⠀ ⠀ ⠀ ⠀ ⠀ ⠀⩩⦙ 𝒊. 𝖀𝖒𝖆 𝖛𝖎𝖘𝖎𝖙𝖆 𝖎𝖓𝖊𝖘𝖕𝖊𝖗𝖆𝖉𝖆
Chame-me, chame-me terras distantes
Pois agora devo vagar neste dia errante
Longe devo vagar neste dia errante
A MUITO TEMPO ATRÁS, antes do nascimento do sol em uma época que a Terra ainda era jovem e o único sentimento conhecido pelas criaturas vivas era a felicidade, três belas feiticeiras foram criadas com o propósito de manterem a harmonia dentro das terras de Valinor e protegerem todas as criações dos Valar.
Essas feiticeiras eram popularmente conhecidas como tríade de Yavanna, pois apesar de terem sido criadas para manterem o equilíbrio entre todas as coisas existentes, grande parte dos seus poderes estavam conectados com as forças da natureza. Sempre juntas, nunca separadas. Elas eram as responsáveis por manterem a ordem, distribuir alegria em sua mais pura forma e acalentar os corações dos elfos.
A primeira a ter sido criada foi Tiqvah, moldada como uma bela senhora de idade avançada, seu propósito em Valinor era orientar a todos aqueles que buscavam por seus conselhos. Era conhecida por sua sabedoria, por seu senso de justiça e por seu punho de ferro. Também tinha como responsabilidade instruir as duas feiticeiras subsequentes em suas missões e ensiná-las a dominar os poderes que possuíam.
A segunda feiticeira era Khalilah, sendo ela a representação da mãe. Era uma mulher madura e graciosa com o coração gigantesco, não hesitava em acolher aqueles que necessitavam de um abraço ou palavra amiga, sempre que estava presente a sua companhia aquecia o coração das pessoas ao redor e dominava a arte da cura, podendo ser considerada como a primeira "médica" do mundo.
Já a última, mas não menos importante, se chamava Branween. Diferente das suas irmãs mais velhas, ela fora gerada na forma de uma criança, tendo muito mais dificuldade para controlar os poderes devido a limitação da idade. Por conta de sua aparência infantil ela não recebia o mesmo tratamento respeitoso do que as outras feiticeiras e era constantemente deixada de lado nos assuntos considerados sérios, fosse pelos filhos de Ilúvitar quanto das próprias irmãs. Mesmo assim ela ainda fazia parte da tríade e como tal possuía funções específicas, sendo o seu principal dom o da visão do futuro. Apesar de não compreender muito bem e ter dificuldade para separar os sonhos e pesadelos das visões, ela foi responsável pela criação de inúmeras profecias que existem até hoje na Terra-Média. Infelizmente, nenhuma delas costuma ser um bom presságio.
O primeiro péssimo presságio visto através dos sonhos por Branween foi a destruição das duas árvores de Valinor, a qual lamentavelmente não foi narrado a tempo para suas irmãs mais velhas por acreditar ser outro dos seus vários pesadelos.
Aquelas duas árvores brilhantes representavam todo o poder dos deuses e a graça na qual os elfos viviam, tornando-se rapidamente o principal alvo de Melkor. Contando com o auxílio de agentes infiltrados, o Anduir elaborou um plano para destruir a luz. Quando Branween alertou as irmãs sobre o mal já era tarde demais. Mesmo com os esforços das feiticeiras mais velhas e de outros elfos para protegerem as árvores, Valinor foi engolida para escuridão.
O evento fora tão traumático para as criaturas que habitavam aquelas terras que eles passaram a rejeitar o nome de Melkor o tratando apenas por Morgoth que significa "Sinistro inimigo do mundo", e uma ameaça a ser combatida. Tanto os elfos quanto as feiticeiras fizeram um juramento, eles e sua descendência jamais descansariam até que todo o mal fosse derrotado de uma vez. Com a promessa de vingança consumindo seus corações, eles deixaram Valinor rumo a Terra-Média, um lugar cheio de perigos e criaturas estranhas por todos os lados.
Assim como ocorre em todas as guerras, houve consequências terríveis que perpetuam como cicatrizes horríveis deixando a Terra-Média em ruínas. Milhões de vidas foram ceifadas, incluindo as duas filhas mais velhas de Yavanna que foram mortas pelo próprio Morgoth devido os seus poderes e disposição para lutarem até o último segundo.
