𝑻𝒉𝒊𝒓𝒕𝒚 𝑻𝒘𝒐
Minutos depois da ligação de Adrien, enquanto se arrumava o melhor que pôde para não parecer desleixada, [Nome] contemplou que estava nadando em águas turvas.
Ou melhor, em duas águas diferentes, com um pé pousado no mar tempestuoso e perigoso da França, e o outro mergulhado naquele oceano de tramas do Japão.
O que a deixava inquieta era que não importava para que lado mergulhasse, não se sentia segura em nenhum deles. Coisas que não conhecia surgiam de todos os lados, e ser isenta do controle não a agradava; Não saber o quanto Manjiro sabia a fazia morder o interior de sua boca.
Até onde se estendia o seu conhecimento sobre a vida dela? Quem teria dito algo relacionado a ponte a ele? Ninguém além de Marcel e sua trupe de idiotas cruéis. Seus dedos apertaram a pele macia que segurava, uma raiva confortável se instalando em seu peito.
— Sempre tão delicada, não é?
O riso de Takuya a fez voltar a encará-lo, notando que estava pressionando as unhas em seu antebraço com força demais para ser considerado carinhoso. Forçando um meio sorriso, afastou-se de seu meio abraço.
[Nome] precisava de uma distração, qualquer coisa que a puxasse de todos os cenários obscuros sobre como iria esfolar Manjiro Sano se ele estivesse tentando fazê-la de boba, e em como gostaria disso.
— Com você eu sempre sou — brincou, escondendo a morbidade por trás de um tom falsamente doce.
— Não vamos flertar agora, ou vou te pegar emprestada e demorar para devolver.
— Poderíamos escapar por cinco minutos.
Não notariam sua ausência se o fizesse, não quando não estava fazendo muito para ser agradável. Sanzu e Draken não se importavam com sua presença, seu primo dispensava comentários e Manjiro parecia ter achado outra coisa com o qual mexer. Não foi surpresa ele não ter tentado falar com ela — fosse pela dispensa de mais cedo ou pela mulher inegavelmente bonita.
— O que aconteceu entre você e Takemichi?
— Depende do que ele te falou.
[Nome] imaginou o que resultaria em uma conversa entre os dois, e o incômodo de seus pensamentos se misturou com o enjôo que sentiu pelo odor forte de comida pronta. Aqueles cinco minutos longe pareceu ser o ideal.
— Sobre você não saber o que está fazendo, mas acho que é o contrário, não é?
A resposta a fez rir, quase concordando. Ela sabia, o problema era que não se importava; se achava no direito de continuar. Mesmo que um passo em falso e levasse para um poço que não tinha certeza se conseguiria voltar.
Admitir isso a faria parecer patética, perdida.
E o tanto que fez para não ser relacionada com nenhuma dessas coisas ainda estava muito vivo. Todas as aulas, todos os pés machucados, os ossos quebrados. Nada parecia ser o suficiente para mostrar a Takemichi que ela não era fraca, que apesar de não merecer sua confiança, também não deveria ter sua compaixão.
[Nome] massageou a própria nuca, se perguntando por quanto aquela situação se estenderia. Mizuki a extraditou como uma mercadoria defeituosa por muito menos. E ela lhe deu a luz. Não demoraria para ser despejada novamente.
— Eu vou procurar ele, já que não fui chamado aqui para participar de nada — Yamamoto sorriu, apesar da pequena tensão que ficou.
— E veio apenas me ver? Que gracinha — a provocação veio naturalmente, ocultando a sensação de desânimo que sentia.
— Apesar das inúmeras coisas que quero fazer com você, não deixamos de ser amigos — seus dedos passaram pelos cabelos dela, quase com carinho — ainda pode falar comigo. Sobre qualquer coisa.
Imagens de quando Takuya era apenas um menino medroso que ficava encantado por uma garota lutar tão bem que colocava medo até nos adolescentes mais velhos passou por ela.
Mesmo antigamente, as mentiras já se derramavam de sua língua com uma facilidade pecadora. A procedência de seus machucados? Encobertas por mentiras. As semanas que passou no hospital? Outra mentira. Mentira e mentira.
[Nome] engoliu em seco, buscando o que dizer, e quase agradeceu a Deus por não precisar, porque Manjiro e Sanzu voltaram para atrair a atenção de todos. Como se soubesse que haviam acabado, Yamamoto a olhou uma última vez antes de sair, a deixando com coisas entalada na garganta.
— Estou acabando — Mitsuya informou, franzindo um pouco as sobrancelhas para Draken, que estava prestes a colocar pressão.
