≀ ꒰ TE ꒱ ៹ ﹫prologue ⋆ ◝🧟♀️﹆
Richard D. Grimes, ou Rick Grimes, como todos o conheciam, não imaginava que estaria vivendo os dias que estava vivendo. Naquela manhã, ele era apenas um policial comum, fazendo o que fazia de melhor: perseguir bandidos, combater o crime e proteger sua cidade. O tiro que recebeu durante uma operação, no entanto, mudaria tudo. Foi rápido demais para entender, e antes que pudesse reagir, a dor o levou à inconsciência.
No hospital, os dias se arrastaram entre monitores que apitavam e médicos que murmuravam, sem saber que o mundo fora do quarto onde ele estava internado já estava mudando para algo irreconhecível. Rick ficou em coma por semanas. Durante esse tempo, o planeta começou a desmoronar sob os ataques de algo inimaginável: os mortos haviam se levantado.
Quando Rick finalmente despertou, com a sensação de que algo estava errado, ele se viu em um mundo de ruínas. O cheiro de morte estava no ar, mas o que mais o assustava era o silêncio profundo que tomava conta da cidade. Ao sair do hospital, Rick não encontrou os prédios vibrantes que lembrava, mas uma paisagem devastada, onde a única coisa que parecia viva eram os próprios mortos.
A realidade foi um golpe brutal. As ruas, antes cheias de gente, agora estavam vazias, exceto pelos corpos que se arrastavam, famintos. Rick, com sua mente atordoada e confusa, não sabia ao certo o que estava acontecendo. O que ele soubera até aquele momento parecia tão distante agora. Ele, um simples policial, agora era um dos poucos sobreviventes de um mundo destruído, e sua única missão, mais urgente do que nunca, era sobreviver a cada novo amanhecer.
Um dia após acordar, Rick Grimes se encontrou dirigindo uma viatura da polícia, sozinho, pela estrada deserta. O motor do carro era a única coisa que quebrava o silêncio absoluto ao seu redor. O mundo parecia estar em um eterno fim, onde tudo o que restava eram as lembranças de um tempo que agora parecia distante e irreconhecível. A estrada à sua frente, uma vez cheia de movimento e vida, estava vazia, exceto por alguns carros abandonados e os ecos da desolação que tomavam conta de tudo.
Ele seguia em direção a Atlanta, guiado pela esperança de encontrar mais sobreviventes, ou pelo menos entender o que havia acontecido. Sua mente ainda tentava processar o caos, mas cada quilômetro percorrido parecia mais surreal. As árvores que margeavam a estrada estavam cobertas por uma névoa densa, e o sol, embora brilhando forte, não parecia capaz de dissipar a sensação de apocalipse.
Foi então que, à distância, algo o fez diminuir a velocidade do carro. Uma figura solitária aparecia na beira da estrada, caminhando com passos firmes, mas sozinha. Rick não acreditava no que seus olhos estavam vendo. Era uma mulher.
Ela usava calças apertadas, gastas pelo tempo e pela luta pela sobrevivência, e uma blusa justa que mostrava sua determinação de enfrentar o mundo novo, sombrio e hostil. O que mais chamou a atenção de Rick foi a arma presa à sua costa, uma presença imponente que parecia ser a única coisa que poderia garantir sua segurança nesse mundo dilacerado. Ela caminhava sem se virar, ignorando a viatura que se aproximava.
Rick, sem pensar muito, freou a viatura, fazendo o carro ranger enquanto parava a alguns metros dela. Ele observou atentamente, sentindo o peso do silêncio que agora preenchia o ar entre eles. A mulher não parecia se assustar com a presença do veículo, mas também não demonstrava qualquer reação imediata, como se estivesse tão acostumada ao apocalipse quanto ele.
Ele desceu do carro, cauteloso, a mão ainda na pistola presa à sua cintura.
── Ei! ── chamou, tentando quebrar o silêncio.
A mulher parou, mas não se virou de imediato. Rick não sabia se ela era amiga ou inimiga, se ainda havia um pouco de humanidade nela ou se o mundo a havia moldado de uma maneira que ele ainda não compreendia.
