⠀ ⠀ ⠀ ⠀ ⠀ ⠀⩩⦙ 𝖎𝖎𝖎. 𝕻𝖗𝖎𝖒𝖊𝖎𝖗𝖆𝖘 𝖎𝖒𝖕𝖗𝖊𝖘𝖘𝖔̃𝖊𝖘
"Fili e Kili aos seus serviços"
AS IRMÃS SENTIAM-SE levemente assustadas, mas, ao mesmo tempo, estavam excitadas e completamente curiosas para explorarem o mundo existente além dos muros da fortaleza que durante séculos habitaram. O encanto presente nas expressões das feiticeiras aumentava a cada mudança de paisagem, principalmente aos olhos da jovem Isleen, a qual não possuía memória sobre a Terra-Média por ter crescido presa no conforto do lar.
Os campos ficavam mais esverdeados com o decorrer da cavalgada, estando repletos das mais belas árvores, flores e criaturas que Isleen só havia visto nos livros e anotações presentes na extensa coleção da biblioteca. Apesar de muita coisa florescer nos jardins do lar com o uso de magia, não existiam espaços suficientes para desenvolver cada espécie botânica da Terra-Média, e vê-las presentes em seus lugares endêmicos tornavam as coisas ainda mais mágicas e fascinantes para a feiticeira mais nova.
Quando as primeiras vilas foram surgindo pelo caminho Mairween precisou repreender Isleen por seu excesso de carisma. Por mais que vários dos cidadãos não aparentassem ser uma ameaça em potencial, como exemplo o grupo de crianças com quem Isleen puxou assunto quando a irmã do meio não resistiu ao cheiro delicioso de pães frescos e parou para comprar alguns, ainda eram mulheres solitárias na estrada e deveriam manter-se alerta. Ambas deixavam claro que não pertenciam aos locais por onde passavam, sendo essa a razão pela qual Mairween ignorava o conforto das estalagens e seguiam caminho até encontrarem um lugar seguro para acamparem fora da estrada. Em meio a natureza ela saberia se virar caso o mal as encontrasse, utilizando dos poderes elementais e estratégias aprendida com os elfos no passado para estraçalhar qualquer criatura que os atacasse.
Estavam a quase dois meses viajando em direção ao Condado e durante esse tempo não tiveram nenhuma informações sobre Branween, fazendo com que cogitassem que a mais velha não havia seguido o lema da família e as abandonara para a própria sorte. Sabiam que ela não desejava interferir nas profecias e temia pelo futuro, principalmente com o da sua família. Porém não aceitavam as desculpas da mais velha para permanecer em casa caso essa tivesse sido sua escolha, afinal mesmo com todas as previsões o futuro é algo mutável e incerto, se arriscar faz parte do processo chamado vida.
— Acho melhor procurarmos um local para acampar — Falou Mairween observando o sol lentamente esconder-se por trás da colina, fazendo o céu tornar-se um degrade nas cores laranja, rosa, roxo e azul escuro. — Quanto mais cedo descansarmos, mais cedo voltaremos a viajar. Quem sabe seremos as primeiras a alcançar o Condado.
— Não conseguiremos chegar essa noite? Parece que falta tão pouco pelo mapa — O tom de voz da mais nova soava como se estivesse implorando, não demonstrava sinais de cansaço ou saudades do conforto do lar, estando movida pela adrenalina e ansiedade relacionada a aventura.
— Preciso descansar Isleen! Diferente de você, eu não dormi na noite passada. — Reclamou Mairween suspirando profundamente. Ela havia duplicado sua ronda na noite anterior após vislumbrar o que julgava ser pegadas de Orcs, ficando cem por cento alerta já que Isleen acabava cochilando na maioria de suas rondas. — E pense na nossa montaria, Morpheus e Amendoim estão cansados. Você não os escuta, mas eles já reclamaram várias vezes. — Os cavalos relincharam ao escutarem o que a do meio havia dito, o que significava que concordavam com o pausa do descanso — Viu? Estão cansados.
Saltando de cima do animal com maestria, Mairween foi a primeira a descer da montaria para buscar a pé por algum abrigo seguro no meio da floresta. Mesmo estando a dias na estrada, Isleen não tinha a mesma habilidade que a irmã do meio, ficando alguns passos para trás e correndo para alcançar a outra na trilha. A mais nova não ousava dizer uma única palavra, deixando a irmã trabalhar com as informações cedidas pela floresta. Não demorou muito para que alcançassem o rio, possuindo água a esquerda e floresta gramada a direita. Infelizmente o terreno era muito irregular para montarem acampamento e com vários pontos abertos, dificultando uma corrida sobre as árvores em caso de perigo.
