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O1 ⎯⎯ pelo quê vale a pena viver?

3.580 palavras. aviso!
ao longo do capítulo, o protagonista
se refere várias vezes como "ela" ao
falar de si mesmo no passado. mas
nenhum tipo de transfobia será aceito.

também deixo alertado as descrições
gráficas de dor e auto aversão por parte
do próprio noam. capítulo ainda não re-
visado, então ignorem os erros, okay :D.

NOAM NÃO DEMOROU MUITO PARA DECIDIR QUE PREFERIA ESTAR MORTO. Uma das poucas vantagens em sua condição de saúde ─── e também a maior das desvantagens ───, era a total e inestimável auto consciência.

Ele percebeu que ainda estava vivo logo após ter certeza que estava morto, porque é claro que era assim que sua vida funcionava, não? Assim que seus olhos se fecharam e a sua mente nebulosa foi abraçada pela escuridão do desmaio, bem quando o toque cálido e o beijo sombrio da morte pareciam a centímetros de distância, as memórias decidiram voltar a assombrá-lo. Num rompante de batalha entre o nada e um flash de luz, o passado passou a correr novamente bem diante de seus olhos.

Se a ignorância era uma benção, então a auto consciência era o pior dos mártires, a mais cruel sentença.

Sob a perspectiva de que ainda vivia, o homem de cabelos azuis se viu parado no oco absoluto de sua memória hiper estimulada. Num abismo de escuridão, onde os lados, chão e teto se refletiam no mais puro nada, Noam se encontrou estático de um modo muito familiar. Por onde quer que seus olhos vagassem, tudo que ele podia ver era o vazio da noite eterna.

Aos seus pés, águas escuras ondulavam calmamente e ressoavam a cantiga de um oceano adormecido.

Ele estava no limbo que sua própria mente havia criado.

Sua pele pálida era quase translúcida naquele cosmo de coisa alguma, seus cabelos azuis sobrevoavam ao seu redor como se o mais gentil dos ventos sul o estivesse acariciando. O toque de uma mão amiga em seus fios coloridos, o calor suave de um corpo alinhado ao seu ─── tudo isso era inexistência. Uma irrealidade, um surrealismo, que era parte da sua realidade desde anos atrás. No vazio, Noam era Nada. Seu corpo nu pulsava como a água correndo ao seu redor e nada mais importava exceto o ponto de luz que, calmamente, se revelava diante de suas orbes escuras.

Como uma coração bombeando vida por vasos sanguíneos desentupidos, a parca bola de luz ofuscante foi crescendo. E crescendo. Pulsando, aumentando, se contraindo.

Foi como testemunhar o ciclo de vida e morte, foi trágico, belo; foi decrépito. Pitoresco, exuberante, assustador, grotesco, foi repulsivo. Então, foi lindo.

O ponto brilhante se tornou uma tela viva e, nela, memórias começaram a rodar como filmes e fitas antigas. Um ruído surdo soou naquele além obscuro, mas ninguém jamais o teria escutado. Na tela, o passado ganhava tons, camadas, sons e estalos que feriam Noam e seu corpo como facadas profundas. Ele gostaria de ter força o suficiente para sangrar, se perguntou se poderia sangrar quando tudo que era, agora, era nada.

Um piscar de olhos e Noam Perenne tinha 10 anos de idade. Ele conhecia essa memória bem o bastante para fechar seus olhos e suspirar fundo. A conhecia como a palma de sua mão ─── a conhecia como viria a conhecer todas as suas outras memórias dali por diante. Houve um estalo ao seu redor, como um fita VHS começando a rodar novamente após ser colocada pra tocar e, então, os sons, os cheiros e os sentidos o tomaram de assalto. Foi difícil não se sentir sobrecarregado, mas ele já estava acostumado.

Isso não era um sonho, era uma lembrança.

─── Temos que ser sinceros com a senhora, já tínhamos ouvido falar dessa doença, mas… nunca conhecemos ou ouvimos sobre alguém realmente diagnosticado com ela ─── a voz do médico o fez fazer uma careta. Era tão ridiculamente alta, para um profissional da saúde, ele não deveria saber falar mais baixo? Ser mais compassivo?

Pela septuagésima vez, Noam desejou tê-lo mandado calar a droga da boca naquele dia. Mas como poderia? Ele nem mesmo era Noam ainda.

