003.
003. Calafrio
SE ARREPENDIMENTO MATASSE, neste momento o corpo de Hazel poderia ser encontrado sem vida caído no ━ pelas palavras da mesma ━ inferno branco e de mármore. Ela seguia Castiel a cada passo que o anjo da frente dava, mas o que mais a incomodava era os outros que cochichavam e seguiam ela com os olhos; agiam como se tivessem visto uma assombração, e quando ela os encarava de volta, eles tentavam ━ inutilmente ━ disfarçar.
Era estranho ficar tanto tempo calado, quando já havia se acostumado com o jeito animado e caloroso dos brasileiros com quem passou tantos anos. Agora tinha que seguir para uma sala, que teria mais anjos com pautas, reuniões, responsabilidade e, é óbvio, a confiança e lealdade cega ao céu.
Hazel lembrava-se bem dessas "reuniões", quase como se a última que ela tivesse participado houvesse ocorrido no dia anterior. Era normal que resultassem em discussões, ameaças e muitas lâminas sendo puxadas de um lado e do outro.
FOI ESTRANHO ENCARAR alguns conhecidos que ela havia vivido antes de descer dos céus. Zacarias parecia mais atônito do que o normal, havia mudado de casca e, se ela fosse sincera, diria sem hesitação nenhuma que havia sido uma péssima escolha. Ela olhou ao redor, estavam apenas os três e um quarto anjo. Fazia décadas que não via Uriel, e ela gostaria que tivesse ficado mais tempo sem vê-lo.
━ A filha pródiga à casa torna. ━ o tom de deboche presente na voz de Zacarias era o suficiente para ela dar as costas e deixar o céu mais uma vez, mas Castiel parecia tão tenso na presença do outro que ela achou que abandoná-lo ali seria imperdoável.
━ Bom te ver também, Zac. ━ ela não fez a menor questão em disfarçar o quanto aquele sorriso minúsculo presente em seu rosto era falso. Queria fazer questão de mostrar que estava ali contra sua vontade, que não estava nem um pouco contente em retornar ao paraíso.
Uriel trocou o peso do corpo de um pé para o outro. Encarou Hazel de cima à baixo e disse:
━ É, vamos fazer Hazel ser o centro das atenções ou vamos falar sobre o que realmente é prioridade ?
Ela o encarou, o seu típico olhar cortante e os olhos faiscantes que pareciam que iriam explodir a qualquer momento. Se já estava irritada em ter que voltar para o céu, um deboche aqui e outro ali ━ principalmente de anjos não queridos, como era o caso de Uriel ━ seriam o suficiente para fazê-la cometer algo ruim.
━ Você tem algum problema com meu retorno, Uriel ? ━ ela ainda mantinha seus olhos sobre ele quando perguntou; levando a mão para dentro da jaqueta jeans ━ Podemos resolver isso com mais facilidade, não acha ?
Ah sim. Hazel esqueceu por um instante que, quase sempre, ela acabava envolvida em uma das brigas que resultaram dessas conversas angelicais.
━ Nossos segredos estão sendo ameaçados ━ Zacarias começou, parecia tentar interromper qualquer conflito que poderia acontecer ali dentro ━ Será que poderiam focar nisso ? ━ ele reclamou ━ Quando resolvermos tudo, deixo vocês brincarem com as lâminas.
Como se eu precisasse da sua permissão para algo, era o que corria pelos pensamentos de Hazel nesse momento.
Zacarias começou a explicar o que estava ocorrendo. Como se fosse líder de alguma coisa, ele falava sobre a jovem Anna que havia ficado sintonizada na frequência da rádio angelical e isso havia se tornado de conhecimento por parte dos demônios. Agora eles precisavam impedir que ela fosse capturada e forçada a falar o que ouvia para os olhos escuros. Mas como para aqueles seres de asas nada era do jeito fácil, sua missão inicial era matar a pobre moça.
Estaria mentindo se falasse que pouco se lixava para os segredos dos anjos ou coisas do tipo. Quantos milhares de anos iriam durar essa confusão que estabeleciam com os demônios ? Um caça o outro, tenta descobrir fraquezas e continuam nessa brincadeira de gato e rato o resto de suas miseráveis e eternas existências.
