{90} Falsas Predições
Passamos o resto da aula tomando notas sobre cada uma das Maldições Imperdoáveis. Ninguém falou até a sineta tocar – mas quando Moody nos dispensou e saímos da sala, a turma explodiu em um falatório irrefreável. A maioria dos alunos discutia as maldições em tom de assombro: “Você viu ela se contorcendo?”, “... e quando ele matou a aranha – assim!”.
Comentavam a aula como se ela tivesse sido um espetáculo fantástico, mas eu não a achara nada divertida – tampouco Hermione e Harry.
— Anda logo. — Disse ela tensa para eu e os meninos
— Não é a biblioteca outra vez, é? — Perguntou Rony
— Não. — Respondeu a garota, secamente, apontando para um corredor lateral — Neville.
Neville estava em pé sozinho, no meio do corredor, de olhos fixos na parede de pedra oposta, com a mesma expressão horrorizada e pasma que fizera quando Moody demonstrara a Maldição Cruciatus.
— Neville? — Chamou Hermione de mansinho. Neville virou a cabeça.
— Ah, alô. — Disse ele, a voz mais aguda do que habitualmente — Aula interessante, não foi? Que será que tem para o jantar, estou... estou morto de fome, vocês não?
— Neville, você está bem? — Perguntei
— Ah, claro, estou ótimo. — Balbuciou o garoto, na mesma voz anormalmente aguda — Jantar muito interessante... quero dizer, aula... que será que tem para se comer?
Rony lançou a Harry um olhar assustado, e depois me olhou da mesma forma.
— Neville, que...?
Mas ouvimos às costas um som seco metálico estranho e, ao nos virarmos, vimos o Prof. Moody vindo em nossa direção. Nós cinco ficamos em silêncio, observando-o apreensivos, mas quando ele falou, foi com um rosnado bem mais baixo e gentil do que tínhamos ouvido até então.
— Está tudo bem, filho. — Disse ele a Neville — Por que não vem até a minha sala? Vamos... podemos tomar uma xícara de chá...
Neville ficou ainda mais assustado ante a perspectiva de tomar chá com Moody. Ele não se mexeu nem falou.
Moody virou o olho mágico para Harry.
— Você está bem, não está, Potter?
— Estou. — Disse Harry, quase em tom de desafio
O olho azul de Moody estremeceu de leve na órbita ao examinar Harry. Então falou:
— Vocês têm que saber. Parece cruel, talvez, mas vocês têm que saber. Não adianta fingir... bom... venha, Longbottom, tenho uns livros que podem lhe interessar.
Neville olhou suplicante para eu, Rony, Harry, e Hermione, mas não dissemos nada, de modo que o garoto não teve escolha senão se deixar conduzir, uma das mãos nodosas de Moody em seu ombro.
— Que foi que houve? — Perguntou Rony, observando Neville e Moody virarem para outro corredor
— Não sei. — Disse Hermione, parecendo pensativa
— Mas foi uma aula e tanto, hein? — Disse Rony a mim e Harry, quando nos dirigiamos ao Salão Principal — Fred e George tinham razão, não é? Ele realmente conhece o assunto, o Moody. Quando ele lançou Avada Kedavra, o jeito com que aquela aranha simplesmente morreu, apagou na hora...
Mas Rony se calou de súbito ao ver a expressão no rosto de Harry, e logo viu que eu também não estava tão animada com aquilo. Ron não tornou a falar até chegarmos ao salão, quando comentou que era melhor começarmos a preparar o trabalho sobre as predições da Profa. Trelawney àquela noite, porque íamos demorar horas naquilo.
Hermione não entrou na nossa conversa durante o jantar, mas comeu furiosamente depressa e, em seguida, foi para a biblioteca. Eu e os meninos voltamos à Torre da Gryffindor, e Harry, que parecia não pensar em outra coisa durante todo o jantar, agora levantou o assunto das Maldições Imperdoáveis.
— Moody e Dumbledore não ficariam encrencados se o Ministério soubesse que vimos lançar as maldições? — Perguntou ele ao nos aproximarmos da Mulher Gorda
— Provavelmente. — Disse Rony — Mas Dumbledore sempre fez as coisas do jeito dele, não é, e Moody, eu imagino, já anda encrencado há anos. Atacar primeiro e fazer perguntas depois, vê só a história das latas de lixo.
— Ele é um completo biruta. — Acrescentei
A Mulher Gorda girou para a frente, revelando a passagem e entramos na sala comunal da Gryffindor, que estava cheia e barulhenta.
— Vamos apanhar o nosso material de Adivinhação, então? — Sugeri
— Acho que sim. — Gemeu Rony.
