
ᥫ᭡ 016
— DO QUE ESTÁ FALANDO? — pergunto, irada. — Que direito você acha que tem de opinar sobre os meus sentimentos assim?
Fico prestes a partir para a agressão. Ele me tira do sério. Que questionamentos são estes? Como ele pode falar com tanto domínio sobre o que eu sinto? Hyunjin me deixa cada vez mais furiosa à medida em que nos falamos.
— Se está tão irritada, então é mesmo tudo verdade — ele conclui com isso tudo. — Se eu estivesse contando alguma mentira, não seria algo para te incomodar tanto.
Eu fico surpresa para onde as suas conclusões o levam, é o único motivo pelo qual por alguns instantes eu não sei como rebater as suas acusações. Sim, é apenas por isso.
— E-eu não sei que tipo de psicologia doentia você está tentando aplicar em mim, Hyunjin. Mas não vai funcionar! — tropeço nas palavras no início, mas me recomponho. — Eu gosto do Chan.
— Eu não falei o contrario — ele rebate. Seus posicionamentos parecem confusos e contraditórios para mim. — Eu não disse que você não gosta dele, disse que você não está apaixonada — ele explica. — Ou eu estou errado?
— Desde que eu te conheci você nunca disse algo, de fato, correto. E tem mais, o que Chan e eu sentimos não te diz respeito. Se você se dedicasse tanto assim ao seu namoro quanto se dedica a cuidar do meu, Yujin seria a garota mais feliz do mundo.
— Eu não entendo porquê você está falando sobre ela e eu. Se sente tão insegura sobre o que tem com Chan que precisa falar do meu relacionamento, princesinha?
— Você não me chama de princesinha! — eu o aponto o dedo. — Hyunjin, eu já aguentei muitas merdas que você falou, mas você não tem o direito de falar sobre quaisquer inseguranças minha.
É engraçado como, quando brigamos, todo o ambiente em volta assemelha-se a um campo de batalha. Parece que somos parte de um filme de faroeste, com armas postas, preparando para soltar o primeiro disparo. Não usamos balas, mas dizemos palavras que machucam tanto quanto. Nós contamos até dez antes de apertar o gatilho, nesses segundos cogitamos desistir, mas sempre tem um que acaba acertando primeiro, ou outro que interrompe a contagem e apunhala pelas costas, atingindo o outro de surpresa.
Contamos até dez, devagar. Nos encaramos prontos para começar a troca de tiros, ele cerra os dentes e enche os pulmões, eu faço o mesmo. Com o dedo no gatilho, só é preciso que dispare. Mas, antes que comece a chacina de insultos, o doutor Kim chega, interrompendo-nos.
— Serviço de quarto... — ele brinca. O médico traz uma bandeja com o cardápio do almoço.
— Eu já estava de saída, não acho que a dor de cabeça vá passar — Hyunjin fala. — E você está incorreta sobre ela eu, Jiyoon. Na verdade, sobre tudo que disse.
Ele sai pela porta como um furacão, bate a porta tão forte que ela poderia cair.
Doutor Kim parece curioso, mas não pergunta nada, apenas coloca a bandeja na maca que eu estava deitada. Eu volto para o colchão e resolvo comer aqui mesmo, poderia até ter ido para o refeitório, mas seria sem graça sem o meu irmão ou namorado. E também, se eu fosse, Seungmin me puxaria para a mesa dos amigos dele, o que envolve o Hwang.
A comida está gostosa, mas eu não consigo comer muito. A discussão me fez perder o apetite que pouco tinha. Eu estou me forçando a comer algo, mas claro, respeitando o meu limite. Não adianta eu me obrigar a comer muito para depois colocar tudo para fora, assim não serve de nada. Como o que preciso, porque como diz a minha mãe, saco vazio não para em pé.
— Já acabou? — Kim Taehyung pergunta ao me ver deixar o prato pela metade.
— Sim — confirmo. — Se eu já não estava com fome antes, agora muito menos.
Eu observo sua expressão. Ele está sentado em sua mesa, lia alguns papéis mas parou. No seu rosto consigo ver um ponto de interrogação — não literal —, ele deve se questionar "eu pergunto ou não?". Na sua testa forma-se uma ruga, mesmo que ele aparente ser jovem de mais para ter linhas de expressão.
— Senhorita Yang... o que aconteceu aqui enquanto eu estive fora? — ele decide por perguntar. — Não quero ser intrometido, mas ainda assim, vocês estavam na minha sala, sob minha responsabilidade.
— Nós brigamos, é obvio. Não nos damos bem, aconteceria cedo ou tarde.
Isso não parece esclarecedor o suficiente para ele. Sinto que virão mais perguntas.
— Por que não se dão bem? São jovens de mais para guardar tanto rancor — ele fala como se parecesse algo impossível Hyunjin e eu nos odiarmos. — Vocês dois já namoraram? — ele insiste que houve ou há algo entre Hwang e eu.
— Não, nós dois nunca namoramos, nem namoraremos. E nos odiamos porquê é natural, se ele me odeia, então eu o odeio também.
— Pensei que vocês namoravam, ou que eram no mínimo ex's — ele diz, surpreso. Apesar de não ser o meu tópico favorito de conversa, gosto de falar com o doutor Kim. Alguns adultos aqui são sérios de mais, é bom saber que pelo menos um deles não é tão quadrado, careta. — É estranho você dizer que não há nada, quando eu posso sentir claramente algo no ar.
— Só há ódio, ânsia de vômito, repulsa.
— Eu já ouvi essa ladainha antes — ele diz, dando uma risada abafada. — Digo, eu já tive a idade de vocês. Garotos implicando com garotas porquê gostam delas, garotas batendo em garotos porquê gostam deles, essas coisas de uma sociedade heteronormativa que eu nunca irei entender.
— Acho que nós já passamos dessa fase — eu discordo de sua opinião. — Hyunjin e eu não somos duas crianças, nós apenas não gostamos um do outro.
— Eu acredito — ele não acredita.
— Estou vendo no seu olhar que não é verdade — falo. Poderia falar por muito mais, mas tenho que voltar para as aulas. — Mas não importa agora. Estou indo, preciso ir antes do sinal tocar.
— Não precisa, eu te liberei das aulas da tarde — ele me comunica. — Eu vou ligar para a sua mãe vir te buscar.
— Eu agradeço, doutor. Mas não quero ficar para trás, eu assistirei as aulas e descansarei quando puder — comunico e me levanto. — Ah, eu moro com o meu pai agora, se tiver que falar, fale com ele.
— Tudo bem, mas não faça muitos esforços — ele concorda, discordar seria uma longa jornada de tentativas. — Se cuide. Te vejo de novo quando vocês dois começarem a namorar, senhorita Yang.
— Se é assim, até nunca mais, doutor Kim.
Eu saio da enfermaria e volto para sala de aula. Assim que entro recebo os olhares dos meus fãs, haters, melhor dizendo. Eu sento-me na minha mesa vazia, que logo é preenchida por meu amigo Seungmin, ele senta-se na cadeira que o Hwang ocupava, ele ainda não estava na sala. Obrigada, meu Deus.
— Ei, como você esta? — ele pergunta, preocupado. — Você não faz ideia do pânico que causou nessa sala, quantos gritos foram ouvidos. E fui eu quem te carregou até lá, só não sabia que osso pesava tanto!
— Ainda bem que não foi você que desmaiou. Você deve pesar bem mais que eu, só essa cabeçona aí... — eu o irrito também. Nós dois rimos. — Estou melhor, foi estresse.
— Eu já te disse para cuidar melhor da sua saúde! — ele me repreende.
— Eu vou, já disse.
— E vai mesmo, eu vou me encarregar disso! — ele exclama. Eu sei que boa coisa não vem, seu rosto é fácil de ler, ele tem um plano. — A partir de amanhã você vai sair para caminhar comigo, todos os dias, às 05:00h da manhã.
— ÀS 05:00H DA MANHÃ!? — grito, sem perceber. — 05:00h da manha!? — sussurro.
— Sim, é o melhor horário para isso. Vamos dar algumas voltas pelo bairro e depois voltamos, você vai tomar um bom café e depois vamos para a escola juntos. Seu irmão e você irão sentar na mesma mesa que eu nos lanches e no almoço, para eu me certificar que você está comendo mesmo. Depois você pode ir pra casa enfiar a cara no celular, mas vai jantar e me mandar foto de todas as refeições.
— Meu Deus, Seungmin. Como você seria um namorado super controlador e sufocante!
— Não, eu não serei. Porque não vou namorar com uma sem juízo igual a você! — ele me mostra a língua.
— Que maravilha, estou cercada de inimigos!
E por falar em inimigos, lá está ele. Hwang Hyunjin aparece na porta da sala, quando olha na nossa direção nós imediatamente paramos de falar. Ele se aproxima e Seungmin se levanta do lugar do outro, mas o garoto faz sinal para que o amigo pare.
— Vamos trocar de lugar, é mais confortável — Hwang fala.
Kim concorda, acompanhando o outro até sua antiga mesa e trazendo seu material consigo. Que bom que o outro tomou essa atitude, é melhor assim.
(•••)
— Boa... — eles nem me deixam terminar a frase.
— O doutor Kim me ligou hoje — meu pai diz. — Ele disse que você desmaiou no meio da aula. Que história é essa, Yang Jiyoon.
Encaro os rostos preocupados. Sumin, papai e Felix me encaram de braços cruzados no sofa, este último todo coberto na mantinha macia, parecendo um bombom. Mas não é tudo, quando olho para o lado, vejo a minha mãe também. Sinto que isso está prestes a virar um daqueles episódios do "casos de família". O tema de hoje "Minha filha desnaturada não come e quase me mata".
— Eu não estava me sentindo bem e aconteceu, foi um caso isolado — falo baixinho, perco a voz com medo de levar uma bronca feia.
— Ele também me disse que você não está se alimentando. Qual o problema, querida? — Sumin pergunta, dos quatro ela é a que parece mais calma, ou é a imagem que quer passar. — Você não gosta da minha comida?
— Não é isso, você cozinha muito bem, eu adoro. Eu só não estava com apetite esses dias — explico, mas não alivia muito a minha barra. — Estava muito estressada e acabei pulando algumas refeições.
— Filha, você não pode continuar assim. Quando você era pequena vivia no hospital, estava sempre doente porquê não comia. Não sabe o quão aterrorizante para um pai é ver um filho numa cama de hospital. Então, por favor, não faça mais uma coisa dessas! — papai está bravo, mas acima de tudo, preocupado.
— Vocês se importam se eu conversar com a minha filha em particular? — mamãe diz suas primeiras palavras desse que eu cheguei.
— Tudo bem — papai concorda.
— Me mostra o seu quarto novo, meu amor? — ela sugere o local, eu concordo.
Eu já estava de pé, então apenas esperei minha mãe fazer o mesmo e a conduzi até o meu quarto. Assim que entra eu tranco a porta e sento na minha cama, mamãe não, ela dá uma rondada no local, estava analisando tudo para que pudesse encontrar algum defeito e dizer que era melhor quando eu morava com ela. Eu conheço bem a mãe que tenho.
A mais velha dá uma olhada na minha mesinha de estudos, nos meus cadernos e porta-retratos, depois nos polaroides pendurados na parede como se fosse um varal, até na cortina da minha janela ela fica analisando como se fosse a coisa mais interessante do mundo. Quando termina, ela se joga de costas na minha cama.
— Faz tempo que a gente não conversa, não é? — ela diz, é verdade. — Tem alguma coisa que você quer me contar, filhota?
— Ai mãe... — eu suspiro. — É que tem tanta coisa mudando, tudo tão rápido. Sempre que eu fico estressada ou sobrecarregada, perco o meu apetite.
— Eu entendo, querida — ela segura minha mão. — Você quer me contar algo? — ela pergunta. Eu aceno positivamente.
— Desde que eu vim morar aqui estou com dificuldades de me adaptar a vários tipos de mudanças. Você sabia que eles assistem doramas juntos todas as noites? Nós não tínhamos esse hábito — expus a situação. — Até Felix e eu nos desentendemos ontem, não brigamos, mas ele parece chateado com algo e eu nem sei o que eu fiz. Acho que a nossa relação está mudando também, eu não gosto disso.
— É natural que isso aconteça — ela me fala. — Quando você morava comigo, vocês não se viam tanto assim, aproveitavam mais a relação de amigos, agora estão vivendo como irmãos e irmãos brigam o tempo inteiro, geralmente.
— Eu não quero brigar o tempo inteiro, odeio quando ficávamos brigados.
— O bom de ter um irmão, é que não importa quantas vezes vocês briguem, sempre podem fazer às pazes. E sobre ele estar chateado com algo que você fez, o melhor agora é perguntar.
Minha mãe tem razão, devo conversar com Felix e entender o que deixou ele tão esquisito esses dias. Mas não é a única coisa que me incomoda. Eu quero contar a ela sobre Chris, mas confesso que tenho medo da sua reação.
— Mãe, tem uma coisa que eu ainda não te contei — anuncio. A mais velha me olha atenta com seus olhos de águia, me amedronto por um segundo, mas lembro que é apenas a mamãe. — Eu estou namorando.
