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𝑇𝐻𝐸 𝑈𝑁𝐶𝐿𝐸, 𝑇𝐻𝐸 𝐹𝑅𝐼𝐸𝑁𝐷, 𝑇𝐻𝐸 𝑇𝐸𝐴𝐶𝐻𝐸𝑅 𝐴𝑁𝐷 𝑇𝐻𝐸 𝑃𝐸𝑉𝐸𝑁𝑆𝐼𝐸 𝑆𝐼𝐵𝐿𝐼𝑁𝐺𝑆

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𝑇𝐻𝐸 𝑈𝑁𝐶𝐿𝐸, 𝑇𝐻𝐸 𝐹𝑅𝐼𝐸𝑁𝐷, 𝑇𝐻𝐸 𝑃𝑅𝑂𝐹𝐸𝑆𝑆𝑂𝑅 𝐴𝑁𝐷 𝑇𝐻𝐸 𝑃𝐸𝑉𝐸𝑁𝑆𝐼𝐸 𝑆𝐼𝐵𝐿𝐼𝑁𝐺𝑆

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𝐐𝐔𝐄𝐑𝐈𝐃𝐀 𝐏𝐑𝐈𝐍𝐂𝐄𝐒𝐀 || quando estiver em posse desta carta, creio eu que já estará longe, o que é o melhor nesse momento, minha querida princesinha. Você já é uma moça crescida, e vou pedir-lhe que entenda a situação em que estamos nesse momento. Tente ver o melhor nessa situação, como você sempre viu, e seja uma mocinha sensata e atenciosa com seu tio Ralph. Espero que nos reencontremos em breve, minha querida. Com carinho, seu pai.

𝓐𝓪𝓻𝓸𝓷 𝓐𝓿𝓲 𝓒𝓻𝓮𝔀𝓮

Sarah Ashley Frances Crewe dobrou o papel de carta mais uma vez, fitando quietinha a janelinha do carro que seu tio havia mandado para buscá-la. Tinha doze anos recém completos, e por ser alta, julgavam que ela tinha catorze, porém o olhar em seus olhos teria sido estranho em uma senhorita de dezessete, e em uma garota tão novinha, por mais que ricamente vestida, embora preto do tecido do vestido, por maior que fosse a qualidade, a deixasse pálida demais, os olhos esbugalhados demais, e os cabelos caindo em cachos como se fosse um pônei de Shetland, era muito esquisito.

— Ele não teria a deixado se tivesse uma escolha, querida. — A voz suave da governanta da casa, Madame Carmichael, tirou-a do devaneio de observar aquelas ruas escuras iluminadas por postes mesmo que ainda fosse dia, o céu nublado e carregado de nuvens tristonhas. Em Paris não é tão escuro assim. O Jaguar do tio estava cheio de seus pertences, e ela segurava uma boneca firmemente no colo, as madeixas castanhas e os olhos azuis-cinzentos de Amelia, a boneca que ganhou de seu papa em seu anniversaire de onze anos, se esparramando em seu colo. Suas malas haviam sido preparadas com esmero vários dias antes de o pai lhe dar um beijo de despedida e despachar ela para a Inglaterra com um grupo que levava várias crianças judias para o Reino Unido. Na época, ela não se perguntou por que ele não viria com ela, já que o grupo apenas levava crianças, e seu pai havia dito que iria em questão de pouco tempo, assim que resolvesse negócios pendentes na França.

— Eu sei, Madame Carmichael. — Sarah murmurou, em um tom educadinho e simpático, embora tivesse um pouco de tristeza ao fundo.

Sarah foi devidamente apresentada ao tio quando chegaram de viagem, um homem de suíças ruivas e um chapéu-coco cobrindo já o começo da careca, e a mãe dele, a Sra. Josephine que lhe acolheu em seus braços magros, porém firmes. Sabia que sua prima Josie, a filha mais velha de seu tio, havia morrido em um acidente, pouco depois de se casar, e em sua cabeça, ela havia inventado um longo romance trágico a respeito, e o filho do tio, Alloysius, havia perdido a vida lutando pela pátria, e por isso o tio parecia triste. Apesar de não ser mais do que uma criança, ela sabia que seria bem cuidada ali, pois seu tio parecia bem-disposto a lhe dar todas as vontades, por boa amizade com seu pai. Era um homem de semblante sério, porém não fechado, e normalmente ria sempre que conversava com ela, as vezes dizendo saudoso que Josie, a finada filha, não tinha sido divertida como ela quando viva.