Suas mãos minúsculas agarraram a barra de sua saia roxa e rodada como uma memória muscular estúpida. Seus ouvidos surdos à discussão entre o doutor e sua própria mãe, cujos olhos se revezavam entre dor, ao olhar para a garotinha ao seu lado, e raiva ao encarar o bendito homem descarado. Mesmo que se negasse a escutar tudo aquilo de novo, e de novo, a criança sabia muito bem qual era o motivo da pauta e para onde tudo aquilo levaria. O médico sempre quis testar até que ponto sua memorização perfeita ia, forçando os limites de sua doença até que a sua cabeça acabasse explodindo ou sua mente enlouquecesse de vez.

Se soubesse que, mais de tantos anos depois, Noam ainda sonhava com o tom de sua voz, o castanho de seus cabelos e o brilho repulsivo de curiosidade medicinal em seus pequenos olhos azuis, então o doutor teria aplaudido e o tratado como o pequeno ratinho de laboratório que conseguiu comer o queijo no fim do dia. Seria sinceramente patético.

Aturdido, ele se levantou da cadeira quando a mãe pediu, com a voz manchada de lágrimas, que a esperasse na sala ao lado. Era uma clínica pediátrica especializada em lidar com crianças esquisitas, mas sua versão mais jovem ainda não fazia ideia do quão esquisita ela de fato era. Seus passos pequenos e rápidos, ainda que hesitantes, o levaram até o lugar onde a mamãe havia mandado. A ansiedade, que em breve se tornaria uma amiga íntima e um tumor irretratável, o impediu de se sentar no pequeno puff azul localizado no canto da sala.

Noam passou anos se perguntando sobre qual seria a sensação de se sentar ali, mas ele nunca teve coragem de saber a resposta.

Como qualquer criança, ficar parado parecia uma missão impossível, mas ele era tímido e tenso demais para vagar pela sala ou pegar os brinquedos guardados no baú logo ao lado. Tocar nos bichos de pelúcia sem permissão era errado, mas pedir por isso parecia pior ainda. Agitado e inquieto, a criança vagou até a frente de um espelho manchado por dedinhos e digitais não muito maiores ou menores que as suas. Ao lado do vidro fino, um desenho de girafa pintado na parede continha inúmeras marcações de centímetros e números.

O tamanho ultrapassava, por pouco, os 1,50m e Noam sabia exatamente o que aquilo significava e para quê servia. Como boa parte das meninas na idade dele, ele não era muito alto e mesmo na ponta do pé mal alcançava a marca dos 1,40. Era frustrante.

Mas mais doloroso ainda foi a imagem refletida que o encarou de volta através do espelho. Um cabelo azul escuro amarrado em duas marias chiquinhas mal passava de seu ombro. Seus pompons eram de um azul clarinho que se destacava no meio da cabeleira quase da cor do mar profundo. Dois olhinhos brilhantes e claros como o céu repleto de nuvens possuíam dúvidas e questões que, mesmo depois de tanto tempo, ainda não sabia responder. No espelho, suas orelhas furadas continham um par de brincos dourados que sabia, até hoje, onde estavam perdidos.

A blusa amarela de patinho parecia tão ridícula quanto era. Ficava pior ainda combinada com sua saia e as malditas e estúpidas galochas de dinossauro. Quando criança, o bom gosto de Noam era tão questionável quanto continuou a ser na vida adulta. Outra das muitas mentiras que o contaram foi essa, que suas vestes eram bonitas e adoráveis e que ele parecia um anjo quando as portava saltitando por aí.

Foi a mentira mais inocente que ele já ouviu, mas agora o machucava muito mais do que as piores delas.

A dor pulsante em seu corpo rapidamente se transformou em algo ácido, corrosivo. O que antes era apenas quente e desconfortável, facilmente ignorado, se tornou afiado e pungente como uma faca envenenada. Cortou-o ao meio; naquele reflexo, Noam via uma menininha, mas não enxergava a si mesmo. Apertando os olhos cerrados firmemente, ele escutou o barulho dos passos, o rangido da porta se abrindo e soube que seu tormento estava, finalmente, chegando ao fim.

E a autoconsciência pingou atrás de suas pálpebras novamente, sussurrando ante à sua esclera que, ao acordar, todo o sofrimento viria dez vezes mais. E a dor lúdica em breve o tornaria insano, que não demoraria muito mais tempo para que ele abrisse mão da sanidade de uma vez. Que em breve seria tomado de novo pela fúria, pela sede de sangue e pelo maquinário malévolo de sua própria busca por vingança.

Mas tudo estava bem ─── não era nada que Noam já não soubesse.

[...]

Dor.

