89 | A Reluctant Remembrance
╔╦══• •✠•❀•✠ • •══╦╗
89. Uma Lembrança
Relutante
╚╩══• •✠•❀•✠ • •══╩╝
─━━━━━⊱✿⊰━━━━━─
Senhor, estive me perguntando o que o senhor sabe sobre... sobre Horcruxes?
─━━━━━⊱✿⊰━━━━━─
Não demorei muito mais na Sala da Profa. McGonagall, pois Trevor me disse que precisava ir e logo nos despedimos, Mia disse que tinha que ficar um pouco sozinha e também se foi, então eu procurei pelos meninos. Pelo resto do dia, Harry foi assediado com pedidos de sextanistas para descrever como alguém se sentia quando aparatava. Foi sorte que Rony não tivesse dito que eu também tinha uma idéia de como era isso. Observei que todos manifestavam assombro em vez de desapontamento quando Harry lhes contava o desconforto que era aparatar, e, ele ainda respondia a perguntas detalhadas às dez para as oito da noite, quando foi obrigado a inventar que precisava devolver um livro à biblioteca, para se livrar em tempo de irmos à aula de Dumbledore.
Os lampiões no escritório do diretor estavam acesos, os retratos dos diretores anteriores roncavam suavemente em suas molduras e a Penseira estava mais uma vez pronta sobre a escrivaninha. As mãos de Dumbledore estavam dos lados da Penseira, a direita escura e queimada como sempre. Não parecia ter sarado, e fiquei imaginando, talvez pela centésima vez, o que teria causado aquele ferimento singular, mas não perguntei nada, tampouco, Harry. Dumbledore dissera que nos contaria no momento certo e, seja como for, havia outro assunto que precisávamos discutir. Antes, porém, que pudéssemos eu ou Harry mencionar qualquer coisa, Dumbledore falou:
— Ouvi dizer que vocês se encontraram com o ministro da Magia no Natal.
— Verdade — Respondeu Harry — Acho que ele não ficou muito satisfeito com a gente.
— Não. — Suspirou Dumbledore — Ele também não está muito satisfeito comigo. É preciso tentar não sucumbir sob o peso de nossas angústias, Harry, e continuar a lutar.
O garoto sorriu.
— Ele queria que eu e o Harry disséssemos à comunidade bruxa que o Ministério está fazendo um trabalho maravilhoso. — Cruzei os braços enquanto falava
Dumbledore sorriu.
— Originalmente, essa ideia foi de Fudge, sabe. Nos últimos dias de Ministério, quando ele ainda tentava desesperadamente se manter no cargo, quis se encontrar com vocês dois, na esperança de receber apoio...
— Depois de tudo que ele fez no ano passado?! — Exclamou Harry irritado — Depois da Umbridge?
— É mesmo um cara de pau. — Acabei soltando, depois acrescentei depressa: — Desculpa, professor.
— Não, tudo bem. Eu disse ao Cornélio que não havia a menor chance dele ver vocês, mas a ideia não morreu quando ele deixou o cargo. Horas depois de Scrimgeour ser nomeado, nos encontramos e ele exigiu que eu marcasse uma reunião com vocês dois…
— Então foi por isso que os senhores se desentenderam! — Deixou escapar Harry — Deu no Profeta Diário.
— O Profeta Diário às vezes acaba noticiando a verdade, ainda que por acaso. Certo, foi por isso que discutimos. Bem, parece que finalmente Rufo descobriu um jeito de encurralar vocês.
— Ele nos acusou de ser “por inteiro de Dumbledore”.
— Que grosseria a dele.
— Eu respondi a ele que eramos. — Respondi
Dumbledore abriu a boca para falar e tornou a fechá-la. Às costas de Harry, Fawkes, a fênix, soltou um pio baixo, suave e melodioso. Para o intenso constrangimento meu e de Harry, percebemos repentinamente que os olhos muito azuis de Dumbledore pareciam marejados, e depressa comecei a encarar minhas botas pretas. Quando o diretor falou, porém, sua voz estava bem firme.
— Fico muito comovido, Rox.
— Scrimgeour queria saber aonde o senhor vai quando não está em Hogwarts. — Tornou Harry, os olhos fixos nos joelhos
— É, ele anda muito curioso a respeito disso. — Disse Dumbledore, agora com a voz animada, e achei que já era seguro erguer os olhos — Chegou a tentar mandar me seguir. Na realidade, é engraçado. Pôs Dawlish no meu rastro. Não foi nada gentil. Já fui obrigado a azarar Dawlish uma vez; tive de fazer isto outra vez, lamentando muito.
— Então eles continuam sem saber aonde o senhor vai? — Perguntei esperançosa, iludidamente esperando obter mais informações sobre sua intrigante ausência, mas os olhos de Dumbledore meramente sorriram por cima dos oclinhos de meia-lua
— Continuam, e ainda não chegou a hora de você e Harry saberem. Mas me diga, Rox, soube que você se encontrou com o Magizoologista Trevor Fawley.
— Ah, sim… — Falei pensativa se contava a ele da minha visita à Somerset no ano retrasado — ele veio conversar comigo.
— Sei o que houve com Trevor nos últimos meses, envolvendo inclusive sua esposa Genevieve Burke, então acho que imagino o motivo da visita e espero que não tenha praticado Necromancia, Rox…
— Ah, não, não, professor... — Me apressei em dizer
— Certo, pois você sabe o quanto isso pode ser perigoso para seu organismo, não? — Perguntou Dumbledore e eu assenti — Ótimo, acho que Trevor não desejaria nada de mal a você, mesmo que para falar alguns minutos com Mirian Lourence…
Eu suspirei, mal por Mia e tudo que ela passou, mas logo o diretor continuou:
— Agora sugiro que nos apressemos, a não ser que tenham mais alguma coisa...?
— Na realidade temos, sim, senhor. —Harry se adiantou — Eu tenho. É sobre Malfoy e Snape.
— Professor Snape, Harry.
— Sim, senhor. Eu escutei os dois e a prima do Malfoy, a tal Lestrange, durante a festa do professor Slughorn... bem, para dizer a verdade, eu os segui...
Dumbledore ouviu impassível a história de Harry, eu suspirei apenas. Quando o garoto terminou, o diretor permaneceu calado por alguns momentos, depois disse:
— Obrigado por me contar, Harry, mas sugiro que você esqueça esse assunto. Acho que não tem grande importância.
— Não tem grande importância? —Repetiu Harry incrédulo — Professor, o senhor entendeu...?
— Claro, Harry, abençoado como sou com uma extraordinária capacidade intelectual, entendi tudo que me contou. — Disse Dumbledore, com uma certa rispidez — Acho mesmo que você talvez devesse considerar a possibilidade de eu ter entendido mais do que você. Mais uma vez fico satisfeito que tenha confiado em mim, mas asseguro que você não me disse nada que possa me inquietar.
Harry ficou parado, percebi que em furioso silêncio, olhando zangado para Dumbledore. sua mente bastante irritada, e acessível enquanto tentava entender o motivo da indiferença do diretor.
— Então, senhor — Perguntou Harry num tom que desejava que fosse educado e calmo —, o senhor decididamente ainda confia...?
— Já fui bastante tolerante em ter respondido a essa pergunta. — Replicou Dumbledore, mas sua voz já não parecia muito tolerante — Minha resposta não mudou.
— Eu acharia que não. — Falou uma voz irônica; evidentemente era Phineus Nigellus que apenas fingia estar dormindo. Dumbledore não lhe deu atenção
— E agora, Harry e Rox, devo insistir que nos apressemos. Tenho coisas mais importantes a discutir com vocês dois hoje à noite.
Eu concordei, mas observei que Harry parecia revoltado, como se quisesse insistir em suas suspeitas. Como se tivesse lido a mente de Harry, Dumbledore balançou a cabeça.
— Ah, Harry, com que frequência isso ocorre até entre os melhores amigos! Cada qual acredita que o que tem a dizer é muito mais importante do que qualquer coisa que o outro tenha a contribuir!
