03
Assim que coloquei os pés para fora da escola, a brisa fria me envolveu, trazendo um silêncio que parecia amplificar meus pensamentos. Meus olhos foram imediatamente atraídos para a estrada à minha frente, longa, vazia, e misteriosamente convidativa. Um pensamento me atingiu com força: eu nunca tinha caminhado sozinha antes. Não de verdade. Sempre tinha alguém ao meu lado, me guiando, me protegendo, ou simplesmente me dizendo o que fazer.
Mas hoje... hoje seria diferente.
Enquanto o vento brincava com os papéis jogados pelo chão, olhei ao redor. A escola parecia tão viva, cheia de risos e vozes. Pessoas indo e vindo, cada uma seguindo seu próprio caminho. Era fascinante, quase libertador, ver isso pela primeira vez. Por que eu não poderia fazer o mesmo?
Estar na escola já tinha sido um desafio, algo novo e inesperado. Consegui resolver meus questionamentos sozinha, até mesmo fiz uma nova "amiga". Não tinha perigos em seguir uma vida normal. Então, por que não ir embora caminhando para casa? Apenas eu e a estrada. Sem precisar da carona de Jacob, sem ninguém para me vigiar.
Era algo tão simples, que para qualquer pessoa em sã consciência seria considerado, ridículo. Para mim, era um grande passo, sem sombra de dúvidas.
Segurei o celular, os dedos deslizando hesitantes pela tela. O vento brincava com meu cabelo. Finalmente, Jacob atendeu.
— Renesmee? — A voz dele saiu mais preocupada do que eu mesma esperava.
— Oi, Jake... — Suspirei, passando a mão livre pelos cabelos, tentando organizar meus pensamentos antes de dizer o que precisava. — Escuta, você não precisa vir me buscar, tudo bem?
Houve um silêncio do outro lado, o tipo de silêncio que fazia meu coração pesar. Sabia que ele estava pensando, escolhendo as palavras certas. Jacob sempre fazia isso comigo: ponderava, hesitava, como se não quisesse nunca me magoar.
— É perigoso, Nessie. — Ele finalmente disse, o tom baixo, quase como um alerta.
Fechei os olhos por um momento. Não queria machucá-lo. Não queria que ele pensasse que eu não precisava dele, porque precisava. Só... precisava de mim mesma também, nem que fosse por um instante.
— Jake, eu sei que você se preocupa, e eu amo isso em você. De verdade. Mas eu não posso passar a vida inteira sendo protegida por todos.
— Não é sobre isso... — Ele começou, mas eu o interrompi antes que pudesse continuar.
— É sobre mim. — falei enquanto caminhava lentamente em círculos. — Eu sei que sou importante para você. Mas às vezes, eu preciso ficar sozinha... Entende?
Do outro lado, Jacob ficou em silêncio. Eu sabia que ele queria discutir, argumentar, mas também sabia que ele entendia, mesmo que não admitisse.
— Não gosto disso, Nessie. — Ele finalmente disse, a voz baixa, quase um murmúrio.
Sorri, mesmo que ele não pudesse ver.
— Eu sei, Jake. Mas eu preciso. Só um pouquinho. Prometo que vou ficar bem.
Houve um momento de hesitação antes de ele soltar um suspiro pesado.
— Você tem certeza?
— Tenho. Não vou demorar.
— Tudo bem. — Ele finalmente cedeu, e o alívio tomou conta de mim. — Só me avisa quando chegar, tá bom?
— Claro. — Sorri novamente, sentindo o calor na voz dele.
Quando desliguei, um estranho sentimento de liberdade tomou conta de mim.
Caminhei devagar, os passos hesitantes como se estivesse me acostumando com a liberdade. Guardei meu celular de volta na mochila, ainda sentindo os dedos formigarem ao lembrar do que tinha acontecido mais cedo. Aquele garoto... O jeito que ele tentou tirar o celular das minhas mãos, rindo como se fosse a coisa mais engraçada do mundo.
Será que todos os garotos daqui eram assim? Sempre com piadas de mau gosto, brincadeiras que não faziam sentido, como se precisassem provar algo o tempo todo? Revirei os olhos ao lembrar do sorriso arrogante dele, da forma como me olhou como se eu fosse algum tipo de alvo fácil. Ele era terrível, sem dúvidas.
Respirei fundo, afastando a lembrança. Não valia a pena ficar remoendo aquilo. Talvez fosse esse o motivo pelo qual sempre tinha alguém ao meu lado. Mas hoje, eu queria acreditar que podia lidar com isso sozinha. Que podia ser mais do que a garota que todos protegiam.
Ajustei a alça da mochila e continuei caminhando, deixando a escola para trás e me focando apenas na estrada à frente.