— Não estamos sozinhas — Avisou Mairween esticando o braço para que Isleen interrompesse a caminhada.
— Orcs? — Perguntou Isleen arregalando os olhos.
— Não sei, mas ouço os peixes gritarem e não estão muito longe. — Mairween retirou as lâminas escondidas na manga da vestimenta, ficando pronta para batalha caso fosse necessário — Fique aqui e se esconda, não saia até que eu dê o sinal.
Utilizando umas das inúmeras técnicas aprendidas com os elfos da floresta, Mairween cobriu a cabeça com o capuz e escalou a árvore próxima, se camuflando entre suas folhagens enquanto saltava pelos galhos com destreza, aproximando do acampamento "inimigo" com discrição. Pescando na borda do riacho, dois anões haviam montado acampamento em local invejável pela feiticeira, naquela parte da floresta haviam gramíneas suficiente para os cavalos, água potável e abrigo seguro.
— Ouviu isso? — Perguntou um dos anões quando o som de galho sendo quebrado foi ouvido não muito longe, irritando Mairween por saber que tratava da Isleen tentando ser furtiva.
— Será coelhos? — Perguntou o outro anão empunhando o arco em uma das mãos e a flecha em outra. — Teremos uma refeição completa essa noite.
— Consegue vê-lo?
— Não, mas está atrás daquele arbusto.
"Merda!" Pensou Mairween vendo-se obrigada a impedir que os anões atacassem a esmo o esconderijo falho da irmã mais nova. Antes que o moreno tivesse a chance de lançar a flecha, a feiticeira saltou sobre o anão e o derrubou de costas no chão, o prensando com o joelho enquanto apontava a lâmina para a artéria principal do pescoço. Para que não corresse o risco de ser atingida por trás pelo outro anão presente, ela desembainhou a espada escondida nas costas e apontou na direção do loiro, obrigando-o a parar no momento que a ponta quase atingiu seu pomo de adão.
— Qualquer gracinha e eu destroço vocês dois — Crispou a feiticeira em Khuzdul e fazendo seu olho direito cintilar na cor laranja, sendo essa uma forma de demonstrar poder e conhecimento sobre suas "vítimas".
— Não pode ser, as histórias são reais — Falou Fili também na língua dos anões. Suas expressões eram um misto de terror e admiração por estar na presença de uma das figuras lendárias que pertenciam somente ao imaginário folclórico dos moradores da Terra-Média. — Você é a língua encantada. Aquela capaz de controlar qualquer criatura viva existente. Escutamos muitas coisas ao seu respeito.
— Como aquela que matei dois anões em um piscar de olhos? — Perguntou Mairween permanecendo com a postura ameaçadora. Mesmo com o ego levemente inflado pelo reconhecimento, não abaixaria a guarda até ter certeza absoluta que era seguro.
— Anões, Mairween! Eles são anões! — Mesmo sabendo que não era o correto a ser feito, Isleen deixou o seu esconderijo nos arbustos e caminhou na direção da irmã do meio com as mãos em riste — Anões!
— É meio óbvio, Isleen. Acha que não sei reconhecer anões? Logo eu? — Mairween arqueou a sobrancelha esquerda.
— Anões que estão indo para o Condado — Prosseguiu Isleen notando que a irmã não havia sacado o que queria dizer.
— Não me interessa onde eles estão indo...
— Anões da companhia do Thorin — Isleen suspirou profundamente — Serão nossos companheiros de jornada.
— Prove — Urrou Mairween entre os dentes para o anão moreno, mantendo a guarda alta tanto para ele quanto para seu irmão.
— Thorin é o nosso tio — Falou o anão loiro com calma — Eu sou Fili e esse é Kili! Estamos indo encontrar o nosso ladrão, vamos recuperar o que é nosso por direito, nosso lar das garras de Smaug.
— E o que é Smaug? — Perguntou Mairween.
— Você não sabe? — Kili esbanjou um sorriso debochado na face, achando que a feiticeira não possuía conhecimento sobre a enorme criatura que havia surrupiado o trono de seus antepassados e exilado todos os anões.
— É óbvio que eu sei. — Respondeu Mairween friccionando a lâmina contra o pescoço do rapaz, fazendo um fino filete de sangue escorrer do corte minúsculo criado. Por breves segundos olhou para Isleen, revelando a mudança de cor em uma de suas íris. — Vou matar ele.
