Capítulo 12
Any Gabrielly 🦋
Por ser uma cidade relativamente pequena, Bridgton costuma tratar o halloween como uma data tão importante quando o 4 de Julho ou o Natal. É por isso que a cidade inteira está "adequada" para a data festiva, decorada até o talo com abóboras fazendo caretas, fantasmas falsos, teias de aranha falsas, luzes em tons assustadores e tudo o mais que posso imaginar que sirva como decoração de halloween.
E, por isso, os alunos da minha escola não paravam de falar da festa da Sabina durante a semana inteira, e que está para começar daqui algumas horas.
Eu devia estar preocupada com quando voltaria para casa, ou se vou beber, beijar alguém ou sei lá o que, mas estou pensando no que Noah me disse no início da semana. "Vá a festa de halloween no sábado e eu te conto." Tá, mas contar o quê exatamente? Quer dizer, sei que eu pedi uma resposta para o motivo dele ir atrás de mim hora sim e hora não, mas ainda não tenho nenhuma pista sobre o que ele vai me dizer essa noite. Isso é assustador.
Pela última vez, encaro meu reflexo no espelho, decidindo que minha fantasia de Cisne Negro e a maquiagem que aprendi a fazer pelo Youtube não ficou tão ruim, se levar em consideração que me maquiei sozinha. Toda a minha roupa de bailarina é preta, desde o collant apertado, até as sapatilhas amarradas nos meus pés. Passo os dedos cobertos pela luva de renda, no tutu preto, sentindo a textura entre os dedos. Arranjar a fantasia foi difícil, já que as fantasias femininas mais famosas do halloween na nossa cidade são as de bruxa.
Sorrio para mim mesma, apesar de sentir que vou ficar com dor de cabeça, por ter puxado meu cabelo em coque alto e forte. Usei quase metade do pote de gel para conseguir esse efeito.
Batidas leves na porta do quarto ecoam e eu me viro na direção dele.
— Entra, mãe. — Digo
— Minha nossa, que linda! — Minha mãe sorri e cobre a boca com as mãos ao me observar. Reviro os olhos, mas estou sorrindo para ela. — Pode dançar igual a um ganso com torcicolo, mas é a bailarina mais linda de todas!
— Mãe!
Dou risada e ela segura minhas mãos com a delicadeza, analisando cada detalhe da minha fantasia e da minha maquiagem. Quando disse que eu iria fantasiada de Cisne Negro, minha mãe praticamente saltou de alegria pela cozinha, porque sempre amou ballet. Ela até fez alguns anos de aula, mas, infelizmente, quebrou o pé quando tinha 12 anos e teve que desistir dos seus sonhos. Pelo menos não tentou me forçar a seguir esse sonho por ela…
— Preciso tirar uma foto! — Ela diz, toda contente por me ver toda montada desse jeito.
— Nãããão! — Resmungo e pego minha jaqueta de couro em cima da cama. — Vamos logo, a Sof tá me esperando.
— Não sem uma foto! Faz uma pose aí.
Suspiro, pondo a jaqueta antes de fazer uma pose simples de bailarina, porque só assim minha mãe me deixa em paz. Depois de tirada a bendita foto, eu pego tudo o que vou precisar e então vamos embora.
Dentro do carro da minha mãe, eu observo a cidade mergulhada na noite "mágica" de halloween, onde as crianças fantasiadas correm por aí atrás de doces ou travessuras. Há fantasias de todo tipo; fofas e assustadoras, cujas são minhas favoritas. Lembro-me de ter essa idade, e sempre querer me fantasiar de Maria Sangrenta, porque Josh morria de medo dessa lenda e eu amava assustar ele. Pensar nessas lembranças me fazem rir baixinho.
— Do que você está rindo ai, hein? — Minha mãe pergunta, com um sorrisinho no rosto.
— Nada, só… — Olho para ela e sorrio de volta. —…só lembrando. Lembra do Josh Beauchamp?
— O gatinho que tinha uma queda por você? Uhum, lembro sim.
— Tava pensando na época em que éramos mais próximos. Só isso.
Ignoro o ardor das minhas bochechas ao ouvir minha mãe dizer que ele tinha uma "quedinha" por mim. Sim, eu sei disso. Sim, eu gosto de zoar ele por isso. Mas não, não é legal quando sua mãe fica te lembrando que um cara bonitinho já teve um crush em você.
— Ah…tava pensando nele, é? — Minha mãe me lança um olhar malicioso, e eu reviro os olhos.
— Não desse jeito, mãe. Josh era só um amigo, e hoje em dia um colega de turma. Só isso.
— É, talvez você tenha razão. — Ela dá de ombros enquanto presta atenção na estrada. — Eu sei quando você tem algum crush por algum garoto. É assim que se fala? Crush? Ai, essas gírias de vocês…
— Tá legal, cita um garoto da qual já tive um crush? — Cruzo os braços e ergo uma sobrancelha para ela, a desafiando. Gostar de um cara, tipo, de verdade, é algo que raramente acontece comigo. Sou muito seletiva, e sempre acho desculpas para não ficar com ninguém.
— O Noah Urrea, por exemplo?
Ela ergue uma sobrancelha de volta, deixando bem claro quem desafia quem por aqui. Eu arregalo meus olhos e desvio o olhar do dela, crente de que assim vai acabar um informação de mim que eu nem sabia que existia.
— Não tenho um crush pelo Urrea. Surtou. — Murmuro, sentindo aquele mesmo ardor de antes, se tornar fogo em minhas bochechas. Sorte que a maquiagem esconde o vermelho da pele. Eu acho.