Os dois subiram ao dormitório deles para apanhar os seus livros e mapas e eu me direcionei para o meu, estava vazio, apenas apanhei meu exemplar de Esclarecendo o futuro e voltei à sala comunal, os meninos chegaram no mesmo instante.
— Neville estava lá. — Disse Harry para mim enquanto procurávamos uma mesa para começar a trabalhar as predições para o mês seguinte
— Ele está melhor? — Perguntei já ajeitando meu livro e pergaminhos na mesa
— Sim. — Explicou Rony — Parece que Profa. Sprout andou dizendo que ele é muito bom em Herbologia, o Prof. Moody lhe deu um livro de plantas, algo assim, então ele está ótimo.
Fiquei feliz que ele estivesse melhor. Repetir para Neville o que a Profa. Sprout dissera fora uma maneira muito delicada de animar ele, porque Neville raramente ouvia alguém dizer que ele era bom em alguma coisa. Era o tipo de coisa que o Prof. Lupin teria feito, então talvez o Prof. Moody viesse a ser um bom professor.
Uma hora mais tarde, tínhamos feito pouco progresso no trabalho de Adivinhação, embora a mesa estivesse coalhada de pedaços de pergaminho cobertos com somas e símbolos e meu cérebro estivesse enevoado, como se impregnado pela fumaça da lareira da Profa. Trelawney.
— Não tenho a menor ideia do significado disso. — Disse Harry examinando a longa lista de cálculos
— Eu muito menos! — Falei impaciente
— Sabe de uma coisa. — Disse Rony, cujos cabelos estavam de pé de tanto o garoto passar os dedos por eles, cheio de frustração — Acho que voltamos à velha regra da Adivinhação.
— Quê... inventar? — Perguntou Harry, mas eu consegui entender onde meu irmão queria chegar
— É. — Respondeu Rony, varrendo da mesa o monte de anotações e mergulhando a pena no tinteiro para começar a escrever — Na próxima segunda-feira... — Disse ele enquanto escrevia — Há grande probabilidade de eu apanhar uma tosse, devido à infeliz conjunção de Marte com Júpiter — Ele então ergueu os olhos para mim e Harry — Vocês conhecem ela: escreve uma porção de desgraças que ela engole tudo.
— Claro. — Falei, de repente sorrindo logo me livrando das antigas anotações — Bom... vamos ver, na segunda feira eu... eu... Ah, sim. Eu vou acabar me atrasando para a aula de poções e levar uma bronca do Prof. Snape.
— Eu não queria estar na sua pele. — Disse Rony brincando — Sua vez Harry.
— Certo. — Disse Harry, amassando seu primeiro rascunho e atirando-o por cima das cabeças de um grupo de alunos do primeiro ano que conversavam — Muito bem... na segunda-feira vou correr o perigo de... hum... me queimar.
— E vai mesmo. — Disse Rony sombriamente — Vamos ver os explosivins de novo. OK, terça-feira vou... hum...
— Perder algo valioso.— Sugeri enquanto folheava o Esclarecendo o futuro à procura de ideias
— Boa. — Disse Rony, copiando-a — Por causa de... hum... Mercúrio. Por que você não leva uma punhalada pelas costas de alguém que você pensou que fosse amigo?
— Ótimo... — Anotei a sugestão — Porque... Vênus está na décima segunda casa. E Harry que tal você cair da escada?
— Não é uma boa coisa pra se desejar a alguém, mas é uma boa sugestão. — Harry falou enquanto escrevia
— E na quarta-feira, acho que vou levar a pior em uma briga. — Disse Rony
— Ihh. Bom, se você vai entrar em uma briga e perder, é óbvio que eu vou tentar te defender, então vou acabar ganhando uma detenção na quarta-feira por bater em alguém ou lançar feitiços nos corredores. — Comecei a anotar — Nada que eu já não tenha feito antes. — Acrescentei de brincadeira
— Aah, eu ia ter uma briga. — Disse Harry — OK, vou perder uma aposta.
— É, você vai apostar que vou ganhar a minha briga... — Sugeriu Rony
Continuamos os três a inventar predições (que foram se tornando mais trágicas) por mais uma hora, enquanto a sala comunal se esvaziava à medida que as pessoas iam se deitar. Bichento foi até nós, deu um salto leve para uma cadeira vazia e me mirou misteriosamente, de um modo semelhante ao de Hermione quando sabia que não estávamos fazendo o dever de casa direito.