O sorriso brincando em meus lábios enquanto observava os pássaros pulando de galho em galho nas árvores ao redor. O vento trazia sons suaves, como se a natureza quisesse me acompanhar nesse raro momento de liberdade. Eu sabia que isso não duraria para sempre. Com cada passo meu, imaginava como minha família estaria agora, possivelmente surtando porque eu, a garota que sempre foi protegida como se fosse feita de cristal, decidi ir sozinha para casa.
Quase certo que sim. Meu pai provavelmente estaria cogitando cada movimento meu à distância, franzindo a testa com uma desaprovação que ele fazia tão bem. Minha mãe? Ela já teria passado por todas as possibilidades catastróficas que poderiam acontecer comigo, porque, claro, o mundo é perigoso demais para Renesmee Cullen caminhar sozinha por uma estrada tranquila.
E Jacob... Ah, Jacob provavelmente estava tentando convencer a todos de que eu sabia o que estava fazendo, enquanto ao mesmo tempo se preparava para aparecer do nada, pronto para surtar e me proteger de um mundo que eles juravam ser horripilante.
De certa forma, era engraçado. Tudo o que eu queria era um momento para respirar, mas parecia que para eles, isso era o mesmo que eu me lançar diretamente no perigo. Balancei a cabeça, rindo sozinha enquanto chutava uma pedra no caminho. Talvez eles tivessem razão. Talvez fosse loucura da minha parte, mas a sensação de estar sozinha, livre... era boa demais.
Quando dei o próximo passo, um som estranho cortou o meu silêncio. Algo bem próximo. Meu corpo congelou por um instante, os músculos tensos enquanto eu virava a cabeça rapidamente, procurando a origem do barulho. Mas tudo que vi foram as árvores, altas e imóveis, formando um túnel verde ao longo da estrada.
Fiquei parada ali por alguns segundos, ouvindo apenas o barulho das folhas com o vento. Nada. Talvez fosse só um animal, ou o vento mexendo em alguma coisa. Dei de ombros, forçando um sorriso, tentando ignorar o leve arrepio que percorreu minha espinha.
Continuei caminhando, os passos agora um pouco mais rápidos, como se quisesse me distanciar daquele incômodo sem realmente admitir que estava nervosa. Mas antes que pudesse me convencer de que era coisa da minha cabeça, o som veio novamente.
Um estalo, baixo, mas claramente diferente do som natural da floresta. Como um galho se partindo, e não muito longe de onde eu estava. Parei no mesmo instante, o coração acelerando. Dessa vez, não consegui ignorar. Meu olhar percorreu as árvores novamente, tentando encontrar algo, ou alguém.
— Olá?
Ninguém respondeu. E naquele momento, a sensação de estar completamente perdida no mundo que haviam criado para mim, me atingiu. Era óbvio. Eu estava com medo, que tipo de pessoa não teria? Nunca precisei lidar com nenhuma situação de puro estresse, ou algo que realmente fizesse meu corpo se arrepiar.
Olhei para trás, tentando não demonstrar o nervosismo que começava a se infiltrar nos meus pensamentos. Nada além do mesmo verde de antes. O caminho parecia tão vazio quanto quando comecei. Suspirei, aliviada por um breve momento, convencendo a mim mesma de que estava exagerando.
Mas quando voltei minha atenção para a frente, fui pega completamente de surpresa. Meu rosto colidiu com algo sólido e frio, um peito forte e rígido, como uma parede que havia surgido do nada à minha frente.
Ergui o olhar, o coração disparado. Lá estava ele. Um desconhecido parado em minha frente, próximo demais.
Ele era alto, com ombros largos e uma postura que exalava um tipo estranho de elegância. Seus traços eram quase perfeitos, como se cada detalhe de seu rosto tivesse sido esculpido com precisão. A mandíbula firme, o nariz reto, os lábios curvados em um sorriso leve, que parecia ser tudo, menos amigável.
Mas o que mais me chamou atenção foram os olhos. Não eram dourados como os da minha família, nem o vermelho ardente de um recém- criado. Eram de um tom escuro, como vinho envelhecido, que exploravam meu rosto como se ele pudesse invadir a minha alma.
Ele vestia preto da cabeça aos pés, o tecido fino de sua camisa destacando ainda mais o contraste com sua pele incrivelmente pálida.
Me afastei levemente, tentando cortar aquela proximidade que estávamos tendo.
— Quem é você? — Minha voz saiu antes que eu pudesse me impedir.
Ele inclinou levemente a cabeça, o sorriso se aprofundando como se eu tivesse acabado de fazer a pergunta que ele esperava.
— Apenas um viajante — respondeu ele, a voz baixa e sedutora, com um leve sotaque que eu não consegui identificar.