A mulher finalmente se virou, e Rick pôde ver seu rosto, marcado pela dureza da sobrevivência. Seus olhos estavam vazios, mas ao mesmo tempo, carregavam uma chama de determinação. Ela olhou diretamente para ele, e por um momento, parecia que as palavras poderiam sair. Mas, em vez disso, ela apenas disse, com uma voz baixa, mas firme:
── Você está indo para Atlanta, não está?
Rick assentiu lentamente, ainda observando-a com cautela. O que ele não sabia era que aquela mulher era mais do que uma sobrevivente perdida. Ela estava ali por uma razão, e Rick, naquele momento, sem saber, acabara de dar o primeiro passo para uma jornada que mudaria sua vida para sempre.
Rick permaneceu parado, observando a mulher à sua frente, os detalhes de sua aparência lentamente tomando forma em sua mente. O olhar atento que ela lhe dirigia revelava mais do que palavras poderiam expressar. Sua expressão era dura, marcada por algo que Rick não conseguia identificar de imediato, mas que ele sabia ser a consequência de dias — ou quem sabe meses - de sobrevivência em um mundo transformado pela destruição.
Ela tinha uma cicatriz visível em seu olho esquerdo, uma marca profunda que cortava sua pele, deixando uma linha clara onde a visão havia se perdido. O olho, agora completamente fechado, não tinha mais função, mas mesmo com a deficiência, a mulher parecia se mover com uma confiança inabalável. Era possível sentir que a perda da visão não a enfraquecia; ao contrário, parecia ser um lembrete da força que ela havia adquirido para sobreviver nesse novo mundo.
Seu cabelo era preto como carvão, preso em um rabo de cavalo simples, mas eficiente, que balançava suavemente a cada movimento. Mesmo com o cenário apocalíptico ao redor, havia algo nele que lembrava os dias antes da calamidade, um pouco de normalidade que a mulher havia conseguido preservar, talvez como uma forma de manter sua sanidade.
Rick também notou o seu olho direito. Era de um verde profundo, que parecia refletir a luz do dia, mas ao mesmo tempo escondia histórias de dor, medo e coragem. Era um olhar penetrante, direto, como se ela soubesse o que as pessoas pensavam antes mesmo delas falarem. Seu olhar encontrou o de Rick e, por um instante, algo em sua expressão o desarmou. Não havia medo nele, nem dúvida. Havia apenas a compreensão de que, em algum ponto, ambos estavam no mesmo barco - ou melhor, à deriva no mesmo mar de caos.
Ele também percebeu as cicatrizes que apareciam nas partes do corpo que suas roupas não cobriam. As marcas eram evidentes, algumas de ferimentos antigos, outras mais recentes, resultado da luta constante pela sobrevivência. Cada cicatriz contava uma história que ela provavelmente nunca contaria, mas que Rick podia ler nas linhas de sua pele: um passado de enfrentamentos, de perdas, de luta.
A mulher não parecia intimidada por sua presença. Ela estava ali, de pé, forte e imponente, talvez mais sozinha do que Rick poderia compreender. Ele, ainda cauteloso, deu um passo à frente. ── Eu sou Rick ── disse, mantendo um tom firme, mas sem deixar de ser amigável.
A mulher o observou por um momento, estudando-o como se estivesse pesando suas palavras, antes de responder, sua voz grave e sem emoções: ── Leah
Rick sentiu o peso do silêncio após sua resposta. Leah. Aquele nome soava como uma espécie de código em meio ao caos. E por mais que ele quisesse questioná-la sobre o que havia acontecido ou oferecer ajuda, ele sabia que não estavam mais em um mundo onde perguntas fáceis ou respostas curtas eram suficientes.