— Eu não acho que seja pouco importante o que o senhor tem a dizer. — Disse Harry, formal, eu quase lhe dei um tapa pra ver se ele parava de ser carrancudo, mas me contive
— Bem, você tem toda razão, porque não é. — Respondeu o diretor com energia — Tenho mais duas lembranças para lhes mostrar esta noite, ambas obtidas com enorme dificuldade, e creio que a segunda seja a mais importante que já recolhi.
Harry não fez comentários, ainda parecia irritado e eu só obervava o diretor com curiosidade.
— Então — Disse o diretor em tom ressonante —, na reunião desta noite daremos prosseguimento à história de Tom Riddle, que na última aula deixamos no limiar de sua entrada em Hogwarts. Vocês lembrarão como ele ficou excitado ao ouvir que era bruxo, que recusou a minha companhia para ir ao Beco Diagonal e que eu, por minha vez, o alertei contra a prática de furtos quando chegasse à escola.
“Bem, chegou o início do ano escolar e com ele veio Tom Riddle, um garoto quieto, com vestes de segunda mão, que se enfileirou com os outros calouros para a Seleção. Quase no instante em que o Chapéu Seletor tocou sua cabeça, ele foi colocado na Slytherin ” continuou Dumbledore, indicando com a mão escurecida a prateleira acima de sua cabeça onde estava o Chapéu Seletor, antigo e imóvel. Essa frase no entanto me fez lembrar da minha própria seleção em que o Chapéu mal tocara a cabeça de Draco e já o mandara para Slytherin. “Não sei em que momento Riddle soube que o famoso fundador da Casa era capaz de falar com as cobras, talvez naquela mesma noite. Este conhecimento só pode tê-lo alvoroçado e incentivado o seu senso de importância.
“Contudo, se estava assustando ou impressionando os colegas da Slytherin com demonstrações de ofidioglossia na sala comunal, os professores de nada souberam. Ele não manifestava nenhum sinal de arrogância ou agressividade. Sendo um órfão talentoso e muito bonito, é claro que atraiu a atenção e a solidariedade dos professores quase na hora em que chegou. Parecia educado, quieto e sedento de saber. Deixou praticamente todos bem impressionados.”
— O senhor não contou a eles como era o Tom quando o conheceu no orfanato? — Perguntou Harry
— Não, não contei. Embora ele não tivesse demonstrado o menor remorso, era possível que estivesse arrependido pelo seu comportamento anterior e resolvido a virar a página. Preferi lhe dar essa oportunidade.
Dumbledore fez uma pausa e olhou curioso para Harry, que abrira a boca para falar. Sei bem no que ele estava pensando. Ali estava novamente a tendência do diretor a confiar nas pessoas, apesar dos indícios avassaladores de que não mereciam sua confiança!
— Mas o senhor não confiava nele realmente, não é? — Perguntou Harry, parecendo lembrar-se de repente — Ele me disse... o Riddle que saiu daquele diário disse: “Dumbledore nunca pareceu gostar tanto de mim quanto os outros professores.”
Eu olhei para meu melhor amigo sem entender como ele nunca comentou sobre isso.
— Digamos que eu não pressupus que ele fosse confiável. — Respondeu Dumbledore — Conforme já mencionei, eu tinha decidido vigiá-lo de perto, e foi o que fiz. Não posso fingir que, a princípio, tenha conseguido grande coisa com as minhas observações. Ele era muito reservado comigo; percebia, sem dúvida, que, na emoção de descobrir sua verdadeira identidade falara demais. Cuidava-se para não tornar a revelar tanto, mas não podia retirar o que deixara escapar em sua empolgação nem o que a sra. Cole me confidenciara. Tinha, no entanto, o bom-senso de jamais tentar me cativar como fazia com tantos colegas meus.
“À medida que progredia na vida escolar, ele foi reunindo ao seu redor um grupo de ‘amigos dedicados’; eu os chamo assim, na falta de um termo melhor, embora eu já tenha mencionado que inegavelmente Riddle não sentia afeto por nenhum deles. O grupo exercia uma espécie de fascinação sombria no castelo. Era uma coleção variada; uma mistura de fracos em busca de proteção, ambiciosos em busca de partilhar sua glória, e violentos que gravitavam em torno de um líder capaz de ensinar formas mais requintadas de crueldade. Em outras palavras, eles foram os precursores dos Comensais da Morte, e, na verdade, quando terminaram Hogwarts, alguns deles se tornaram os primeiros Comensais.
“Controlados com rigor por Riddle, nunca foram apanhados agindo mal abertamente, embora os sete anos que passaram em Hogwarts tivessem sido marcados por numerosos incidentes desagradáveis a que eles jamais foram comprovadamente ligados, entre os quais a abertura da Câmara Secreta – sem dúvida, o mais sério deles – que resultou na morte de uma garota. Hagrid, como vocês sabem, foi injustamente acusado desse crime.
“Não consegui encontrar muitas lembranças de Riddle em Hogwarts — Disse Dumbledore, pousando a mão murcha na Penseira — Poucos que o conheceram naquele tempo querem falar sobre ele; estão aterrorizados demais. Descobri o que sei depois de sua saída de Hogwarts, depois de penosos esforços, depois de localizar os poucos que poderiam ser induzidos a falar, depois de pesquisar em registros antigos e interrogar testemunhas bruxas e trouxas.
“Aqueles que consegui convencer a falar me contaram que Riddle tinha obsessão por sua ascendência. O que, naturalmente, é compreensível; tinha sido criado em um orfanato e naturalmente queria saber como fora parar lá. Parece que procurou em vão algum vestígio de Tom Riddle pai nos brasões da sala de troféus, nas listas de monitores nos antigos registros da escola, e até mesmo em livros de história bruxa. Por fim, foi forçado a aceitar que seu pai jamais pusera os pés em Hogwarts. Creio ter sido então que ele abandonou o seu nome para sempre, assumiu a identidade de Lorde Voldemort e começou a investigar a família de sua desprezada mãe – a mulher que, vocês lembrarão, ele achava que não podia ser bruxa porque sucumbira à vergonhosa fraqueza humana da morte.
“Sua única pista era o nome ‘Servolo’, que, segundo soubera pelos que dirigiam o orfanato, era o nome do pai de sua mãe. Finalmente, depois de penosas pesquisas em velhos livros de famílias bruxas, ele descobriu a existência do ramo sobrevivente da família Slytherin. No verão de seu décimo sexto aniversário, saiu do orfanato ao qual retornava todo ano e foi procurar seus parentes Gaunt. E agora, Harry e Rox, se você se levantarem...”
Dumbledore ergueu-se, e eu vi que de novo segurava um frasquinho de cristal em que revolvia uma lembrança perolada.
— Tive muita sorte em recolher esta —Disse, despejando a massa refulgente na Penseira — Vocês entenderão a razão quando a tiver vivenciado. Vamos?
Eu e Harry nos aproximamos da bacia de pedra e como sempre, fui a primeira a me inclinar obedientemente até meu rosto afundar na superfície da lembrança; tive a conhecida sensação de cair no vácuo, e em seguida aterrissei em um piso de pedra suja envolto em quase total escuridão.
Precisei de vários segundos para reconhecer o lugar, tempo que levou para Harry e Dumbledore aterrissarem ao meu lado. A casa dos Gaunt agora estava indescritivelmente mais imunda do que qualquer lugar que eu já vi. O teto estava coalhado de teias de aranha, o chão coberto por uma camada de sujeira; havia comida mofada e podre sobre a mesa, em meio a várias panelas com crostas. A única luz vinha de uma vela derretida, colocada aos pés de um homem com cabelos e barba tão crescidos que eu não conseguia distinguir nem olhos nem boca. Ele estava largado em uma poltrona junto à lareira, e cheguei a me perguntar por um momento se ele estaria morto. Ouvi, então, uma forte batida na porta e o homem despertou instantaneamente, empunhando uma varinha na mão direita e uma faca curta na esquerda.
A porta se entreabriu, rangendo. Na soleira, segurando um lampião antiquado, encontrava-se um garoto, alto, pálido, os cabelos muito escuros, mas caramba, que bonito. Me boquiabri totalmente olhando para aquela visão do paraíso, meio com um lado das trevas.