Sarah sabia que vinha de uma família rica, mas quando mais nova, apenas sabia daquilo por que ouvia as pessoas falarem. Seu papa tinha duas casas, uma na cidade e uma no campo, e Sarah tinha um pônei e vários brinquedos maravilhosos, e roupas novas e sapatos que nunca ficavam desconfortáveis. Haviam criados na casa, e eles a chamavam sempre de "petite miss". Ela estudava em casa, por que sua mama, quando viva, não queria que ela fosse para a escola normal, sempre contratando tutores para ensina-la em casa, um pouco de tudo: harpa, piano e flauta e falava iídiche, e latim e inglês, e francês era sua língua materna. Havia aprendido aritmética e geometria, e geografia e história, e era apaixonada por poesia e música, e sabia desenhar bem. Diziam também que, quando fosse crescida, seria muito rica, além de bonita. Só quando fez dez anos é que realmente entendeu o que era ser rica. Seu tio não tinha mais filhos, e por isso, diziam que tudo o que o pai tinha, e tudo o que o tio tinha, iria para ela quando crescesse. Se pensasse consigo mesma, não sabia o que pensar daquilo.

Tão logo setembro chegou, ela se viu indo em direção a um colégio interno para senhoritas pela primeira vez na vida, pois sua mãe não achava adequado que ela se misturasse com outras garotas, quando era viva, e depois que ela morreu, seu pai aceitou o desejo da finada esposa, continuando a educação dela em casa. Caso não fosse uma alma necessariamente bondosa, teria sido mais estragada do que ensinada, pois por ser muito abastada, tinha tudo o que queria, pois temiam desagradar ao tio dela, que dera ordens explicitas que ela deveria ter a educação que as filhas do próprio rei teriam, e a diretora, uma mulher magrela e com cabelos muito loiros, afirmou que garantiria aquilo, de forma que Sarah se tornou a primeira de sua turma em várias matérias. Havia aprendido latim e já sabia francês, e era excelente pianista e ginástica. Era uma desenhista dotada, e sempre que podia, enviava pelo correio um desenho junto de duas cartas, uma para o tio Ralph e Josephine – era uma mulher moderna, e dizia que Sarah deveria trata-la pelo primeiro nome, sem tia-avó ou qualquer outra bobagem – e uma para seu pai, contando sempre as novidades da vida da escola, de suas bonecas e deveres.

Sarah Crewe tinha treze anos quando seu tio a chamou para seu escritório, tão logo ela chegou no que em um ano havia se tornado sua casa, embora não fosse a mesma coisa que a enorme casa de campo nos arredores de Paris, e a magnifica casa da cidade, onde seu papa provavelmente já não estava. Deveria estar escondido na casa de amigos, pois seu tio lhe assegurava sempre que ela perguntava que ele apenas não respondia as cartas pois não era seguro, mas logo ele lhe escreveria, e quando fosse seguro, talvez até ligasse para ela. Quando tudo passasse, ela voltaria a morar com o pai em Paris, ou ele iria para Inglaterra ou talvez para os Estados Unidos com ela. Apesar de não ser ignorante ao que acontecia na Alemanha, e que havia dois anos que Paris havia sido tomada pelo exército nazista de Hitler, ela sabia que seu papa era extremamente inteligente, e confiava na palavra do tio que ele a manteria segura pelo seu pai, e que seu pai, no final de tudo, ficaria bem.