Ela olhou para a estrada à frente, o olhar vazio de quem sabia que a viagem era longa, e sem mais palavras, começou a caminhar na direção do carro. Ele hesitou por um momento, antes de decidir segui-la. Eles estavam, agora, unidos em algo muito maior do que simples circunstâncias. O mundo que conheciam já havia desaparecido, mas talvez, só talvez, com Leah ao seu lado, Rick pudesse finalmente começar a entender como sobreviver neste novo apocalipse.
Antes de entrar no carro, Leah parou por um momento e, com um sorriso maroto, olhou para Rick, que estava ao volante, tentando disfarçar o nervosismo crescente. Ela parecia perceber cada movimento dele, como se estivesse completamente ciente do efeito que causava. O silêncio entre eles estava carregado de tensão quando Leah, com a voz baixa e sarcástica, finalmente falou:
── Ah, e só para deixar claro, não sou uma prostituta. Não se preocupe, não estou atrás de clientes.
Rick congelou, seu rosto instantaneamente ficando ruborizado. Ele não havia interpretado nada do que ela dissera de maneira séria, mas agora, a forma como ela olhou para ele, acompanhada daquele sorriso travesso, fez com que ele se sentisse desconcertado. Gaguejando, ele tentou se explicar, as palavras se embolando em sua boca.
── Eu... Eu não pensei que você fosse... Quero dizer, eu não... não...! ── Rick falava sem saber muito o que dizer, sua mente completamente bagunçada pela provocação de Leah.
Leah soltou uma risada abafada, divertida com a situação, antes de finalmente se aproximar da porta do carro e abrir. Ela não parecia nem um pouco ofendida; ao contrário, parecia se divertir com o desconforto de Rick.
── Relaxa, Rick. Eu estava só brincando ── ela disse, com um sorriso de lado que fazia todo o nervosismo de Rick parecer ainda mais embaraçoso. ── Vamos, entre no carro. Não vamos ganhar nada ficando aí, parado.
Rick ainda estava corado, tentando se recuperar do que acabara de acontecer, mas, mesmo sem saber muito bem o que pensar sobre Leah e suas palavras, ele sentiu que ela não era uma ameaça. Talvez fosse apenas mais uma sobrevivente tentando lidar com o novo mundo de uma maneira que Rick ainda não conseguia entender completamente.
Ele respirou fundo e, finalmente, deu partida no carro. Não houve mais palavras entre eles por alguns minutos, mas o sorriso travesso de Leah e a situação desconfortável de Rick pairaram no ar como uma lembrança de que, naquele novo mundo, as interações humanas - mesmo as mais estranhas e desconcertantes - ainda aconteciam.
O silêncio que se seguiu à partida do carro foi quebrado quando Leah, sem tirar os olhos da estrada, virou-se para Rick com um sorriso provocador. Ela parecia não ter pressa de chegar a lugar algum, aproveitando cada segundo daquela interação desconfortante e ao mesmo tempo intrigante.
── Então... por que Atlanta? ── Leah perguntou, sua voz suave, mas com um tom curioso que parecia mais um convite para que Rick se abrisse. Ela estava claramente se divertindo, e Rick, ainda tentando se ajustar à sua presença, não soube exatamente como reagir.
Rick hesitou por um momento, o olhar fixo à frente, antes de finalmente se permitir contar um pouco mais sobre si. ── Estou atrás do meu filho ── disse, a voz mais grave agora, com um peso que ele não podia disfarçar. ── Carl... ele deve estar com minha esposa, Lori. Eu... preciso encontrá-los."
O nome de Carl e Lori parecia trazer à tona um turbilhão de emoções, mas Rick manteve o foco, não queria mostrar fraqueza, especialmente não para alguém como Leah, que parecia ter uma habilidade natural de tirar as pessoas da sua zona de conforto.
Leah o observou por um momento, como se pesando suas palavras. Então, com um suspiro, ela respondeu, sua expressão suavizando um pouco. ── Eu lamento saber disso, Rick ── disse ela, a voz sincera, mas com aquele toque irreverente que a tornava ainda mais difícil de decifrar. ── Saber que você é casado, quero dizer... você definitivamente faz o meu tipo.