— Tem, você tem sim. — Minhas mãe abre um sorriso largo. — Eu pari você; te conheço como a palma da minha mão.
— Se me conhece bem assim, como saberia que eu tenho um crush no Noah? Coisa que eu não tenho.
— Você fica nervosa perto dele…se faz difícil, e, ah, toda vez que ele vai embora, você respira fundo como se estivesse prendendo o ar.
Caralho, ela é boa nisso. Ainda sim, eu não tenho um crush no Noah, apenas fico um pouquinho nervosa perto dele, o que é completamente normal quando você não está acostumada a receber atenção, ainda mais de um cara gato como ele... Que droga, Any, para de chamar ele de gato. Fechos os olhos, tentando manter a calma, e depois os torno a abrir, olhando de volta para as crianças lá fora.
— Eu não gosto dele. — Afirmo — Pode, por favor, esquecer isso, mãe?
— Tudo bem, tudo bem. Mas pensa no que eu te disse sobre como você fica perto do Jacob.
🦋
A casa da Sabina, no lago Highland, já está lotada. Só na entrada da propriedade, depois de ter entregue o convite para o segurança, posso ouvir a música alta ecoando ao redor do bosque. Minha mãe me deixa ali mesmo na entrada, porque o caminho até a casa já está lotado de carros e pedestres adolescentes fantasiados.
— Divirta-se, mas não muito. — Ela diz e beija minha bochecha bem de leve, para não sujar os lábios com maquiagem. — E lembre-se: camisinha previne DST's e bebês indesejados.
— Mãe! — Arregalo os olhos para ela, resmungando entredentes.
Ela apenas ri, acenando para mim enquanto saio do carro.
O frio vento vindo do lago já me pega com tudo, balançando meu tutu, que deveria ficar quase imóvel – apesar de ser bem confortável –, e deixando-me arrepiada de frio, pois a meia calça é fina demais. Abraço meu próprio corpo, me esquentando o máximo possível com minha jaqueta de couro preto. Enquanto caminho entre outras pessoas, observo as fantasias, admirando a falta de criatividade que o povo dessa cidade tem. Mas eu nem posso reclamar, porque sou uma bailarina essa noite; eu podia ter sido uma noiva fantasma.
Antes de entrar na casa, eu paro rapidamente de frente para o píer do lago, que se move em pequenas ondinhas com o vento gélido da noite. O lago tem cheiro de…de natureza. Uma mistura gostosa de mato, com água doce. Sorrio e inspiro esse perfume bom e natural, antes de enfim entrar na casa – na verdade, está mais para um casarão de filme de terror. Não fui nas últimas festas de halloween que Sabina planejou, mas esse ano ela caprichou nas luzes neon, deixando todos brilhantes – exceto eu, porque estou toda de preto – e modernos. Ela também não economizou nem um pouco na decoração de halloween, usando os itens mais caros que encontramos no Walmart. Na porta de entrada, há várias correntes de mentira penduradas no teto, junto com um monte de pisca-pisca vermelho. Ao longo do caminho vejo fantasmas, teias de aranhas, abóboras, esqueletos e um monte de outras criaturas consideradas honradas durante todo o ano, menos no halloween. Velas falsas são o centro da atenção na sala, junto com a fumaça no chão, que percorre todo o andar debaixo da casa.
É, não está tão ruim assim.
Me encosto perto da escada que leva ao andar de cima, e que, por sinal, enfeitada por faixas amarelas da polícia e aranhas de borracha para todo lado. Pego meu celular na jaqueta de couro e mando uma mensagem para Sofya.
Cadê você???
S: Acabei de chegar!
S: Estamos entrando. Onde você tá?
Perto da escada.
O problema vai ser conseguir ver Sof no meio de tanta gente, ainda mais quando a luz ambiente está mais escura do que o normal, graças aos pisca-piscas de luzes intensas e ao neon. Estreito bem os olhos, atenta na porta de entrada, enquanto cada vez mais adolescentes passam por ela...
Vejo uma garota com boina de Super Mario Girl, acompanhada por um pirata, e já associo de cara com Sofya e Noah. Levanto o braço, chamando a atenção da minha melhor amiga, que sorri ao me ver e vem correndo, atropelando todo mundo no caminho.
— Meu Deus, você tá muito…linda! — Ela diz e me analisa de cima abaixo, antes de abrir um sorriso gentil. — E então, o que achou?
Observo a fantasia de Mario Girl que Sofya está usando, e ela é tão fofa, que eu nunca pensei que veria minha melhor amiga – bruta pra cacete – usando algo como esse. Mas eu gostei.
— Tá muito fofo, amiga. — Sorrio e ela me abraça rapidamente, amassando todo o meu tutu.
Enquanto estou em seus braços, procuro pelo pirata Noah, mas ele sumiu no meio de todo mundo. Isso se era ele mesmo o pirata, porque estava escuro demais para conseguir enxergar direito. Eu só soube mesmo que era a Sofya na hora, porque ela era a única Mario Girl por aqui, e eu me lembrei de ter me perguntado sobre a fantasia outro dia.
— Tá aí a muito tempo? — Ela me solta e ei disfarço meu olhar de paisagem, procurando por uma pessoa que provavelmente deve ter se esquecido de mim – não falei com Noah o resto da semana, o que não foi tão ruim, até.
— Não…cheguei agora pouco também. — Sorrio de canto
— Isso aqui tá incrível… A Sabina se superou esse ano. Vai ser a melhor festa de halloween do mundo!
Sofya dá alguns pulinhos, enquanto segura minhas mãos e me balança junto com a música eletrônica que está tocando. Acho que é alguma do Swedish House Mafia, não sei dizer.