O assunto que Ralph Cadwaller desejava conversar eram os bombardeios aéreos, e Sarah já sabia o que implicavam, com as luzes tendo de ser apagadas durante a noite, com cortinas escuras nas janelas, e porões e abrigos subterrâneos sendo criados para abrigar a todos. Ela se lembrava bem de Hannah Field gritando histérica na escola ao ouvir o som de aviões uma noite, e ela admitia que se assustava com as luzes brilhantes no céu e o som das bombas e das turbinas dos aeroplanos. Seu tio havia conversado com um professor que era seu amigo, que possuía uma enorme mansão no campo, e se chamava Prof. Kirke, e ele havia concordado em receber ela e outra garotinha, e talvez, em breve, outras crianças, e ele a estaria mandando para a estação de trem para a casa desse amigo, que ficava bem distante, a dezesseis quilômetros da estação ferroviária, e três quilômetros do correio mais próximo.

Ele instruiu-a a nem mesmo desfazer as malas da escola, e a pegar qualquer objeto que realmente fosse importante para ela, e ter uma boa noite de sono, pois ele queria dispensa-la para o campo o mais rapidamente possível, e como a garotinha que viajaria com ela, que era alguns anos mais nova que ela, pegaria um trem no próximo dia, ela deveria ir junto com a garota, na esperança de que com isso ela fizesse amizade com a menina, que sem dúvidas deveria estar tão assustada como ela – embora ela tenha afirmado que não, muito obrigado, ela estava bem e não estava com medo, e que obedeceria o tio se isso o deixasse mais leve de consciência. Seria divertido, ele falou, pois lá ela poderia jogar críquete e fazer chás de bonecas, e que ele gostaria que ela tivesse mais contato com garotas de sua idade, por isso havia achado tão importante coloca-la na escola, e não a ensinar privadamente, como sua mãe havia feito antes de falecer, e seu pai mantivera o hábito.

Portanto, naquele momento ela estava segurando quantas malas de mão conseguiu, as roupas tão espremidas quanto eram possíveis dentro da bagagem para que coubessem. Vestia um casaco apesar de não fazer frio, e estava confortavelmente sentada em uma cabine da primeira classe, acenando alegremente para Madame Carmichael, que havia lhe levado para a estação. Queria pensar que era apenas uma impressão quando viu que a gentil governanta secava os olhos em um lenço, para não pensar que a situação era tão grave quando pensava, quando notou uma garotinha que entrou praticamente empurrada no trem, chorando alto enquanto o pai se afastava. Era baixinha e seus cabelos eram de um tom ruivo-loiro, e segurava duas malas grandes para o seu tamanho, além de uma boneca visivelmente cara, de porcelana. Ela pensou rapidamente antes de sair de sua cabine, parando na frente da garotinha cujos olhos estavam inchados e a aparência estragada pelo choro. Agradecia por ainda estar cedo e o trem não estar apinhado de crianças, como estaria horas mais tarde.

— Olá, meu nome é Sarah. — Ela disse, tirando do bolso um bombom que tinha guardado para a viagem, estendendo-o para a criança, que pegou o embrulhinho nas mãos magras, encarando ela enquanto ela pegava uma de suas malas e mão e a segurava pela mão livre, mal dando tempo para que ela se apresentasse. Havia em Sarah um sentimento muito maternal, principalmente por crianças pequenas, e queria tornar aquela viagem o mais confortável possível para a pequena menina. — Sua boneca é muito linda! Ela tem um nome? — A garotinha se sentou diante de Sarah, o queixo ainda tremendo, mas já bem mais recomposta quando respondeu.

— Jenna. — Sarah sorriu carinhosamente.

— É um nome muito bonito. Qual o seu nome? — A garotinha abriu o embrulho, dando uma pequena mordidinha no doce e voltando a embrulha-lo.

— Kelsey. Kelsey O'Malley... sou de Muswell Hill. — Sarah ergueu as sobrancelhas surpresa, notando então a etiqueta amarrada no pescoço da criança. Era exatamente quem ela julgava ser, e sorriu antes de ela estender a mão para a garotinha.