— Não vai matar ninguém! — Exclamou Isleen gesticulando com os braços, naquele instante desejou a presença da irmã mais velha para controlar o temperamento da do meio — Respondam para ela.
— Smaug é o terrível dragão que habita as montanhas solitárias — Kili respondeu mantendo o bom humor em suas frases, o que enfurecia Mairween por ele não vê-la mais como uma ameaça e estar apreciando a situação.
— Merda! — Por ter recebido a resposta correta do anão, a feiticeira guardou novamente as armas no lugar que haviam sido retiradas das vestes e assobiou, chamando ambos os cavalos que aguardavam suas ordens para agir violentamente se necessário – Salvos por galopes. Mas não acho que terão tanta sorte da próxima vez.
— Não terá próxima vez, eles não são uma ameaça — Isleen estendeu a mão, ajudando Kili a levantar da grama.
— Mas eu sou. — Mairween desdenhou com os ombros e caminhou até sua montaria, acariciando a cabeça do animal enquanto conversa com o mesmo em uma língua que apenas ela e a natureza eram capaz de compreender.
— Ela só está querendo os assustar — Explicou Isleen revirando os olhos enquanto meneava negativamente com a cabeça. — Aliás ela se chama Mairween, mas vocês já sabem disso e eu sou Isleen.
— Desculpe a pergunta, mas vocês não são uma tríade? As três filhas de Yavanna. — Perguntou Fili olhando desconfiado para as meninas. Devido o ataque surpresa da irmã do meio, ele não conseguia acreditar de que elas não eram mais uma ameaça, suspeitando que a irmã mais velha estivesse escondida para destroça-los.
— Branween mudou sua rota, ela queria se encontrar pessoalmente com Thorin — Mentiu Mairween antes que a mais nova pudesse revelar que não sabiam do paradeiro da outra. — Disse para seguirmos caminho sem ela, coincidentemente encontramos vocês, os sobrinhos do rei exilado. — Ela sentou à beira da fogueira feita pelos anões e retirou novamente a espada, polindo o objeto enquanto sorria sem mostrar os dentes — Onde estão os outros membros da comitiva?
— Pela estrada, alguns estão vindo de lugares distantes, outros saíram com horas ou dias de diferença. — Ignorando o puxão recebido por Fili nas mangas das vestes, Kili se acomodou ao lado de Mairween carregando um sorriso empolgado na face, estava tão feliz quanto uma criança ganhando seu presente favorito no aniversário. — Você é exatamente como eu imaginei, Língua Encantada.
— Estou feliz que as histórias fazem jus a minha imagem — Disse Mairween sorrindo breve ao anão.
— E a sua personalidade — Complementou Fili cruzando os braços.
— Ótimo. Essa é a prova que anões sempre cumprem suas promessas. — Mairween apontou a lâmina na direção do anão loiro, fazendo-o dar um passo para trás. — Se sabe quem eu sou, porque está assustado?
— Você tentou mata-los — Respondeu Isleen coçando a nuca antes dos rapazes. — E está sendo assustadora.
— Não conheço nenhum deles, mas eles me conhecem. Estão em vantagem aqui — Mairween deu de ombros e levantou com a espada em riste, mantendo o objeto apontado na direção do Fili — Eles podem ser espiões.
— Mairween chega! — Ordenou Isleen entrando na frente da espada e forçando a irmã abaixar a lâmina na direção do chão — Temos que conviver todos em harmonia, faremos parte da mesma comitiva. Estamos juntos pela mesma missão.
— Isso aí! — Concordou Kili empolgado. — Agora que tal comermos? Teremos um longo dia pela frente amanhã. Gostam de peixe?
— Eu não como carne — Mairween fez caretas — E não como nada preparado por mãos estranhas, ainda não confio em vocês. Isleen também não irá comer. — Ela falou antes que a mais nova aceitasse um dos espetos de peixe estendidos por Kili — Comeremos de nossas provisões e montaremos acampamento. Isleen pode descansar, eu farei a ronda.
— Te acompanho na ronda — Disse Kili encantado com a ideia de passar a noite acordado com a filha de Yavanna descrita em muitas lendas anãs que envolviam o povo de Durin. — Vai ser uma noite divertida.
— Vai ser uma longa noite — Mairween revirou os olhos e balançou a cabeça negativamente.
Preferindo manter a postura neutra em relação a 'rixa' entre os anões e a irmã do meio, Isleen usufruiu do silêncio e da obediência, seguindo as ordens da irmã e a ajudando a montar um acampamento alguns metros distantes dos sobrinhos do Thorin. Caso fosse verdade o que os meninos disseram sobre sua descendência e a jornada que enfrentariam juntos em breve, eles teriam mais tempo para interagir e se conhecerem melhor. Por hora a coisa mais sensata a fazer era ficar ao lado da Mairween.