Dou risada, balançando meu corpo junto com Sofya, para aproveitar a batida eletrizante da música que faz todo mundo se mexer, onde quer que estejam; na escada, no corredor, na sala ou até mesmo lá fora. Minha amiga segura a boina com uma mão, enquanto balança a cabeça de um lado para o outro, remexendo o cabelo curto. Enquanto eu dou alguns pulinhos, girando e movendo os quadris em direção ao chão. Na última festa, me senti obrigada a dançar, mas, dessa vez, tudo parece ser tão divertido que quero poupar os esforços para ser a "excluída" da festa toda.
É o espírito de halloween!
— Eu preciso de uma bebida pra isso aqui ficar mais divertido! — Sof grita sobre o som da música, parando de pular comigo. — Quer alguma coisa?!
— Não, obrigada!
Faço sinal de joinha e ela afirma com a cabeça, saindo por entre as pessoas para chegar até a cozinha para pegar alguma bebida. Como eu morro de vergonha, paro de dançar e me encosto de volta na grade da escada, esperando Sofya voltar a qualquer minuto. Esse é o lado ruim de não ter amigos e ir a uma festa onde você só tem intimidade com uma pessoa…
— Minha linda princesa Rolim! — Ouço a voz de Noah atrás de mim, ecoando através da música, de tão alto que ele fala.
Me viro, a tempo de vê-lo se aproximar de mim. Ele está vestido como um pirata. Um pirata gostoso, com uma daquelas camisas antigas e amareladas, de mangas estufadas, e com o chapéu de capitão torto. Dou risada. Sabia que o pirata era ele.
— Eu não sou uma princesa, sou uma bailarina. — Digo com um sorriso leve no rosto.
— Sério? — Ele junta as sobrancelhas, confuso, e depois me olha de cima a baixo. Sei que estou usando uma coroa, mas o tutu já deveria entregar tudo sobre minha fantasia…
— Sério. — Afirmo outra vez. — E também não sou sua.
— Mas é linda.
Ele se encosta na grade da escada junto comigo, sussurrando no meu ouvido. Abro um sorriso e ignoro o arrepio e o calor que percorre meu corpo, abaixando a cabeça para que Noah tire a dele do meu pescoço.
— O que você quer, Noah Urrea? — Pergunto na esperança de que ele pare de me torturar, e me dê de vez a resposta que me prometeu outro dia.
— Por que sempre que me aproximo, você acha que eu quero alguma coisa?
— Porque você sempre quer alguma coisa. — Evito olhar para ele. — E eu conheço você bem o suficiente para saber que só procura alguma garota, quando quer algo a mais dela.
— Eu nunca faria isso com você. É sério; nunca.
Ele segura meu queixo entre o polegar e o indicador, puxando meu rosto suavemente para que eu olhe em seus olhos. É o que eu faço. Eles estão contornados por uma sombra preta e esfumaçada, principalmente na parte de baixo, que nem o Johnny Deep em Piratas do Caribe. Isso deixa ele com ar misterioso, e ao mesmo tempo perigoso, de certa forma. Estico o dedo de forma automática e toco a pequena Cruz que ele desenhou na maçã do rosto, dando um toque charmoso a fantasia.
Ao perceber o que estou fazendo, arregalo os olhos e me afasto alguns passos. Não estou nervosa; meu coração só tá batendo rápido em um nível perigoso, minhas pernas estão trêmulas e eu só penso em beijar ele. Não, nem um pouco nervosa.
— É, porque eu nunca deixaria. — Cruzo os braços e sorrio de forma teimosa para ele, parecendo super tranquila por fora, embora por dentro meu coração já tenha dando mil e uma cambalhotas. Talvez eu deva tomar meus remédios. — Nem todas as garotas ficam babando por você, Noah.
— É Jacob… — Ele sorri e joga a cabeça para trás levemente, sobressaltando seu pomo de Adão. Quando morde o lábio para completar a pose, isso o deixa sexy. — Pelo amor de Deus, me chama de Jacob…
— Shhhh! — Pouso meu dedo sobre seus lábios, o calando. — Não fale em Deus, ou sua língua vai pegar fogo?
— Por que? — Murmura
— Porque você é o diabo, Noah Urrea.
Abro um sorrisinho, afastando meus dedos de sua boca antes que eu faça besteira. Noah sorri para meu comentário e, por mas que eu tente desviar, ele só se aproxima mais, me pressionando contra a grade das escadas. Levanto a cabeça para continuar olhando em seus olhos, sem quebrar o contato visual. Engulo em seco quando Noah me segura pela cintura, mas não quero que solte, apenas fico…nervosa. Droga, mãe.
— Então, talvez, meu trabalho seja fazer você pegar fogo… Any Gabrielly.
Seu hálito quente aquece minha orelha, distribuindo arrepios involuntários pelo meu corpo. Isso é gostosinho, principalmente quando o motivo é tes…
— Olha só, o meu pirata gostoso! — A voz de Sabina invade meus sonhos pervetidos e eu desvio o olhar do de Noah, saindo de perto dele o mais rápido possível.
Sabina está vestida como uma das coelhinhas da revista Playboy, com direito a máscara da Ariana Grande em Dangerous Woman e tudo. Noah olha para ela de cima a baixo, sorrindo como se não tivesse acabado de dar em cima de mim. Tento ignorar os dois, cruzando os braços e me sentindo uma segunda opção, sem nem ser uma das opções da lista. É por aí...
— Você tá gata… — Ele diz para ela, e a mesma se pendura no pescoço dele. — Mas desgruda.