— Eu sou Sarah Crewe. Acho que iremos para a mesma casa, do prof. Kirke, não? — Ela concordou, secando os olhos com as costas da mão. Sarah deu um sorrisinho. — Isso vai ser divertido, uma enorme aventura! Meu tio falou que a casa do professor é enorme, e que poderemos brincar no quintal, e que tem um riacho onde podemos pescar! Talvez possamos até mesmo andar a cavalo, eu gostava muito de andar de pônei, quando ainda ia para o campo com meu papa! Você sabe andar a cavalo?

Durante toda a viagem, mesmo quando mais algumas crianças entraram na cabine e tornaram a sair algumas estações mais tarde, Sarah não parou de confortar Kelsey, e dava sorrisinhos para as crianças que dividiam o vagão consigo, oferecendo sua boneca para uma menina gorducha brincar até ela desembarcar, e contando histórias de terras mágicas para os companheiros de viagem, histórias que ela própria havia inventado, não tiradas de livro algum.

Quando chegaram a parada Coombe, ela garantiu que Kelsey segurasse firmemente em sua manga enquanto pegava todas as suas malas, e garantiu duas vezes que não estavam deixando nada na cabine antes de descerem naquele lugar, que tinha apenas dois bancos em um tablado e uma cerca branca ao fundo, com uma casinha para necessidades, junto de uma placa. Desceu devagar as escadas, achando subitamente suas malas muito pesadas, mas não querendo apoiá-las no chão lamacento como estava.

Foi necessário pouco esperar antes de ouvir um trotar de cascos, e uma égua branca, porém um pouco suja, chegou atrelada a uma carroça, e encarando as duas meninas, uma mulher de traços rígidos. Kelsey, a primeira impressão, teve antipatia do rosto severo e de linhas duras da governanta, porém Sarah, sempre disposta a não se deixar julgar as pessoas pela primeira impressão, arriscou um sorriso.

— D. Martha...? — Ela perguntou, buscando uma confirmação. — Eu sou Sarah Crewe.

— Receio que sim. — A mulher disse, o rosto ainda com linhas duras e sem muita emoção, tão diferente do rosto sério, porém sempre simpático da Madame Carmichael, com algum doce ou outro artigo igualmente adulatório. Sentia naquele momento mais falta de Lyndsey Carmichael e seus abraços quentinhos do que da própria mãe, cuja a única lembrança nítida que tinha era de estar sentada em uma poltrona da grande casa em Paris, com a barriga muito inchada pela sua irmãzinha, que se chamaria Shannon, enquanto ela tocava piano. — Isso é tudo? — Ela perguntou, enquanto Sarah concordava em um tom respeitoso, e Kelsey, parecendo já irritada da conversa fiada, que é o que acontece quando uma criança tem que ficar de pé enquanto duas pessoas mais velhas conversam.

— Sim, D. Martha. — A mulher olhou-a duas vezes antes de perguntar, as sobrancelhas elevadas.

— Pequenos favores? — Sarah procurou nos bolsos, achando uma moedinha de 6 pennies no bolso do casaco, entregando-a para D. Martha, que com toda certeza não parecia esperar o dinheiro, quando Sarah sorriu e disse.

— Muito obrigada por vir nos buscar, D. Martha. Foi uma gentileza enorme da senhora. — Naquele momento, a governanta, que não gostava muito de crianças, viu que pelo menos Sarah não daria trabalho, embora não estivesse muito certa da pequenina. Assim que os pertences estavam acomodados juntamente de Kelsey e Sarah, que foi a última a subir por ter que ajudar Kelsey, D. Martha chicoteou a égua, e por quinze quilômetros, até que se pudesse ver uma casa enorme, ninguém realmente falou.

O professor era um velho de cabelo desgrenhado e branco, que lhe encobria a maior parte do rosto, além da cabeça.

As crianças gostaram dele quase imediatamente. Mas, na primeira noite, quando ele veio recebê-las, na porta principal, tinha uma aparência tão estranha, que Kelsey quase começou a rir, tendo de fingir rapidamente um espirro, porém Sarah achou-o um homem simpático, que logo engatou em uma conversa sobre o cronograma escolar que adotariam em breve, logo após o final do período de férias. D. Martha, porém, logo que o professor se retirou, começou a falar como um papagaio, sem admitir interrupções, enquanto guiava as duas meninas até o respectivo quarto.