Fred e George tinham acabado de sair do Salão Comunal havia uns dez minutos quando o buraco do retrato se abriu e Hermione entrou na sala comunal, trazendo um rolo de pergaminho em uma das mãos e uma caixa, cujo conteúdo fazia barulho, na outra. Bichento arqueou as costas, ronronando.
— Alô. — Disse ela — Acabei!
— Eu também! — Dissemos eu e Rony ao mesmo tempo, em tom triunfante e largando as penas
Hermione se sentou, deixou as coisas que carregava em uma poltrona vazia e puxou as predições de Rony para ver, depois fez o mesmo com as minhas.
— Não vão ter um mês nada bom, hein? — Disse ela ironicamente, quando Bichento veio se enroscar em seu colo
— Bom, pelo menos estou prevenido. — Bocejou Rony
— E eu. Sabendo de tudo que pode acontecer, já tenho pelo que esperar. — Falei
— Você parece que vai se afogar duas vezes, Rox. — Disse a garota
— Ah, vou, é? — Falei baixando os olhos para minhas predições — É melhor eu trocar uma delas por um acidente com um hipogrifo desembestado. Se eu me afogar duas vezes, vou acabar morrendo, não sei nadar afinal...
— Aí vai ficar igual ao meu Roxanne, a Professora vai pensar que eu copiei do seu. — Resmungou Rony
— Não tenho culpa se somos gêmeos e muitas vezes pensamos igual, Ronald! — Rebati depois de corrigir o erro no pergaminho
— Vocês não acham que está um pouco óbvio que vocês inventaram isso tudo? — Perguntou Hermione
— Nós? Que calúnia. Foram os astros. — Falei teatralmente — Como pode pensar que teríamos essa audácia, Hermione? Estou bastante ofendida.
— Exatamente. Claro que foram os astros. Mione, como é que você se atreve! — Exclamou Rony, também fingindo-se ofendido — Estivemos trabalhando como elfos domésticos aqui!
Hermione ergueu as sobrancelhas.
— É só uma expressão. — Acrescentou ele depressa
No mesmo instante, Harry pousou a pena, ao me esticar para ver seu pergaminho, vi que ele tinha acabado de predizer a própria morte por decapitação.
— Péssimo jeito de morrer. — Comentei com um risinho
— Que é que tem nessa caixa? — Perguntou ele à Mione, apontando-a
— Engraçado você perguntar. — Respondeu a garota com um olhar feio para Rony. Tirou então a tampa e mostrou o conteúdo para nós
Dentro havia uns cinquenta distintivos, de cores diferentes, mas todos com os mesmos dizeres: F.A.L.E.
— Fale? — Estranhei, apanhando um distintivo e examinando-o — Falar o quê?
— Não é fale. — Protestou Mione impaciente — É F-A-L-E. Quer dizer, Fundo de Apoio à Liberação dos Elfos.
— Nunca ouvi falar nisso. — Disse Harry
— Ora, é claro que não ouviu. — Disse Hermione energicamente — Acabei de fundar o movimento.
— Ah, é? — Disse Rony com um ar levemente surpreso — E quantos membros já tem?
— Bom, se vocês três se alistarem... quatro.
— E você acha que queremos andar por aí usando distintivos que dizem “fale”, é? — Falou Rony
— F-A-L-E! — Corrigiu-o Hermione irritada — Eu ia pôr “Fim ao Abuso Ultrajante dos Nossos Irmãos Mágicos” e “Campanha para Mudar sua Condição”, mas não dava certo. Então F.A.L.E. é o título do nosso manifesto.
Ela brandiu um rolo de pergaminho para nós.
— Andei pesquisando minuciosamente na biblioteca. A escravatura dos elfos já existe há séculos. Custo a acreditar que ninguém tenha feito nada contra ela até agora.
— Hermione, abra bem os ouvidos. — Disse Rony em voz alta — Eles. Gostam. Disso. Gostam de ser escravizados!
— A curto prazo os nossos objetivos. — Disse Hermione, falando ainda mais alto do que meu irmão e agindo como se não tivesse ouvido uma única palavra dele — São obter para os elfos um salário mínimo justo e condições de trabalho decentes. A longo prazo, os nossos objetivos incluem mudar a lei que proíbe o uso da varinha e tentar admitir um elfo no Departamento para Regulamentação e Controle das Criaturas Mágicas, porque eles são vergonhosamente sub-representados.
— Ok. Certo. E como é que vamos fazer tudo isso? — Perguntei fingindo interesse, com um leve tom de desafio. Obviamente não tinha como aquilo tudo simplesmente acontecer de um dia pra outro
— Vamos começar recrutando novos membros. — Disse Hermione feliz — Achei que dois sicles para entrar, o que paga o distintivo, e o produto da venda pode financiar a distribuição de folhetos. Você é o tesoureiro, Rony, tenho lá em cima uma latinha para você fazer a coleta, a Rox também, ela pode te ajudar a arrecadar o dinheiro ou até a conseguir novos membros, já que ela tem tanta facilidade em conversar com os outros, ou apenas implicar com todo mundo, mas ok.