Ergo uma sobrancelha quando Noah a empurra pelos ombros delicadamente, mesmo que agora ele passe o braço ao redor do pescoço dela. Aí, que vergonha.
— Você está linda, Any. — Sabina me observa, sorrindo com deboche. — Agora, se não se importa, vou roubar o meu pirata por alguns minutos…
Ela pisca para mim e morde o lábio inferior enquanto puxa Noah pela manga da camisa folgada. Eu espero os dois sumirem pela multidão, para só então me lembrar de como respira, e para sentir meu rosto corado voltar ao normal. Olho ao redor outra vez, sabendo que vai ser melhor se eu for atrás de Sofya. Não quero ficar sozinha dessa vez.
Atravessando o mar de pessoas, tendo que empurrar e pedindo várias desculpas por pisar em alguns pés, eu chego até a cozinha. Encontro Sof enfiando algumas bebidas dentro de um copo laranja, com desenhos de fantasminhas pretos. Me aproximo dela.
— Você estava demorando. — Digo e ela olha para mim, sorrindo.
— Não conseguia decidir entre vodka, uísque ou cerveja. Então misturei tudo! — Sofya ergue o copo no ar, rindo. — Um brinde ao halloween, seus otários!
Depois põem a mistura de bebidas pra dentro, e eu faço uma careta só de imaginar o gosto dessa coisa. Cerveja já não é bom, misturado com uísque e vodka então…
— Agora sim, dá pra seguir com a festa! — Ela solta um gritinho e depois sai me puxando mais para dentro da casa, onde rola a festa de verdade e todo mundo está bem…grudado? Calma Any, é só uma festa. Você pode se enturmar com eles bem fácil.
Respiro fundo, e Sofya me puxa até o sofá, onde se senta e termina de encher a cara com a mistura esquisita que ela fez. Pode crer que, daqui a três copos, ela já vai estar caindo de bêbada e vai ser eu quem vai ter que cuidar dela. Isso se não for o Noah.
— Você não vai beber nada? Nem comer se quer um doce? — Gritando para eu ouvir, ela se inclina e pega uma minhoquinha doce numa tigela em cima da mesinha de centro. — Qual, é, Gaby? É uma festa! Se diverte!
— E você quer que eu faça o quê? — Grito de volta, ainda olhando ao redor como se eu fosse um gatinho assustado.
Assim como eu, Sofya também passa os olhos pelo ambiente, mas ela parece mais como um predador atrás de sua presa. Um leão, caçando o cachorro que ameaçou o gatinho, que no caso sou eu. Que comparação bizzarra.
— Hummm…quero que você vá até lá — Ela aponta para um grupo de garotos conversando e analisando as garotas da sala, às vezes trocando risadas ou comentários, mas sem a coragem de irem até elas. — e roube a garrafa de cerveja na mão de um deles.
— O quê?! — Olho para a loira como se ela fosse louca, e ergo uma sobrancelha. — Por que eu não posso pegar uma garrafa de cerveja normal?
— Porque você precisa viver a adrenalina de uma festa! Vai lá, eu juro que você não vai se arrepender!
Estreito os olhos para Sofya, me perguntando mentalmente sobre a quantidade de festas em que ela realmente já foi, para saber tanto sobre "diversão". Ultimamente, tenho me questionado se realmente sou jovem, porque as coisas que as pessoas da minha idade consideram como "diversão" são extremamente irritantes.
Sei que a Sofya não vai me deixar em paz enquanto eu não fizer algo "maluco" para os meus padrões, então me levanto com um resmungo e atravesso a sala, indo em direção aos meninos usando fantasias baratas de esqueleto. Me sinto um pouco nervosa por fazer isso, buscando minha amiga com olhares furtivos, enquanto a mesma me incentiva com joinhas. Quando, enfim, paro de frente para os garotos, eles me encaram por alguns segundos.
— Humm…oi? — Diz um deles, o do meio.
Olho no fundo dos olhos azuis dele, como se fôssemos almas gêmeas, e depois roubo a garrafa de cerveja de sua mão. Sem sair do lugar, dou um gole longo e demorado na cerveja barata, segurando o máximo possível de ar. Ao invés de ficar irritado, o garoto ri e começa a gritar "bebe, bebe, bebe", gerando um couro de outras pessoas entrando para a rodinha.
Eu consigo beber tudo o que tem na garrafa.
Quando eu termino, começo a tossir e puxo o máximo de ar que meus pulmões permitem, já que fiquei um tempão prendendo o fôlego para virar a garrafa de cerveja. É horrível. Porém, nem tanto.
O grupo que se formou ao meu redor me olha com expectativa, enquanto o rap que está tocando, rola solto. Eu abro um sorriso e ergo a garrafa marrom e vazia no ar, os fazendo gritar de emoção.
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Três garrafas inteiras de cerveja barata depois, eu estou sentada no sofá, rodeada por rostos de alunos da Bridgton que eu nem reconheço, rindo tanto que minha barriga dói. Sofya está comigo, contando histórias e piadas sem graça, mas que fazem a galera rir que nem idiotas por causa da quantidade enorme de álcool em seus organismos. Isso inclui o meu.
A essa altura da festa – tipo, quase uma hora depois que cheguei – já está todo mundo de porre. Já vi um casal ou outro subindo as escadas, e eles não estavam se beijando, estavam praticamente se comendo na frente de todo mundo. E não no sentido sexual – sério, quem abre a boca estilo It: A Coisa pra beijar alguém? É nojento!