A guerra perpetuou por séculos e quando Morgoth foi derrotado a dor do luto se sobrepunha a qualquer felicidade. Entretanto aquele ainda não era o verdadeiro fim, seus Orcs haviam se espalhado por toda Terra-Média, multiplicando-se aos milhares sobre o comando do servo mais dedicado, um feiticeiro cruel e astuto chamado Sauron.
Com idade apropriada para tomar suas próprias decisões e memórias trágicas vívidas daquela terrível época, Branween se juntou ao grupo de soldados da comandante elfa Galadriel em busca do Sauron. Estando sedenta para vingar a morte de suas irmãs e amigos que perderam a vida no campo de batalha. Assim ela participou avidamente dos eventos da Segunda era, lutando com bravura ao lado de elfos, anões, homens e magos.
No final, quando todos acreditavam que o mal havia sido derrotado e a falsa sensação de calmaria se instaurou na Terra-Média, a última feiticeira restante da tríade original reuniu suas irmãs mais novas em uma fortaleza nos confins do mundo para treiná-las até que estivessem prontas para finalmente derrotarem Sauron.
Os dias se tornaram meses, os meses se tornaram anos e os anos se tornaram séculos. Com o passar do tempo a dor daquela época foi desaparecendo da memória das criaturas vivas e o nome de Sauron tornou-se lenda, assim como todas as histórias relacionadas as filhas de Yavanna.
Apesar de jamais esquecerem sobre o passado, as próprias feiticeiras tratavam os eventos traumáticos como pesadelos que deveriam ser mantidos somente nos livros de história. Mantendo contato quase nulo com o mundo além das fortalezas do lar, elas seguiam a vida em calmaria.
Uma calmaria que fora interrompida com uma visita inesperada.
Acomodadas na ponta de uma gigantesca e ornamentada mesa de madeira, três belas mulheres conversavam frivolidades cotidianas quando a pesada porta de carvalho foi escancarada, fazendo com que as chamas crepitassem dentro da lareira de pedra e atraísse a atenção da tríade para o viajante.
A princípio Mairween, a irmã do meio, se colocou em posição de ataque empunhando a espada em uma mão e virando a outra na direção do fogo. Seus olhos outrora castanhos brilhavam em coloração alaranjada, lembrando perfeitamente os olhos de uma coruja, o que significava perigo para quem quer que estivesse atrapalhando o jantar da família. Não era comum que pessoas ou criaturas da Terra-Média ingressassem tão afundo na fortaleza sem aviso prévio, principalmente com todos os feitiços de proteção lançados por Branween no decorrer dos séculos.
— Gandalf! — Anunciou a irmã mais velha enquanto levantava da cadeira, com cuidado ela apoiou a mão sobre a ponta da espada da Mairween, indicando que a mesma poderia relaxar e não seria necessário qualquer atitude violenta. — Meu velho amigo, como é bom revê-lo.
Quando o famoso mago cinzento ouviu as boas-vindas, ele alargou o sorriso por baixo da espessa barba branca e aproximou ainda mais das anfitriãs para que pudesse cumprimenta-las de maneira apropriada.
— Também me alegro em reencontrá-las — Ele retribuiu o abraço caloroso oferecido por Branween e segurou seus ombros, observando com admiração cada traço de suas feições. — O tempo tem a valorizado, minha doce feiticeira. — Ternamente ele retirou os fios de cabelos negros que caiam em sua face, para que assim pudesse vislumbrar o intenso azul acinzentado dos olhos. — Está diferente da última vez que a vi, mas possui o mesmo brilho encantador no olhar.
— Sabe que fico constrangida com elogios — Ruborizou Branween apontando para o lugar vazio a mesa ao se afastarem — Por favor, sente-se conosco! Chegou em boa hora, a ceia acabou de ser servida.
— Pegarei mais um prato e talheres, com licença. Por favor, não conte histórias sobre suas aventuras sem mim — Falou Isleen pondo-se em pé e deixando o ambiente. Era a mais nova das irmãs, por ter crescido dentro dos muros da fortaleza com a proteção das mais velhas, ela mantinha a inocência no olhar e a curiosidade imensurável relacionada as coisas que ocorriam longe da segurança do lar.
