
𝑻𝒘𝒆𝒏𝒕𝒚 𝑬𝒊𝒈𝒉𝒕
[Nome] ficou olhando para o corredor por tempo demais para ser normal, ainda digerindo que tivera uma briga com Takemichi, e quase teria se esquecido dos outros se Manjiro não tivesse atraído sua atenção ao se inclinar.
— Ótimo, vamos falar os detalhes? — perguntou, porque a última coisa que queria era demonstrar que não estava lidando bem com a situação, principalmente na frente deles, que esperavam tê-la na gangue.
— Não tem muito o que falar, vamos apenas fazer da mentira uma realidade. Você vai ficar na quinta divisão como um membro que teve a estreia adiantada pela briga na festa do Mitsuya.
Algo no tom de Draken fazia parecer que aquela era apenas uma rotina para eles, mas não gostou da casualidade, ainda mais quando pesou a sutil lista de superiores que acabara de ganhar, que ia desde ele próprio, como seu vice-comandante, até Sanzu, que era vice-líder da divisão.
Nenhum dos dois morriam de amores por ela e tinha Takemichi, que deixou bem claro seu posicionamento acerca da decisão tomada ao sair batendo os pés.
Não era nada bom ter aquela torre de pessoas como “chefes”, porque, com isso, também significava que poderiam restringir suas ações para favorecê-los de alguma forma ou apenas para seu bel prazer.
Bastou uma pequena mordida no lábio inferior para se arrepender um pouco de ter aceitado entrar na Toman tão precipitadamente.
— Não precisavam de três pessoas para me dizer isso. O que mais vocês querem?
— Essa é uma pergunta muito vaga. Quer especificar, amor? — novamente, Manjiro sugeria mais do que dizia, de fato, mesmo que sua expressão fosse tranquila.
Era algum dom que ele tinha ser inconvenientemente sutil em momentos inapropriados. Flertes não deveriam ser pauta ali, e dessa vez, Sanzu notara, revirando os olhos com um ar de aborrecimento.
— Claro que agora vamos focar em Hidetaka e em o que você sabe sobre ele.
— Nada, praticamente — [Nome] colocou a xícara de volta na mesa. Se fosse buscar informações, levaria um tempo que estava disposta a ceder — comecei a investigar agora, só sei que é irmão adotivo de Junichi, que não se davam bem e que não se viam a anos.
— Por que se dar o trabalho, se sabia da relação horrível deles?
— É fácil fingir uma coisa pública. É o que acontece quando não tem ninguém por perto que me interessa — respondeu a pergunta de Draken, virando um pouco para encará-lo.
— Também foi uma perda do seu tempo, a gente já investigou Junichi e não tem nada. Está limpo.
— Como investigaram?
— De todas as formas, além do mais, ele não tem motivo para trair a gente — Sanzu disse com um suspiro em resultado a sua insistência.
— Traição não precisa de motivo, basta ter vontade — segurou o olhar dele por um momento antes de decidir cessar um pouco com as perguntas e dizer algo que acrescentasse — Junichi tem tudo que Hidetaka poderia querer: contatos, dinheiro e a vantagem de um relacionamento ruim como cortina.
Manjiro se apoiou ao lado dela na mesa com uma postura despojada demais.
— Quando começamos a desconfiar de Arata, Junichi foi o primeiro a ficarmos de olho exatamente por esses motivos, amor. Mas não estavam juntos.
— Então alguém com quem não tenha laços — se a situação fosse outra, teria dado alguma atenção ao fato dele estar invadindo seu espaço pessoal, mas não importava muito no momento — vocês têm algum suspeito de quem possa estar com Hidetaka agora?
— Hanma — Draken contou. Ela associou a problema, pelo o que havia entendido.
— Quem ele é?
— Era de uma gangue inimiga nossa que se dissolveu há muitos anos — o Sano disse com uma pitada de desdém — eles tinham um chefe secreto e Hanma Shuji era seu representante oficial.
Aquela era uma richa muito antiga, e se eles estavam nessa depois de todo esse tempo sem resolverem, significava que Hanma conseguiu apoio com outra pessoa após o final da gangue. Alguém importante. Ou o líder poderia ter morrido e Hanma assumido o controle.
[Nome] não queria se aprofundar em assuntos tão densos ligados a Toman, contudo, agora que se ligara a ela, querendo ou não, compartilhavam os mesmos inimigos. Considerando em silêncio com os braços apoiados na cadeira, deixou-se vagar pela imagem do homem com a tatuagem de pássaro.
Talvez ele fosse Hanma Shuji? Ou seu próprio líder? Talvez, se ela não fosse tão imaginativa, aquele homem não seria nada mais que um sócio que ninguém ligaria se sumisse.
— Pessoas não somem — começou, sua voz calma não combinando com o que sentia realmente — Hidetaka está em algum lugar. Só temos que procurar direito.