Rick sentiu seu rosto esquentar novamente, mas agora não era apenas o constrangimento de antes. Era o peso da conversa e, talvez, um pouco de confusão. Ele nunca soubera muito bem como lidar com esse tipo de flerte, especialmente agora, quando o mundo que ele conhecia havia sido virado de cabeça para baixo. Ele não tinha tempo para nada além de encontrar sua família, mas a presença de Leah o fazia se sentir... mais humano, de alguma forma.
── Eu... não sei o que dizer ── Rick murmurou, tentando se manter sério, mas claramente desconcertado. Ele não queria, de jeito nenhum, fazer nada que pudesse ser mal interpretado, especialmente agora, quando seu coração estava focado em uma única coisa: a segurança de Carl.
Leah deu um sorriso de lado, aparentemente satisfeita com a reação dele. Ela não parecia ofendida, apenas mais divertida. ── Não precisa dizer nada, Rick ── ela respondeu, com um tom mais leve. ── Eu só acho interessante que, em um mundo como o nosso, você ainda consiga ser tão... claro sobre suas prioridades.
Rick olhou para ela, tentando entender o que ela realmente queria dizer, mas as palavras pareciam escapar dele. A verdade era que ele não sabia o que esperar de ninguém mais. Em um mundo onde a morte estava à espreita em cada esquina, as relações humanas pareciam se tornar mais complicadas a cada dia. Mas Leah, com seu comportamento descontraído e seu sorriso enigmático, lhe fazia questionar se, talvez, ainda houvesse espaço para algo mais no meio de todo o caos.
Ele não respondeu imediatamente, pois as palavras de Leah ressoaram em sua mente. Era como se ela estivesse testando os limites dele, medindo o que ele ainda tinha de vulnerável. No entanto, o que mais importava, o que realmente estava em sua mente, era o caminho que se desenrolava à frente, o destino incerto e a esperança de encontrar seu filho.
Rick respirou fundo, olhando para a estrada à frente enquanto as palavras que ele precisava dizer começavam a pesar em sua mente. O peso do passado, da dor e das complicações de sua vida antes do apocalipse, estava mais presente do que ele gostaria. Leah, percebendo sua mudança de postura, inclinou-se ligeiramente para frente, como se estivesse aguardando o momento de ouvir algo mais profundo.
── Na verdade ── Rick começou, a voz mais grave, com um tom de cansaço ── Lori e eu... estávamos em situações complicadas antes de tudo isso. Nós íamos nos divorciar, Leah. As coisas entre a gente não estavam bem há muito tempo.
Ele olhou para as mãos, agora apertando o volante com mais força, como se as palavras fossem difíceis de liberar. ── Quando fui baleado... Eu estava em coma por semanas, e quando acordei, o mundo... bem, o mundo já estava acabado. Mas o que eu nunca tinha percebido é que, mesmo antes de todo esse apocalipse, meu casamento já tinha acabado.
Leah o observava, atenta, sem interromper, dando-lhe o espaço que ele precisava para falar. Rick não sabia por que estava compartilhando isso com ela, mas sentia que, talvez, fosse mais fácil contar para alguém que também estava perdendo tudo, de alguma forma.
── A Lori... ela já não me respeitava mais. Ficava me gritando na frente do nosso filho, sempre me deixando na defensiva. Ela não tinha paciência para mim, e eu sabia... Eu sabia que ela tinha casos. Quando ainda éramos uma família, ela já havia se afastado de mim, e eu sabia que não estava mais sendo o homem que ela queria.
O peso dessas palavras parecia esmagar o ar dentro do carro. Rick sentiu um nó na garganta, mas continuou, sem saber o que mais poderia fazer para aliviar essa carga.
── Eu não a culpo completamente, mas... a verdade é que não havia mais amor entre nós. Eu já não sabia o que estava fazendo. Tudo estava desmoronando antes mesmo do mundo começar a desmoronar.