Algo sobre ele parecia errado, como se ele não fosse apenas alguém que tivesse aparecido ali por acaso. E, ao mesmo tempo, era como se eu não conseguisse olhar para outro lugar.
— Renesmee Cullen — ele falou, deixando as palavras escorrerem de sua língua como mel envenenado. — Um nome que não se ouve por aí.
Meus instintos gritaram para eu recuar, mas minhas pernas pareciam congeladas. Ele inclinou a cabeça ligeiramente, me observando com olhos que não piscavam, como um predador analisando sua presa.
— E como você, um estranho no meio da floresta, sabe meu nome? — perguntei, tentando soar firme, mesmo que meu coração ainda martelasse como um tambor.
Ele deu de ombros, como se isso fosse a coisa mais natural do mundo.
— Digamos que você é... interessante. Uma exceção em um mundo tão previsível.
Ele me conhecia. Obviamente me conhecia.
— Não respondeu minha pergunta. Quem é você de verdade?
Ele riu baixo, como se estivesse se divertindo com meu esforço em desvendar quem ele era.
— Quem eu sou de verdade? — Ele deu um passo à frente, encurtando a distância que eu havia tentado criar. — Alguém que gosta de respostas, assim como você. Talvez seja isso que temos em comum.
— Não temos nada em comum — rebati, tentando ignorar seus olhos fixos em mim.
Ele inclinou o corpo ligeiramente para o lado, como se estivesse me analisando, e seu sorriso assumiu um tom mais cruel.
— Não? — questionou, com seus olhos brilhando. — Porque, para mim, você parece alguém que gosta de testar limites... mesmo que não tenha percebido isso ainda.
Ela falava como se soubesse exatamente tudo sobre mim, e aquele gesto me irritava profundamente. Eu não o conhecia, nunca se quer tinha o visto da minha vida, mas ele falava como se soubesse cada passo meu, antes mesmo de se quer eu pensar.
— Você fala como se me conhecesse — retruquei, estreitando os olhos.
Ele apenas riu, passando uma mão pelos cabelos com uma calma que me deixava ainda mais irritada.
— Ainda não. Mas talvez seja apenas questão de tempo. Afinal, Renesmee, parece que você é boa em chamar atenção.
— Não pedi sua atenção — disparei, cruzando os braços em um gesto defensivo.
Ele deu outro passo à frente, tão perto que me fez amaldiçoar o momento em que optei por vir sozinha.
— Não precisa pedir — murmurou, inclinando-se levemente, mas sem se aproximar demais. — Ela já é sua.
Fiquei imóvel, meu corpo completamente tenso. Ele estava perto demais, o sorriso dele me fazendo querer recuar e, ao mesmo tempo, enfrentar aquele desafio que ele parecia me convidar.
— Não me interessa a sua atenção — retruquei, tentando soar firme.
Ele arqueou uma sobrancelha, o sorriso se aprofundando de um jeito que parecia dizer que sabia mais do que eu admitia.
— Tem certeza? — provocou, arrastando sua voz conforme arrastava seu olhar pelo meu rosto. — Porque, de onde eu estou, parece que você gosta de ser notada.
Meus olhos estreitaram.
— Não por você.
Ele riu novamente, um som grave que parecia ecoar dentro de mim, como se estivesse dentro da minha cabeça. Ele tinha um jeito de falar que fazia tudo parecer um jogo, e o pior era que ele parecia estar vencendo antes mesmo de eu entender as regras.
— Não me subestime, Renesmee. — A forma como ele falou meu nome, fez com que meu corpo se arrepiasse— Eu vejo mais do que você acha. E, sinceramente, é fascinante.
— Fascinante? — rebati, franzindo o cenho. — Você mal me conhece.
Ele inclinou a cabeça, os olhos ainda fixos nos meus.
— Talvez. Mas às vezes não é preciso conhecer para... sentir.
Essa última palavra foi dita em um tom que parecia carregar um duplo sentido, algo que me fez cruzar os braços instintivamente, eu estava me sentindo exposta, e sinceramente... Estava gostando.
— Não sei o que você quer — disse finalmente, estreitando os olhos. — Mas eu sugiro que encontre outra pessoa para perturbar.
Ele sorriu, balançando a cabeça levemente, como se estivesse realmente se divertindo.
— Perturbar? — repetiu, um tom de falsa inocência em sua voz. — Eu prefiro pensar que estamos apenas... conversando.
— Essa conversa acabou — retruquei, girando nos calcanhares para me afastar dele, sentindo a necessidade urgente de colocar distância entre nós.
Mas antes que eu pudesse dar dois passos, ouvi a voz dele novamente, enquanto fechava meus olhos para ignorar a sensação que meu corpo dava a sua presença, contra minha própria vontade.
— Quando quiser fugir da sua realidade, me procure pequena Cullen, vai saber onde me encontrar.
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