— O professor Kirke não está habituado com crianças. Portanto, há algumas regras que deverão seguir. Nada de gritaria, nem correria! O elevador de refeições é unicamente para esse fim. E não toque os artefatos históricos! — Ela falou esse último quase como um gritinho, pois Sarah havia guiado a mão em direção a um busto. — E acima de tudo: Nada de perturbar o professor.

Sarah concordou com tudo, afinal, pareciam todas regras perfeitamente razoáveis, e pareceu até mesmo surpresa por em alguns momentos flagrar a pequena O'Malley fazendo caretas as costas da governanta. Quando chegaram ao quarto, foram apresentadas a três criadas da casa, Ivy, Margaret e Betty, que as ajudaram com precisão a colocar todas as roupas no guarda roupa e no baú que lhes foram destinados, e somente quando Ivy encarou os embrulhos nunca antes abertos das pinturas no fundo da antepenúltima mala de Sarah, que ela sorriu, dizendo.

— Por favor, Srta. Ivy, deixe que eu coloco isso eu mesma no baú. — Ela disse, tirando com cuidado as enormes telas, uma a uma, e colocando-as por baixo de todas as roupas do enxoval que estavam no baú, o que eram a maioria, já que as que amarrotavam quando dobradas estavam no guarda-roupas, mas não eram muitas. Horas mais tarde, após o jantar, quando Sarah já estava dormindo e Kelsey estava "contando carneirinhos", pois havia sido o que Sarah havia dito para ela fazer quando se queixou da falta de sono após uma canção de ninar e uma história de fadas – o que foi um erro, pois a história deixou Kelsey mais agitada e com vontade de brincar – Ivy, Margaret e Betty conversaram que a Srta. Sarah parecia um anjinho, de tão comportada e educada.

O ano passou-se depressa, e logo houve o aniversário de Kelsey, e o de Sarah, que foram comemorados com um bolo pequeno de chocolate. Os estudos com o prof. Kirke eram ótimos, e Sarah se percebeu aprendendo muito mais rapidamente quando apenas com uma colega e um professor particular, como era em sua infância. Embora não pudesse ir a sinagoga, pois não havia nenhuma lá perto, Sarah ainda lia a sua parshah semanalmente, e mantinha seus estudos da Torá com frequência. Na primeira noite de sua estadia, o professor Kirke havia lhe assegurado que todo o alimento havia sido preparado seguindo as restrições que seu tio havia lhe informado, pelo que ela seria eternamente grata.

Sarah ensinava Kelsey a conjugar verbos em francês quando foram levadas por D. Martha para o escritório do professor, onde ele ofereceu chá para ambas e lhes contou as boas novas, como ele mesmo disse. Mais quatro crianças se juntariam a elas em breve, dois garotos – tinha anos que Sarah não tinha contato algum com garotos – e duas garotas, uma da idade de Kelsey, e outra da idade de Sarah, o que fez com que elas vibrassem de empolgação de ter duas companhias novas, principalmente Kelsey. Sarah estava crescendo depressa, e já não sentia mais tanto interesse em brincar de chás de bonecas, e sim em seus livros de poesias e em jogar críquete, que por sorte Kelsey apreciava bastante.

O dia em que as crianças Pevensie, que ela havia visto que se chamavam Peter, Susan, Edmund e Lucy, com respectivamente quinze, catorze, doze e dez, chegariam a casa do prof. Kirke, Sarah estava animada, feliz com a possibilidade de fazer novas amizades, e acordou muito mais cedo do que de costume, já que o céu visto pela janela de seu quarto, no segundo andar, foi mudando rapidamente de um azul-escuro e aveludado para um cinzento metálico e frio, depois, lentamente, para um tom rosado salpicado de ouro. Sentou-se na cama e puxou um roupão quente que havia ali, pois ainda era cedo e fazia frio, bem mais do que ela era acostumada na França.