Esperar sem fazer nada iria enlouquecê-la, seus desejos giravam em torno de uma deliciosíssima garrafa de vinho, fechada e de qualidade impecável.
Assim que Mitsuya arrumou o tablet, deixando a tela mais acessível ao toque, [Nome] deu a volta na mesa, se inclinando sobre seu ombro para olhar a imagem do mapa do Japão em detalhes, com círculos vermelhos em alguns pontos.
— Essa é a região que cobrimos — Haruchiyo explicou, com os braços cruzados.
— Esses azuis são coisas que o Sato tem posse — Takashi deslizou um dedo na tela, e marcações novas apareceram. Menos que as vermelhas, mas ainda eram abundantes — as casas dele, salões comerciais, lojas, tudo que está em seu nome.
Um murmúrio de confirmação escapou dela, analisando como as localizações estavam dispostas em uma escala que levava desde uma ponta do país a outra, e se estendiam extensamente pelo litoral, em uma sincronia que circundava as docas perfeitamente.
Outro som baixo saiu de sua boca, dessa vez um de compreensão. De quê, ainda tentava descobrir, mas parecia quase… Estratégico. Ou estava delirando, buscando coisas onde não havia para preencher sua necessidade insaciável de controle.
— O que é isso? — ela indagou, sinalizando para uma cidade marcada com um comentário no sistema. Em Osaka.
— Um negócio que eu estava trabalhando mais cedo, não tem ligação com o restante.
— E o que era?
Apesar de ter acabado de ouvir que não estavam interligados, [Nome] deu um zoom na imagem, deixando ela bem ampliada, ao ponto de conseguir observar as propriedades do Sato, demarcadas de azul, mais nitidamente. Três delas estavam muito próximas do local que Mitsuya estudou anteriormente.
— Um dos nossos homens estava desviando minhas armas para Hanma — a voz de Manjiro bateu nos ouvidos dela sem emoção, tão diferentes das que estava acostumada a ouvir — Já lidei com o inconveniente.
Claro que havia. [Nome] empurrou a indiferente atitude do Sano para um local turbulento de sua consciência, e dedicou seus esforços a montar o quebra-cabeças que se formava em sua frente.
Miyazaki não queria finalizar aquela manhã sem nada além de frustração, e por pouco não cedeu ao próprio fracasso se não tivesse se lembrado da informação que Draken lhe deu, inconsciente de seu valor.
De início, iria usar apenas para ver se conseguia verificar se algum dos franceses chegou a Tokyo legalmente, agora, aquilo poderia ter um significado muito mais profundo e importante.
— Quem está lidando com as rotas marítimas? — foi a primeira das muitas perguntas que gostaria de fazer e, dependendo da resposta, excluiria muitas pontas soltas — a marinha está envolvida?
Ken virou para olhá-la, parecendo interessado.
— Não completamente. Mas a parte política que temos acesso pode nos render um bom controle sobre ela.
— E imagino que todas as ilhas estão sendo monitoradas todas as horas do dia.
Sua afirmação rendeu-lhe bons e límpidos segundos de completo nada.
O território japonês era um arquipélago rico, com tantas pequenas ilhotas que, apesar de não serem habitadas, seriam muito bem utilizadas para fazerem trocas no meio da noite e, além disso, teriam como meios de transportes canoas e barcos pequenos. Quietos, perfeitos. Difíceis de rastrear.
Deliberadamente, os olhos dela encontraram os de Manjiro no instante em que ergueu a cabeça, e se conflito tivesse uma descrição física, essa seria [Nome] naquele instante.
Uma voz inteligente a aconselhava a não compartilhar sua suspeita, não depois do que aconteceu e de que tinha muitos motivos para desconfiar dele. Entregar algo que achava ser uma carta na manga de bandeja não era nada tranquilizador.
A hesitação quase a fez sentir-se irritada, porque mesmo que tentasse fazer as coisas sozinhas, ele definitivamente descobriria.
Aquele caos em forma de homem apareceu de surpresa tantas vezes — a mais recente quase destruiu seu plano de espionar Junichi e, além de introduzi-la em uma corrida no meio de Tokyo, ainda a agraciou com aparições repetitivas no jornal.
Qual a garantia de que não iria surgir debaixo de um coqueiro na praia, ou em qualquer outro lugar enquanto ela espreitava os navios? Quase conseguia ver como ele ficaria arrogante se o fizesse realmente.
Engolindo uma boa dose de seu próprio orgulho, [Nome] tomou sua decisão ao se aproximar de Manjiro, porque afinal, aquilo também era problema dele.