— Caramba, ele é um gato! — Acabei deixando escapar
— Fecha a boca, maluca! É o Voldemort! — Mandou Harry me dando uma cotovelada e me fazendo corar
Levei minhas mãos a boca, meio nervosa e continuei olhando a cena do Voldemort jovem e horripilantemente gato. O olhar dele percorreu lentamente o casebre e deparou com o homem na poltrona. Por alguns segundos eles se encararam, então o homem se pôs de pé com dificuldade, as muitas garrafas a seus pés tombaram e retiniram no chão.
— VOCÊ! — Berrou ele — VOCÊ!
E ele se arremessou ebriamente contra Riddle, a varinha e a faca erguidas.
— Pare.
Riddle falou, logo reconheci que em linguagem de cobra. O homem derrapou e bateu na mesa, lançando as panelas emboloradas no chão, onde caíram com estrépito. Ele encarou Riddle. Fez-se um longo silêncio enquanto se estudavam. O homem perguntou:
— Você sabe falar?
— Sei falar — Respondeu Riddle. Ele entrou na sala permitindo que a porta se fechasse às suas costas
Eu não pude deixar de sentir uma admiração mesclada de ressentimento pelo completo destemor de Voldemort. Seu rosto expressava apenas desagrado e, talvez, desapontamento.
— Onde está Servolo? — Perguntou ele
— Morreu. Morreu há anos, não foi?
Riddle franziu a testa.
— Quem é você, então?
— Sou Morfino, não sou?
— O filho de Servolo?
— Claro que sou, então…
Morfino afastou os cabelos do rosto sujo, para enxergar Riddle melhor, e notei que ele usava o anel de pedra negra na mão direita.
— Pensei que você fosse aquele trouxa. — Sussurrou Morfino — Você é a cara daquele trouxa.
— Que trouxa? — Perguntou Riddle com rispidez
— Aquele trouxa que minha irmã gostava, aquele trouxa que mora na casa grande mais adiante na estrada. — Respondeu Morfino, e inesperadamente cuspiu no chão entre os dois — Você é igualzinho a ele. Riddle. Mas ele está mais velho agora, não é? Mais velho do que você, agora que estou pensando…
Morfino pareceu ligeiramente atordoado e oscilou um pouco, ainda se apoiando na borda da mesa. Mas ele tinha razão, Voldemort era realmente muito igual ao pai.
— Ele voltou, sabe. — Acrescentou Morfino tolamente
Voldemort mirava Morfino como se avaliasse suas possibilidades. Aproximou-se um pouco mais e perguntou:
— Riddle voltou?
— Ar, deixou ela, e foi bem feito, casar com ralé! — Explicou Morfino, e tornou a cuspir no chão — E roubou a gente, veja bem, antes de fugir! Onde está o medalhão, eh, onde está o medalhão de Slytherin?
Voldemort não respondeu. Morfino foi se enraivecendo outra vez; brandiu a faca e gritou:
— Ela desonrou a gente, foi o que ela fez, a vadia! E quem é você para entrar aqui e ficar fazendo perguntas sobre isso? Já acabou, não é... acabou…
Ele desviou o olhar, cambaleando um pouco, e Voldemort se adiantou. Ao fazer isso, sobreveio uma escuridão anormal, que apagou a luz do lampião de Voldemort e a vela de Morfino, apagou tudo...
Os dedos de Dumbledore apertaram o meu braço e o de Harry e tornamos a voar para o presente. A claridade suave e dourada do escritório de Dumbledore pareceu ofuscar os meus olhos depois daquela escuridão impenetrável.
— Pera? — Falei intrigada — Quê que aconteceu, afinal? Ele matou ele?
— É só isso? — Harry perguntou imediatamente — Por que ficou escuro, que aconteceu?
— Porque Morfino não conseguiu lembrar mais nada daquele ponto em diante — Respondeu Dumbledore, fazendo um gesto para que eu e Harry tornassemos a se sentar — Quando ele acordou na manhã seguinte, estava deitado no chão, sozinho. O anel de Servolo desaparecera.
“Nesse meio-tempo, na aldeia de Little Hangleton, uma empregada corria pela rua principal gritando que havia três corpos caídos na sala de visitas da casa grande: Tom Riddle pai, e a mãe e o pai dele.
