XXXV - PRA FAZER PIPOCA PRECISA TAMPAR A PANELA?
❝𝗔𝗾𝘂𝗶𝗹𝗼 𝗾𝘂𝗲 𝘀𝗲 𝗳𝗮𝘇 𝗽𝗼𝗿 𝗮𝗺𝗼𝗿 𝗲𝘀𝘁𝗮́ 𝘀𝗲𝗺𝗽𝗿𝗲 𝗮𝗹𝗲́𝗺 𝗱𝗼 𝗯𝗲𝗺 𝗲 𝗱𝗼 𝗺𝗮𝗹.❞
- Friedrich Nietzsche
O CAMPO REALMENTE CURA A alma. Respirar um pouco de ar puro fez bem para mim. Apesar dos contratempos, a viagem ocorreu bem. Eu aproveitei um tempo de qualidade com a minha família, já que não tinha fazia um tempo. Eu cuidei dos meus animais, meus pais e de quebra ainda ensinei umas pegadinhas novas para o mais novo.
Sinto como se um peso enorme saísse das minhas costas.
Nesta noite de segunda-feira, fico de bobeira em casa, sem fazer nada, apenas de pijama enquanto vasculho a internet. Quando a campainha toca, solto um grunhido irritada por ter que levantar, pelo menos estou usando o meu pijama de calça.
- Oi, vizinha. - Changbin me cumprimenta do outro lado da porta. - Me tira uma dúvida?
- Claro, fala aí.
- Eu sou novo nesse lance de cozinha, o máximo que eu sei é esquentar comida e fazer miojo, mas resolvi ver um filme e é o seguinte: Para fazer pipoca, eu preciso tampar a panela? - ele interroga de repente.
- Certamente.
Eu achei que essa era alguma piada que eu não tinha notado onde estava o humor ainda, mas ao ver a sua expressão, notei que ele não estava brincando. Changbin não pensou mesmo que poderia fazer pipoca com a panela destampada, ou pensou?
- Uh-oh.
Vejo o desespero no seu olhar. Para tentar ajudá-lo, corro com ele até o seu apartamento, tentar conseguir cobrir a panela antes que o estrago esteja feito.
Eu corro o mais rápido que posso, vou ao 315 e quase bato no balcão, tentando passar para a cozinha. Quando chego lá, o fogão está desligado, não tem nem mesmo uma panela sobre as bocas. Estranhamente, Changbin também ficou para trás, percebo quando a porta se fecha, mas com ele para fora. É só depois que eu me dou conta do que está acontecendo.
Jisung está bem aqui. Ele estranha ao me ver.
- Eu fiz a minha parte, o resto é com vocês dois. - diz Changbin, do lado de fora. - Eu vou ao hospital, só chego depois da meia-noite.
Como não ouço mais nada dele, suponho que já foi.
Dou a volta no balcão e olho para Han, sentado numa ponta do sofá. O contato visual não dura muito, logo eu desvio o olhar. Eu me sinto esquisita aqui, em pé no meio da sala de estar enquanto ele está também parado imóvel no sofá. Changbin não trancou a porta, não somos adolescentes. Todo o tempo eu tenho a opção de sair, mas não o faço.
Em passos lentos, me aproximo dele. Sento-me no braço do sofá, na ponta oposta.
Nenhum de nós dois parece saber muito o que dizer. É esquisito, ao mesmo tempo em que parece que esta é a hora ideal para termos a nossa conversa. Mas é compreensível, não é como se eu pudesse apenas chegar aqui, com o clima estando totalmente estranho e algum de nós apenas começasse a falar sobre o assunto, sem nenhuma preliminar antes de ir ao conteúdo central.
- Como você está? - nós dizemos a mesma coisa, ao mesmo tempo, o que causa um riso honesto e espontâneo.
Despropositadamente, quebramos o gelo.
- Como foi que tudo ficou depois que eu voltei para casa? - Jisung faz outra pergunta. - Você se divertiu com a sua família? Eles são legais, você tem sorte de ser criada por eles, sua infância parece ter sido divertida. Fico até com inveja.
- Quando você foi embora Jihoon perguntou de você. - eu conto, sem querer falar muito sobre a minha infância e boa relação com os meus pais, não quero fazê-lo sentir-se mal por não ter isso. - Eu estava me sentindo mal, mas fiquei bem.