Já havia tomado banho – mesmo que estivesse frio, ela gostava da sensação de limpeza que tomar banho todos os dias lhe dava – e se vestido quando pensou em acordar Kelsey, mas sabia que a garotinha ficaria de muito mau humor se fosse levantada tão cedo, e realmente não queria perturbar o sono da amiga, portanto, leu o livro que se encontrava em sua escrivaninha (Peter & Wendy) por quarenta minutos, até que finalmente chegou um horário razoável para (tentar) levantar O'Malley, que resmungou durante todo o tempo em que Sarah insistiu que ela se levantasse para se juntar a ela e o professor para o café, quando por fim ambas se dirigiram para a mesa do desjejum.

Já era final de tarde, e Sarah já havia estudado com Kelsey, se adiantado mais alguns capítulos de Peter & Wendy, ensinado Kelsey a fazer uma estrelinha sem as mãos no jardim, e novamente se banhado quando viu pela janela a égua com D. Martha e quatro crianças, tendo naquele momento uma visão privilegiada dos novos moradores da casa. Todas as crianças pareciam ser bonitas de aparência, e bem cuidadas, mas traziam poucos pertences. Sarah estava a caminho da escadaria quando escutou um pedacinho do sermão da governanta, que pareceu ser o mesmo de um ano atrás, quando chegou com Kelsey O'Malley.

— Nada de gritaria, nem correria. Sem uso indevido do elevador de refeições e... — O discurso foi subitamente interrompido com um grito agudo de criança, seguido de um ainda mais de D. Martha. — Senhorita Kelsey O'Malley! Deus, o que eu fiz para ter esse pequeno demônio aqui? Por que ela não pode ser mais como a Sarah. Kelsey, venha aqui, faz favor! Essa é Kelsey, que já deveria se comportar uma mocinha de sua idade, porém insiste em agir como uma criança de rua. — A reprimenda foi severa, e se Kelsey fosse um pouco menos desbocada, teria se sentido imensamente constrangida por ser advertida daquela forma, na frente de crianças novas. Sarah achou a situação propicia para descer, tanto por querer se apresentar, como por querer poupar a coleguinha da humilhação.

— D. Martha, me desculpe, mas estava procurando Kelsey. — A mulher olhou-a com a boca em uma finíssima linha, estressada e querendo achar um motivo para ralhar até mesmo com Sarah, mas os sapatos de Sarah não tinham sujeira, ela estava limpa e até mesmo a roupa parecia colaborar, não estando suja. — Se a senhora desejar voltar a suas atividades, eu posso mostrar para eles onde ficam os quartos e o banheiro. — A mulher pareceu pensar bem por uns dois segundos, antes de concordar e pedindo licença, sair rapidamente, antes de Sarah sorrir, se virando para os Pevensie, quando o mais velho sorriu e se apresentou.

— Prazer em conhece-las. Sou Peter, — Peter era um garoto loiro alto para a idade, com olhos azuis jovens e a pele aparentemente bronzeada, e Sarah não negaria que ele era um menino bonito, e parecia ser bem simpático, mas ela negaria com todo o seu vocábulario que havia corado, como Kelsye apontou horas mais tarde. — E essas são minhas irmãs; Susan, — a mais velha deu um sorriso gentil, logo elogiando o cabelo de Kelsey – aparentemente sem querer se levar pela primeira impressão – e o sorriso de Sarah, e tanto Kelsey quando Sarah pareceram ter um acordo mutuo de que ela era muito bonita, com os seus cabelos negros brilhantes, o porte alto e magro e os olhos azuis cercados de pestanas longas. — E Lucy. — A caçulinha era loira, e os cabelos eram bem curtos. Segurava um ursinho esfarrapado nas mãos, e Sarah percebeu mais uma vez que a quantidade de malas que ela havia trazido quando veio, apenas para si, era o número de malas que todos, os irmãos traziam, embora as deles fossem bem menores. — E esse é meu irmão, Ed... — O garoto estava com uma carraca, e tinha cabelos negros como os de Susan. Era magro e estava naquela idade em que os hormônios masculinos começavam a deixá-los achando tudo motivo ou de birra ou de briga.