Ela suspirou enquanto se segurava para não questionar o porquê precisavam dela naquele local; se não tinha gente o suficiente para resolver esse problema besta e tiveram que tirá-la do conforto de sua vida mansa para arrastá-la de volta para aquilo tudo.
Será que haviam se tornado tão inúteis que não conseguiam fazer algo comum como aquilo ?
Agora, o pensamento de que ter deixado o céu pela primeira vez havia sido um erro terrível atormentava sua mente flagelada. Que droga, era sua culpa por estarem assim, ou não era ?
Hazel sentiu o olhar de Castiel sobre ela, e o encarou de forma instantânea. O anjo parecia confuso, talvez os sentimentos dela estivessem começando a transparecer. A confusão em sua mente parecia ter afetado a dos outros também. Respirou fundo e se reconstitui no mesmo instante, como se nunca tivesse pensado nada fora do comum para uma situação como aquela.
Estava tudo fácil demais. O que poderia dar errado ?
Era simples se fosse seguido os passos que haviam lhe instruído:
1. Ache a garota
2. Pegue a garota
3. Mate a garota
Era mais fácil do que ela costumava fazer antes.
Nada daria errado. Nada sairia do controle.
TUDO DEU ERRADO desde o momento que ela começou a perguntar o porque o céu parecia tão desalinhado. Ela já sabia que seu pai estava fora da zona, afinal, ela ainda estava ligada na rádio quando, alguns anos depois de sua descida, os anjos gritavam desesperado dizendo que seu pai havia desaparecido.
Mas ela não estava ciente de que Gabriel também havia descido para Terra e menos ainda de que Rafael e Miguel pareciam estarem prestes a travar uma guerra para saber quem assumiria o lugar do pai enquanto ele estivesse fora.
Além disso, os selos haviam começado a serem rompidos. O apocalipse estava começando.
━ Eu espero que você esteja brincando. ━ ela disse para Castiel.
━ E porque eu estaria ? ━ o anjo franziu o cenho.
━ Eu acho que você...━ mas ela se calou, não queria estender nenhum assunto no momento ━ Esquece.
O outro concordou levemente com a cabeça.
━ O que fazemos agora ?
━ Esperamos.
━ Que saco. ━ ela revirou os olhos ━ Como você aguenta ?
Ele deu de ombros.
━ É o que fazemos.
Hazel sentia um calafrio percorrer sua espinha sempre que Castiel ou qualquer outro anjo se referia a ela como uma deles. Não que não fosse verdade, suas asas ainda estavam ali para provar o que ela era, mas já fazia tanto tempo que não se considerava como uma deles, que agora, se sentia incomodada.
As informações que haviam sido repassadas para ela havia atingido em cheio, a cabeça de Hazel estava sobrecarregada com tudo aquilo, seus pensamentos rodopiavam de um lado para o outro e ela sentia seu estômago doer de ansiedade. Sentia que poderia vomitar a qualquer momento.
━ Preciso sair daqui.
Ela não sabe se avisou para Castiel por consideração ou se foi apenas pelo impulso repentino. Ela mal ouviu quando ele disse algo, já estava na porta de saída do céu, assim como havia feito anos atrás.
QUALQUER LUGAR ERA melhor do que o céu. Ao menos era assim para Hazel. Tanto que a primeira lanchonete de esquina que ela encontrou, foi onde ela encontrou um refúgio. Quando sentou-se em uma das mesas vazias, não demorou muito para uma garçonete ir anotar seu pedido.
Embora a lanchonete tivesse mais pessoas do que o normal, ela se sentiu muito melhor do que quando estava no céu. Respirou fundo e tentou colocar a mente em ordem, e por um instante, pensou seriamente em ligar a rádio angelical. Não, sem chance. Não queria ouvir o que estavam dizendo sobre ela.
O sino da lanchonete quando a porta abriu a fez levantar a cabeça, ela observou dois homens entrarem e sentarem-se a duas mesas dela. Ah, sem chance, ela pensava, isso só pode ser brincadeira.
