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002. Garota Misteriosa

Foi colocar os pés dentro da água que Anahí sentiu uma corrente elétrica percorrendo todo o seu corpo, algo parecido com um choque térmico. Instantaneamente ela estremeceu e não conseguiu evitar de sentir um leve arrepio.

Um arrepio que só ia piorar se ela não se mexesse, ela sabia disso. Então, mesmo com frio, abaixou-se até que a água começasse a pegar na altura do seu pescoço para, assim, nadar até um pouco mais afastado da margem do rio. Porém, quanto mais se mexia, mais arrepiada ficava — o que parecia se agravar pelo fato de estar nua.

A garota desistiu de tentar "se esquentar" e passou a focar em terminar aquele banho o mais depressa possível para ir embora logo. Porém, no momento em que terminara de enxaguar o seu cabelo — e já prestes a sair da água —, ouviu uma voz.

Não era uma voz falada, mas sim cantada. Se tratava de uma voz feminina muito, muito linda, encorpada e sexy. Era a voz mais atraente que Anahí já tinha ouvido na vida, e estava cantando vários vocalizes que a faziam se tornar ainda mais gostosa de ser ouvida.

Seja lá quem fosse a dona daquela voz, ela parecia estar por perto. Anahí olhou em volta para ver se encontrava a garota que estava cantando, mas não viu ninguém — o que a fez estranhar. Estaria ela ouvindo coisas? Então por que a voz parecia estar cada vez mais próxima de si?

Sim, a cada segundo que se passava, o volume do canto aumentava. Tal fato intrigou tanto a indígena que a fez voltar a nadar mais afastada da margem. Como olhou em volta e não encontrou ninguém, aquele canto insistente passou a fazê-la ficar irritada. E, por isso, voltou para perto de onde estava as suas coisas, certa de que iria embora e deixar quem quer que estivesse por ali sozinha. Só que, antes que conseguisse sair do rio, foi surpreendida por alguém esbarrando nas suas costas.

Assustada, Anahí se virou repentinamente e deu de cara com uma garota. Morena, dos olhos e cabelos pretinhos — ainda que molhados, aparentemente lisos — e lábios carnudos e avermelhados, se tratava de uma menina muito linda. E essa menina não parecia nem um pouco surpresa ou assustada com a presença da indígena. A água cobria até a altura dos seus ombros, fazendo com que ela não mostrasse muito do seu corpo.

— Oi — assim que ela falou algo, Anahí reconheceu que era dela a voz cantada que ouvira a poucos minutos.

— Oi — a indígena respondeu, um pouco amedrontada pela menina ter aparecido tão repentinamente, mas totalmente perplexa com a beleza e a voz sedutora dela. — Quem é você?

— Quem eu sou? — A garota rebateu antes de levantar uma sobrancelha. — Quem é você?

— O-o meu nome é Anahí — sem entender bem o motivo, ela não conseguiu deixar de gaguejar. Algo naquela garota, talvez o seu tom de voz que agora estava mais grave, a intimidou.

— Anahí, é… — A outra se abaixou um pouco mais na água enquanto observava cada detalhe à mostra da indígena à sua frente. Foi nessa hora que Anahí notou que seus seios nus estavam para fora d'água, sentiu vergonha de ficar exposta e levou ambas as mãos até a altura deles para tapá-los, arrancando um sorriso ladino na menina misteriosa com o seu gesto. — Nome bonito. Tão bonito quanto a dona.

Diante de tal elogio, a indígena sentiu as suas bochechas corarem — mesmo que para a outra talvez fosse difícil perceber que ela ficou envergonhada, visto que a sua pele era naturalmente avermelhada. Não soube o que responder, até abriu a boca para ver se saía alguma palavra, mas quando notou que não tinha nenhuma a dizer, fechou-a e continuou fitando a garota à sua frente, que sorriu largo — e debochada — para si, antes de se aproximar mais.

— Sabe, Anahí — ela ficou séria e nadou em volta da indígena, dando uma pausa nas palavras antes de continuar a sua fala. — Você gostou de me ouvir cantando?

Ainda sem saber exatamente o que dizer, Anahí balançou a cabeça em sinal afirmativo, fazendo a outra sorrir largo mais uma vez.

— Então eu posso cantar só para você!

Dessa vez a indígena balançou a cabeça em sinal negativo.

— Eu já estou de saída — falou. — Já terminei de tomar banho e tenho que voltar para a minha aldeia.

Sem sequer esperar por uma resposta, assim que terminou a sua frase a indígena virou as costas e foi novamente em direção à margem. Porém, antes que saísse, a outra garota a surpreendeu — de novo — com uma fala:

— Mas eu queria tanto…

O tom dela ficou tão sexy, tão grave, tão semelhante à um sussurro e à um gemido, que a indígena não pôde deixar de sentir um arrepio, novamente. Porém dessa vez era um arrepio bom, um arrepio semelhante ao de excitação. Ao se virar para a garota, notou que ela se encontrava ainda mais próxima de si do que estava antes, ao ponto de a fazer ficar desconcertada.

— Você queria cantar pra mim?

— Não, Anahí — percebendo o efeito que causou na indígena, a menina misteriosa se aproximou ainda mais dela, de modo que ficassem a apenas poucos centímetros de distância, e ergueu se, a ponto de deixar que seus seios nus saíssem debaixo da água, relevando uma parte extremamente atraente de seu corpo. — Eu te achei bonita e queria te beijar. Cantar pra você era só uma forma de lhe mandar um sinal para ver se percebia isso.

Olhando para a parte do corpo à mostra da menina, Anahí não podia negar para si mesma o quanto se sentia atraída por ela. A parte que via do corpo alheio parecia escultural de tão perfeita que era. E, por um momento, a indígena se pegou imaginando como seria mergulhar entre as curvas daquela garota.

Mas ao perceber que estava indo longe demais, ela balançou a cabeça rapidamente para espantar aqueles pensamentos impuros. Só que quando voltou a encarar aquela à sua frente — que olhava pra ela com uma expressão muito serena, dessa vez —, ela não conseguiu evitar que eles voltassem à tona. Diante disso, com receio, porém seduzida, ela articulou:

— Me beija, então.

E foi assim que, depois de mais um sorriso ladino, a garota misteriosa puxou Anahí pela cintura e selou os seus lábios em um beijo ardente — que lhe foi retribuído da mesma forma.

A indígena sentiu o seu corpo todo pegar fogo com os toques que a menina deixava em si. Vez ou outra uma delas se afastava para levar os lábios à outras partes do corpo alheio, e ficaram assim por longos minutos, até que, em uma das afastadas, a garota levou uma de suas mãos até o ombro de Anahí, a afastando de si, e a outra até a sua própria testa, e disse:

— Eu não estou bem.

Foi ela dizer isso, não se passaram nem dois segundos que desmaiou. Por sorte a indígena foi mais rápida em segurá-la pelos braços, senão ela teria caído na água e aí sim seria difícil tirá-la de lá.

Segurando a menina, Anahí se pôs a nadar de costas até a margem, assim poderia tentar acordá-la. Porém, ao conseguir arrastá-la para a terra, levou um choque e ficou paralisada por alguns segundos.

Assim que a menina foi totalmente posta para fora d'água, ficou perceptível que, no lugar de pernas, ela tinha uma bela cauda dourada de peixe. Assustada, Anahí ficou por um tempo tentando processar a informação de que estava diante de uma sereia — pior, que tinha beijado uma sereia — que poderia muito bem ser a tal da Iara Mãe D'água, aquela que a sua avó tinha lhe alertado mais cedo para tomar cuidado.

E faria sentido se fosse! Segundo a lenda, Iara seduz as suas vítimas com a sua beleza e a sua voz e depois as afoga no rio, então seria por isso que Anahí havia ficado tão atraída pela voz e beleza da garota! E o pior de tudo: se estivesse diante verdade, a lenda contada pelo seu povo era real, sinal de que Jaci poderia sim ter sido morta por aquela mesma sereia.

Ao cair a ficha de todas essas possibilidades, a indígena gritou. Gritou muito alto, de medo e frustração. Ainda gritando, ela se levantou dali e saiu correndo sem rumo mata adentro.

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1391 palavras.

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