— Eu sei me apresentar, Peter, obrigada. — Peter simplesmente ignorou, se atrevendo até mesmo a revirar os olhos.

— Edmund. — Sarah sorriu, cumprimentando todos e Kelsey fez o mesmo, e embora parecesse que ela e Edmund estavam já trocando farpas, ela somente ignorou pois Kelsey também estava naquela idade em que os hormônios das garotas começavam a deixa-las irritadiças.

— Eu sou Sarah, prazer em conhecer todos vocês. Não se sintam intimidados com D. Martha, ela normalmente não pegará no pé de vocês, e o prof. Kirke é muito gentil. — Peter andava quase emparelhado com Sarah, segurando a mão de Lucy. — Tem várias salas vazias, e algumas com alguns artefatos históricos. De vez em quando aparecem turistas, sugiro que não interrompam d. Martha quando ela estiver apresentando a casa, ela fica irritada. Não sei se notaram, mas ela...

— Não gosta muito de crianças? Não, mal cheguei a perceber. — Peter disse, sarcástico, e isso a fez sorrir. Um pouco de bom humor para entender um sarcasmo bom e saudável as vezes era ótimo. — Mal lhe pergunte, seu sotaque é diferente, e não parece americano. — Ela sorriu, seguindo reto até parar diante de um quarto que seria de Susan e Lucy.

— Sou francesa. Meu papa me mandou para cá... antes de tudo. Papa me manque dix fois plus que tout au monde... — (Sinto falta do papai dez vezes mais do que tudo no mundo) as palavras saíram com tanta facilidade como em inglês, e tão baixas como um sussurro. Sentia mesmo falta do pai, e queria mais do que tudo que logo fosse seguro para ele responde-la.

Je suis sûr qu'il voulait te voir en sécurité... — (Tenho certeza de que ele queria vê-la em segurança). Por um segundo, ela pareceu chocada pelo som da língua materna, sem ser a voz irritada de Kelsey, que não sentia tanta vontade de aprender o idioma, pois falava um inglês sensato, e como por vezes dizia, "se eu for para Paris um dia, eu terei minha fiel melhor amiga para traduzir tudo para mim".

Je sais ... merci. — (Eu sei, obrigada). Vendo que o ele não falaria mais nada, e que este tomava um ar modesto... o mesmo ar que as pessoas assumem quando visitamos o jardim que fizeram ou lemos uma história que escreveram. Por isso, era da mais elementar educação que Sarah dissesse. — Fala muito bem, poderia toma-lo por um francês. Mas bem... esse, é o quarto das meninas. — Susan rapidamente deixou a malinha ao lado da porta, enquanto todos entravam. Havia lareira, uma mesa com um rádio e duas poltronas, além de uma grande cama que as meninas teriam de dividir, diferentemente do quarto das outras, que havia duas camas menores. A decoração era escura, mas era bem grande e confortável, e pelo menos bem acomodadas elas estariam. Deixou que apreciassem o quarto a vontade, dando algumas voltinhas dentro, e com Susan mostrando-se extremamente satisfeita por ter um espelho. Seguiu algumas portas para frente, abrindo outro quarto de hóspedes, mostrando-o aos meninos, e logo defronte, havia o banheiro, onde deu instruções claras e diretas de que todos teriam que usar o mesmo, portanto deveriam facilitar o trabalho das três criadas da casa, Ivy, Margaret e Betty, e não fazer muita bagunça e ter um horário organizado de usar, para que ninguém saísse prejudicado. Avisou-os dos horários das refeições, e que qualquer coisa que precisassem, poderiam procura-la, na porta logo diante ao quarto das meninas. E assegurou Lucy de que tudo seria legal, até mesmo lhe dando um bombom, e tentou travar amizade com Edmund, que parecia de mau humor, dizendo que a estada deles seria agradável como uma primavera, que poderiam brincar fora de casa, andar a cavalo, e que na biblioteca haviam vários livros para se entreterem com as histórias.