A dor era sempre a primeira coisa que o saudava quando a consciência enfim tomava seu lugar de direito. Uma dor que ia além do corpo físico, se pudesse ser mais objetivo. Uma agonia latente que persistia como um tumor cerebral na parte esquerda do seu crânio. Era uma piada irônica e massiva do universo para caçoar de sua própria doença ─── era dessa forma que Noam definia essa maldita dor. Ele a tinha e a sentia desde aquela memória aos 10 anos; a garotinha no espelho também se recordava dessa sensação.

Mas, dessa vez, o incômodo não foi apenas no inchaço do seu hipocampo ou na parte de trás dos olhos. A porra do seu corpo inteiro estava em chamas.

Assim que ele reconheceu a dor maçante que sentia, o homem de cabelos azuis também percebeu que gritava a plenos pulmões. Engraçado, tudo doía e queimava tanto, que a voz estourando seus tímpanos nem mesmo parecia sua. Ele parecia tão prestes a derreter até restar somente seus ossos, quanto parecia prestes a arder em combustão instantânea e explodir órgãos, sangue e tripas pela sala inteira.

Hiper senciente de cada sensação e agulhada de agonia fincando sua pele, os olhos agitados de Noam cruzaram o ambiente em que ele estava, sua língua enrolada e pesada demais para pronunciar qualquer palavra em qualquer um dos idiomas que conhecia. O de cabelo azul marinho, naquele momento, não podia fazer nada além de gritar. Sua garganta já áspera e em carne viva, seus sentidos sobrecarregados com tanta auto consciência de sensações, de toques, de dor.

Mesmo o algodão macio das vestes que o cobriam parecia uma lixa em contato com sua epiderme torturada; era como se não houvesse um único centímetro de seu corpo que não estivesse sendo apertado, torcido, arranhado e beliscado. Era demais, era demais, era demais, era tão tão tão demais.

Noam nem mesmo soube diferenciar a dor do toque quase gentil que ergueu seu queixo com cuidado, inclinou em seus lábios algo espesso e de sabor insosso e que, então, o forçou a engolir aquela substância desconhecida.

Tão rápido quanto a dor veio, ela se foi.

Vozes e balbucios estrangeiros murmuravam coisas e palavras que o homem ferido não sabia identificar. Suas pálpebras piscavam turvas enquanto o azulado, ainda perdido e aturdido pela dor repentina e o mormaço que o tomou, se fazia questionar baixinho e meio suspirar, meio sussurrar, uma pergunta esquisita.

─── Mor.. fina? ─── sua mente, lutando para não ficar grogue, ainda teve a perspicácia de questionar em inglês. Mesmo recém acordado do que, provavelmente, tinha sido um coma pós uma experiência de quase morte, Noam ainda se lembrava (perfeitamente bem) de que não estava em terras conhecidas quando apagou.

Se ele não estava enganado ─── e acredite, ele nunca estava ───, então Noam Perenne e seu quinhão de experiências terríveis de vida ainda estavam atolados na China e em seu conglomerado político de cidades e vilarejos distintos e culturais.

O homem balbuciando em mandarim antigo ao seu lado, e segurando a mesma jarra rasa que havia sido inclinada em seus lábios na mão, certamente comprovou sua certeza.

Piscando lentamente para afastar a lerdeza e se acostumar com a luz clara do lugar, o jovem estrangeiro forçou seu corpo fatigado a uma posição semi sentada ─── ou o mais perto disso que conseguia ───, enquanto seus olhos afiados (e, na visão daqueles chineses surpreendidos, estranhamente claros e conscientes para alguém que havia acabado de acordar aos berros de dor) avaliavam toda a sala ao seu redor. Quarto, na verdade, sua mente foi rápida em corrigir.

Com um suspiro profundo e um fechar de olhos rápido, Noam já estava totalmente no controle de sua cabeça e consciência de novo. Tão ágil e sagaz seus pensamentos eram que, do momento antes de apagar devido aos ferimentos, até o momento anterior a esse, quando seus passos furiosos e sedentos por sangue o levaram até aquela maldita família, era como se não tivesse se passado nem meio minuto. Ignorada a dor e fraqueza de sua estrutura física, este Noam era o mesmo Noam de antes, prestes a cometer um crime hediondo e uma chacina.

Os três homens chineses parados ao seu redor, o analisando da mesma forma com que os analisava, não perceberam que estavam na presença de um monstro vivo.