Leah permaneceu em silêncio por um longo momento. O único som era o do motor do carro quebrando a quietude. Ela parecia absorver cada palavra, sem julgá-lo, mas Rick sentia o peso de sua confissão. Talvez fosse a necessidade de alguém entender. Talvez fosse o vazio, a solidão que ele sentia. Mas, de alguma forma, ele sentia que precisava contar. Precisava dizer a alguém que, apesar de tudo o que havia perdido — sua esposa, seu mundo, sua certeza — ele ainda lutava, ainda procurava algo que fosse real. Algo que não fosse destruído.
── Eu sei o que é se sentir perdido, Rick ── Leah disse finalmente, sua voz calma e sem julgamento. ── E eu sei o que é ver alguém que você ama se afastar de você antes do mundo acabar. Mas você não está sozinho agora.
Rick olhou para ela rapidamente, surpreso com a empatia que ela transmitia, sem aquele tom de compaixão vazia. Ele não sabia o que pensar sobre ela ainda, mas, de alguma forma, as palavras dela trouxeram um pouco de alívio, mesmo que por um instante.
── Obrigado ── ele murmurou, mais para si mesmo do que para ela.
Leah deu um leve sorriso, o olhar suavizando. ── Todo mundo tem uma história, Rick. E, no final, acho que o que importa é o que você vai fazer com ela. O que você vai fazer com esse novo começo, com essa nova chance. ── Ela olhou para ele com uma intensidade que o fez sentir uma conexão, algo inesperado naquele cenário apocalíptico.
Rick não soube o que responder. A verdade era que ele ainda estava tentando entender seu próprio lugar no mundo agora. Mas, por algum motivo, o caminho parecia mais claro do que antes. O futuro era incerto, mas ele sabia que, por enquanto, teria que continuar a lutar. Não só por Carl, mas por ele mesmo, talvez pela primeira vez em muito tempo.
Rick manteve os olhos na estrada, a mente ainda ocupada com as palavras que acabara de compartilhar. O peso da conversa não desaparecia, mas algo na presença de Leah começava a trazer uma sensação estranha de leveza, como se ela fosse uma distração bem-vinda, uma pausa momentânea da dor e das memórias que o perseguiam.
Leah, parecendo perceber o quanto ele ainda estava absorvendo tudo, respirou fundo e então, com um sorriso no rosto, inclinou-se um pouco para frente, quebrando o silêncio. Seu tom era diferente agora, mais leve, até sedutor, como se tentasse afastar a tristeza que tinha pairado no ar durante a conversa.
── Então ── ela começou, a voz suavizando e ganhando um tom brincalhão, "você tem um filho chamado Carl, huh? Que idade ele tem?"
Rick, um pouco surpreso com a mudança de atitude dela, olhou para ela rapidamente. ── Ele tem 12 ── respondeu, a voz mais suave, ainda sentindo os resquícios da conversa anterior. ── Mas não sei onde ele está agora... espero que esteja seguro.
Leah assentiu, seu sorriso não deixando de ser enigmático. ── Eu aposto que ele é parecido com você, né? Deve ser um garoto esperto, com um bom pai, mas pelo que vejo, você também tem um lado mais... protetor. ── Ela levantou uma sobrancelha, sua expressão agora mais descontraída, como se estivesse tentando relaxar a atmosfera.
Rick deu uma risada nervosa, tentando suavizar a tensão. Ele não estava acostumado a esse tipo de conversa, especialmente em um mundo onde a sobrevivência era a única prioridade. ── Sim, ele é... ele é bem esperto, como você disse. Mas eu... bem, não sou exatamente o tipo de pai protetor tradicional. ── Ele deu um pequeno sorriso, tentando se soltar. ── Tenho minhas falhas, como todo mundo.
Leah olhou para ele com aquele olhar afiado, como se estivesse testando cada palavra, mas ao mesmo tempo, se divertindo com o desconforto de Rick. ── Ah, Rick ── ela disse, sua voz suavizando ainda mais ── acho que quem não tem falhas hoje em dia é quem está mentindo para si mesmo. Esse mundo acabou, mas você ainda está aqui, tentando fazer o melhor para ele, para sua família. Isso já diz muito sobre você.
