✷ ﹐ ── 𝙥𝙧𝙤𝙡𝙤𝙜𝙤
── Alya, eu não quero ir! ── reclamo pelo que parece ser a milésima vez seguida, revirando os olhos ao escutar minha amiga bufando ao desistir de me puxar para fora da cama, não tendo sucesso nisso e soltando meus pés.
Tomara que ela desista, penso. É quase como se eu não conhecesse Alya, porque a última coisa que ela faria seria isso. Acho que tive esperanças demais, por um momento.Não dura muito, já que minha amiga decide apenas mudar de tática, ao invés de deixar aquilo de lado. Parando de me puxar pelos pés, ela decide tentar soltar meus dedos da cabeceira da cama, não tendo sucesso de primeira mas rapidamente tendo outra ideia e me fazendo cócegas. Um plano definitivamente melhor, considerando o quão facilmente me rendo a isto, desde que me conheço por gente.
É inútil lutar contra, e mesmo assim eu tento, apenas para acabar no chão, rindo ao ponto de lágrimas se formarem em meus olhos e minha bexiga começar a doer, enquanto Alya sorri triunfante quando finalmente se afasta, me estendendo a mão para me ajudar a levantar enquanto eu ainda me recupero do ataque.
── Você não tem mais escolhas. Você já disse que sim, lembra?
Bufo, cruzando os braços, não aceitando sua ajuda e me recusando a levantar do chão. Viro o rosto na direção oposta dela, olhando para um ponto aleatório no chão do meu quarto.
── Vamos! Você disse que ia, (nome). ── ela me cobra, como se eu não soubesse disso, me fazendo revirar os olhos.
Eu sei o que eu disse.
── Sim, mas isso foi antes, quando eu ainda não sabia que você ia tentar me arrastar pro cinema só pra assistir algum filme chamado Paixão-Não-Sei-De-Quem. E, pior, junto com o Nino!
Nino que me perdoe, mas nem fodendo.
── Ah, (nome). O quê que tem? Ele é seu amigo também né, devia imaginar que ele iria junto.
── É, meu amigo mas seu namorado, né, Alya? ── relembro a ela com um sorriso irônico, não verdadeiramente incomodada com a relação deles, mas com a situação em si, pra ser honesta. ── Eu aceitei porque você veio falar comigo, toda falsa, dizendo que ia ser um "passeio entre amigos" e que a gente ia se divertir um pouco no shopping antes das aula voltarem. Mentirosa. ── acuso ela sem hesitação.
── Ué, e onde eu menti nisso? ── diz de forma quase imediata, na defensiva ao cruzar os próprios braços, me encarando de cima daquela maneira intimidante, onde seus óculos pareciam grandes demais, como os das personagens rigorosas e medonhas de animações.
Me intimida um pouco, não vou negar. Mas mantenho a mesma postura ao retribuir o olhar, fechando minha expressão e arqueando uma das sobrancelhas ao zombar dela apenas com o olhar.
Ela sabia bem onde tinha mentido ali.
Por isso, não demora muito antes que se justifique.
── Nós vamos ao shopping, entre amigos, antes das aulas voltarem e você sumir dentro dos livros e dos corredores daquele lugar.
── Ah sim, entre amigos, aham. Eu e meu assento né, porque você e o Nino não podem chegar perto um do outro que não desgrudam mais as bocas! — reclamo com um revirar de olhos, zombando do casal, fazendo gestos e sons de beijos para a envergonhar um pouco mais, já que eu podia ver suas bochechas começando a ficar levemente mais avermelhadas do que o normal.
── E-eii! Também não é pra tanto assim, né...?
Rio genuinamente por isso, apenas uma risada leve, mas mesmo assim. Nego com a cabeça ao olhar para ela, um sorriso em meu rosto, suspirando ao me apoiar no chão, minhas mãos atrás do corpo e as pernas bem abertas, espalhadas pelo tapete rosa e macio em meu quarto.
Uma das minhas melhores escolhas de decoração, de fato.
── Alya. ── digo em um tom conhecedor, tendo visto como os dois eram babões e melosos durante as férias praticamente inteiras.
Algo muito normal para um casal recém formado, já que Nino esperou até os últimos segundos da última semana de aulas antes de pedir a garota em namoro. Seu medo de rejeição e insegurança realmente fizeram um trabalho e tanto nesse ponto, mas tudo deu certo no final e, felizmente, Alya aceitou o pedido com um sorriso no rosto.
Como já era de se esperar.
── Ninguém está julgando vocês dois por isso, muito pelo contrário. Fico muito feliz por vocês, de verdade mesmo. Vocês se merecem. ── comento, dando um sorriso um pouco mais gentil para minha amiga ao notar o nervosismo por trás de seus olhos, tentando suavizar um pouco isso.
Parece funcionar, já que a tensão em seus ombros diminui drasticamente depois disso, Alya dando até um sorrisinho mais relaxado, provavelmente pensando no namorado.
Reviro os olhos por isso, apesar de ainda sorrir, suspirando levemente.
── Eu só não quero estar presente pra ficar vendo vocês se pegando o tempo todo. ── continuo a dizer, me explicando.
── Mas nós não vamos-
── Amiga. ── interrompo ela bem a tempo, cruzando as pernas e colocando as mãos sobre meus joelhos, me mantendo sentada no chão.
── Não é por mal não, mas eu ouvi isso durante esses meses todos. E adivinha quantas vezes isso foi verdade?
É uma pergunta retórica, mas consigo ver ela se encolhendo levemente, trocando o peso do corpo de um pé para o outro ao chegar na mesma resposta que eu.
Nenhuma vez.
── Pois é. E agora, no nosso penúltimo final de semana em paz, onde eu posso aproveitar pra dormir o dia inteiro e maratonar de madrugada aquela série lá do golpista que te falei, você quer que eu saia da minha residência?
É um absurdo!
Ela ainda abre a boca para tentar se defender, mas não permito, continuando a falar antes que ela tivesse chances, não deixando abertura o suficiente para qualquer coisa que ela viesse a dizer.
── E, pior! Não só que eu saia, mas também que vá pro cinema, onde vou gastar meu dinheirinho, pra comprar ingressos pra um filme de romance clichê, que eu não tenho interesse nenhum, mas que vou acabar vendo sozinha de qualquer jeito?
── Você não vai ver o filme sozinha,(nome)!Parece ser a única coisa que ela tem a dizer em defesa própria, e mesmo isso não me convence já que, claramente, não é verdade.
── Eu vou sim. É sempre assim. ── murmuro, revirando os olhos, divertida apesar de notar que irritava a outra garota aos poucos. Dou de ombros perante isso.
Nossa amizade é assim mesmo, e é bom que ela me ature.
── Vocês podem até assistir os primeiros minutos do filme. Aí de repente o refri de um está acabando e vocês têm que dividir. Depois vem os risos quando vão comer a pipoca e, do nada, "Mari, quer pipoca?" e bum! Vocês ficam com as mãos livres pra ficar se agarrando no meio do cinema e trocando beijos escandalosos o suficiente pra eu querer me afundar no saco de pipoca e me esconder dos olhares de julgamento que são pra vocês mas sempre sobram pra mim! ── reclamo, me lembrando de cerca de umas três situações que acabaram do mesmo jeito.
Os enormes sacos de pipoca do cinema nunca eram fáceis de carregar para dentro da sala, mas também nunca pareciam o suficiente para esconder minhas bochechas coradas e sorrisos sem graça para as outras pessoas nas fileiras, tentando me desculpar silenciosamente pelos atos do casal ao meu lado que, literalmente, nunca davam a mínima para nada e ninguém mais depois de começarem a se beijar.
Era bonitinho.
Mas nem tanto.
── Eu prometo que vamos tentar não fazer isso, pode ser?
── tenta negociar, juntando as mãos em frente ao corpo em uma falsa súplica. Estalo a língua no céu da boca ao ver isso.
── Ah, vai, (nome)! O Nino já estava a caminho quando eu saí de casa, e você literalmente já está pronta pra ir, apesar dessa sua birra! Você não se arrumaria desse jeito só pra deitar na cama e assistir série o resto do dia. Muito menos pra dormir. ── aponta e, sim, é... faz sentido.
Ela está um pouco certa, já que realmente me arrumei com certa empolgação antes de descobrir que seria mais um dos passeios que em sirvo de vela, meu humor mudando de forma drástica e imediata apenas quando ela chegou em meu quarto, dizendo sem mais nem menos que estávamos atrasadas e que Nino já estava a caminho.
Isso tirou um pouco de meu bom humor e disposição, não vou mentir.
── Uhm, não. ── respondo, após um tempo pensando.
── Por favor?
── Não.
── (nome) (sobrenome)
── Alya Césaire! ── digo mais rápido, não me afetando pela sua tentativa de intimidação, vendo ela mesma revirar os olhos e bufar impaciente desta vez quando nem mesmo sua ameaça surte efeito.
Eu não estava facilitando mesmo e nem planejava.
Se ela queria teimar ao tentar me convencer a ir, então eu iria teimar em contrariar ela para ficar aqui.
Simples assim.
── Olha, (nome)... ── começa, respirando fundo antes de tentar mais uma vez, gesticulando de forma controlada, me fazendo cruzar os braços ao reparar aquilo.
Parecia que ela estava fazendo um esforço enorme a este ponto, quase jogando tudo aos ares e me mandando ir pra puta que pariu antes de me arrastar pelos cabelos. Coisa que, conhecendo Alya, sei muito bem que ela faria.
Mesmo assim, continuo parada no lugar, usando todo o estoque de coragem que eu nem sabia que tinha.
── Nós duas vamos sair daqui e ir até aquele cinema, como já tinha sido combinado, você querendo ou não. ── diz, de uma forma que me faz querer retrucar de imediato, mas ela ergue um dedo para me manter calada e, pelo amor que sinto por minha vida, obedeço, mesmo que de forma emburrada. ── Agora, podemos fazer isso por bem ou por mal, certo? E, por bem, eu prometo tentar não ficar muito... grudada com o Nino.
Ela não precisa dizer o "por mal" para eu saber que as coisas não acabariam bem nessa situação, mesmo se eu apenas estivesse a questionando.
Por isso, decido não fazer isso, cedendo um pouco ao implicitamente aceitar o acordo dela, mas querendo saber um pouco mais sobre suas condições.
── Mas e se vocês continuarem, de um jeito ou de outro, o que eu ganho com isso? A sensação de ser vela pra vocês dois não conta! ── adiciono rapidamente, notando que ela parece pensar por um bom momento antes de também ceder um pouco, suspirando ao voltar a estender as mãos para mim, oferecendo ajuda para que eu levantasse do chão.
── Se isso acontecer, eu deixo você mandar suas milhares de reclamações de clichês por mensagens. Você pode despejar todo o seu ódio dos clichês que você mais odeia e eu não vou poder falar nada em troca e nem tentar defender nenhum, mesmo que seja o meu favorito da vida. Pode ser?
Isso me faz parar e pensar.
Alya nunca teve paciência para me escutar julgando os seus milhares de livros de romance, muito menos as tropes toscas que alguns deles tinham, sempre me cortando e mudando de assunto ao defender os livros com unhas e dentes.
Essa era uma oportunidade de ouro já que, de uma forma ou de outra, ela me arrastaria até aquele cinema.
Ganhar alguma coisa em troca disso, parecia uma boa ideia, mesmo que não chegasse perto de um terço da tortura que eu estava prestes a passar, era alguma coisa, pelo menos.
Concordo com a cabeça, segurando as mãos dela dessa vez.
── Feito! Mas depois não diga que eu não te avisei. ── brinco, dando uma risada ao ver o quão aliviada ela parece. ── Já desativa as notificações do seu celular, porque eu tenho muita coisa pra mandar. Já estou até pensando no que dizer, são tantas possibilidades.
── Vai sonhando, (sobrenome)! ── brinca, parecendo me desafiar quando me ajuda a levantar, se afastando após eu me equilibrar. ── Se eu disse que não vai acontecer, então não vai. Eu diria pra você se preparar, porque vai ser uma noite comum, entre amigos, igual nos velhos tempos, lembra? Vamos nos divertir, você vai ver!
Ela fala com muita convicção.
Tanta que, eu, ingenuamente, quase acredito por algum tempo. Ou, bem, na verdade... eu meio que acredito sim.
Acredito, porque... é divertido quando nós encontramos com Nino, brincando entre nós ao comprarmos os ingressos e passearmos pelo shopping até dar a hora do filme.
Realmente parece como os velhos tempos, quando éramos apenas um trio de amigos, ao irmos comprar doces, refrigerante e pipoca antes de entrarmos na sala de cinema, entregando nossos ingressos para a verificação e conversando entre nós enquanto isso, tendo uma leve dificuldade de acharmos nossos lugares mas logo posicionados vendo os trailers.
Rimos entre nós enquanto zombo de todos os filmes românticos que passam ali e dos que sabíamos que estavam em cartaz, discutindo com Alya por isso, ela defendendo os filmes com a própria alma, mesmo ainda não tendo visto nenhum. Nino só se mostrando presente por suas risadas e o barulho de engasgo enquanto bebe o refrigerante, tirando mais fôlego de nós três quando isso ocasiona outra onda de risadas.
Mas não é como os velhos tempos e muito menos divertido quando o filme começa e, antes mesmo de sermos apresentados ao interesse amoroso da protagonista, eu acabo com um segundo saco de pipoca em mãos, revirando os olhos e o humor murchando levemente quando um pai de família, um pouco mais na frente, vira para trás, incomodado com o barulho do casal.
É bem chato, na verdade.
Eu quase me culpo por ter acreditado em minha amiga e tido fé em suas palavras, mas dizem que a esperança é a última que morre, então tento não pensar muito nisso ao me esconder dos olhares alheios, tão incomodada quanto essas pessoas mas não podendo fazer nada a respeito.
Novamente, Alya e Nino entram em uma bolha, um mundinho somente deles, nesse momento, e ninguém consegue os tirar dali ou impedir de continuar o que faziam.
Nem mesmo eu.
Por isso, ao invés de focar em um filme que não me interesso, ou passar vergonha por algo que não fiz, aproveito estarmos nas cadeiras ao fundo, mandando as benditas mensagens prometidas, com o intuito de me distrair e ignorar as coisas ao meu redor, tal como o filme ao fundo, em tela grande, ou o casal ao meu lado, que sequer tentava ser discreto.
O que fica ainda mais óbvio e escancarado quando começo a escutar certos barulhos em tom baixo, todos vindos de Alya. Sons que, definitivamente, não deviam estar sendo feitos em uma sala de cinema.
Faço uso de minha ingenuidade uma segunda vez aqui, mas tudo bem. Não é como se alguém além de mim notasse, de qualquer forma.
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