— Eu poderia ter te matado — Disse Mairween regressando para seu lugar a mesa. Ela mantinha o olhar sobre o mago, o qual aparentava estar bem mais velho do que a última vez que haviam se encontrado.
— Fico feliz por não ter feito isso — Gandalf sorriu com o canto dos lábios e piscou, fazendo com que Mairween alargasse o sorriso refreado.
— Trouxe fogos de artifício? Por favor, diga que sim — Isleen regressou para o salão de jantar com o prato, talheres e taças douradas extras, tudo de melhor qualidade para o convidado especial. Apesar de não ter memórias aventureiras com o mago cinzento como as irmãs, já que ela o via esporadicamente, recordava com carinho dos fogos de artifício que ele trazia em sua carroça.
— Isleen, por favor, deixe-o descansar primeiro e apreciar o jantar feito pela sua irmã — Branween apontou para o lugar vago da mais nova, ordenando de forma singela que regressasse para o mesmo — Depois falaremos sobre fogos de artifício e qualquer outro assunto que tivermos que tratar.
— Uma ideia excelente — Elogiou Gandalf compreendendo nas entrelinhas o desejo da governanta da família. — Faz muito tempo desde a última vez que comi algo feito por Mairween.
— Eu melhorei desde a última vez, tive séculos de prática — Mairween retribuiu o sorriso debochado do mago. No último jantar que estiveram reunidos ela acidentalmente trocou os potes de tempero e arruinou o que deveria ser um ensopado de batatas.
— Que o jantar seja apreciado. — Gesticulou Branween e se acomodou novamente em seu lugar na ponta da mesa.
Durante longos minutos os únicos ruídos que podiam ser ouvidos eram o crepitar das chamas da lareira e os talheres sobre os pratos. Deliciaram com o jantar maravilhoso composto por uma variedade gigante de legumes e verduras criados pelas feiticeiras no interior da fortaleza. Assim como os elfos elas não comiam alimentos de origem animal que não fosse ovos, mel ou leite, principalmente Mairween que era capaz de se comunicar com toda e qualquer criatura viva que cruzasse seu caminho devido parte dos seus poderes. Para ela até o ato de matar um mísero inseto era considerado pecaminoso, mesmo sendo muitas vezes necessário.
No instante que todos os pratos foram esvaziados e o quarteto sentia-se satisfeito, Isleen limpou a mesa o mais rápido que conseguia, fazendo suas obrigações em tempo recorde para que pudesse ouvir tudo o que Gandalf teria a dizer. Quando ela regressou para o salão eles poderiam, finalmente, tratar de negócios.
— Agora que todos estamos alimentados, devemos tratar de assuntos mais urgentes. Pois sabemos que a visita de nosso velho amigo significa algo importante — Branween sorriu sem mostrar os dentes, dessa vez nervoso e levemente aflito.
— E eu achando que era para trazer fogos de artifício — Debochou Mairween com o intuito de provocar Isleen, a qual lançou olhar desaprovador para a irmã do meio.
— Não se preocupe, pequena. Também trouxe alguns como presente. — Gandalf se pôs em pé e aumentou o tom de voz — Venho reivindicar uma velha dívida dos seus antepassados, relembrar as razões para as quais foram geradas.
— Eu estou dentro — Mairween retirou os pés da mesa e levantou a mão, apesar de não fazer ideia do quão perigoso poderia ser a proposta do mago, aquilo cheirava como aventura e aventura era tudo o que ela estava esperando.
— Deixe-o falar — Ordenou Branween mudando suas expressões abruptamente, tornando-se mais fria e preocupada.
— Bem distante no leste, além de montanhas e rios... — Gandalf retirou um pedaço de pergaminho dobrado do bolso e o estendeu em cima da mesa, revelando um pequeno mapa — Depois de florestas e desertos existe um único e solitário pico.
— A montanha solitária — Leu Isleen segurando um candelabro para iluminar com mais precisão o pedaço de papel.
— Então é real? A profecia está se cumprindo? — Perguntou Mairween segurando com a ponta dos dedos a presilha de prata que prendia uma das tranças de seu cabelo. — A profecia do povo de Durin.