Ela se recostou no banco, os olhos fixos nele, mas o tom de sua voz agora era mais suave, quase como se quisesse quebrar a dura camada de dor que envolvia Rick. ── Acho que isso é o que importa, não é? Não o que a gente já foi, mas o que a gente ainda pode ser.
Rick não soube o que responder de imediato. Ele estava começando a entender que Leah, de alguma forma, sabia como equilibrar o peso da tristeza e da solidão com uma leveza que ele ainda não conseguia encontrar. O que ela estava dizendo não era só sobre ele ou sobre sua família, mas sobre todos, sobre a luta de tentar encontrar um propósito em um mundo que já não fazia mais sentido.
Ele olhou para ela, o sorriso agora mais genuíno, ainda confuso, mas tocado pela forma como ela conseguia transformar a dureza do apocalipse em algo mais suportável. ── Eu... não sei ── ele disse finalmente, ── mas talvez você esteja certa. O que importa é continuar, mesmo que não saibamos exatamente para onde estamos indo.
Leah deu de ombros, voltando a olhar pela janela com um sorriso enigmático. ── É, quem sabe. Mas, Rick, uma coisa é certa: você não está sozinho nessa. E, quem sabe, eu também posso ser útil, se você quiser. ── O tom leve e insinuante voltava a estar presente em sua voz.
Rick não soube como responder a isso. Mas algo dentro dele, uma sensação de alívio e curiosidade, se acendeu. Ele não sabia o que o futuro reservava, mas por aquele momento, estava começando a perceber que talvez, em meio ao caos, ele pudesse encontrar algo mais. Algo além da dor. Algo que ainda valesse a pena lutar.
Enquanto o carro seguia pela estrada deserta, Rick não sabia que, por trás do sorriso encantador e do comportamento descomplicado de Leah, havia um passado sombrio e perturbador que ela ainda não estava pronta para compartilhar. Ele, imerso em suas próprias cicatrizes e dúvidas, não imaginava que, assim como ele, ela também carregava demônios.
Leah olhou para a janela, as imagens do mundo apocalíptico passando rapidamente, mas sua mente estava longe, presa em um passado que ela tentava evitar. Ela podia sentir a distância entre ela e Rick diminuir, mas o peso do que ela havia vivido não a deixava relaxar totalmente. Ele falava com sinceridade sobre sua família, sobre o que perdera, mas Leah sabia que não poderia se abrir completamente, ainda não. O apocalipse havia feito coisas com ela que nem ela mesma entendia.
Ela nunca havia tido tempo para parar e refletir, mas tudo se desenrolou tão rapidamente após o início do fim. Quando acordou, o cenário era bem diferente do que imaginava para si mesma.
Leah se lembrava do momento em que abriu os olhos pela primeira vez no início do apocalipse. Ela estava nua, deitada em uma cama de laboratório fria e impessoal. Os braços e pernas estavam atados por fios e aparelhos, monitorando o que restava de seu corpo. O ambiente estava abafado e silencioso, e o único som que ela conseguia ouvir era o do ritmo dos seus próprios batimentos cardíacos. Ela não sabia onde estava, quem era ou por que estava ali. A única coisa que sabia era seu nome. Leah.
A confusão e o pânico a tomaram rapidamente. Ela tentou se mover, mas estava fraca demais. O medo começou a se instalar, misturado com um crescente sentimento de perda. Não sabia o que havia acontecido com o mundo, mas o que estava diante dela não fazia sentido algum. Aos poucos, ela foi desconectando os aparelhos, sem entender a gravidade da situação. Quando conseguiu se levantar, sentiu um vazio imenso, não só em sua memória, mas também no seu peito. Algo estava faltando, mas o que? Ela não sabia. Era como se tivesse sido arrancada de sua própria vida, sem explicações.