— Cobrimos toda a área de Osaka, onde o carro dele foi abandonado, mas não achamos nada — Ken informou, mantendo o foco na superfície brilhante da mesa — nem registros de hotéis ou carros alugados.
— Ele pode ter ido embora — pensando no período que ficou investigando os franceses, percebeu que o Sato poderia ter fugido nesse meio tempo, mas Ken negou.
— Não foi, a gente está de olho nos aeroportos desde que descobrimos o que aconteceu com você. Ninguém como ele entra ou sai sem que fiquemos sabendo.
Aquilo era bom, e tirava muita coisa do caminho, mesmo que, sem saber, Draken tivesse entregado de bandeja algo que a fez querer sorrir pela primeira vez naquele dia.
Só teria que mover uma peça aqui e ali com algumas palavras bem pensadas e, se possível, a ajuda inconsciente de Manjiro.
Mas era algo para ver depois, no momento, teria que focar em outras coisas mais importantes.
— E as casas? Imóveis comprados há muito tempo, que estejam no nome dele ou de alguém suspeito — sugeriu, e viu quando os três se encararam em busca de alguma resposta — sei que já descartaram Junichi, mas ele deve ter muitas propriedades que Hidetaka pode ter acesso fácil.
O silêncio durou pouco, mas o meio olhar que o Sano lançou a ela se estendeu por mais que o necessário antes de falar de novo, diretamente para Draken.
— É melhor chamar o Mitsuya e o Hakkai, ver a área que já cobrimos, passar a limpo, e procurar de novo.
Quando ele concordou, [Nome] pôde sentir alívio por terem aceitado tão facilmente. A princípio, julgou que seria impossível ser ouvida por diversas razões, além da própria experiência e de ter acabado de ser incluída naquele círculo. Já planejava argumentos para debater seu ponto, mas não foi preciso.
Manjiro simplesmente validou. Por falta de opções ou não, não importava.
Ken, que ela erroneamente achou ser o primeiro a fazer protestos, apenas fez um gesto afirmativo antes de ligar para Mitsuya.
Foi algo extremamente pequeno, mas encerrar a conversa sem ter que pressionar os próprios nervos foi uma vitória genuína. Ficar ali e esperar não era algo que queria, iria ao menos trocar de roupa e renovar os sentidos em um lugar menos tenso.
— Eu já volto — foi o aviso que deu ao sair, não esperando, mas notou imediatamente que Manjiro virou sutilmente para lhe dar espaço.
O barulho da TV ligada foi aumentando enquanto se aproximava da sala, vendo o cobertor fino que Takemichi usava quando ela acordou. Parecia que ele passara a noite acordado resolvendo coisas que pediu para não ser sobre si.
Seu primo permanecia ocupado desde que se recuperara do tiro que levara, colocando coisas em ordem e passando horas fora de casa. O encontro com Hinata deveria ter sido uma suavização de todo o estresse. E fora arruinado por tão pouco.
Ir correndo resolver as diferenças não era o melhor, não quando estavam tão firmes nas próprias razões que nada frutífero renderia de uma conversa. Hanagaki era uma das pessoas mais obstinadas que conhecera.
O problema era que o gene estava na família.
Foi com pensamentos conflitantes que entrou no closet de seu quarto, ainda dividida se valia a pena abrir uma caixa antiga de seu passado de maneira literal. Mas já estava com o veludo nas mãos ao tirar a tampa da caixa que havia colocado perto dos sapatos, hesitando de uma forma quase patética ao ver a escova entre os papéis de seda branco que eram usados como revestimento interno.
Devagar, ela segurou o cabo rosa perolado, com desenhos delicados subindo pela estrutura, com cerdas macias, mais finas que as de um pente e mais suave que seu próprio cabelo. Parecia uma pena em sua mão.
Era ridículo a ideia de um simples objeto a sentenciar a uma desconsolada angústia, mas Takemichi desenterrou coisas ao mencionar o que não deveria.
Fazendo-a lembrar da única coisa que tinha de Kei.
Um dedo traçou seus desenhos, subindo e descendo para fazer um ruído com a unha. Ainda era tão bonita quanto no dia em que a ganhou, e não era atoa que a maravilhara quando criança, porque era idêntica a uma peça retratada nos livros de história como pertences da realeza.
A beleza a cativou, mas a [Nome] de oito anos teria ficado menos emotiva se não tivesse recebido o presente em tal momento delicado, depois de ter passado dias de castigo em consequência a briga na escola, pisando em ovos perto de Mizuki para não merecer outra de suas lições, o qual sempre acabava com ela usando vestidos floridos de manga longa e meias calças para esconder as marcas roxas e vermelhas que vergonhosamente carregava.
Teve que piscar para que Kei não visse os olhos brilhantes em lágrimas ao pegar a escova da caixa que ele segurava.