— Quero falar com você — pediu o mais calma possível, amarrando o restante de sua dignidade e confiando em sua própria sagacidade.
A proposta pareceu interessá-lo, e em uma quietude que não era de seu feitio, a conduziu de volta à sala. Fazia meses que não era totalmente genuína em suas ações, e não era uma sensação reconfortante.
— Acho que Hanma ou Hidetaka podem estar usando o litoral para entrar e sair do país sem serem notados — não foi um bom começo, dado que havia certas coisas para colocar em ordem.
— E você diz isso apenas vendo um mapa?
O Sano não parecia desdenhoso com seu raciocínio, embora tampouco demonstrasse que estava levando a sério.
— Os roubos aos turistas, Manjiro — o lembrou, sua mente ficando mais clara à medida que ia verbalizando suas suspeitas, como se a névoa que a afetasse se dissipasse, e em resposta à sua mínima animação, se aproximou dele — Eles estão tentando atrair sua atenção aos aeroportos, e com isso, todo o tráfego marítimo fica desprotegido. O Sato possui muitos locais que serviriam para acobertar quem viesse pelo mar, e não precisariam entrar ou sair de forma legal. Ficam fora do radar da polícia, e do seu.
Conforme falava, os olhos negros dele se arregalaram minimamente, absorvendo tudo com o que parecia ser estima.
— Isso não seria uma via de mão única. Eles estão tendo ajuda de fora…
Se estivesse certa, Shuji teria estabelecido uma parceria com máfias e gangues de outras nacionalidades.
— Sabe quem lucraria com a sua queda? Posso começar por aí.
A garganta de Manjiro oscilou quando engoliu em seco, encarando seus lábios, mas sua arrogância permaneceu intacta.
— Muitos querem me derrubar desde antes de eu tomar tudo.
— Diminua essa lista, não quero perder nenhuma oportunidade.
— Não estou desesperado, se é isso que parece.
O sorriso astuto dele apenas a recordou de que era a única correndo contra os obstáculos que o universo insistia em jogar em seu caminho. Contudo, não deixaria a centelha fraca que acendeu dentro de si apagar.
— Irei averiguar a área litorânea. Começarei ainda hoje, preciso–
— Você? — a interrompendo, o Sano fez aquele movimento novamente; as pálpebras cerradas, sobrancelhas se franzindo em inspeção.
— Tem ideia melhor?
— Tenho um contato que pode ajudar.
Considerando o conflituoso relacionamento que os dois cultuavam, não iria reclamar se recebesse desconfiança em troca de desconfiança, mas não significava que aceitaria calada.
— Quem? Uma desconhecida tem melhores chances. Qualquer um vai saber que você está investigando se enviar alguém como o Sanzu.
— Não vai ser ele — arrumando a gola da camisa, ele lhe ofereceu um sorrisinho cheio de cinismo — e depois de ontem, você não é mais tão desconhecida assim.
— E de quem é a culpa? Eu estava me saindo muito bem.
— Você iria ficar girando em círculos sem mim, admita que ajudei — não poder negar a fez revirar os olhos — e ajudaria muito mais, se me contasse o que quer de Hidetaka.
Um movimento desinteressado com os ombros foi sua resposta. Fez o bastante dividindo o que descobriu, e como pagamento, acabou ficando de fora sem mais nem menos.
— O que aconteceu para que você desconfie de tudo o tempo todo?
A pergunta pareceu ter sido mais pessoal, mas como foi feita em voz alta, estatelou contra as barreiras que circundavam [Nome], a empurrando para um assunto que queria evitar.
Dessa vez, a decisão de sufocar as raízes sob sua pele foi totalmente ignorada, seu corpo a traindo lindamente, segurando o pulso de Manjiro para mantê-lo perto. Para ver se conseguia captar qualquer mentira escondida em seu rosto inegavelmente bonito.
— Nós podemos fazer isso, não é?
— Tem um abismo muito grande nessas essas palavras, querida — sua feição particularmente tranquila não se abalou com o toque.
— Sei que seu dever como líder da Toman é maior que essas brincadeiras entre a gente — agradecidamente, conseguiu manter-se séria — Não represento perigo, mas não vou aceitar qualquer ação insidiosa.
O mínimo que gostaria de dizer escapou, determinada o bastante para deixar claro que iria passar por cima do que quer que acontecesse.
— Mesmo que se recuse a ver, sua coisinha teimosa, estamos do mesmo lado — ele sussurrou, com uma sutil reverência — e você faz parte da Toman agora, é minha responsabilidade. Minha. Te deixo livre para tentar continuar como quiser, vou te ver andar para longe, apenas para achar seu caminho de volta para mim.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro