
ᥫ᭡ 008
CHEGAR NA CASA DO PAPAI ME trouxe alívio e conforto, por mais que pouco. As coisas que escutei ainda ficam em minha mente, é como se não houvesse nada mais no mundo além de suas palavras ruins. Elas me cortam como lâminas, me ferem e deixarão cicatrizes aparentes. Mas por que eu ainda gosto dele se isso me machuca tanto?
Me pergunto o que houve, o que posso ter feito para que ele me deteste tanto. Meu coração quer dar a ele uma chance de se explicar, mas a minha mente discorda. Eu não devo ir atrás se é ele quem está com a navalha apontada no meu pescoço. Não posso tentar correr atrás de alguém que só me faz sentir pior.
Honestamente, estou exausta disso tudo. Eu preciso de mais, eu mereço mais.
— Jiyoon-ah, o que aconteceu? — Felix pergunta bem baixinho, assim que entramos em casa.
— Felix, nós podemos falar sobre isso amanhã? — questiono com a mente cheia, tudo que preciso é de descanso. — Eu só quero ir para o meu quarto agora, estou exausta.
— Tudo bem — ele é compreensivo. — Boa noite, Yoon! — Lix despede-se de mim com um beijo no topo da minha cabeça e em seguida vai para o seu quarto.
Eu deixo os meus calçados perto da porta de entrada e dali vou direto para o meu quarto. Jogo-me na cama e cubro-me dos pés a cabeça com o lençol. Meu celular vibra ao meu lado e a tela se ilumina, exibindo assim uma mensagem de Chan. Já se passa das onze.
Ignoro as mensagens do Bang. Estou furiosa. A única pessoa com quem consigo conversar em momentos assim é o meu Wangja, nem penso duas vezes e abro o Wattpad. Mas quando faço isso, tenho uma surpresa desagradável.
Eu estou muito
preocupado, JiJi.
Eu não falei antes,
mas estou com
alguns problemas
familiares e vou
precisar ficar um
tempo fora do app.
Me desculpa por
sumir, mas eu não
sei como lidar com
isso e preciso de um
tempo para mim.
Eu prometo que volto
antes que mesmo que
você perceba que sumi.
Me sinto ainda pior. Além de tudo o mais, o meu melhor amigo virtual saiu do aplicativo e eu só vi isso agora. Penso que falhei como amiga ao não perceber que ele não estava e eu está bem, pois com tudo o que sei dele, Wangja já devia estar se sentindo assim por muito tempo até chegar no ponto de se afastar.
Eu largo o celular na mesinha de cabeceira, bem longe do meu campo de visão e volto a ficar debaixo das cobertas. Não troco de roupas ou tiro a maquiagem, de tão exausta, durmo como estou. Não foi mesmo uma noite bem dormida, resumiu-se a pequenos cochilos e caminhadas pela casa no meio da noite. E é numa dessas acordadas noturnas que eu vou até a cozinha.
Caminho até a geladeira para procurar algo para me ajudar a dormir tranquila. Depois de uma boa olhada, resolvo esquentar um pouco de leite. Faço tudo com extremo cuidado, não quero acordar ninguém. Quando coloco o leite já quente em uma xícara, vou até a sacada da casa apreciar a vista.
Já é tarde da noite, mas aqui é sempre bem barulhento. Seja a noite, ou em qualquer hora do dia, é possível ouvir os sons da cidade. As buzinas de carros, os flashes de luzes que passam pela fachada do prédio, bebês que choram sem parar... estamos todos acordados. Confesso que isso ajuda, faz eu encontrar conforto na minha solidão.
Resolvo ir para o meu quarto. Lavo a xícara suja e deixo a cozinha para trás, já sinto os bocejos chegando. Eu vou para o meu quarto enfim a procura de repouso, mas antes que chegue, percebo uma movimentação suspeita no quarto do meu irmão.
Com cautela, eu aproximo o ouvido da porta, tento escutar do que se trata. Meu coração fica apertado ao ouvi-lo, Felix está chorando bem baixinho, provavelmente encolhido na sua cama como fazia quando criança. Minha reação natural é levar a mão à fechadura da porta, mas assim que toco a maçaneta gelada, eu paro e o deixo em privacidade.
Aquilo acabou com a minha noite e no dia seguinte eu mal consegui me levantar da cama, fingi que estava com dor de estômago e ninguém me perguntou mais nada sobre o assunto. Eu perdi o meu fim de semana inteiro por conta do que aconteceu naquela festa. Durante o domingo Chan até me mandou uma outra mensagem, algum vídeo que supus ser engraçado por vir acompanhado de uma mensagem de risos. Ele deve ter feito isso para tentar quebrar o gelo e descontrair, mas assim como não respondi as primeiras mensagens, não vi as últimas.
Hoje, na segunda, eu ainda estou na casa do papai. Tudo parece normal à mesa, estamos os quatro reunidos comendo. Até mesmo eu, que não tenho o costume de tomar café da manhã, estou repondo as forças que perdi ao chorar ontem. Felix também está repondo energia, está comendo bem mais do que o casual.
— Você está se sentindo melhor, princesa? — papai pergunta antes de tomar um gole do seu chá verde.
— Sim — digo simplista.
— E como foi a festa, querida? — Sumin tenta puxar o assunto, mas acho que nem eu nem seu filho queremos comentar o assunto. — Eu não tive tempo para conversar com vocês depois que chegaram. Vocês se divertiram?
— Ah... foi legal — eu minto para evitar explicações.
— E você filho, não tem nada para dizer? — a mulher pergunta outra vez. — Não quer contar como foi a sua noite?
— Não — ele responde sem ânimo. Um pouco sem educação para quem falando com os próprios pais. — Vamos Yoon, está na hora.
Não contesto, quero ir antes que tenha que ficar conversando sobre o desastre que foi aquela noite. Eu me ergo da cadeira, sigo Felix e Sumin até o estacionamento e nós vamos juntos para o colégio. A casa do papai não é tão perto da escola, mas se comparado a minha, é quase vizinha.
Eu fico com a cabeça encostada na janela o percurso inteiro enquanto espero o tempo passar. O caminho até a escola nem sempre é rápido, mas hoje ele passou voando e é tudo por causa de Hyujin. Porque quando eu penso nele não percebo o tempo passar, ele para para nós dois, já que a única coisa que me importa é ele.
Lembro-me de quando a maior parte dos meus pensamentos eram sobre ele e de como eu ficava animada em ir à escola, apenas para poder vê-lo de perto. Atualmente a escola perdeu a graça para mim, eu não quero o ver porquê quando isso acontece tudo o que sinto é raiva e rancor. Eu estou mais que chateada, fui humilhada. As palavras que ele disse a Chan àquela noite me maltrataram. Eu não fiz nada com ele ou para ele, Hyunjin passou a me tratar mal de uma hora para a outra, o que só faz parecer que essa raiva de mim ele guarda faz tempo.
Eu gostava dele, eu o admirava e o idolatrava de longe — como se ele fosse o meu idol favorito. Ele era o meu mundo. A imagem que eu criei dele, que ele dizia ser, era importante para mim. Mas de uma hora para outra, ele me mostrou o quão dura a realidade pode ser e quem ele realmente é. O meu mundo de fantasias onde ele era alguém perfeito foi desfeito. Nunca tivemos nada real, mas o que eu inventei me confortava. Mesmo que ele nunca tivesse demostrado algum tipo de sentimentos por mim, seu olhar apaixonado — por tudo, menos eu —, o sorriso deslumbrante e todos os detalhes não listáveis dele me faziam pensar que estava tudo bem.
Eu não deveria, mas depositei meu coração nessa paixão não correspondia. Ele apenas sorriu e eu li como um gesto de carinho, ele me olhou e eu tive forças, ele apenas existia e era motivo para me fazer feliz. Eu me perdi no que era real e no que eu inventei. O quão maluca isso faz de mim? Até que certo ponto deixa de ser paixão e torna-se loucura?
A noite de ontem acabou comigo, mas parece que eu não fui a única com uma noite horrível. Em hipótese alguma teria esquecido do meu irmão, como ele estava ontem. Felix e eu ainda não tivemos a chance de conversar sobre aquilo ainda, mas eu vou fazer isso o quanto antes. A situação me preocupa.
Assim que descemos do carro fomos direto para dentro da escola, em silêncio. Eu paro de andar quando chegamos na porta da sala, quando lembro que Chris pode já estar lá dentro, eu tiro o celular da bolsa junto dos fones de ouvido e os coloco.
Assim que entro na sala sou tomada por una onda de olhares dos meus colegas. Com o meu histórico, ignorar é a melhor opção. Eu abaixo a cabeça, entro na sala e deito o rosto na minha mesinha, não quero papo. Eu percebo quando Chris se vira e imediatamente fecho os olhos, Yongbok dará um jeito na situação, ou então ficará calado até Chan desistir de conversar.
Fecho bem os olhos, mas só consigo lembrar da noite de sábado e das coisas que Hyunjin disse sobre mim. Eu não queria que as suas palavras tivessem efeito em mim, queria que ele não importasse, gostaria de conseguir fingir que ele não existe. Mas ele existe e eu ainda estou bem aqui, na mesa atrás dele.
Abro os olhos outra vez quando sinto Felix me cutucar. O professor chega na sala de aula, a nossa apresentação de história é hoje, me esqueci completamente.
— Nós seremos os primeiros — Bang fala.
Nenhum dos outros três de nós disse alguma coisa .
O professor nos chama e a nossa apresentação logo tem que começar, foram os vinte minutos mais longos da minha vida. Mas se me perguntarem como foi a apresentação ou o que eu disse, não saberei como responder, apaguei tudo da minha mente. Apenas saberei se fomos bem quando as pontuações forem anunciadas. Eu não me importei com o resto daquela aula nem com as demais até o tão merecido descanso. Quando fomos liberados para almoço, fui direto ao refeitório, em seguida para a mesma mesa de sempre.