O mundo estava desmoronando enquanto ela tentava entender o que havia acontecido com ela, e com o mundo ao seu redor. Através das informações que conseguiu reunir e das pessoas que encontrou, ela soubera que o apocalipse havia começado quando ela estava em algum tipo de experimento, em um laboratório isolado. Mas como? Por que? Ela não tinha respostas. A sensação de vazio persistia, e por mais que tentasse se focar na sobrevivência, a pergunta sempre voltava: quem era ela antes de tudo isso?
Ao longo dos meses, Leah aprendeu a se proteger, a se esconder, a lutar quando necessário, mas as memórias ainda não voltaram. Às vezes, ela se pegava olhando para as pessoas e imaginando quem eram, o que significavam para ela. O contato com os outros parecia um reflexo, algo distante, como se fosse tudo uma grande peça de teatro que ela estava assistindo sem participar de verdade.
Enquanto Rick dirigia, ela sentiu o peso dessas lembranças se aproximando. Ela se virou para ele com um sorriso que tentava disfarçar a dor que ainda sentia. ── Sabe, Rick ── ela disse, a voz agora mais suave, ── Eu não sou a pessoa que você acha que sou. Eu não sou... como todo mundo imagina que eu seja.
Rick olhou para ela, seus olhos curiosos, ainda sem entender totalmente quem era Leah, mas sentindo que ela escondia muito mais do que demonstrava. ── Eu sei ── ele disse, sem saber exatamente por que, mas sentindo uma conexão mais profunda com ela do que deveria. ── Eu sei que todo mundo tem suas histórias, seus próprios fantasmas.
Leah sorriu, mas seus olhos estavam longe, como se estivesse revivendo algo. ── Eu acordei em um laboratório, Rick. Não sabia nada sobre mim. Não sabia quem eu era, o que tinha feito, nem o que estava acontecendo com o mundo. Só sabia o meu nome, Leah. Nada mais. E tudo o que restava era tentar sobreviver.
Rick a observou com mais atenção, agora compreendendo que o peso dela não era apenas o do apocalipse, mas algo muito mais pessoal, uma perda de identidade que talvez fosse ainda mais devastadora do que qualquer batalha que ela tivesse enfrentado.
── Eu... não sabia disso, Leah ── Rick disse com uma sinceridade que tocou algo profundo nela. ── E isso deve ter sido... terrível.
Leah deu um pequeno sorriso forçado, mas não respondeu de imediato. Ela sabia que Rick estava tentando entender, mas sabia também que nem ela mesma havia conseguido se entender completamente. ── Eu acho que, de alguma forma, estamos todos tentando encontrar algo no meio de tudo isso. Algo que valha a pena, algo que nos faça sentir que ainda somos humanos, sabe?
Rick assentiu, sentindo o peso dessas palavras. Talvez, no fim, fosse isso que todos procuravam: algo que os fizesse sentir que, apesar da destruição, ainda havia alguma razão para seguir em frente. Mas Rick também sabia que, às vezes, as respostas não vinham com facilidade. Ele olhou para Leah mais uma vez, agora com mais empatia. Eles tinham suas próprias batalhas, mas estavam juntos nesse caos. Talvez isso fosse o suficiente, por enquanto.
Leah ficou em silêncio por um momento, o olhar fixo na estrada à sua frente, mas a mente voltando para aquela manhã sombria, quando ela se viu pela primeira vez após acordar. Ela se lembrava do espelho sujo que encontrou em um prédio abandonado, com uma lâmpada piscando à sua frente. A imagem que refletia de volta era a de uma estranha, uma mulher que não reconhecia, mas que parecia carregada de sofrimento. O primeiro choque foi seu olho cego, a cicatriz grossa que ia da sobrancelha até perto da bochecha, um lembrete constante do que ela havia perdido e do que ela havia enfrentado. Mas não eram apenas as cicatrizes visíveis que a marcaram; havia as que ela não conseguia ver, aquelas deixadas pelas agulhas, pelas experiências, pelas dores que ela ainda não compreendia completamente.