- Você esteve doente?
- Também. - não era somente ao mal estar físico ao que eu estava me referindo. - Estava com dor de cabeça, um pouco de enjoo e fraqueza também. Mas eu já estou bem agora. - digo. - E você? - questiono. Pensando que este papo pode não nos levar a lugar algum, eu me atrevo: - Cancelou o casamento?
Han fica surpreso por eu ir logo direto ao ponto, pular os rodeios e questionar sobre isso. É surpreendente para mim também, ir direto ao assunto quando o assunto se torna este, mas tínhamos que começar de algum jeito.
- Não. - ele responde.
- Ah. - é tudo o que eu tenho forças para dizer. Com certeza não é o que eu gostaria ou esperava ouvir. Talvez ele tenha mudado de ideia. Eu me sinto tão burra.
- Não é que eu não queira, eu só preciso de um pouco mais de tempo, me precaver antes, certificar-me de que tudo vai dar certo para o tiro não sair pela culatra. - ele diz. - É uma história tão complicada, Jiwoo. Mas eu prometo que vou te contar cada detalhe dela a partir de agora.
- Como você acabou noivo? Para início de conversa. - faço o primeiro questionamento.
Han se ajeita no sofá, eu aproveito para me aproximar um pouco. Saio do braço do sofá e sento no local adequado, ainda um pouco distante dele, mas agora muito menos.
- Tudo foi ladeira abaixo depois que eu entrei como CEO da empresa. - ele diz, eu não discordo, foi depois disso que os nossos problemas começaram. - Quando nós conversamos sobre isso antes, eu te expliquei um dos motivos e disse que o outro deixaria de fora por ser muito pessoal da minha família. Pois bem, eu vou te contar tudo agora.
- Estou ouvindo. - ao mesmo tempo que não quero interromper, estou curiosa.
- Eu assumi a empresa para preservar a minha família de um escândalo. - ele inicia. - Eu nunca te contei isso, porque é um segredo. A verdade é que, o que aconteceu foi resultado do vício do meu pai. - Jisung fala com calma, mas sei que o assunto é pesado. - Meu pai é viciado em jogos de azar e apostas, Jiwoo. Acho que desde que a minha mãe foi embora que ele ficou assim, descontou a raiva e a solidão na bebida e nas apostas. Sem que todos soubessem, ele estava roubando da empresa e usando o dinheiro para isso. Levou muito tempo, mas o meu avô acabou descobrindo, e, ao invés de procurar tratamento para o filho, ele o afastou e me pediu para assumir o lugar dele.
Eu escuto tudo calada, não que eu precise dizer alguma coisa aqui. Este é um assunto tão sério e particular, não consigo nem esboçar reações.
- Eu sei que o vovô não teve más intenções. - ele defende o ancião. - Ele ama muito todos nós e fez o que achou que era o correto para nos proteger. Ultimamente, eu percebi que tentar proteger todo mundo é um defeito de família.
- Querer cuidar de alguém não é algo errado, Jisung. - eu digo. - Mas se torna um problema quando exagerado. Proteger é diferente de fechar os olhos para algo, ou escolher por alguém o que tem que ser feito.
- Eu sei, me desculpe. - ele pede. - Eu quis te proteger, te afastar desta bagunça que é a família Han. Sei que deveria ter sido honesto com você.
- É, você deveria. - concordo. - Eu nunca quis estar afastada disso. Quando eu decidi ficar com você, eu sabia perfeitamente no que estava me metendo. Eu quis me envolver em tudo sobre você, eu queria o Jisung completo, com todas as qualidades e defeitos. - o confesso. - Mas é a sua vez de falar. Continue, por favor.
Jisung concorda, logo volta a falar:
- Eu assumi o cargo, queria me sentir parte da família pela primeira vez. - ele então admite. - As coisas já começaram a dar errado desde a festa em que fui apresentado como o novo chefe. Meu pai me apresentou Sana e ele sempre insistia demais para que eu e ela criássemos algum vínculo. Até que deu certo, descobri que ela é uma ótima pessoa, tem um coração puro... - ele vai dizendo as qualidades da japonesa. - e é lésbica. - então completa.
Sou pega de surpresa. Sim, Momo já havia me dito que era impossível acontecer algo entre Jisung e a sua melhor amiga, mas eu não pensei que este é o motivo. Agora me sinto ridícula por ter sentido ciúmes dos dois.