— Meu Deus, é serio? — ela duvida de mim. — Então você finalmente tomou vergonha na cara e se declarou para Hyunjin?
— Não mãe! — eu exclamo. Não quero falar sobre ele. — Por Deus! Por que todos sempre pensam que é com ele? — bufo irritada.
— E quem são "todos" esses que você já contou e eu não sabia ainda?
— Apenas Felix e Seungmin — digo. — Tem algumas pessoas do meu colégio também, mas eles descobriram sozinhos.
— Então isso quer dizer que o seu pai não sabe e eu ganhei dele novamente! — ela festeja. Eles tem uma relação esquisita, mas é boa. — Mas esse garoto, é ele quem está te causando dor de cabeça?
— Ah, não. Não mesmo. Chan é ótimo, ele é o único que não está me dando dor de cabeça — respondo honestamente. — O que está me incomodando mesmo neste relacionamento é que parece que estão todos se questionando sobre nós, insinuando o que eu sinto ou deixo de sentir.
— E o que você sente? — ela me pergunta, vai direto ao ponto.
— Chan é incrível mãe, você adoraria conhecê-lo — eu digo, estou segura disso. — Ele é educado, gentil, carinhoso, romântico, atencioso, me trata como uma verdadeira princesa.
— Não foi isso que eu te perguntei, meu amor.
Suspiro. Entendo sua pergunta, mas minha resposta é que ela não compreende. Talvez, no fundo, nem eu entendo como me sinto.
— Eu gosto dele, mãe. Mais ainda é muito cedo para dizer que estou apaixonada por ele. Ele cuida de mim e eu gosto disso.
Minha mãe faz uma expressão duvidosa, confusa. Eu repito a mesma, me questiono sobre o que ela pensa. A mais velha parece estar pensando bem no que dizer, ela sempre toma cuidado e procura escolher as palavras certas para não me machucar ou ofender, totalmente em oposto a Hyunjin.
— Filha, você acha que gosta dele, ou dá ideia do que ele representa? — ela me faz um bom questionamento.
— O que a senhora quer dizer com isso? — interrogo.
— Não pense que estou querendo dizer como se sente, estou falando com base na minha experiência — ela esclarece. — Eu já tive a sua idade, ficar confusa é mais comum do que você pensa. Às vezes a gente pensa que sente uma coisa, quando na verdade é algo completamente diferente. Se isso está te incomodando tanto, não acha que pode haver um motivo oculto?
— Você também acha que eu não gosto dele, mãe? — pergunto a ela, mas deveria perguntar para eu mesma.
— Não estou dizendo isso, minha princesa. Estou te perguntando se tem certeza de que namorar com esse garoto foi realmente a melhor escolha a se fazer. O que ele sente por você, você sabe?
— Ele disse que também gosta de mim. Nós não dizemos que estamos apaixonados um para o outro, porque seria mentira. Nos gostamos e acho que por enquanto isso é suficiente.
— Se você está certa de que gosta dele e ele de você, aproveite. Mas não ache que porquê esta é uma das melhores fases da sua vida, que ela será fácil.
— Claro, mãe. Mas eu posso considerar que a senhora aprova o nosso relacionamento? — pergunto. Assim como Chan quer muito o apoio de Hyunjin, eu quero o da minha mãe.
— Não é bem assim, eu preciso conhecer o garoto primeiro. Quero saber se ele é tudo o que você diz mesmo, ou se você não está enxergando quem ele realmente é.
— Eu vou apresentar vocês dois quando eu estiver pronta — eu a asseguro. — Mas, por enquanto, a senhora tem algum conselho para mim?
— Hmm... — ela pensa a respeito. — Siga o seu coração. Aproveite as coisas boas de estar em um relacionamento, mas não tente apressar as coisas. Escute o seu coração, mas também use o cérebro para pensar, você é uma garota inteligente, Jiyoon. Talvez os sentimentos ainda estejam todos misturados e confusos, mas eles vão se ajustar. Dê tempo ao tempo.
— Obrigada, mãe — agradeço com um bom sorriso. — E, por favor, não conta para o papai.
— E perder a minha vantagem? Nem morta! Eu estou ganhando — ela comemora. — Agora eu preciso ir, meu bem. Eu vim te ver porquê estava preocupada, então me prometa que isso não vai acontecer nunca mais — ela pede.
— Eu prometo.
— Então tá — a mais velha fica de pé. — Tchauzinho, meu amor! — ela se despede dando um beijinho na minha bochecha.
— Tchau, mãe.
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