Noah também sumiu, mas não acho que ele esteja com a Sabina, porque acabei de ver ela andando pela sala, bêbada e rindo com os amigos. Ele deve estar comendo alguma garota aleatória por aí, ou sei lá, enchendo a cara… não sei e nem quero saber também. Ele é o idiota, que me faz sentir como "a outra", mesmo que nunca tenhamos se quer nos beijado, e nem namorar com a Sabina ele namora. Eu só quero entender o que ele quer comigo, por que o jeito como está agindo me deixa louca. E não é louca de tesão, como geralmente deixa.
Pisco algumas vezes, vendo tudo turvo. Acho que bebi um pouco demais. Até em tesão eu tô pensando.
Abro um sorriso preguiçoso e deito a cabeça para trás, segurando uma risada. Mas não adianta, porque ela escapa por entre meus lábios. A bebida deixa as pessoas idiotas assim mesmo?
— Vocês deviam ver como essa dentuça aqui era no fundamental. — Sofya se inclina na direção do nosso grupo, embolando as palavras enquanto finge cochichar e cai na gargalhada. — Só tinha dente e cabeça!
O grupo de bêbados inteiros começa a rir, inclusive eu, que me inclino e cuspo um pouco enquanto dou risadam. Isso só me faz rir ainda mais. O gosto da bebida em minha língua é amarga, mas, por algum motivo que eu não sei qual é, eu não consigo parar de beber. Talvez se eu tivesse um pouco mais de experiência com cerveja, eu soubesse beber, mas essa foi a primeira vez que tomei porre até ficar louca. Louquinha na cerveja barata e amarga feito açúcar queimado.
E, por falar em açúcar, talvez eu devesse comer algo, porque estou completamente de estômago vazio. Segurando minha quarta garrafa de cerveja e meia – porque essa estou dividindo com Sofya –, eu olho para a mesinha de centro, onde deveria ter as tigelas cheias de doces. Mas já acabou tudo. Faço bico.
Talvez tenha mais na cozinha.
— Aí, segura aqui…já volto.
Empurro a garrafa de vidro marrom contra o peito de Sofya, que o segura como se fosse seu próprio filho. Faço esforço para levantar, rindo do meu próprio fracasso, até conseguir ficar de pé. Está tudo meio turvo ainda, mais divertido de certa forma, e eu cambaleeio entre os pés enquanto caminho ainda mais para dentro da festa lotada. Eu já sou um pouco magra, então me espremer entre as pessoas para chegar na cozinha não é difícil, eu tenho pena é do meu tutu que está todo amassado agora.
Tutu. Que nome engraçado, parece até aquele barulhinho que os trens fazem. Tutu! Todos a bordo!
Me encosto no balcão e começo a rir igual a uma retardada, só por esse pensamento que é ainda mais retardado. Caralho…o que ta acontecendo comigo?
Ainda apoiada no balcão, fecho os olhos por alguns segundos e sinto tudo girar, apesar do efeito entorpecente do alcool me fazer sentir um pouco mais solta e corajosa; gosto disso. Volto a abrir os olhos e vejo uma bandeja com maçãs mergulhadas em caramelo, só que um caramelo com corante preto. Vou até lá e pego uma, mordendo um pedacinho que faz meu estômago roncar em agradecimento.
Hummm…delícia.
Mordo mais alguns pedaços, praticamente devorando a maçã em segundos que passam com a velocidade da luz. Tá, talvez eu esteja exagerando, mas que estou comendo rápido, isso é verdade.
— Calma aí, ou vai se engasgar! — Um Harry Potter para do meu lado e ri, mas eu preciso estreitar bem os olhos para reconhecer quem é. Josh. Nossa, ele fica gatinho vestido de Harry Potter.
— Ah…eu tô morrendo de fome. — Dou risada, mas até isso parece sonolento, arrastado, embriagado. Depois mordo mais um pedaço da maçã, sentindo o caramelo se dissolver na minha boca bem devagar. — Eu não sabia que tava na festa.
— E eu não sabia que você ficava bêbada. — Ele ergue uma sobrancelha, mas ainda está sorrindo para mim. Sorrio de volta; pelo menos ele não está me julgando por ter bebido demais. — 'Cê tá legal?
— Eu tô… — Continuo sorrindo e jogo meu corpo para o lado, encostando-me em Josh. Ele se assusta, mas não hesita em me segurar para que eu não caia. — Você é a pessoa mais fofa que eu já conheci.
Levanto o rosto, fazendo biquinho até meus lábios encostarem em sua bochecha macia, lhe dando um beijinho demorado. Josh fica praticamente imóvel, apertando meu braço como reflexo do meu beijo em sua bochecha. Solto uma risadinha larga e embriagada.
— Você ainda fica todo nervosinho perto de mim. — Digo a ele, tentando não rir mais ainda. — Isso é tããão fofo. Por que eu não consigo gostar de caras como você, Josh Beauchamp?
Em um minuto estou rindo, e em outro estou triste, fazendo até beiço. Agarrada ao corpo de Josh, eu levanto o rosto para ele e choramingo, apesar de não estar nem um pouco perto de chorar. Chorar é algo bem difícil pra mim, por mais que eu tente forçar às vezes, é como se eu não tivesse lágrimas o suficiente no nem corpo para tal evento dramático.
— Olha, você bebeu demais. — O loiro me segura pelos ombros, desgrudando seu corpo do meu. — Melhor sentar e tentar ficar sóbria. Que tal?
Nego com a cabeça e abro um sorriso maroto, roubando seus óculos redondos de Harry Potter. Não tem nem lente falsa, apenas dois buracos enormes na direção dos olhos, o que não faz diferença, porque ninguém repara nisso dentro de uma festa. Josh suspira e eu faço uma cara séria, tentando imitar o Harry falando – gritando – Expecto Patronum. Minha varinha é uma barra de alcaçuz molenga.