As irmãs se alimentaram com as frutas desidratas e sementes, as quais estavam diminuindo consideravelmente de acordo com o tempo de viagem. Após jantarem elas esticaram seus sacos de dormir a aproximadamente um metro e meio de distância do acampamento dos rapazes, local perfeito para que aproveitassem das chamas da fogueira sem se envolverem diretamente com os anões. Enquanto Isleen caiu no sono profundo em questões de segundos, Mairween permaneceu desperta como ambos os irmãos do outro lado do campo. Para ter o que fazer durante a noite ela foi retirando as armas escondidas das vestes, aproveitaria para lustrar e afiar os objetos enquanto seguia soando ameaçadora.
Enquanto isso, do outro lado da fogueira, os descendentes de Durin conversavam aos sussurros sobre a veracidade dos fatos. Fili prosseguia descrente de que as garotas eram as famosas filhas dos Valar, principalmente por ter apenas duas delas ao invés de três como as lendas narravam. O anão mais velho não estava seguro, temendo pelo futuro dele e do irmão mais novo nas mãos da feiticeira durante a madrugada. Elas poderiam não ser filhas verdadeiras de Yavanna, mas era óbvio que não eram humanas comuns e que Mairween conhecia muito sobre técnicas de luta e magia.
— Eu sei o que fazer — Disse Kili gesticulando para que Fili esquecesse suas desconfianças sobre as feiticeiras.
Tanto Fili quanto Mairween ficaram curiosos sobre os próximos passos do anão mais novo quando o mesmo levantou do chão, sorrindo para a mulher ele caminhou até seus próprios pertences e retirou da mochila pesada que carregava uma pequena rabeca. Não esperou estar novamente ao lado do irmão no fogo para começar a tocar uma antiga canção.
Um sorriso divertido surgiu sobre os lábios de Mairween no momento que reconheceu os acordes tocados por Kili. Não se tratava de uma música qualquer, mas uma criação milenar feita exclusivamente para ela e passada para as próximas gerações. No momento certo ela entrou na melodia, cantando as letras enquanto sua mente entupia-se de memórias do passado distante de quando era apenas uma criança.
"Beleza e perigo
Olhos amarelos sombrios
Os lobos podem ser gentis
Sob seus céus violetas
Presos por um desejo
Ou alguma feitiçaria
Sonhando com lilases
E groselhas
Tranças escuras e negras
Enroladas em torno de sua alma
Os lobos podem ficar inquietos
Lá fora, sozinhos
O amor é um desejo
Ou alguma feitiçaria?
Sonhando com lilases
e groselhas
Quando os céus estão tempestuosos
Quando as noites são longas
Os lobos podem ficar sozinhos
Agora que seu perfume se foi
O amor é um desejo
Ou está destinado a ser?
Sonhar com lilás
e groselha
Beleza e perigo
Sombra de olhos amarelos
Lobos podem ser gentis
Sob seus céus violetas
Presos por um desejo
Ou alguma feitiçaria
Sonhando com lilases
E groselhas"
A feiticeira sentia seu interior aquecer enquanto cantarolava, passando a sensação adorável que sentia para todos ao seu redor. O loiro abriu a boca estupefato com a comprovação de que aquela era mesmo a língua-encantada, pois não somente ele o irmão estavam apreciando a música, como toda a natureza ao redor pareceu fazer silêncio para apreciar a voz harmoniosa de Mairween.
— E através dessa canção finalizamos todas as desconfianças que temos uns com os outros — Sorrindo com o canto dos lábios, Mairween piscou para os anões e guardou adaga de volta no esconderijo debaixo do cano da bota de couro. — Fiquem com a primeira ronda, preciso descansar. Mas qualquer gracinha o Morpheus vai estraçalhar vocês embaixo dos cascos que não terão tempo de dizer "Mithril".
Para demonstrar estar consciente das ordens dadas pela "dona", o cavalo relinchou se apoiando sobre as patas traseiras por alguns segundos e arrastando uma pata frontal após voltar a posição costumeira. Aquilo surpreendeu ainda mais os anões, os quais assentiram rapidamente e ficaram em alerta. Virando de costas para os rapazes, Mairween sorriu com sinceridade, se os outros anões também tivessem conhecimento sobre quem ela era, aquela viagem seria ainda mais divertida, pois, diferente da irmã mais velha, ela sempre feriu os anões aos elfos.
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