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{42} Na Cabana de Hagrid

   Esperei que Lavender, Parvati e Amélia parassem de conversar sobre a Câmara e finalmente dormissem, só então eu vesti um casaco e desci cuidadosamente as escadas para o Salão Comunal onde Harry e Ron já deviam estar me esperando.

— Rox. — Escutei um sussurro e vi Harry levantar um pouco a capa perto do buraco do retrato, Ron estava com ele — Vem.

   E então corri entrando também debaixo da capa da invisibilidade. A viagem pelos corredores escuros e desertos do castelo não foi um prazer. Eu nunca tinha os visto tão cheios depois do pôr do sol. Professores, monitores e fantasmas andavam pelos corredores aos pares, olhando tudo atentamente, à procura de alguma atividade incomum. A capa da invisibilidade infelizmente não nos impedia de fazer barulho, e houve um momento particularmente tenso em que Rony deu uma topada a poucos metros do lugar onde Snape estava montando guarda. Felizmente, o prof. Snape espirrou quase ao mesmo tempo que Rony xingou. Foi com alívio que chegamos às portas de entrada e as abrimos devagarinho.

   A noite estava clara e estrelada. Corremos em direção às janelas iluminadas da casa de Hagrid e despimos a capa somente quando estávamos à sua porta de entrada. Segundos depois de termos batido, Hagrid escancarou a porta. Demos de cara com um arco que ele apontava. Canino, o cão de caçar javalis, o acompanhava dando fortes atidos.

— Ah! — Exclamou ele, baixando a arma e nos encarando — O que é que vocês estão fazendo aqui?

— Para que é isso? — Perguntei ao entrarmos apontando para o arco

— Nada... nada... — Murmurou Hagrid — Estava esperando... não faz mal... sentem... vou preparar um chá...

   Ele parecia não saber muito bem o que estava fazendo. Quase apagou a lareira ao derramar água da chaleira e em seguida amassou o bule com um movimento nervoso da mão enorme.

— Você está bem, Hagrid? Soube do que aconteceu com a Mione? — Perguntou Harry

— Ah, soube, soube, sim. — Respondeu Hagrid, com a voz ligeiramente falha

    Ele não parava de olhar nervoso para as janelas. Nos serviu três canecões de água fervendo (esquecera-se de pôr chá na chaleira) e ia servindo uma fatia de bolo de frutas num prato quando ouvimos uma forte batida na porta. Hagrid deixou cair o bolo de frutas. Eu e os meninos nos entreolhamos em pânico, mas logo se cobrimos com a capa e nos retiramos para um canto. Hagrid se certificou de que estávamos bem escondidos, apanhou o arco e escancarou mais uma vez a porta.

— Boa-noite, Hagrid.

   Era Dumbledore. Ele entrou, parecendo mortalmente sério e vinha acompanhado por um homem, nada desconhecido para mim e Ron e de aspecto muito esquisito. Ele tinha os cabelos grisalhos despenteados, uma expressão ansiosa e usava uma estranha combinação de roupas: terno de risca de giz, gravata vermelha, uma longa capa preta e botas roxas de bico fino. Sob o braço carregava um chapéu-coco cor de limão.

— É o chefe do papai! — Rony cochichou

— Sim. — Confirmei — Cornélio Fudge, o ministro da Magia!

  Harry deu uma forte cotovelada em mim e Rony para nos calarmos. Hagrid empalidecera e suava. Deixou-se cair em uma cadeira e olhava do Professor Dumbledore para Cornélio Fudge.
 
— Problema sério, Hagrid. — Disse Fudge em tom seco — Problema muito sério. Tive que vir. Quatro ataques em alunos nascidos trouxas. As coisas foram longe demais. O Ministério teve que agir.

— Eu nunca. — Disse Hagrid, olhando suplicante para Dumbledore — O senhor sabe que eu nunca, Professor Dumbledore...

— Quero que fique entendido, Cornélio, que Hagrid goza de minha inteira confiança. — Disse Dumbledore fechando a cara para Fudge

— Olhe, Albus. — Respondeu Fudge, constrangido — A ficha de Hagrid depõe contra ele. O Ministério teve que fazer alguma coisa, o conselho diretor da escola entrou em contato...

— Contudo, Cornélio, continuo a afirmar que levar Hagrid não vai resolver nada. — Disse Dumbledore, seus olhos azuis tinham uma intensidade que eu nunca tinha visto antes

— Procure entender o meu ponto de vista. — Tornou a dizer Fudge, manuseando o chapéu-coco — Estou sofrendo muita pressão. Precisam ver que estou fazendo alguma coisa. Se descobrirmos que não foi Hagrid, ele voltará e não se fala mais no assunto. Mas tenho que levá-lo. Tenho. Não estaria cumprindo o meu dever...

— Me levar? — Perguntou Hagrid, começando a tremer — Me levar aonde?

— Só por um tempo. — Disse Fudge sem encarar Hagrid nos olhos — Não é um castigo, Hagrid, é mais uma precaução. Se outra pessoa for apanhada, você será solto com as nossas desculpas...

— Não para Azkaban? — Lamentou Hagrid, rouco

  Antes que Fudge pudesse responder, ouvimos outra batida forte na porta. Dumbledore atendeu-a revelando alguém nada interessante.

   Lucius Malfoy entrou decidido na cabana de Hagrid, envolto em uma longa capa de viagem, com um sorriso frio e satisfeito. Canino começou a rosnar.

— Já está aqui, Fudge. — Disse em tom de aprovação — Muito bem...

— O que é que o senhor está fazendo aqui? —  Perguntou Hagrid furioso —Saia da minha casa!