Desato a rir feito doida, abaixando minha "varinha" e apontando para Josh.
— Parece um pau murcho. — Digo entre risadas. Não, gargalhadas. Minha risada frouxa de bêbada chega me deixa mais fraca. — Olha, olha, olha…um pau murcho de velinho.
Josh desvia o olhar e segura a risada, e eu sei disso, porque suas bochechas se curvam para cima e tremem um pouco, enquanto ele deixa escapar pequenos resmungos de risada. Continuo balançando o alcaçuz na frente do rosto dele, gritando "pau murcho" igual a uma idiota, até, enfim, Josh começar a rir comigo. Explodo em gargalhadas, me encostando nele, toda molenga.
— Tudo bem, ok, foi engraçado. — Ele me segura pelos ombros outra vez, me olhando nos olhos enquanto alisa meus braços nus. Droooga, perdi minha jaqueta de couro. — Mas você não devia beber assim.
— Qual é! Você tá parecendo minha mãe! — Lhe dou um empurrão leve no peito, mas isso nem faz cócegas nele. — É uma festa, me deixa!
Estou falando que nem a Sofya agora.
Abro os braços e cambaleeio para trás, toda sorridente…
Até sentir um líquido estranho molhar todo o meu tutu. Esbarrei em alguém. Me viro, e o garoto vestido de Zorro pede desculpas, mas vai embora zanzando todo torto antes que eu comece a xinga-lo. Se bem que a culpa é toda minha, mesmo. Resmungo baixinho, sentindo o tecido do tutu pesar com o líquido que o ensopou.
— Você tá legal? — Josh ergue uma sobrancelha pra mim.
— Uhum…só preciso me limpar. — Olho para ele — Vou no banheiro, e volto já.
— Quer ajuda?
— Não, não…obrigada.
Lhe dou um tapinha no rosto – isso mesmo, no rosto – e saio andando toda torta, igual ao Zorro que me ensopou com a bebida gelada e de cheiro estranho. Me espremo entre as pessoas fantasiadas, me apoiando em todos os móveis e paredes possíveis enquanto caminho, porque está tudo girando diante dos meus olhos, e a sensação é horrível. Até alguns minutos atrás, estar bêbada era a melhor coisa do mundo, agora é como se eu tivesse batido a cabeça e não conseguisse nem me situar de onde estou.
Subo as escadas para o segundo andar, agarrada na grade para evitar esbarrar nos casais que estão se pegando. Deveria ser um crime deixar as pessoas se pegarem nas escadas; é nojento e pega a maior parte do caminho. Já lá em cima, eu resmungo ao notar o tamanho da fila para o banheiro. Parece que todo mundo sentiu uma enorme vontade de mijar agora. Não tô afim de esperar tudo isso, porque a umidade na minha fantasia já está incomodando. Por cima de toda a embriaguez, me lembro que Sabina tem um banheiro só dela no quarto. Espero que não esteja trancado, porque é pra lá que eu vou.
Mordo o lábio inferior, olhando para ver se ninguém está me observando, e então entro no corredor onde ficam os quartos. O dela é sempre o mesmo, perto da escada para o sótão. Apoio a mão na parede, contando a quantidade de portas, até achar a porta número 5; o quarto da Sabina. Por favor, que seja esse. Por favor, que não esteja trancado. Por favor, que não tenha nenhuma orgia acontecendo lá dentro.
Giro a maçaneta e empurro a porta do quarto, que abre sem muito esforço. Para minha sorte, ele está bem vazio e tranquilo. Sorrio e fecho a porta, me sentindo meio estranha por estar aqui de novo.
Josh e eu já passamos muitos verões aqui, junto com Sabina. Sempre vínhamos nas semanas de 4 de Julho. A gente nadava no lago, brincavamos no bosque e às vezes nos escondianhamos no sótão quando queriam nos fazer ir dormir cedo. Era divertido, e, naquela época, eu sentia que a amizade que tínhamos duraria para sempre; seríamos eu e eles dois até morremos. Mas isso obviamente não aconteceu.
Talvez tenha sido melhor assim.
O som da festa está abafado atrás das paredes do quarto, e isso me faz sentir um pouco menos tonta. Ainda sim, caminho com cuidado. Toco os objetos na penteadeira da Sabina, até achar a caixinha de jóias antiga dela. Ela sempre adorou a musiquinha que tocava quando a abria – To a Wild Rose, um som em piano muito relaxante. Abro a caixinha e a bailarina começa a virar ao som dessa música, me fazendo abrir um sorrisinho. Além dessa relíquia, encontro a pulseira da amizade que eu fiz pra ela um pouco antes do transplante de coração. Ela bordada com linhaa roxas e azuis, enquanto a que Sabina fez pra mim é bordada com linhas laranjas e amarelas. Em ambas pulseiras, há um pingente de coração, que se completam quando estão juntas.
Na época, pareceu ser a coisa mais linda do mundo, mas agora é brega. Então por que estou com os olhos marejados? Fecho a caixinha, interrompendo o som da música antes que comece a chorar.
Eu não choro, ainda mais estando bêbada; é patético.
Fecho a porta do banheiro enquanto tiro meu tutu, sabendo que vou passar o restante da festa usando só um collant apertadinho. A ideia não parece ser muito boa. Na verdade, acho melhor já ir embora, porque tenho que estar em casa até meia noite e já é quase onze e meia; o caminho é longo.
Jogo o tutu em qualquer canto, enquanto olho meu reflexo no espelho. Minha maquiagem não está tão horrível assim, pra falar a verdade, ela parece tão boa quanto na hora em que cheguei. Ao contrário de mim, um monte de outras garotas já estão com os cabelos estufados e com o rímel borrado. É isso, ou estou tão bêbada que nem consigo enxergar meu rosto do jeito certo. Para ter certeza, estreito os olhos e me debruço sobre a pia, tentando me enxergar mais de perto.
Não, eu não estou ruim mesmo.
Quando me abaixo para pegar o tutu e ir embora, ouço a porta bater e vozes preencherem o quarto. Arregalo os olhos pelo susto; merda. Me aproximo um pouco mas dá porta do banheiro, tentando ouvir quem são as pessoas lá fora. Se eu tiver sorte, talvez eles estejam tão bêbados, que apaguem antes mesmo de conseguirem começar a transar.
— Eu não consigo te entender, Noah. — Porra, é a Sabina. — Por favor, me ajuda a decifrar o que você tá pensando; está me confundindo.
— Caralho, Sabi, eu já disse pra você que eu não namoro. Para de se intrometer na minha vida.
— Você é muito sem noção mesmo, né? É óbvio que eu vou me intrometer na sua vida; eu transo com você Noah. Isso é muita intimidade pra mim, sabia?
— É mesmo? Pra mim não.
Engulo em seco, sabendo que é melhor me afastar da porta antes que acabe escutando o que não deveria. Mas eu não consigo.
— Isso é por causa daquela garota, não é? — A voz de Sabina se torna mais áspera e irritada. — Argh, Noah! Pelo amor de Deus, o que você viu nela? Se eu consegui tirar ela da minha vida quando éramos crianças, você pode muito bem fazer isso agora também. Não é difícil, sabia?
O quê? O álcool no meu estômago se revira, e eu começo a sentir o peso de ter comido muita pouco. Penso naquele em que Noah tentou me beijar, na casa dele, e nos elogios tão repentinos. O que está acontecendo?
— Ela frequenta minha casa, mais do que eu mesmo. É claro que é difícil esquecer uma pessoa que vejo todos os dias. — Posso até ouvi-lo suspirar. — E não estamos falando da Any…
— Ah, estamos sim, senhor! Como pode se interessar por uma garota como ela, enquanto você e eu estamos juntos já faz anos? Tipo, como conseguiu esse feito? Sério, ela põem pra correr todos os caras que chegam perto dela.
Eu não faço isso! Ou faço?
— Ah...espera aí! — Sabina ri com deboche, e posso imagina-la pondo as mãos nos quadris. — Era por isso que o Bailey estava implicando com você, não era? Dizendo que você não pegava ela nem em mil anos, porque ela não gosta de você.
Mentira, eu gosto dele. Hã? Quanto mais ouvi a conversa deles, mais ansiosa fico, chegando a roer as unhas que eu pintei de preto ainda ontem.
— Cala a porra da boca, Sabina! Eu não quero você falando da Any assim, e nem quero que espalhe coisas sobre esse assunto por aí, escutou bem?
— Não acredito que está jogando tudo fora por causa dela. Não acredito que está jogando nós dois fora por causa dela. Isso é sério mesmo, Noah? Todo mundo sabe que formamos um par excepcionalmente bom, só estão esperando pela confirmação.
— Bom, vão ter que esperar sentados. Nosso relacionamento não é nada além de sexo, e eu sempre deixei isso muito claro, desde o início. Você não pode simplesmente começar a agir como se fosse minha namorada, como fez lá embaixo, Maria Sabina!
— Não me chama assim. — Ela odeia ser chamada de Maria Sabina. — Escuta bem o que eu vou te dizer, Noah; quando garotas orgulhosas e metidas a duronas como Any Gabrielly começarem a perceber que você é um babaca de merda, você vai voltar correndo pra mim, e eu vou dizer "eu te avisei". Além disso, conheço você bem o suficiente para saber que vai se enjoar dela na primeira noite.
Alguns segundos de silêncio dão espaço para que eu ouça a música da festa, e em seguida alguém bate a porta do quarto com força. Espero com todo o meu coração defeituoso que tenha sido a Sabina. Respiro fundo, mantendo o rosto perto da porta, tentando ouvir mais alguma coisa. Está muito quieto lá dentro, o que me deixa com ainda mais medo de sair daqui. Que ideia genial de se trancar no banheiro, Any.
Começo a andar de um lado para o outro, me perguntando o que fazer. Mas não consigo nem andar direito, de tão bêbada, quanto mais pensar em alguma coisa pra me tirar daqui. As únicas palavras que vêm na minha mente, são as da conversa entre Noah e Sabina. Aquela conversa bizarra, sobre ele não querer namorar com ela, sobre pensar em mim… Argh, é muita coisa para uma pessoa só.
Volto a me sentir tonta outra vez, o álcool subindo aí cérebro. Estico o braço para me apoiar na mármore da pia, mas ao invés disso derrubo todos os cremes para cabelo dentro da pia. Merda. Fecho os olhos, esperando que eu não tenha feito tango barulho assim, ou que não tenha ninguém lá no quarto…
A porta do banheiro se abre com um rangido, batendo contra a parede. Levo um susto e olho para Noah, que parece confuso, ou até mesmo irritado. Ao perceber que sou apenas eu, suas sobrancelhas relaxam, assim como seus ombros, e ele afrouxa o aperto dos punhos.
— Any? — Ele me olha com os olhos castanhos esverdeados confusos, e eu abro um sorriso amarelo.
— Oi, Jacob…
Nossa, eu chamei ele de Jacob, tipo, pela primeiríssima vez na vida.