— Infelizmente, meu amigo, não podemos ajudar. — Interrompendo qualquer outra palavra que Gandalf ou as irmãs pudessem proferir, Branween retirou o mapa de cima da mesa o dobrando novamente e o devolveu para o mago cinzento — Essa é uma batalha para o povo de Durin e somente para eles. Não interferimos em seu destino. Eles foram responsáveis para atrair a fera e serão responsáveis por derrota-la.
— Compreendo, Branween. Mas a senhorita, melhor do que ninguém, sabe o que isso implica. Eles precisam de toda a ajuda possível para recuperarem o que é deles por direito — Gandalf guardou o mapa no bolso, seu olhar dizia mais do que as palavras e, infelizmente, eram captados pela mais velha com preocupações — Tríade dos Valar, filhas de Yavanna, vocês foram criadas para manterem o equilíbrio na Terra-Média...
— E é o que estamos fazendo — Rebateu Branween cruzando os braços na frente do corpo — Como disse, essa não é a nossa briga.
— Essa é a minha briga — Mairween apontou com o dedo polegar para o próprio peito.
— Não, não é! — Urrou Branween aumentando o tom de voz. — Sempre juntas, nunca separadas. Esse é o lema de nossa família. Estou dizendo que ninguém sairá da fortaleza, até onde sei ainda sou a autoridade.
— Há um mundo fora dessas fortalezas que deve ser explorado, Lady Branween. Onde está o espírito daquela jovem aventureira que conheci a séculos atrás? — Questionou Gandalf insistindo no assunto. — Quando a filha mais nova de Yavanna deixou escapar a chance de uma verdadeira aventura?
— Quando ela se tornou a mais velha — Disse Branween determinada a recusar o convite.
— Onde vai ser o encontro? Só por curiosidade — Perguntou Isleen timidamente, aquela era a primeira vez que viam as irmãs com os nervos à flor da pele. Elas descordavam com frequência, mas com aquela intensidade era a primeira vez.
— A reunião ocorrerá daqui dois meses no Condado, caso mudem de ideia. A runa marcará o local — Respondeu Gandalf olhando diretamente para Mairween, a qual estava determinada a seguir adiante com a ideia mesmo que contrariando as ordens da mais velha.
Ao dizer as coordenadas, Gandalf deixou o recinto descontente com o resultado negativo do convite. Durante alguns segundos os únicos sons ouvidos foram o da lareira, nenhuma das feiticeiras ousava dizer a primeira palavra, pois era visível que desencadearia uma discussão acalorada vinda pelas duas mais velhas.
Por isso a primeira que deixou o salão de jantar foi Isleen, conhecia as mulheres o suficiente para saber que aquilo duraria horas e seria mais intensa do que qualquer discussão trivial que já tiveram. Temendo que sobrasse para seu lado, ela rumou para seus aposentos.
Cerrando os punhos e com os olhos alaranjados, Mairween encarava a irmã mais velha com crueldade. Não compreendia os motivos que levaram Branween agir com tamanha estupidez sobre o pedido de auxílio de um velho amigo. Ela esperou Isleen estar a uma boa distância do para iniciar a briga eminente.
— Mas que caralho, Branween — Resmungou revoltada.
— O que disse? — A outra se pôs em pé, mantendo o olhar severo sobre a do meio. Havia escutado perfeitamente o que a outra dissera, mas queria oferecer uma segunda chance para reformular a frase.
— Eu disse: Mas que caralho, Branween — Repetiu Mairween pausando as palavras. — Essa é a primeira vez que temos uma oportunidade real de sair da fortaleza, fazer o que fomos criadas para fazer. Desde quando as filhas de Yavanna fogem do perigo? Você não era assim. Eu não te conheci assim. Você vivia, não sobrevivia.
— O mundo é um lugar perigoso e cheio de horrores, sabe disso — Falou Branween ríspida — Essa aventura é suicídio. Nada de bom vem para aqueles que enfrentam dragões. Você com sua língua-encantada não ajudará em nada.
— Não custa tentar — Mairween desdenhou com os ombros — Essa é uma causa que vale a pena lutar. São anões, filhos de Aulë, quase nossos irmãos. Somos mais próximos deles do que dos elfos, sabe disso.
— Ainda assim, não é a nossa luta e está decidido. Sou a anciã agora.