— Por que está me dando um presente? — havia perguntado, se sentindo pequena e desconfiada — se isso é um pedido de desculpas por ter viajado sem me contar, saiba que não aceito suborno.
Uma das poucas coisas que lembrava sobre ele, era que dificilmente sorria, mas sempre se agachava para que ficassem na mesma altura quando conversavam.
— O que uma pirralha como você sabe sobre suborno?
Fizera tanto esforço para relembrar algum resquício do timbre autoritário dele na memória que a frustrou com o que recebeu. Era apenas um eco do que deveria ser. Não o que queria.
— Sei que é pouco para você me comprar.
— Não quero te comprar, garota — a imagem que tinha dos olhos dele era turva e inadequada — e o que é isso? Passo uma semana fora e você esquece como falar com os adultos?
Kei tinha autoridade como segurança pessoal de Ichiro, mas o título não a impediu de expressar sua indignação.
— Foram dezesseis dias! — defendeu, segurando firmemente a escova entre os dedos pequenos — e você não contou, então valem muito mais.
— Muita coisa aconteceu com você em dezesseis dias, não é? — fechando os olhos, os cílios de [Nome] ficaram úmidos com as lágrimas contidas, então fez uma careta para disfarçar.
— Eu dei conta.
— Não deveria dar. Sabe quantos seguranças você tem à disposição? Eu estou à sua disposição — da careta que fazia, ela fez um infantil e baixo “humph” — Mas você está se tornando cada vez mais uma versão feminina de Ichiro, querendo resolver tudo sozinha.
— Isso é um elogio?
— Será? — logo, a caixa estava nas mãos dela, o veludo quase acariciando seus dedos — Você sabe que quando eu vou, eu sempre volto. Mesmo que demore muito tempo. Então não fique mais com raiva de mim.
[Nome] se viu apoiada contra um dos vidros do closet, lambendo os lábios vermelhos pelas ocasionais mordidas com o intenso e aterrador sentimento de insatisfação por não lembrar mais do que isso.
O quão desafortunada poderia ser, para guardar tão vividamente coisas horríveis que a faziam perder o sono, mas esquecer momentos incríveis com o mais perto de um pai que tivera?
Não era justo.
Não podia buscar conforto em nenhuma memória mais antiga, que eram distorcidas, mas marcantes. Como sua figura sentada na plateia em suas apresentações de balé, ou quando desafiava a vontade de Mizuki e ia visitá-la apenas para entregar presentes ou levá-la até a casa de seu avô.
Tudo ficou estranho depois que ele lhe entregou a escova, suas viagens ficaram tão frequentes que quase não o via mais.
[Nome] se perguntou quando as coisas começaram a dar errado; ou nada nunca esteve certo, realmente.
Assim como as explicações miseráveis de sua mãe sobre o acidente que conseguiu tirar a vida de duas pessoas que amava tanto, falando de Ichiro como se ele fosse um desconhecido que teve a morte anunciada no jornal, e Kei… Ela engoliu a ardência na garganta quando lembrou do tapa que ganhara por ter perguntado sobre o que fora feito de seu corpo, se, por acaso, tinha uma lápide dele no cemitério da família, onde deveria ficar.
E a resposta foi pior do que poderia pensar; não teria uma para deixar flores depois que ela recebesse alta do hospital. O carro destruído foi achado pelas autoridades na manhã seguinte ao acidente junto do corpo de seu avô, mas Kei, segundo especulações, desceu o rio ligado ao mar.
Não tinha como ter sobrevivido, mas por dias, esperou que uma enfermeira viesse lhe contar que o acharam com vida em algum litoral. E nunca vieram, nem com boas ou más notícias, como um caso arquivado no fundo da gaveta.
[Nome] se sobressaltou ao ouvir o barulho de uma moto, indicando que alguém havia chegado. Mitsuya, provavelmente. Suspirando pesadamente, se obrigou a dar importância ao agora.
Girando a escova na mão, ela a segurou de cabeça para baixo, observando a ponta afiada no cabo enquanto voltava ao quarto, sentindo-se um pouco mais confiante do que apática.
Aquela escova não era apenas algo que um amigo falecido dera, mas também algo que simbolizava o início de uma nova vida.
A ironia de ter escapado da morte na mesma noite que Kei e Ichiro morreram era desgastante, mas não a deixava esquecer de que significava mais que isso.
Tentavam tirar coisas dela há muito tempo, e mesmo pequena e adormecida nos próprios lençóis, não conseguiram.
Não deixaria agora com tanto avanço; iria continuar, achar o que queria e matar quem deveria.
Como repetiu a si mesma todas as noites esquecida na cama do hospital. Como disse quando se viu sozinha em um país novo com dores para cicatrizar e como diria sempre que precisasse, para quem quisesse ouvir ou não.
Não levariam mais nada.
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