Ela nunca os havia visto, mas pela maneira como Castiel os descreveu, aqueles não poderiam ser ninguém mais e ninguém menos do que Dean e Sam Winchester. Ela precisava sair dali o mais rápido o possível, antes que algum anjo encontrasse ela e em consequência, aqueles dois também. Cass havia lhe contado que o céu parecia ter um interesse maior nos dois irmãos. Hazel odiava tirar conclusões precipitadas sobre os outros, tinha que ver o que os dois eram com seus próprios olhos. Mas não naquele momento.
━ Moça. ━ ela chamou a garçonete que havia anotado seu pedido mais cedo, e agora, o dos irmãos também ━ O meu é 'pra viagem.
A mulher apenas confirmou com a cabeça e com um sorriso no rosto, seguindo seu caminho para atrás do balcão em seguida.
Hazel evitou olhar para a direção da mesa dos Winchester, mas era difícil quando o mais velho a encarava em curtos intervalos de tempo.
Que diabos, ela havia fugido de uma encrenca e estava prestes a entrar em outra. Respirou fundo e por um segundo desejou parar com o que ia fazer, mas seu código moral já estava em outro lugar.
Sua audição já era ótima, sem a rádio angelical para lhe atrapalhar e com um pouco de concentração a mais, ela conseguiu abafar as outras vozes e focar apenas na dos dois homens. Ela pegou a tempo de ouvir um:
"Ela é um demônio, Sam. Não tem porque confiar."
"Eu conheço a Ruby e confio nela, Dean. Eu te garanto que ela não nos trairia."
O silêncio predominou por mais alguns segundos, até que o mais velho continuou:
"E agora ainda tem o caso dessa Anna. Como se não a gente já não tivesse dor de cabeça o suficiente."
"E os anjos."
"E os anjos também."
━ Puta merda. ━ ela balbuciou baixo. Agora sim, ela precisava sair dali o mais rápido o possível.
E como se seus desejos fossem atendidos, a garçonete retornou com seu lanche, onde o anjo pagou e levantou-se apressadamente.
Quando passou pela mesa dos dois, olhou para eles de relance, mas sentiu o olhar dos dois queimar suas costas enquanto saia do estabelecimento.
━ Eu sou muito burra.
LONGE DA LANCHONETE, Hazel estava sentada em um banco de um parque qualquer, observando a movimentação humana que tanto admirava. A presença de Castiel era inconfundível, e ela nem precisou olhar para o lado para confirmar que o anjo estava em pé ao seu lado.
━ Onde você estava ? ━ ele perguntou. Direto como sempre, como todos eles.
━ Fui tomar um ar. ━ ela levantou o resto do hambúrguer que tinha em mãos, mas não direcionou o olhar para ele.
━ Tem certeza que foi apenas isso ? ━ perguntou ━ Não encontrou mais ninguém ou nada fora do normal ?
Sim.
━ Não. ━ e com o melhor sorriso que tinha guardado, ela olhou para ele, mentindo o quanto que conseguia ━ Tudo normal, na medida do possível.
━ Não sei porque insiste nisso, minha irmã. ━ e por um momento ela sentiu seu corpo esfriar, mas logo notou que o olhar de Castiel estava voltado para o lanche que tinha nas mãos ━ Sentimos o gosto de cada célula, então porque comer ?
━ Para ficar igual eles.
━ Os humanos ?
━ É, 'pra me misturar entre eles. ━ suspirou ━ Passei muito tempo na Terra, Cass, fiz amizade e sai muito. Seria estranho se eu fosse a única da mesa que não comesse ou bebesse algo. ━ um sorriso triste brotou em seus lábios.
━ É. Faz sentido.
━ Então, o que veio fazer aqui ?
━ Procurar você. ━ disse simples ━ Uriel disse que em breve teremos que ir atrás de Anna.
"Teremos", ele estava novamente à englobando naquele circo todo.
Mas a menção do nome Anna a fez recordar do breve encontro que teve com os Winchester ━ onde ela bisbilhotou a conversa dos dois irmãos.
━ Só isso. ━ ela disse, levantando-se do banco ━ Só isso e eu vou embora, Cass.
━ Você não pode ir. ━ ele respondeu, por uma fração de segundos ela jurou poder ter visto uma expressão de surpresa no rosto do anjo ━ Não de novo. E não agora.
━ E por qual motivo eu ficaria ?
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