— O que tá fazendo aqui? — Pergunta
— Hã... — O que eu digo?! Tipo, tenho um ótimo motivo para estar nesse banheiro, mas minha embriaguez e meu nervosismo atrapalha meu sistema de dicção. É horrível. Nunca mais vou beber desse jeito. — É…tutu, bebida, zorro. — É o que consigo dizer, enquanto gesticulo.
— Pera aí, o quê?
Encaro Noah sem saber mais o que dizer, sentindo meus batimentos cardíacos acelerarem. Me apoio na pia, tentando me manter firme, apesar do arrepio subindo pela minha espinha. Estou com um estranho pressentimento sobre esse momento no banheiro da Sabina.
— Esquece. — Noah balança a cabeça, provavelmente cansado de esperar por uma resposta que faça sentido. — Você…você ouviu alguma coisa?
Olho para o quarto vazio da Sabina, como se a própria estivesse de pé ali, e depois engulo em seco antes de olhar de volta para o Noah. Afirmo com a cabeça.
— Porra… — Ele tira o chapéu de pirata da cabeça e passa a mão nos cabelos, que hoje estão mais desarrumados do que o normal. Combina com a aparência de pirata. — O que você Ouviu exatamente?
— Você e a Sabina precisam de um terapeuta de casal. De nada, tchau.
Abro um sorrisinho forçado e debochado, tentando sair do banheiro para ir embora. Mas Noah apoia o braço na batente, se encostando nela para evitar que eu consiga passar.
— Ai, meu Deus! — Exclamo quando quase dou de cara contra seu peitoral. Literalmente.
Levanto a cabeça, encarando Noah com o rosto a poucos centímetros de distância.
— Eu e a Sabina não somos a porra de um casal. — Ele diz entredentes e irritado. — Por que todo mundo acha isso?
— Vamos ver…bom, vocês estão sempre juntos, ela tá sempre grudada com você nos lugares, vocês transam o tempo inteiro, vão ao cinema juntos às vezes e ela te beija quando bem entender. — Digo, enquanto vou listando dedo por dedo. — Eu acho que isso é um namoro.
Tento sair outra vez, mas Noah continua me impedindo.
— É, mas a gente não tá namorando. Qual é? O que eu tenho que fazer pra convencer as pessoas do contrário?
Dou de ombros.
— Parar de transar com ela, talvez? Você já é um galinha mesmo, vai sobreviver.
— Um "galinha"? — Ele ergue uma sobrancelha. — Cite um exemplo em que eu fui galinha.
— Sábado passado, você trocou nosso trabalho para ir transar com a Sabina ou sabe-se Deus lá o quê. E eu já vi você embaixo das arquibancadas, se pegando com uma das líderes de torcida, depois do jogo.
— Era a adrenalina pós-jogo circulando no meu corpo. — Ele inclina a cabeça na minha direção, sorrindo de forma perversa, e segura meu pulso com delicadaza, alisando com o polegar exatamente onde posso sentir minha pulsação forte e acelerada. Isso me…acalma. Surpreendentemente, não fico ainda mais nervosa do que já estou. — Você tá bêbada, não tá? Posso sentir o cheiro de cerveja.
— Eu tô, e daí? Você também tá.
Noah nega com a cabeça.
— Já disse que eu não bebo quando trago a Sofya nas festas comigo. — Sof…Sofya! Meu Deus, tinha me esquecido completamente dela.
— Eu tenho que ir…
Minha terceira tentativa de sair é falha outra vez. Talvez eu não esteja tentando sair o suficiente, porque no fundo eu não estou afim de voltar lá pra baixo.
— Não, não vai. — Se qualquer cara me dissesse isso, eu chamava a polícia, mas Noah fala de uma forma tão aveludada e gentil…chega fico quente e arrepiada. — Eu te devo algumas respostas, lembra?
Ele sussurra no meu ouvido e eu afirmo com a cabeça. Tinha me esquecido disso.
Depois de fechar a porta do banheiro, Noah me segura com uma mão pela cintura e com a outra pela nuca, mantendo nossos corpos próximos como nunca antes. Sua respiração quente e pesada encontra a minha, criando atrito entre as duas. Ao passo em que ele se inclina para baixo, na minha direção, sinto o hálito fresco e doce de bala e um pouco de vodka com cereja. Vodka com cereja. Eu conheço bem o cheiro.
— Estou esperando por elas. — Sussurro enquanto olho para seus lábios. Noah passa a língua entre eles, rapidamente, e eu solto um suspiro.
— Você é muito linda. — Ele sussurra de volta e roça o nariz no meu. Não acho que seja essa a resposta que prometeu, principalmente pela maneira como seus olhos me encaram com tanta intensidade. Mas eu não ligo mais para essas perguntas idiotas. — Não sabia que tinha sardas.
Seu polegar da mão esquerda acaricia minha bochecha, exatamente onde eu sei que estão as pintinhas bem clarinhas, quase do tom da minha pele. Nossos olhares se encontram, e um segundo depois não consigo parar de observar seus lábios rosados tão próximos dos meus, que estão formigando intensamente. Noah morde o inferior e sorri.
Nesse momento, eu juro, todos os avisos sobre Noah Urrea que eu me fiz mentalmente foram esquecidos, e o álcool no meu sangue e os hormônios tomam conta do painel de controle do meu bom senso.
Agarro Noah pela nuca e fico na ponta dos pés, o beijando de forma bruta.
all for us
7274 palavras....senhor passei mal.
seguinte, pelo capítulo de hoje ter sido enorme, vou soltar só ele hoje, amanhã já venho com 3 de uma vez, amaram o lacre? boa noite, xuxus 💜🦋
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