- Este casamento é igual ao do Minho; comercial e uma tentativa de encobrir que um dos cônjuges não é hétero. No nosso caso, nenhum de nós somos. - ele pontua. - O meu pai roubou tanto a empresa que ela está quase falindo, o casamento foi um jeito que ele arrumou de extorquir a família Minatozaki. Para ele eu sou descartável, logo ele me mandaria embora e aplicaria um golpe nos japoneses.
- E mesmo assim você continuou com essa farsa. Pela sua família, por ele, para não tornar público os problemas dela e da empresa.
Consigo o entender melhor agora, mas não acho que se caso a situação fosse comigo eu tomaria a mesma decisão que ele, não tenho tanta compaixão assim.
- Mas o casamento... eu não entendo. - digo. - Não é certo, Jisung. Não é certo com você, comigo, com ela e a família dela. Se você sabe que o que o seu pai está tentando fazer é roubar dos Minatozaki, precisa tentar impedir.
- Eu sei disso. - ele diz. - Eu ia dar o meu jeito de não deixar ele encostar na grana. Não que eu quisesse me casar com ela, mas precisava fazer isso por vocês duas.
- Nós duas?
- Sim. Você e Sana. - ele reafirma. - Eu fiquei com medo por ela. Quando o casamento for cancelado, o pai dela irá arrumar um outro noivo num piscar de olhos. Ela merece ser feliz com quem ama e eu sei que não seria comigo, mas pelo menos estaria com alguém que jamais a forçaria a nada. Se ela casasse comigo poderia ser livre da família dela e ficar com quem quisesse, porque seria a mesma coisa que morar com um amigo. Mas o meu maior medo foi por você.
- Por que por mim? - questiono, tento entender a história completa. - O que ele fez?
- Ele conseguiu um parceiro de crime que odeia nós dois juntos mais do que qualquer outra coisa: Myung Huye. - só de ouvir o nome já quero vomitar. - Quando nos encontramos em Paris, ele não perdeu tempo. O seu ex entrou em contato com meu pai, foi assim que ele descobriu sobre nós dois. Se os planos do casamento já estavam em andamento, naquele momento se concretizaram. Meu pai estava esperando uma maneira de me convencer e agora ele tinha algo com que me chantagear.
- Eu não estou entendendo. O que ele usou contra você? - interrogo.
- Seu ex-namorado contou do acidente com os amendoins. - ele responde. - Se eu não casar, ele vai entrar com uma queixa contra você, te acusando de tentar o envenenar, ele fará parecer que você estava praticando bullying. Este tipo de assunto aqui é tratado super sério, Jiwoo, você sabe. Acusações assim, mesmo sem provas e falsas, são o suficiente para acabar com a vida de uma pessoa.
- Meu Deus, Jisung. - eu passo as mãos pelo rosto, atordoada. - O que você pretende fazer?
- Eu vou atrás da documentação financeira da empresa. Eu quero ter as provas do que meu pai fez e aí sim eu terei algo contra ele. Será o suficiente para ele me deixar em paz, o que me preocupa é Huye tentar algo mesmo assim.
- Ele não vai. - eu digo com confiança. - Por que você acha que ele nunca tentou nada depois do término? - questiono. - Porque além de eu ter métodos e testemunhas para provar que foi um acidente, eu sei de algo sobre ele que faria a mídia ficar muito mais interessada. - explico sem dar muitos detalhes. - Mas sobre as provas, você sabe onde encontrar?
- Eu acredito que sim. Se eu conseguir isso, eu finalmente vou estar livre dele. Mesmo que o meu avô não perceba o problema, eu vou fazer ele ver. - Han diz, convicto. - Mas antes de acabar com o casamento, o lance com Sana ainda me preocupa. Eu vou conversar com ela, vou dizer que não podemos ficar juntos, mas que ela pode contar com a minha ajuda e o meu apoio. Eu sei como é ter uma família caótica, ser rejeitado por ser quem é e obrigado a viver do modo que as outras pessoas esperam.
- Você tem um coração muito bom, Jisung.
Wow. É tanto para processar.
Jisung não deveria ter me afastado e decidido o que era melhor para mim, isso é fato. Mas é verdade quando diz que as suas intenções eram boas. Ele estava pensando no melhor para o todo e é muito altruísta da parte dele desistir da própria felicidade para ajudar quem ama.
Eu ainda estou com raiva pela sua atitude, mas sei que vai passar. Ele entende o que fez de errado e o que resta agora é saber se está comprometido a não repetir. Quero que isso dê certo, mas primeiro, é preciso esclarecer algumas coisas.
- Me desculpe por te afastar de mim, foi a pior decisão que eu já tomei na minha vida. - ele olha para baixo. - Eu sei que foi errado e estou mesmo aprendido.
- Acredito em você. - eu digo. - Você promete que nunca mais vai esconder as coisas de mim? - pergunto. - Que vai sempre conversar e me explicar tudo antes? Eu sou adulta, Jisung, posso tomar as minhas próprias decisões.
- Eu prometo. - ele diz. - Eu sei que você é uma mulher forte e corajosa, o covarde aqui sou eu. É verdade quando digo que quis te poupar de mais sofrimento, mas esta era uma decisão que só cabia a você.
- Que bom que você entende isso. Jisung, eu quero que a gente possa confiar um no outro e que não mantenhamos segredos. - eu compartilho o meu desejo. - Eu entendo que tem certos assuntos que são pessoais de mais, mas tudo o que me envolva, nunca esconda de mim, por favor.
- Eu não vou. - ele me garante, eu resolvo confiar. - Eu prometo.
- Também quero que me prometa mais uma coisa. - eu peço. - Que nós vamos sempre conversar sobre tudo o que sentimos, principalmente as coisas ruins. Você sabe que o diálogo é a base de uma boa relação.
- Está combinado. - ele diz, sorridente. - Eu nunca tive alguém que eu pudesse falar sobre todos os meus sentimentos, até os mais feios e tristes. Isto não é desculpa, eu só estou dizendo que fico feliz por ter alguém do meu lado que eu possa mostrar todas as versões de mim, até as que eu não me orgulho.
- Eu sei como você se sente. É tão melhor quando nós podemos ter uma conversa franca um com o outro, sem ficar brigando. - suspiro. - Eu prometo que da minha parte também vou me esforçar para que haja sempre diálogo entre nós.
Sinto-me aliviada. Meu peito fica tranquilo depois desta conversa, nós precisávamos dela e agora é como finalmente estar em paz.
- Você me perdoa, Jiwoo? - ele questiona.
- Perdoo, Han. - respondo.
Ele suspira em alívio e me mostra o mais belo sorriso do mundo. Meu coração se enche de alegria novamente e até esquece de tudo o que aconteceu na semana passada.
A vida é assim mesmo. A gente erra, aprende e faz diferente. Eu dou a Jisung o benefício da dúvida, a chance de me provar que as coisas mudarão agora, que ele vai cumprir com a sua promessa e ficar ao meu lado daqui para frente e sempre. Eu nunca terei certeza de que ele cumprirá com a sua promessa até eu ver acontecer, mas até lá, eu escolho acreditar que ele fará diferente de agora.
Ele fica todo manhoso, praticamente dando um pulo até aqui e afundando o rosto no meu pescoço. Eu acaricio as suas costas, louca para o ter pertinho novamente, mas ainda com certos limites. Jisung então para para me olhar nos olhos, uma de suas mãos segura o meu rosto, seus olhos logo se direcionam aos meus lábios, que por reflexo os umedeço com a língua. Ele avança na minha direção, mas quando que tenta me beijar, eu me afasto.
- Eu achei que as coisas estavam indo bem entre nós dois. - em fala meio sem jeito.
- E estão. - afirmo. - Eu acredito em você e está tudo bem, mas, por enquanto, nós dois continuamos separados. Eu mal posso esperar para poder ficar com você de novo, mas isso só vai acontecer quando não houver mais casamento e a gente conseguir tudo o que for necessário para que o seu pai não seja um empecilho entre nós. Você entende?
- Eu entendo. - ele diz, com um sorriso tranquilo nos lábios. - Prometo que vou resolver isso logo.
- Você está cheio de promessas hoje. Olha lá hein, Jisung. Esta é a última chance que eu vou te dar, é melhor você saber usá-la direitinho!
- Eu prometo que vou. - ele ri, em seguida beijando-me na bochecha.
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