— É a anciã, mas não é a minha mãe — Mairween balançou a cabeça negativamente — Não pode me impedir de sair.
— Não me obrigue a te trancar nos seus aposentos — Ameaçou Branween acendendo os olhos com um tom roxo cintilante. — Sabe que Isleen jamais sobreviveria lá fora, longe da vida confortável que leva. Ela é delicada, inocente e ingênua. Imagine as coisas ruins que podem acontecer com ela nessa aventura.
— Não use Isleen como desculpas — Ordenou Mairween apontando o dedo para a mais velha — Você não sabe...
— Eu sei, Mairween. Ela morrera na primeira batalha, isso caso não morra de frio ou fome — Argumentou a outra aproximando da irmã do meio — Temos uma longa vida pela frente, não devemos deixa-la escapar por entre nossos dedos no primeiro sinal de aventura. Existe algo maior lá fora, algo mais perigo para o qual estou treinando vocês.
— Não me venha com Sauron novamente, ele se foi a muito tempo. Saruman...
— Saruman não sabe o que diz.
— Ele é o líder do conselho branco e um Istari. É, realmente ele não sabe o que diz. — Mairween revirou os olhos.
— Você não sabe o que está dizendo.
— Talvez porque você não queira nos dizer nada — Reclamou Mairween gesticulando com ambas as mãos.
— Estou poupando vocês de uma morte lenta e dolorosa — Rebateu Branween irritada. — E agora suma da minha frente ou eu matarei você.
— Isso não vai ficar assim, não vai — Mairween deu as costas para a irmã e deixou o recinto com passos pesados.
Segurando o pingente do colar em seu pescoço, Branween suspirou virando na direção da lareira. Apesar dos seus olhos estarem sobre as chamas dançantes, os pensamentos viajavam para além da muralha. O receio da mais velha em relação a aventura sugerida por Gandalf estava além da compreensão de qualquer uma das feiticeiras mais novas, principalmente quando nenhuma delas havia encarado verdadeiramente o campo de batalha.
Com grande revolta em seu coração, Mairween praguejava em uma linguagem própria o comportamento esquivo da irmã mais velha enquanto cruzava os extensos corredores de pedra da moradia. Tentava entender quando Brainween havia deixado de ser a majestosa guerreira do passado e se tornando uma tediosa dona de casa. Era óbvio que a líder das feiticeiras estava escondendo alguma coisa, talvez alguma profecia maléfica que não chegou a colocar em pergaminhos. Fosse qual fosse o segredo, Mairween não ficaria no castelo para descobrir e, assim que a oportunidade surgisse, escaparia de madrugada para viver uma aventura.
— O que está aprontando, Isleen? — A estranha movimentação no quarto da mais nova atraiu a atenção da feiticeira do meio enquanto passava na frente. Mesmo suspeitando da resposta que poderia vir a seguir, ela precisava ouvir dos lábios da outra. Encarando a menor com um sorriso maroto estampado na face, ela encostou o ombro no batente da porta.
Quase todos os pertences da Isleen estavam esparramados em cima da cama, destoando da imagem de menina perfeccionista e organizada que a mesma possuía. Ela encarou assustada a irmã por breves segundos, mas relaxou as expressões ao perceber que se tratava de Mairween. Rapidamente empanturrou o necessário dentro da maior mochila de viagem que possuía, colocando não apenas roupas leves, mas também algumas ervas, um mapa, dois livros de feitiços de cura, um caldeirão pequeno de estanho, moedor e outros apetrechos necessário para realizar poções de modo prático e rápido.
— Vou partir para o Condado — Respondeu Isleen apontando com o queixo para o corredor. — Gandalf não perderia o tempo dele cruzando boa parte da Terra-Média se não fosse importante. Eu ajudarei os anões ou vou morrer tentando — Ela colocou o pé sobre a mochila, fazendo força para fechar as cordas que a prendiam — Estou cansada de ficar trancafiada aqui, quero conhecer o mundo como a Brainween e você conheceram. Quero viver uma aventura digna dos livros de história. Somos feiticeiras do Valar, as filhas de Yavanna. Posso não dominar completamente os meus poderes ainda, mas vou aprender na marra. Você e Branween possuem canções que perduram por séculos, eu também quero uma.