O quarto parecia uma enfermaria antiga e extremamente simplificada. E o que devia ser a sua maca hospitalar, não passava de futon no chão (ou como quer que os chineses o chamavam, já que o jovem Perenne não se lembrava de já ter recebido essa informação antes), com um fino travesseiro que era onde ele apoiou seus cotovelos. As paredes eram distribuídas de formas indistintas e, para sua surpresa, não eram somente quatro. O cômodo possuía uma forma hexagonal, contando com oito lados ao todo, e, de onde estava, Noam conseguia identificar colunas e algumas outras estruturas (possivelmente vigas) revestidas de argamassa de cimento e areia, provavelmente cobrindo algum tipo de sustentação de ferro. Estavam pintadas de um azul muito semelhante aos seus próprios cabelos e as paredes tinham um acabamento que imitava troncos de bambu, pintadas num azul tão claro que podia ser facilmente confundida com branco para olhos menos treinados.

As janelas tinham um padrão intricado de voltas e nós que formavam uma bela figura, uma flor que, posteriormente, Noam identificaria como uma lótus. Os monges vestiam um típico macacão laranja que, ele supôs, eram roupas tradicionais e, atrás deles, se encontrava um dos poucos objetos que o azulado reconhecia; um biombo. Uma tela com várias dobras e repartições de bambu que servia para separar cantos do ambiente e dar privacidade de olhos curiosos.

Haviam outros três futons no chão, todos dobrados, fora os vários móveis baixos como gavetas, baús e incensários ─── um deles aceso e preenchendo o local com o cheiro de lavanda e sândalo. Numa daquelas mesinhas de tomar café da manhã na cama, feita de madeira e, talvez, alguns detalhes em jade, residia uma chaleira antiga de porcelana e vários outros comprimidos e ervas naturais.

Somando um mais um, Noam entendeu que estava em algum templo budista perdido nos arredores da última cidade em que ele esteve. E que essas pobres pessoas tolas, para a própria infelicidade, o haviam resgatado.

Em seu cerne, ele não teve forças para sentir piedade ou raiva por elas. Noam Perenne, a essa altura, já não sentia mais nada.

As frases balbuciadas ao seu redor, contudo, não se tornaram mais reconhecíveis. Claro, ele estava na China há um tempo considerável, o bastante para entender quando as pessoas tentavam conversar com ele, mesmo que raramente as desse o benefício de uma resposta; acontece que esses monges, sejam lá a quais deuses serviam, não falavam mandarim. Não o típico, o atual. Talvez estivessem falando em algum chinês antigo ao qual Noam nunca tivera acesso antes, era muito provável ─── sua mente podia ser um computador vivo repleto de informações que ele jamais esqueceria, uma vez que as tivesse conhecido, mas não dava para saber de tudo, não se nunca tivesse ouvido falar antes.

Nessa altura, com uma tontura e ânsia desesperada que arranhava sua garganta, o homem, o monstro, tinha duas opções plausíveis: ficar quieto e esperar a primeira deixa, o momento certo em que todos baixassem a guarda, e causar uma chacina sem poupar vidas inocentes. Ou apenas abrir sua boca para perguntar, em inglês mesmo, onde é que estavam.

Abrir a boca e falar foi quase mais difícil do que trucidar uma dúzia de monges inocentes.

─── Onde é a saída? ─── sua voz soou rouca, destroçada. Era como se sua língua pesasse um quilo e sua garganta fosse lixa. Talvez o assassinato não fosse uma idéia tão ruim…

A pergunta foi bastante objetiva, mas rapidamente ficou óbvio que os homens não o entendiam. Continuaram a balbuciar coisas inteligíveis, foi frustrante. Um dos monges, vestindo um tipo diferente de manto (mas que ainda era laranja num tom berrante), se aproximou e tentou tocar no seu ombro. Noam quase gritou quando o toque roçou sua pele, um estremecimento que desceu por todo seu corpo até às palmas de suas mãos. De repente, o homem que o tocou estava sem ar, o rosto contorcido e roxo enquanto agarrava o braço de Noam em busca de salvação.

O azulado pensou, apertando o pescoço do desconhecido enquanto os outros fugiam da sala aos gritos, provavelmente buscando por ajuda, que sua primeira opção sempre deveria ser a correta. Haviam poucas coisas das quais a morte ─── sua ou dos outros ───, não poderia livrá-lo. Mas um bom mentiroso, decidiu ao soltar o monge e vê-lo respirar longas e profundas bufadas de ar, um bom mentiroso não precisa de nada além de uma única boa mentira.