— Meu caro, por favor acredite em mim, não me dá nenhum prazer estar no seu... Hum... você chama isso de casa? —Rosnou Lucius desdenhoso, correndo os olhos pela pequena cabana — Simplesmente vim à escola e me disseram que o diretor se encontrava aqui.

— E o que era exatamente que você queria comigo, Lucius? — Perguntou Dumbledore. Falou com cortesia mas a intensidade ainda encandecia os seus olhos azuis

— É lamentável, Dumbledore. — Disse Malfoy sem pressa, puxando um rolo de pergaminho — Mas os conselheiros acham que está na hora de você se retirar. Tenho aqui uma Ordem de Suspensão, com as doze assinaturas. Receio que o Conselho pense que você está perdendo o jeito. Quantos ataques houve até agora? Mais dois hoje à tarde, não foi? Nesse ritmo, não sobrarão alunos nascidos trouxas em Hogwarts, e todos sabemos que perda horrível isto seria para a escola.

   Falso! Deu vontade de gritar o quanto ele era falso, era óbvio que ele estava feliz com esses ataques.
  
— Ah, olhe aqui, Lucius — Disse Fudge, parecendo assustado — Dumbledore suspenso, não, não, a última coisa que queremos neste momento...

— A nomeação, ou a suspensão de um diretor é assunto do Conselho, Fudge. — Disse o Senhor Malfoy suavemente — E como Dumbledore não conseguiu fazer parar os ataques...

— Olhe aqui, Malfoy, se Dumbledore não consegue fazê-los parar. — Disse Fudge, cujo lábio superior estava úmido de suor — Eu pergunto, quem vai conseguir?

— Isto resta ver... — Disse o Sr. Malfoy com um sorriso desagradável — Mas como todo o Conselho votou...

    Hagrid levantou-se de um salto, a cabeça desgrenhada raspando o teto.
   
— E quantos você precisou ameaçar e chantagear para concordarem hein, Malfoy? — Vociferou

— Ai, ai, ai, sabe, esse seu mau gênio ainda vai lhe causar problemas um dia desses, Hagrid. Eu aconselharia você a não gritar assim com os guardas de Azkaban, eles não vão gostar nadinha. — Rosnou o idiota do Malfoy

— Você não pode afastar Dumbledore! — Gritou Hagrid, fazendo Canino se agachar e choramingar no cesto de dormir — Afaste ele, e os alunos nascidos trouxas não terão a menor chance. Vai haver mortes em seguida.

— Acalme-se, Hagrid — Ordenou Dumbledore. Virou-se então para o Sr. Malfoy — Se o Conselho quer que eu me afaste, Lucius, naturalmente eu vou obedecer...

—  Mas... — Gaaguejou Fudge

— Não! — Disse Hagrid com raiva

   Dumbledore não tirara seus olhos azuis cintilantes dos olhos frios e cinzentos de Lucius Malfoy.

— Porém... — Continuou ele, falando muito lento e claramente de modo que ninguém perdesse uma só palavra — Você vai descobrir que só terei realmente deixado a escola quando ninguém mais aqui for leal a mim. Você também vai descobrir que Hogwarts sempre ajudará aqueles que a ela recorrerem.

   Por um segundo tive quase certeza de que os olhos de Dumbledore piscaram em direção ao canto em que estávamos escondidos.

— Admiráveis sentimentos. — Disse Malfoy fazendo uma reverência — Todos sentiremos falta do seu... hum... modo muito pessoal de dirigir as coisas, Albus, e só espero que o seu sucessor consiga impedir... ah... matanças.

    E dirigiu-se à porta da cabana, abriu-a, fez um gesto largo indicando a porta para Dumbledore. Fudge, manuseando seu chapéu-coco, esperou Hagrid passar à sua frente, mas ele continuou firme, inspirou profundamente e disse com clareza:

— Se alguém quiser descobrir alguma coisa, é só seguir as aranhas. Elas indicariam o caminho certo! É só o que digo.

   Fudge olhou-o muito admirado.
  
— Tudo bem, estou indo. — Disse Hagrid, vestindo o casacão de pele de toupeira. Mas quando ia saindo para acompanhar Fudge, ele parou outra vez e disse em voz alta: — Alguém vai ter que dar comida a Canino enquanto eu estiver fora.

   A porta se fechou com força e eu e Rony logo tiramos a capa da invisibilidade.
  
— Estamos enrascados agora. — Disse ele rouco

— Dumbledore foi embora. Seria melhor que fechassem a escola hoje à noite. Com a saída dele haverá um ataque por dia. — Tornei a falar apreensiva

   Canino começou a uivar, arranhando a porta fechada.

— Hey, olhem. — Harry aponta para a janela

   Logo notamos várias aranhas de bom tamanho que estavam formando uma fileira enorme na parede deslocando-se numa estranha linha reta como se tomassem o caminho mais curto para ir a um encontro combinado. Eu e Ron nos entreolhamos amedrontados.

— Hagrid disse sigam as aranhas. — Harry falou andando depressa atrás delas

— Aranhas. Aranhas. “Sigam as aranhas” — Falei em tom irônico — Não podiam ser borboletas?

— Vamos medrosos. — Harry murmurou

   Corremos na direção dele ainda assustados, Harry agora segurava a varinha que tinha sido acesa com o feitiço “Lumos”, seguimos o fluxo constante de aranhas que iam pelo caminho, logo adentrando a Floresta Proibida.

   Andamos por uns vinte minutos, sem falar nada, procurando ouvir outros ruídos que não fossem os dos gravetos estalando ou das folhas rumorejando. Então, quando o arvoredo se tornou mais denso que nunca, de modo que já não avistavamos as estrelas no alto, e a varinha de Harry brilhava solitária num mar de trevas, vimos as aranhas que nos guiavam abandonarem o caminho.

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