— E está pensando em ir sozinha? — Mairween sorriu animada com a ideia de fugir de casa, principalmente pela mesma não ter sido cogitada somente por ela. Queria ver as expressões da Branween quando descobrisse que a mais "responsável" havia realizado algo imprudente.
— Óbvio que não, não seja tola — Isleen revirou os olhos e colocou a mochila pesada com certa dificuldade nas costas — Sei que vem comigo, seu sorriso idiota não esconde o desejo e faria de um jeito ou de outro. Todo mundo sabe que tem uma mochila de viagem escondida em algum lugar do estábulo.
— E quanto a Branween? — Perguntou Mairween gesticulando para que a mais nova a seguisse, como iriam fugir elas precisavam de uma rota que não chamasse atenção da governanta da família. — Ela pode aparecer a qualquer momento...
— Sempre juntas, nunca separadas. É o lema da nossa família — Respondeu Isleen seguindo a outra por passagens do castelo que ela nunca cogitou a existência. — Ela se juntará conosco uma hora ou outra, principalmente quando notar que fugimos.
— Você arquitetou tudo sozinha? — Perguntou Mairween cruzando um corredor estreito dentro das paredes que mal cabia uma pessoa.
— Em partes. Conversei com Gandalf alguns meses atrás, por isso não fiquei surpresa com sua visita abrupta. Estava lendo os velhos pergaminhos quando notei os sinais das velhas profecias, sua marca de nascença está em evidência e seus poderes mais fortes. Branween começou a ficar inquieta e eu... — Ela fez uma pausa sutil, levando o dedo indicador para os lábios.
— Você... — Insistiu Mairween sentindo os pelos da nuca arrepiarem com a revelação.
— Comecei a ter um sentimento estranho crescendo dentro de mim, uma necessidade. Não sei explicar do que se trata. Mas meus poderes estão ficando mais fortes e algo me diz que aqui não é o meu lugar. — Respondeu Isleen sorrindo nervosa.
— Aqui não é o lugar de ninguém, fique tranquila quanto essa sensação — Disse Mairween na tentativa de acalmar a irmã.
— Enfim, Gandalf deixou os animais prontos para nossa partida. Pedi para que ele o fizesse, assim não perderíamos tempo — Prosseguiu Isleen aliviada com o desabafo.
— Nunca imaginei que um dia você faria algo tão rebelde quanto as minhas proezas — Zombou Mairween soltando uma gostosa gargalhada quando atravessavam os jardins escuros até o estábulo. — Estou orgulhosa, minha irmã.
— Dizem que represento o futuro. E se existe algo que descreva o futuro no momento é que ele é uma caixinha de surpresas — Isleen piscou para a irmã recordando o mesmo jeito divertido do mago cinzento.
— É o que dizem, você vive com a pessoa por séculos e ainda não a conhece direito — Mairween parou no meio do caminho, abrindo um alçapão de pedras no chão antes de entrar de vez no estábulo. Aquele lugar era o esconderijo dos seus suprimentos de viagem, os quais eram trocados e revistos semanalmente desde que decidiu partir um dia. — Pronto. Agora se prepare, precisaremos correr se não quisermos ser impedidas. Vai ser uma longa jornada.
Trocando sorrisos empolgantes com a irmã mais nova, Mairween montou facilmente em Morpheus, seu corcel tão negro quanto uma noite sem estrelas, e segurou suas rédeas esperando Isleen montar em Amendoim, seu alazão bege. Quando a garota estava pronta, a feiticeira do meio falou algumas palavras em uma linguagem que apenas ela e os animais conheciam, os quais saíram do estábulo em disparada.
Mesmo a estrada sendo longa e, possivelmente, cheia de dificuldades e inimigos, elas alcançariam o Condado em poucas semanas, chegando no tempo certo para encontrar a comitiva do rei exilado, Thorin Escudo-de-Carvalho, e unir-se a ela para a maior aventura de suas vidas. Uma aventura cheia de perigos, adversidades e histórias. Aquilo era o correto a ser feito, deixar de ser somente lendas e voltar a colocar o nome das feiticeiras nas próximas narrações que perpetuariam por séculos. Era o dever das filhas de Yavanna protegerem a Terra-Média e seria isso que iriam fazer.
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