─── Sinto muito ─── sussurrou, uma máscara de culpa escorregando sobre sua face de um tomada de fôlego para a outra. A falsidade lhe era tão natural quanto o oxigênio saindo e entrando de seus pulmões.

Noam era Nada, mas poderia ser Tudo, bastava ao homem uma mentira. Só uma por vez.

─── Eu não queria machucar você ─── continuou falando, calmamente encolhendo seu corpo numa bola. Do outro lado da porta de bambu, por onde os estranhos haviam fugido, podia-se ouvir o som de passos. Não os mesmos que haviam corrido desesperados, e com certeza não mais do que um par deles. Apenas dois pés, uma só pessoa.

Os olhos do azulado voaram outra vez ao redor da sala, não porque ele pensasse que havia deixado algo passar ou porque precisava prestar atenção em algo que não havia reparado antes. Mesmo uma olhada só, rápida e fugaz, ficaria marcada a ferro e fogo sob suas pálpebras uma vez que a informação fosse mandada ao seu cérebro e a memória fosse gravada no interno do seu hipocampo. Olhar ao redor foi a desculpa mais rápida e acessível que ele tinha para manter a mentira viva; agir como um homem doente, perdido, assustado. Ele era apenas três dessas coisas no momento; muito mais assustador do que em pânico.

O medo ele já havia deixado para trás há muitos anos, no mesmo instante em que a deixou também.

Os passos pesados pararam por trás da porta. Não demorou mais do que poucos segundos para que ela se abrisse. Uma porta, alguns segundos e uma troca de olhares. Isso, somente isso, tudo que foi necessário para o universo todo se romper; para que a realidade ficasse, num rompante, de cabeça para baixo. Outros mundos, outras dimensões, se é que existiam, entraram em irrupção, explodiram-se todas. Sóis nasceram e morreram, o tempo escorreu e tornou-se pó. Vida e morte uniram-se, separaram-se e se fizeram inexistir.

Noam conheceu Liu Kang e realidades inteiras pagaram por isso. E eles só precisaram de um olhar.

─── A saída é aqui. Está olhando para ela.

─── Estou olhando para um homem ─── um desconhecido, alguém cuja aparência é irreal. ─── E não consigo me convencer de que não estou enlouquecendo.

Isso pareceu tirar um bufo divertido dos lábios dele. O estranho era alto, tinha uma voz de barítono que causou um arrepio em toda sua pele. Ele era forte, não apenas figurativamente, não, o homem parecia ter sido esculpido em mármore, músculos tão intrinsecamente delineados que um único braço seu poderia destruir um corpo humano ao meio. Seu corpo tinha um tom de oliva delicioso, um bronzeado natural que falava de dias e noites dedicados e passados sob um céu aberto, com um sol brilhante acariciando seus cabelos longos e escuros. Estava claro que este estranho era asiático, mas, mais óbvio que isso, era o fato de que ele não era, não podia ser, humano.

Noam já era uma aberração única, com cabelos azuis marinhos que não possuíam lógica ou justificava, mas que eram naturais. Agora, nem mesmo para ele, um esquisito, era normal que homens humanos tivessem tatuagens brilhantes, pulsantes, correndo pelos braços e corpo. Também não lhe parecia nada comum ter pupilas brancas, totalmente brancas e que cintilavam com uma luz própria que só poderia ser descrita como divina.

Se este era mesmo um templo, Noam tinha acabado de encontrar um Deus.

─── O mundo inteiro está louco há muitas eras, você não é o primeiro ─── ao dizer isso, o estranho finalmente entrou no quarto, dando um aceno ao monge caído que saiu correndo sem olhar para trás. Ele andou até parar na frente de Noam, olhos azuis encontrando olhos brancos. O Diabo encarando Deus, uma aberração sendo observada de perto pela própria perfeição. Deveria haver alguma poesia, em algum lugar, que pudesse dizer, com palavras humanas, como a próxima frase a sair pelos lábios do homem fizeram toda a máscara e a mentira escorrerem de Noam até seus pés. Virando uma poça inútil que aquele ser divino, com toda a elegância e fidelidade do mundo, ignorou prontamente. ─── Também não será o último. Num mundo louco como este, não precisamos encontrar lógica ou razão, tudo de que precisamos é algo pelo quê viver. E é isso que estou disposto a oferecer a você, Noam Perenne. Uma vida.

Oh, ele é doce, pensou o azulado, um sorriso quebradiço repartindo seu rosto, mas sem alcançar seus olhos. Ele pensa que pode me oferecer salvação.

Liu Kang era realmente estúpido.

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