— Ei, qual é. — Protestei cruzando os braços — Você fala como se eu saísse arrumando brigas por aí! — Acrescentei, mas ela nem fez questão, só me lançou um olhar como se dissesse que eu realmente vivia arrumando brigas com todo mundo, mas logo continuou a falar
— E você, Harry, é o secretário, por isso você talvez queira anotar tudo que estou dizendo agora, para registrar a nossa primeira reunião.
Houve uma pausa em que Hermione sorriu radiante para nós, e Harry se dilacerou entre a exasperação com a amiga e a vontade de rir da cara de Rony, eu por outra hora, apenas achava aquilo interessante, menos a parte que ela disse que eu tenho facilidade de implicar com as pessoas, o que claramente não é verdade, qualquer pessoa de Hogwarts confirmaria que eu sou um anjo e a pessoa mais paciente que existe.
O silêncio não demorou a ser quebrado, não por Rony, que de qualquer maneira parecia estar temporariamente mudo de espanto, mas por umas batidinhas leves na janela. Quando corremos os olhos pela sala agora vazia vimos, iluminada pelo luar, uma coruja branquíssima encarapitada no peitoril da janela.
— Edwiges! — Gritou Harry, precipitando-se pela sala para abrir a janela do lado oposto
Edwiges entrou, voou pela sala e pousou na mesa em cima das predições de Harry.
— Até que enfim! — Exclamou Harry, correndo atrás da coruja
— Ela trouxe uma resposta! — Exclamou Rony, excitado, apontando para um pedaço sujo de pergaminho preso à perna de Edwiges
Harry desamarrou-o depressa e se sentou para ler, depois do que Edwiges voou para o joelho do garoto, piando baixinho.
— Que é que ele diz? — Perguntei ofegante
A carta era muito curta e parecia ter sido escrita com muita pressa. Harry leu-a em voz alta.
Harry,
Estou viajando para o norte imediatamente. A notícia sobre a sua cicatriz é o último de uma série de acontecimentos estranhos que têm chegado aos meus ouvidos. Se ela tornar a doer, procure imediatamente Dumbledore – dizem que ele tirou Olho-Tonto da aposentadoria, o que significa que tem identificado os sinais, mesmo que os outros não os vejam.
Logo entrarei em contato com você. Dê minhas lembranças a Rony, Rox e Hermione. Tente tranquilizar Vega, tenho certeza que ela não vai acreditar que estou bem, sei que Siena não é muito vista no colégio, imagino que esteja sempre ocupada e Vega pode precisar de você.
Fique de olhos abertos, Harry.
Sirius
Harry olhou para mim, Rony e Hermione, que retribuímos o seu olhar.
— Ele está viajando para o norte? — Sussurrou Hermione — Está voltando?
— Dumbledore tem identificado que sinais? — Perguntou Rony, parecendo perplexo
— Harry, que é que está acontecendo? — Perguntei, pois Harry acabara de dar um soco na própria testa, sacudindo Edwiges para fora do colo
— Eu não devia ter contado a ele! — Disse Harry furioso
— Do que é que você está falando? — Perguntou Rony, surpreso
— Fiz ele pensar que precisa voltar! — Disse Harry, agora batendo o punho na mesa de modo que a coruja foi parar no espaldar da cadeira de Rony, piando indignada — Precisa voltar porque acha que estou correndo perigo! E não há nada errado comigo! E não tenho nada para você — Falou ele com rispidez para Edwiges, que batia o bico, esperançosa — Vai ter que ir para o corujal se quiser comida.
Edwiges lançou ao dono um olhar extremamente ofendido e saiu voando pela janela aberta, raspando a asa na cabeça dele ao sair.
— Harry. — Começou Hermione, numa voz tranquilizadora — Imagino que não seja só por você, ele deve está preocupado com a Vega também. A Profa. Misttigan de fato quase não é vista no castelo.
— Sim, Harry. Vimos como a Vega estava quando você perguntou se ela tinha tido notícias dele. Ele é o pai dela, aliás. E eles passaram onze anos sem se ver. — Tentei argumentar
— Eu vou me deitar. — Disse Harry impaciente — Vejo vocês de manhã.
E assim ele saiu, levando consigo seus materiais de adivinhação e nos deixando totalmente atordoados.
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