Naquela mesma noite, após o jantar e se despedirem do professor, Sarah e Kelsey foram convidadas por Susan para ir a seu quarto, para que pudessem se conhecer e ouvir as primeiras impressões, e logo Peter entrou também, se sentando no encosto da poltrona para ouvir ao rádio e ver o céu ao mesmo tempo. A voz do locutor avisava que um avião alemão havia atacado a Grã-Bretanha na noite anterior, e que os ataques haviam sido dispersos, porém demorados. Susan, que procurava arrumar as coisas no quarto, bateu os sapatos até o aparelho, o desligando e apontando sutilmente com a cabeça para Lucy, fazendo Peter descer do estofado para ver a garotinha, que já estava deitada para dormir. Sarah se sentava ao lado dela, tentando acalmar os pequenos olhos chorosos contando histórias de fadas e sereias e princesas, e terras de contos de fadas e castelos de mármore e campos de flores sem fim.

— Os lençóis pinicam.... — Lucy disse, e Sarah mentalmente se lembrou em pedir para Ivy, Margaret ou Betty trocá-los no dia seguinte.

— Guerras não duram para sempre, Lucy. Logo estaremos todos em nossas casas, e isso parecerá apenas um sonho muito distante. Pense como se fosse uma aventura, garanto que será divertido! Amanhã, podemos explorar todo esse lugar, e eu posso te ensinar a montar, e escalar árvores, e talvez, se tivermos açúcar o suficiente, possamos fazer um bolo! — Aquilo pareceu animar a garota, antes da voz azeda de Edmund, que estava na porta, dizer.

— Se a casa ainda estiver lá... — Falou Edmund, com muito sono, mas fingindo que não, o que o tornava mal-humorado. — Não fiquem falado desse jeito!

— Que jeito? — Perguntou Susan, que aparentemente não deixaria passar. — Além do mais, já era hora de você estar dormindo.

— Sim, mamãe. Que direito tem você de me mandar dormir? Vá dormir você, se quiser.

— Ed... — Peter murmurou, cansado e impaciente, mas ignorando em prol de falar com a menorzinha. — Vai ser formidável, Lu. O professor deixa a gente fazer o que quiser.

— Ele é bem simpático. — Sarah fez força, sorrindo para a garotinha, cujo queixo já não parecia mais tremer.

— É melhor irmos todos para a cama — Disse Lucy. — Vai haver confusão, se ouvirem a nossa conversa.

— Não vai, não — disse Peter. — Este é o tipo de casa em que a gente pode fazer o que quer. E, além do mais, ninguém está nos ouvindo. É preciso andar quase dez minutos daqui até a sala de jantar, e há uma porção de escadas e corredores pelo caminho.

— Que barulho é esse? — Perguntou Lucy de repente.

Era a maior casa que ela já tinha visto. A ideia de corredores compridos e fileiras de portas que vão dar em salas vazias começava agora a lhe dar arrepios.

— Foi um passarinho, sua boba — disse Edmund.

— Foi uma coruja — disse Peter. — Este lugar deve ser uma beleza para passarinhos. E agora para cama! Amanhã vamos explorar tudo. Repararam nas montanhas do caminho? E os bosques? Aqui deve ter águia. Até veado. E falcão, com certeza.

— E raposas! — Disse Edmund.

— E coelhos! — Disse Susan.

Saiu do quarto juntamente com os meninos, e enquanto Edmund ia pela frente e fechava a porta, Peter ficou para trás por um momentinho.

— Queria lhe agradecer por estar ajudando a Lucy, e por não ter perdido a paciência com Edmund. Ele é um bom menino, só está nervoso com toda essa situação, sabe, ele só tem doze anos. — Sarah sorriu.

— Não há por que agradecer, Peter. É difícil para todos nós ficar longe de casa, e eles são pequenos— Vendo que ele não falaria mais nada, ela disse, sorrindo. — Bonne nuit, dors bien — (Boa noite, durma bem) ela disse, abrindo a porta de seu quarto, enquanto Peter acenava antes de dar as costas.

Bonne nuit.

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