Cada marca, cada cicatriz, era como uma parte do quebra-cabeça de sua identidade que ela ainda não conseguira montar. Ela tentava afastar esses pensamentos, ignorar o peso do passado que ainda a assombrava, mas era difícil. Mesmo com toda a fachada de mulher forte e confiável, Leah sabia que sua vulnerabilidade era um segredo bem guardado.
Foi então que ela decidiu, mais uma vez, usar seu charme para afastar a tristeza, para aliviar o peso das memórias. Ela olhou para Rick, que parecia completamente imerso em seus próprios pensamentos, e com um sorriso ligeiramente provocante, decidiu jogar suas palavras de volta, sem o peso da seriedade.
── Você sabe, Rick ── ela começou, sua voz suave e cheia de um tom brincalhão ── você parece ser alguém decente. Sério, acho que poderia confiar em você. ── Ela pausou, o sorriso se alargando um pouco, enquanto seus olhos se fixavam nele, como se estivesse medindo sua reação. ── Quem sabe, até poderia ter um filho seu, né? Só imagina a gente formando uma família... em um mundo como esse."
Rick ficou quieto por um momento, surpreso pela audácia da afirmação. Ele tinha ficado cada vez mais intrigado por Leah, mas essa última declaração fez com que ele se sentisse, de alguma forma, mais desconfortável e, ao mesmo tempo, mais atento. Leah não estava apenas brincando; ela estava colocando tudo isso no ar, desafiando-o a responder de uma maneira que ele não sabia exatamente como.
Mas Rick, que já estava longe de ser um homem sem humor, sentiu uma pontada de provocação em sua própria resposta. Ele não estava apenas disposto a ser o alvo dessa brincadeira, não mais.
── Você acha que seria fácil assim, huh? ── Rick respondeu, seu olhar se encontrando com o dela, um sorriso travesso se formando em seus lábios. ── Bem, Leah, se fosse qualquer outro cara, talvez ele tivesse caído no seu jogo. Mas eu... tenho algumas regras. E uma delas é não sair por aí fazendo filhos sem saber o que está acontecendo no mundo. Não é por nada, mas o apocalipse já está complicado o suficiente.
Leah ficou em silêncio por um instante, surpreendida pela resposta, mas logo riu, um riso baixo e divertido. Ela adorava essa troca. Sentia que, de alguma forma, estavam começando a se entender, apesar da fachada de distâncias que ambos mantinham. "Eu gosto de você, Rick," disse ela, seu tom mais suave agora, mas ainda cheio de ironia. ── Você não é fácil de conquistar, isso é certo. Mas isso só faz a brincadeira mais interessante.
Rick riu também, um som genuíno, e pela primeira vez em muito tempo, sentiu uma leveza que não tinha em muito tempo. Talvez não fosse o tipo de conexão que ele esperava, mas, naquele momento, a troca com Leah parecia ser a única coisa que o afastava da dor da solidão e da perda.
── Bem ── ele respondeu, com uma risada baixinha, ── se for pra brincar assim, acho que vou ficar por aqui. Não sou de dar respostas fáceis, mas acho que, por enquanto, você vai ter que me aceitar como sou.
Leah olhou para ele com um sorriso divertido, mas algo mais profundo passava em seus olhos, uma compreensão silenciosa sobre as feridas que ambos carregavam, embora ninguém tivesse tocado no fundo da questão. ── Aceitar você? Acho que vou acabar me acostumando com você, Rick Grimes.
O clima havia mudado de novo, mais leve, mais descontraído, mas com uma tensão palpável que nenhum dos dois estava disposto a admitir. Ambos sabiam que, sob as palavras e os flertes, havia mais do que simples diversão. Havia dor, medo, e, talvez, a tentativa desesperada de encontrar algo — qualquer coisa — que os fizesse sentir que, apesar de tudo, ainda havia algo que valia a pena lutar.
○⃘ 𝆬 ͚⃝🧟♀️ 𝆺
Prólogo postado, depois de ler e reler pra ver se realmente me agradou e no final eu gostei bastante. Foi algo totalmente descontraído e leve.
○⃘ 𝆬 ͚⃝🧟♀️ 𝆺 5188 palavras.
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