“As autoridades trouxas ficaram perplexas. Pelo que sei, até hoje não sabem como os Riddle morreram, porque a Maldição Avada Kedavra normalmente não produz dano visível... a exceção acha-se à minha frente”, acrescentou Dumbledore, indicando a cicatriz de Harry. “Por outro lado, o Ministério percebeu na mesma hora que se tratava de um homicídio bruxo. Percebeu também que um sentenciado que odiava trouxas morava no vale do lado oposto à casa dos Riddle, um bruxo que já fora preso por atacar uma das pessoas assassinadas.
“Então o Ministério fez uma visita a Morfino. Não precisaram interrogá-lo nem usar Veritaserum nem Legilimência. Ele confessou o homicídio imediatamente, fornecendo detalhes que somente o assassino poderia conhecer. Disse que sentia orgulho de ter matado os trouxas, havia anos que esperava essa oportunidade. Ele entregou a varinha, e logo se comprovou que fora usada para matar os Riddle. E Morfino se deixou levar para Azkaban sem resistir. A única coisa que o perturbava era que o anel de seu pai desaparecera. ‘Ele vai me matar por ter perdido o anel’, repetia, sem parar, aos seus captores. E, aparentemente, isso foi tudo que voltou a dizer. Ele viveu o resto da vida em Azkaban, lamentando a perda da última peça herdada por Servolo, e foi enterrado ao lado da prisão com outros pobres coitados que expiraram em seu interior.”
— Então Voldemort roubou a varinha de Morfino e a usou? — Perguntou Harry, sentando-se ereto
— Exatamente. — Respondeu Dumbledore — Não temos lembranças para confirmar isto, mas acho que podemos ter razoável certeza do que aconteceu. Voldemort estupeficou o tio, apanhou sua varinha e atravessou o vale em direção “à casa grande mais adiante na estrada”. Lá, ele matou o trouxa que abandonara sua mãe bruxa, e, por precaução, os avós trouxas, suprimindo, assim, os últimos membros da indigna família Riddle e vingando-se do pai que jamais o quisera. Voltou, então, ao casebre dos Gaunt, realizou o complexo feitiço de implantar uma falsa lembrança na mente do tio, colocou a varinha de Morfino ao lado do seu dono inconsciente, guardou o anel antigo que ele usava e partiu.
— E Morfino nunca percebeu que não tinha sido ele? — Perguntei me ajeitando no assento e mexendo no pingente da letra “R” no centro de um coração do colar no meu pescoço
— Nunca. Como digo, ele fez uma confissão vaidosa e completa.
— Mas durante todo esse tempo guardou a lembrança verdadeira!
— Guardou, mas foi necessária uma boa dose de competente Legilimência para fazê-la aflorar. E por que alguém iria se deter mais tempo examinando a mente de Morfino se ele já confessara o crime? Contudo, consegui permissão para visitá-lo em suas últimas semanas de vida, época em que eu estava tentando descobrir o máximo possível sobre o passado de Voldemort. Extraí a lembrança com dificuldade. Quando vi o que continha, tentei usá-la para obter a libertação de Morfino de Azkaban. Mas, antes que o Ministério tomasse uma decisão, ele morreu.
— Mas por que o Ministério não percebeu que Voldemort tinha feito tudo isso a Morfino? — Perguntou Harry indignado — Ele era menor de idade à época, não era? Pensei que fossem capazes de detectar o uso de magia por menores.
— Você está certo, Harry... eles podem detectar a magia, mas não o seu autor: você está lembrado que o Ministério o culpou pelo Feitiço de Levitação que na verdade foi realizado por…
— Dobby — Resmungou Harry; a injustiça ainda o exasperava
— Então… — Falei começando a ficar interessada — se um menor de idade usa a magia em um bruxo adulto ou na casa de um bruxo, o Ministério não fica sabendo?
— Certamente não saberá dizer quem realizou o feitiço. — Respondeu Dumbledore com ar de riso ao ver a grande indignação no rosto de Harry e minha curiosidade — O Ministério confia que os pais bruxos exijam dos filhos que moram sob seu teto o cumprimento das leis.
— Mamãe exige. — Levantei a mão na hora enquanto alegava
— Ora que bobagem — Retorquiu Harry — Veja o que aconteceu neste caso, veja o que aconteceu a Morfino!
— Concordo. Por pior que fosse Morfino, ele não merecia morrer como morreu, culpado por crimes que não tinha cometido. Mas está ficando tarde, e quero que vocês vejam mais uma lembrança antes de nos separarmos…
Dumbledore tirou de um bolso interno outro frasquinho de cristal, e eu me calei, lembrando que o diretor lhe dissera que era a lembrança mais importante que tinha recolhido. Reparei que foi difícil esvaziar o conteúdo do frasco na Penseira, como se estivesse levemente congelado; será que as lembranças talhavam?
— Esta vai ser rápida — Disse Dumbledore, quando finalmente esvaziou o frasco — Estaremos de volta antes que vocês percebam. Mais uma vez, mergulhem na Penseira, então…
E eu fui a primeira a atravessar mais uma vez a superfície prateada, aterrissando desta vez diante de um homem que reconheci imediatamente.
Era um Horácio Slughorn mais jovem. Eu estava tão habituada a vê-lo careca que achei a visão de Slughorn com uma basta e brilhante cabeleira cor de palha muito desconcertante; dava a impressão de que mandara cobrir a cabeça de sapê, embora no topo já fosse visível uma tonsura calva e reluzente. Os bigodes, menos compactos do que os atuais, eram louroavermelhados. Ele não era tão gordo quanto o Slughorn que eu conheço, embora os botões dourados do seu colete ricamente bordado já estivessem sob tensão. Com os pezinhos apoiados sobre um pufe de veludo, ele se encontrava sentado em uma confortável bergère, tendo um cálice de vinho em uma das mãos e a outra enfiada em uma caixa de abacaxi cristalizado.
Olhei ao redor quando Harry e depois Dumbledore apareceram ao meu lado e percebi que estávamos no escritório de Slughorn. Havia meia dúzia de garotos sentados ao redor do professor, todos em cadeiras mais duras e baixas do que a dele, e todos aparentando uns dezesseis anos. Eu reconheci Riddle imediatamente. Tinha o rosto mais bonito, e parecia o mais descontraído dos garotos. Sua mão direita estava pousada negligentemente sobre o braço da cadeira; com um sobressalto, vi que ele estava usando o anel ouro e negro de Servolo; já tinha matado o pai.
— Senhor, é verdade que a professora Merrythought está se aposentando? — Perguntou Riddle
— Tom, Tom, se eu soubesse não poderia lhe dizer. — Respondeu Slughorn, sacudindo um dedo açucarado para Riddle, num gesto de censura, embora estragasse esse efeito com uma ligeira piscadela — Confesso que gostaria de saber onde você obtém suas informações, rapaz; sabe mais do que metade dos professores.
Riddle sorriu; os outros garotos riram e lhe lançaram olhares de admiração.
— Com a sua fantástica habilidade para saber o que não deve e a sua cuidadosa bajulação das pessoas certas... aliás, obrigado pelo abacaxi, você acertou, é o meu preferido…
Enquanto vários garotos abafavam risinhos, aconteceu algo muito estranho. A sala foi repentinamente tomada por uma densa névoa branca, impedindo-me de ver outra coisa além do rosto de Dumbledore e o de Harry, que estavam parados ao meu lado. Então, a voz de Slughorn ecoou através da névoa, anormalmente alta:
— ... você vai acabar mal, rapaz, escute bem o que estou dizendo.
A névoa desapareceu tão repentinamente quanto surgira, embora ninguém fizesse qualquer alusão nem parecesse ter visto nada diferente acontecer. Intrigado, corri os olhos pela sala no mesmo instante em que um pequeno relógio de ouro em cima da escrivaninha de Slughorn batia onze horas.
— Santo Deus, já é tão tarde assim?! — Exclamou o professor — É melhor irem andando, rapazes, ou vamos todos nos meter em confusão. Lestrange, quero o seu trabalho até amanhã ou receberá uma detenção. O mesmo se aplica a você, Avery.
Slughorn levantou-se da poltrona com esforço e levou seu cálice vazio até a escrivaninha enquanto os garotos saíam. Riddle, no entanto, ficou para trás. Percebi que o garoto se demorava de propósito, querendo ser o último na sala com o professor.
— Ande logo, Tom — Disse Slughorn se virando e ainda encontrando-o ali — Você não quer ser apanhado fora da cama depois da hora, ainda mais sendo monitor...
— Senhor, eu queria lhe perguntar uma coisa.
— Pois pergunte, meu rapaz, pergunte...
— Senhor, estive me perguntando o que o senhor sabe sobre... sobre Horcruxes?
E o mesmo fenômeno tornou a acontecer: o denso nevoeiro invadiu a sala de modo que não pude mais ver Slughorn nem Riddle; apenas Harry, e Dumbledore sorrindo serenamente ao nosso lado. Então a voz do professor ecoou exatamente como acontecera antes.
— Não sei nada sobre Horcruxes e não lhe diria se soubesse! Agora saia daqui imediatamente e não me deixe apanhá-lo mencionando isso outra vez!
— Bem, é só — Anunciou Dumbledore placidamente ao meu lado e de Harry — Hora de partir.
E os meus pés saíram do chão e bateram, segundos depois, no tapete defronte à escrivaninha de Dumbledore.
— Mas o que aconteceu? — Perguntei
— A lembrança é só isso? — Perguntou Harry , por sua vez, sem entender
Dumbledore dissera que essa lembrança era a mais importante de todas, mas não consegui ver o que tinha de tão significativo. Sem dúvida, o nevoeiro e o fato de que ninguém parecia tê-lo percebido eram esquisitos, mas afora isso nada mais acontecera além de Riddle ter feito uma pergunta e não ter recebido resposta.
— Vocês talvez tenham notado — Disse Dumbledore tornando a se sentar à escrivaninha — que essa lembrança foi alterada.
— Alterada? — Repetiu Harry, sentando-se também
Eu arqueei uma sobrancelha, me sentando lentamente e cruzando as pernas.
— Certamente. O professor Slughorn modificou as próprias recordações.
— Mas por que faria isso?
— Porque, em minha opinião, tem vergonha do que lembra. E tentou retrabalhar a lembrança para aparecer sob uma luz mais favorável, apagando as partes que não quer que eu veja. Fez isto, como vocês devem ter reparado, de modo muito tosco, o que foi muito bom, porque mostra que a lembrança verdadeira persiste sob as alterações.
“Então, pela primeira vez, vou lhes passar um dever de casa, para os dois. Vocês deverão persuadir o professor Slughorn a revelar a lembrança verdadeira, que sem dúvida será a nossa informação mais crucial.”
Harry arregalou os olhos para o diretor, eu meramente franzi a testa.
— Mas, com certeza, senhor —Respondeu Harry no tom de voz mais respeitoso possível —, o senhor não precisa de mim… ou da Rox… o senhor pode usar Legilimência... ou Veritaserum...
— O professor Slughorn é um bruxo extremamente competente que estará prevenido contra ambos os recursos. Ele é muito mais competente em Oclumência do que o pobre Morfino Gaunt, e eu não me espantaria se estivesse carregando um antídoto contra o soro da verdade desde que o obriguei a me contar este arremedo de recordação.
“Não, acho que seria tolice tentar extrair a verdade do professor Slughorn à força, faria mais mal do que bem; não quero que ele abandone Hogwarts. Contudo, ele tem fraquezas como todos nós, e acredito que vocês dois sejam os únicos que talvez possam penetrar suas defesas. É muito importante obtermos a lembrança verdadeira, meninos... e sua real importância nós só saberemos quando virmos o que de fato aconteceu. Então, boa sorte... e boa-noite.”
Um pouco surpreso ante a dispensa abrupta, Harry se pôs de pé ligeiro, depois olhou pra mim, me fazendo saltar da cadeira também.
— Boa-noite, senhor.
Ao fechar a porta atrás de nós, ouvimos distintamente o comentário de Phineus
Nigellus:
— Não vejo por que os dois garotos seriam capazes de fazer isso melhor que você, Dumbledore.
— Eu não esperaria que visse, Phineus. — Replicou Dumbledore, e Fawkes soltou outro pio baixo e melodioso
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro