellie seguirem, mesmo em hesito ele puxou a garota com ele. Levantei do chão com dificuldade, sentindo um gosto metálico na boca, sangue.
Segui devagar e agachada até a arma do outro lado, o estalador estava um pouco mais à frente. Foi quando Tess apareceu lutando contra outro estalador, carreguei a arma e atirei repetidas vezes no que estava bem na minha frente até vê-lo cair completamente morto no chão. Tess caiu por baixo do outro estalador com dificuldade, puxei meu canivete e o chutei para longe dela, o acertei repetidas vezes até sentir meus membros doloridos de cansaço, caí ao lado do corpo.
— Puta merda. — Tess disse ofegante, e veio até mim me ajudar a levantar. — Agora sei porque a Marlene confia tanto em você.
— Vocês estão bem? — Joel e Ellie se juntaram a nós, esfreguei a mão cortada na minha roupa e tentei tirar o sangue do meu rosto com apenas uma passada de braço.
— Estamos. Tudo bem. — Tess respondeu por nós, guardei meu canivete no cinto e fui até a janela.
— Vamos sair logo daqui. — Pedi, eles me seguiram com pressa. — Ta brincando.
— O que foi? Tem medo de altura? — Joel me confrontou, havia apenas uma madeira velha como passagem para o outro prédio.
— Vai se foder. — Retruquei, considerando que aquele era o menor dos meus problemas.
Atravessei o prédio e parei para observar a vista, senti o corte na minha mão arder. Quando olhei para trás avistei Joel cuidando de Tess na janela, eles pareciam sérios e irritados um com o outro mas mesmo assim ele cuidava dela.
— Isso parece sério. — Ellie desviou minha atenção, seus olhos encaravam meu corte.
— Já tive piores. — Um lapso de memória me veio à mente, lembrei-me das outras cicatrizes espalhadas pelo meu corpo.
— Sério? Isso é legal pra caralho. — Ellie afirmou, sorri.
— Devia cuidar disso. — Tess chamou minha atenção, baixei a mão e apertei meu cinto.
Ellie foi até a beira do prédio para apreciar a vista da cidade, Joel fez o mesmo. A mulher mais velha abriu sua mochila e me deu uma garrafa com água, usei apenas algumas gotas para não desperdiçar, fiz um curativo rápido e apertado.
— Você está bem? Aquele estalador te derrubou feio. — Puxei assunto com Tess, ela desviou o olhar.
— Estou bem. Vamos.
A segui até uma escada, descemos até o térreo do prédio. Para a nossa sorte os estaladores eram os únicos monstros no nosso caminho. Seguimos estrada até outra base dos vaga-lumes onde supostamente deveríamos encontrar mais pessoas para nos ajudar com munição e equipamentos.
Tess parecia uma tanto séria apenas seguindo o caminho, não conseguia tirar meus olhos dela, algo estava errado.
— Você é foda pra cacete. — Ellie me alcançou, sorri. — Onde aprendeu a lutar daquele jeito?
— Tempo. Prática. Motivação. —Joguei algumas palavras no ar, sem dar um devido significado para elas.
— Me ensina?
— Quando crescer. — A olhei de cima, Ellie assentiu mesmo levemente frustrada, sorri e voltei a olhar distante.
Em poucos minutos chegamos à capela, a segunda base mais próxima dos vaga-lumes desde a cidade. Havia sangue no chão e a porta estava aberta, Joel inspecionou um caminhão logo na entrada.
— Porra. — Puxei minha arma e corri até o prédio, ele me seguiu também com uma arma em mãos.
Quando entrei estava tudo bagunçado, haviam corpos espalhados pelo chão, estavam todos mortos. Guardei a arma e corri até os equipamentos buscando pelo mapa, sem ele não conseguiríamos sequer deixar a cidade.
— O que foi? O que está procurando? — Tess perguntou ao chegar na capela, levantei e joguei o cabelo para trás irritada.
Corri até os corpos buscando pelo mesmo, nada. Joel entendeu no meu olhar o que estava errado, o velho bufou guardando sua arma no cinto.
— A porra do mapa, era pra encontrarmos aqui. Algum desses merdas deve ter perdido.
— Pensei que soubesse onde fica o lugar. — Joel cobrou, estiquei os lábios de uma forma sarcástica.
— Tenho um rabisco ou dois, mas precisava dessa merda. — Apontei para o chão, Tess correu para procurar pelo pedaço de papel.
— Tess esquece. — Joel resmungou, ela parecia procurar loucamente. — Tess! Acabou!
— Tem que estar aqui! Só temos que procurar! — Ela pediu, parecia mais desesperada que eu, cruzei os braços.
— Não está aí. Vamos embora. — Joel pediu, Tess negou e continuou procurando. — Vamos para casa!
— Lá não é minha casa! Eu não vou com vocês Joel.
— O que você quer dizer? — Ele perguntou sentindo um aperto no peito, estava irritado.
— Puta merda, ela foi mordida. — Ellie disse, puxei minha arma e apontei para a mulher, Joel se colocou na frente dela.
— Tess?
— Uma hora a sorte ia acabar. — Ela respondeu entristecida, minhas mãos começaram a tremer quando Tess nos mostrou seu ferimento no pescoço, correndo-a.
De repente um dos cadáveres acordou fazendo-me pular para trás, o acertei bem na cabeça, o tiro ecoou por toda a capela dando-me arrepios. Suas mãos começaram a envolver o fungo brotando do chão, praguejei, Joel correu até as portas.
— Estão vindo, temos que ir. — Fechou as portas e avisou, Tess permaneceu parada feito estátua.
— Vocês vão, vou ganhar um tempo. — Pediu, Joel negou a puxando pelo braço. — Joel vai! Elas precisam de você. Leve-as até o Bill, ele vai saber o que fazer.
— O que vai fazer? — Perguntei, Tess negou me empurrando para o outro lado.
— Vão agora! — Pediu, puxei Ellie pelo braço, a garota partiu mesmo em hesito.
Joel veio logo atrás nos cobrindo com seu rifle, senti um aperto no peito ao deixar Tess para trás, agora teria que seguir com Ellie e o velho sozinha. Quando chegamos longe o suficiente da capela, Tess atirou nos galões explodindo-a completamente junto com todos os infectados lá dentro.
— Anda logo Ellie, não olha pra trás. — Pedi, a garota parecia chateada, irritada.
Seguimos floresta à dentro, Joel estava logo atrás com a mesma expressão facial, me perguntava como conseguia agir desta forma? Frio, sem reação, tenho certeza que Tess era mais do que só uma conhecida.
— Vamos parar! Já estamos bem longe. — Joel pediu, ele jogou suas coisas no chão e começou a empilhar alguns tocos de madeira.
— Tem um rio uns dois minutos pra lá. — Apontei, ele se esticou para ver, não estava muito longe.
— Devia limpar esses ferimentos. — Sugeriu enquanto olhava para minha mão ensanguentada, concordei, deixei minhas coisas no chão e fui até o rio apenas com minha arma e canivete.
A água corrente fazia um som agradável, me agachei e comecei a limpar minhas mãos, braços e rosto. Parei por alguns segundos, olhar diretamente para o rio me fez rever algumas lembranças.
— E se tivesse? — Danny me perguntou enquanto colocava vinho na taça, não estava prestando atenção na conversa, acabei me perdendo.
— O que?
— Uma cura.
— Danny... — Neguei com uma risada frouxa, ele se aproximou e envolveu suas mãos em minha cintura.
— Os vaga-lumes, eles lutam por algo melhor. — Me desvinculei assim que o ouvi comentar outra vez sobre o grupo rebelde, ele torceu os lábios. — Lorie por favor.
— Outra vez? Estamos seguros aqui, sabe o que vão fazer com você se descobrirem que está concordando com esses malucos?
— Esse lugar é uma merda, não temos liberdade pra nada. E o seu pai. — Ele parou assim que recebeu uma encarada minha, joguei o vinho dentro da pia e deixei o cômodo.
Quando voltei ao acampamento provisório Joel estava finalizando uma fogueira, Ellie se encolheu em um canto e deu algumas mordidas em seu sanduíche. Sentei-me no outro lado, puxei meu canivete e comecei a afiar um galho.
— Cuidado com a fogueira, não queremos chamar atenção. — Avisei, Joel baixou ainda mais o fogo deixando apenas uma pequena fonte de luz.
— Os infectados seguem a fumaça?
— Não tem só infectados aqui fora. — Acrescentei, Ellie entendeu no mesmo segundo.
— Quando decidiu virar vaga-lume? — Ellie perguntou, a encarei, a garota levantou as mãos em rendição. — Ta bom, não vamos fazer isso.
— Quando eu perdi tudo. — Encarei o fogo lembrando-me das chamas, do incêndio. — Morava em um abrigo no Colorado, foi quando ouvi falar deles, os vaga-lumes. As coisas nunca iam bem, tínhamos que obedecer e seguir as regras, claro que algumas pessoas não são capazes de seguir algo à risca.
— Como você. — Ellie sugeriu, soltei um sorriso frouxo.
— No começo eu tinha medo, estava cercada de pessoas ruins e não podia confiar em ninguém. Mas aí... — Daniel, sua persistência em querer me convencer de que estávamos do lado errado, tudo levou ao fogo. — Houve um incêndio, a Marlene me salvou junto com muitos feridos.
— É por isso que está aqui? — Ela perguntou, senti Joel me encarar mesmo de longe quase na completa escuridão da floresta.
— Não. Quero sair daquela merda de cidade, não quero mais ver as mesmas pessoas. — Levantei, Ellie me seguiu com os olhos, pisoteei a fogueira até apagar completamente. — Chega de histórias, é melhor dormir.
Ela virou-se para o lado coberta pelo seu segundo casaco, peguei minha arma e saí, precisava dar uma volta. Já era bem tarde, para a nossa sorte não havia sinal de animais selvagens, infectados ou pessoas. Ouvi um galho quebrar, puxei minha arma, senti alívio ao ver Joel indo até a água ainda com a mesma expressão de seriedade.
— Você também deveria dormir. — Sugeri, ele agachou e pegou um pouco de água com as duas mãos unidas formando uma concha. — Não deviam ter aceitado isso.
— Ela sabia das consequências. — Foi curto e grosso, me perguntava como conseguia se manter tão estável.
— Ninguém entende até realmente viver o momento.
— Você parece entender. — Apontou com a cabeça, encarei o céu, as estrelas estavam bem espalhadas e iluminadas.
— Você não entenderia. — Resmunguei, agora seu olhar sério estava sobre mim. — Passei por muita coisa fora daqueles muros, e os vaga-lumes, eles continuavam lutando. Eu os vi perder, e se reerguer outra vez.
— Se continuar perdendo não vai mais ter pelo quê lutar. — Ele cuspiu as palavras, permaneci em silêncio pensando no que aconteceu com Tess. — Eles perdem porque lutam por algo que não existe.
— Talvez não exista uma cura, talvez tudo isso não tenha sentido. — Abri os braços argumentando firmemente. — Mas a Ellie é real, ela foi mordida e está bem ali. Pode ser sorte, ou pode ser algo novo.
Ele se manteve quieto, seu silêncio me serviu bem como resposta. Voltei ao acampamento e me sentei perto de uma árvore, encostei no tronco e fechei os olhos esperando adormecer.
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