Coloco os fones outra vez e ligo minha playlist triste, bem como eu estou. Eu como enquanto escuto Gone, por muito pouco não me desfiz em lágrimas aqui mesmo, mas já estou mal o suficiente.
Eu olho ao redor procurando por Yongbok, ele sumiu assim que o sinal tocou e desde então não o encontrei. Quando o meu celular notifica penso que pode ser ele, mas não é, se trata de Bang Chan.
"Você comeu?
Pode me encontrar na sala de dança?"
Eu desligo a tela do celular e o deixo sobre a mesa, pausando a música mas sem retirar os fones. É só assim que percebo que, provavelmente, durante todo esse tempo, há algumas garotas sentadas na mesa atrás da minha e falando não tão baixo sobre mim.
— Você acha que eles dois brigaram? — uma delas pergunta.
— Eles quem? — uma segunda questiona sem entender. Também não consigo acompanhar.
— Jiyoon e Chan — a primeira responde. — Você não sabia que eles dois estão namorando?
Chan e eu estamos o que!?
Eu iria apenas ignorar as mensagens dele e seguir com a minha vida sem-graça, mas ao ouvir isso sinto que preciso tirar essa história a limpo com ele. Vai ver é justamente por isso que ele quer me encontrar.
Uma memória daquela noite vem à minha mente, aquela parte em que alguns amigos me contam sobre a namorada de Hyunjin ter criado o boato. Torço para não, mas será que ele pensa que eu fiz como ela e iniciei o boato?
Desesperada, eu ligo o celular outra vez e respondo a mensagem, digo que estarei lá em cinco minutos. Durante esse tempo, eu o uso para me recompor. Quando chego no local marcado, não espero para entrar. Assim que me viu, Chan sorriu, eu quis sorrir com ele, mas eu não consegui.
— Vem, entra — ele diz quando me vê imóvel em frente à porta.
Com cuidado, em passos lentos eu caminho até ele, observando toda a movimentação pelos grandes espelhos nas paredes. Me aproximo, mas continuo calada. Mantenho-me esperando que ele inicie o assunto, já que fora ele quem havia solicitou minha presença.
— Você está bem? — ele pergunta, sempre sendo tão prestativo.
— Próxima pergunta? — evito responder.
— Por que não me esperou? — ele questiona. — No sábado. Você me disse que só iria embora às onze, mas eu te procurei antes e você não estava.
— É que Felix não estava se sentindo bem e nós tivemos que ir mais cedo — mentiras e mentiras saem da minha boca como nunca.
— É só por isso? — ele interroga.
— Não quero mais ter que mentir para você, Chris — resolvo abrir o jogo. — Acho que me aproximar de você foi um erro, deveríamos voltar para como era antes, com apenas alguns acenos nos corredores.
— Jiyoon, eu fiz algo que te chateou?
— Não você, mas Hyunjin. Você sabe que ele me odeia, não quero que fique em uma situação chata com o seu melhor amigo, então vamos acabar com isso antes que comece mesmo. As pessoas já até andam dizendo que estamos namorando por conta daquele beijo.
— Ah, então você também ouviu.
— Eu ouvi. E te juro que não faço ideia de quem começou esse boato, mas seja quem for, não vai ficar assim.
— Do jeito que você fala parece que ela cometeu um crime. Seria tão ruim assim namorar comigo?
— Não, não é isso. É que eu não gosto quando as pessoas inventam coisas sobre mim.
— Eu entendo. Você sabe como essa escola é, sempre tem boatos sobre tudo. Ninguém sabe sobre nada mas continuam insistindo em algo que eles mesmos criaram.
— Eu sei exatamente como é.
— Jiyoon, eu posso ser honesto? — ele pergunta. Eu confirmo com a cabeça. — Sei que ouviu o que Hyunjin disse. Quando nós dois estávamos do lado de fora, eu te vi sair dali.
Fico sem saída, não imaginei que ele descobriu que eu estava espionando os dois. Não tenho outra opção que não seja confessar.
— Sim, eu ouvi. Mas não é como se ele já não tivesse deixado bem claro para mim o que pensa.
— Seja lá o que ele te disse, eu não acredito que seja verdade — ele me diz. — Nós dois não nos conhecemos por séculos, mas sei que você é uma pessoa boa, Yoon.
— Você realmente pensa isso de mim? — meu rosto se ilumina de felicidade. Hyunjin não conseguiu contaminar a cabeça do amigo.
— É claro que sim. Você e Hyunjin parecem ter os seus problemas, mas isso não diz que eu tenha. Eu gosto de você, Jiyoon. Por isso não me importo com os rumores, sei que eles serão reais algum dia. Talvez mais perto do que pensemos.
Eu estou para explodir. Devo estar completamente vermelha, todo esse afeto me deixa um tanto — muito — constrangida.
— Eu... — não sei o que dizer.
— Eu vou sair com alguns amigos amanhã à noite, você quer ir com a gente? — ela muda o assunto vendo minha expressão de vergonha.
Por enquanto, a sua resposta é sim.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro