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❝Muitas das verdades que temos dependem de nosso ponto de vista.❞ - Yoda
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— Então você não queria ser um Jedi? — perguntei, surpresa, com os olhos arregalados.
Ben e eu estávamos sentados de frente um para o outro com as pernas cruzadas no chão da minha cabana, dois pedaços de bolo em dois pratos encontravam-se entre nós. Nós fomos os primeiros a terminar o jantar, então pegamos nossas sobremesas e corremos para a minha cabana para comer e conversar.
A conversa se iniciou sobre o treinamento daquele dia, mas depois passou a ser sobre as nossas famílias, os lugares onde nascemos e crescemos, nossos sonhos e aventuras que gostaríamos de viver.
— Não — respondeu Ben depois de engolir um pedaço do bolo, balançando a cabeça em negativa. — Eu queria ser um piloto, assim como o meu pai. Era o meu sonho desde sempre.
— Então por que está treinando para ser um Jedi ao invés de um piloto?
— Um dia, escutei do meu quarto os meus pais conversando na sala. Brigando, na verdade — ele deu de ombros, como se já estivesse acostumado com isso. Terminei de comer o meu bolo e inclinei a cabeça para prestar atenção. — Eles achavam que eu estava dormindo, mas escutei algumas coisas. Estavam falando de mim. Não sei o que discutiram sobre mim, só sei que, no dia seguinte, tio Luke foi me buscar para me treinar para eu me tornar um Jedi como ele.
Inclinei ainda mais a cabeça.
— Você não sabe mesmo o porquê da discussão? — perguntei. — Nunca quis perguntar aos seus pais ou ao mestre Luke?
Ben balançou a cabeça em negação, alguns fios de seu cabelo preto caíram sobre seus olhos, e deu de ombros novamente, o olhar conformado.
— Mesmo se eu perguntasse, eles não me responderiam — disse. — Mas tudo bem. — ele me fitou. — Se eu não tivesse vindo para cá, não teria conhecido você e não seríamos amigos.
Sorrimos.
Eu não conseguia me imaginar não sendo amiga de Ben Solo. Eu gostava muito dele, ele era um bom amigo.
— E você? O que queria ser? — Ben perguntou.
— Eu nunca pensei sobre isso — admiti, comprimindo os lábios e fazendo uma expressão pensativa. — Eu pensava que jamais sairia de Naboo, que eu teria que fazer alguma coisa por lá mesmo.
— Mas nunca sentiu que deveria fazer algo específico? Seguir algum caminho?
— Ajudar as pessoas — respondi sem precisar pensar. — Independentemente do que eu fosse fazer, sabia que devia ajudar as pessoas. Talvez, se eu não estivesse treinando para ser uma Jedi, eu estudaria para ser uma curandeira.
Ben sorriu abertamente. Covinhas apareceram em suas bochechas.
— Acho que você nasceu para ser uma Jedi.
Sorri também.
Alguns minutos se passaram e nós ficamos em silêncio, apenas aproveitando a companhia um do outro e olhando para o horizonte pela janela. O sol se punha lentamente, exibindo tons amarelados e alaranjados que se misturavam com o azul escuro que surgia.
— Do que você mais gostaria neste momento? — indagou Ben.
— Qualquer coisa?
— Qualquer coisa.
Mantendo meus olhos naquele belo pôr do sol, não precisei pensar muito para responder à pergunta.
— Gostaria de estar com a minha família — dei um pequeno sorriso. — Queria estar com meus pais vendo o pôr do sol como fazíamos todos os dias.
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Após respirar fundo, virei o corpo lentamente na direção oposta da cama e me deparei com o homem que eu sabia que lá estaria.
Kylo Ren.
Ele estava vestido com as mesmas roupas pretas que estava usando na floresta, mas não havia sinal de seu sabre de luz em seu corpo. Um curativo encontrava-se em seu rosto no local que Rey atingira. Não havia traços de Ben Solo em suas feições, os olhos emanavam frieza e tensão, o corpo rígido parecia estar em alerta. Eu não conseguia mais ver o brilho de antes em seus olhos castanhos ou a leveza em seu rosto. Eu não conseguia encontrar seus traços de bondade e gentileza e a chama de esperança única que ele tinha. Era como se nada disso existisse mais.
Perceber tais coisas doeu de uma forma que eu não conseguiria descrever, meu coração se rachou com força, batendo com pesar dentro do meu peito.
Como eu sentia falta do meu Ben.
Por dentro, eu estava me sentindo destruída, mas, por fora, mantive uma expressão impassível.
Mesmo que discreta, pude detectar, entretanto, uma certa surpresa nos olhos de Kylo Ren assim que eles encontraram os meus.
Como sempre desde que éramos crianças, em todas as outras vezes que nos conectamos, eu não conseguia ver nada ao seu redor, somente ele.
— Você está viva — disse Ren, finalmente, depois de alguns segundos em silêncio absoluto que mais pareceram uma eternidade. Sua voz saiu firme, apesar da pequena surpresa em seus olhos.
Mesmo não sendo uma pergunta, balancei a cabeça.
— É, todos que me conheciam antes estão muito surpresos com isso também — falei. — Mas é natural que pensassem assim, considerando tudo que aconteceu, não é?
Kylo Ren permaneceu com os olhos fixos nos meus sem demonstrar absolutamente nada. Era como se eu estivesse conversando com uma máquina, sua falta de reação era muito incômoda. Até mesmo C-3PO e R2-D2 demonstravam ter mais emoções em uma conversa.
— Onde você esteve esse tempo todo? — ele perguntou, depois de mais uma eternidade de segundos em silêncio.
— Não importa, falar onde estive durante esses anos não fará diferença — respondi. — Estou aqui agora. Isso é o que importa.
Meu coração se acelerava a cada segundo que passava, doendo com mais força dentro do meu peito. Eu não podia controlar o meu interior – como impedir meu coração de acelerar ao estar na presença do homem que eu amava? –, mas eu podia controlar o exterior, e foi isso que permaneci fazendo. Era melhor demonstrar o mínimo de emoções possível, era o melhor a se fazer.
Mesmo acreditando que Ben Solo estava vivo naquele homem, ele não era mais o mesmo com quem eu havia convivido por anos. Eu precisava ter sabedoria sobre que tipo de emoção demonstrar na sua frente e em quais momentos. Seria difícil, mas eu precisava ao menos tentar.
— Onde você está agora? — quis saber Kylo Ren.
— Ben Solo não precisaria perguntar, saberia onde estou — respondi, simples.
Kylo Ren virou o corpo levemente para a direita, refletindo sobre minha resposta enquanto olhava para longe, então guiou seus olhos de volta para mim.
— Entendo. Você foi atrás dele — disse, friamente, frisando a palavra com um pouco de raiva. — Você sempre foi apegada ao passado. Mas não importa. Skywalker está velho e fraco. — ele inclinou a cabeça, os olhos ganhando um brilho de ódio. — A catadora de lixo está aí também?
— Não fale assim dela, o nome dela é Rey! — retruquei, séria. — Você fala assim do seu tio, mas lembre-se que foi Luke Skywalker que derrotou Darth Vader e ajudou Anakin Skywalker a voltar para o Lado Luminoso da Força. Ele é sábio e tem mais experiência que nós dois juntos. — cruzei os braços, inclinando a cabeça e semicerrando os olhos. — E é sério que você quer falar comigo sobre se apegar ao passado? É você que está seguindo os passos do seu avô.
Ren deu um passo à frente com a cabeça erguida, se aproximando de mim, seus olhos queimando a minha pele pela intensidade.
— E, pelo visto, você está seguindo os passos do seu — rebateu ele, as mãos se fechando em punhos. — Agora me diga, onde você...
Um urro alto vindo do lado de fora ecoando pela nave me fez perder a concentração e virar na direção da porta.
Chewie.
Antes de prestar atenção no que o wookiee estava dizendo, voltei meu olhar para o homem, mas Kylo Ren já não estava mais lá. A conexão tinha sido interrompida.
Suspirei, sentindo um misto de emoções borbulhar dentro de mim, bem como uma ardência nos olhos.
— O que foi, Chewie? — gritei a pergunta, me controlando para não deixar aquela ardência se transformar em um choro.
Chewbacca grunhiu em resposta.
— Eu realmente não estou com fome, Chewie.
Outro grunhido.
— Tenho certeza. Obrigada!
Direcionei o olhar mais uma vez na direção que Kylo Ren estava, sabendo que nossa conexão não voltaria a se formar naquele dia. Eu não precisava mais guardar tudo no meu interior, pensei ao deixar uma única lágrima escorrer pela minha bochecha, mas também não precisava deixá-lo tão turbulento com as emoções.
Decidi fazer o que mais me relaxava: meditar.
Sentei-me na cama, cruzei as pernas e repousei as mãos sobre os joelhos. Meus olhos se fecharam e minha mente se expandiu, me deixando conectada com cada um naquele planeta. Eu conseguia sentir a morte e a vida, a tristeza e a felicidade, o frio e o calor, o perigo e a segurança. O equilíbrio da Força.
Depois de mais um tempo, senti Rey e Chewie, mas, como eu já esperava, não consegui sentir Luke. Meu antigo mestre ensinou coisas a mim que nunca chegou a ensinar aos seus outros aprendizes, como a arte de se esconder utilizando a Força daqueles que queriam lhe fazer mal. Eu continuava utilizando esse conhecimento para a minha proteção. Aqueles que possivelmente queriam o meu mal, principalmente aqueles do Lado Sombrio, não conseguiam me sentir direito e nem saber quem eu era por meio da Força, a minha história.
Kylo Ren, meu Ben Solo, era a única exceção. Nossa conexão era forte demais, estávamos ligados de formas que mal conseguíamos imaginar e explicar. Esconder-nos um do outro era muito difícil, tanto que, durante os anos que nos conhecíamos, aconteceu somente duas vezes: a primeira vez aconteceu quando perdi meus pais, e a segunda quando perdi Ben para as trevas – a qual teve a duração mais longa, só se restaurando no nosso reencontro na floresta da Base Starkiller.
Luke deve ter se aperfeiçoado, pois ele não estava se escondendo apenas dos seus inimigos, mas da sua família e amigos também. Da própria Força.
Meus olhos começaram a se mover depressa sob as pálpebras, os pelos do meu corpo se arrepiaram, e uma linha específica, como uma linha sendo puxada, despontou no centro da minha cabeça. Então a imagem da ilha onde estávamos vista do alto surgiu na minha mente, bem no centro, como se eu estivesse flutuando sobre ela.
A sensação da queda veio em seguida e a visão acompanhou, despencando para chegar ao solo rochoso. De forma veloz, a visão me levou para várias partes da ilha, me guiando até chegar a um enorme tronco de árvore cortado, retorcido em vários ângulos para várias direções. O lugar sussurrava, me chamava. Diversas vozes sussurradas se misturavam. Eu não conseguia distinguir o que elas diziam, apenas o meu nome.
Lyra. Lyra. Lyra.
Que lugar era aquele? Em qual parte da ilha ele estava?
Por que se mostrar para mim? Por que me chamar?
Quando reforcei meus sentidos para entender o que os sussurros diziam, o som da Millennium Falcon sendo ligada me desconcentrou. A visão foi interrompida e os sussurros se silenciaram. Eu estava de volta ao quarto da nave, sentada com as pernas cruzadas sobre a cama.
Abri os olhos lentamente em meio a uma respiração longa, pensativa e intrigada, o corpo formigando. Amanhã, pensei, decidida, eu exploraria aquela ilha. Eu precisava encontrar aquele lugar e descobrir o que ele era e o que as vozes queriam me dizer, sentia que era importante e que havia uma razão para elas terem confiado a mim seus sussurros.
Após um suspiro, me levantei da cama e saí do quarto para ver quem havia ligado a nave. Caminhei pelos corredores, meus pés de movendo de forma silenciosa. As luzes estavam apagadas naquela parte da Falcon.
Ao chegar à entrada do centro da nave, permaneci escondida nas sombras assim que escutei a voz de Luke e os bips de R2-D2.
— Velho amigo... — disse Luke, a voz carregada com emoção por estar falando com R2. — Eu queria que você pudesse entender, mas eu não vou voltar. Nada vai mudar a minha cabeça.
O silêncio reinou sobre a Millennium Falcon por um tempo, até que os chiados de uma transmissão antiga preencheram o ambiente.
— No passado, você serviu meus pais nas Guerras Clônicas. Agora ele pede sua ajuda para lutar contra o Império.
Minha boca se entreabriu e meus olhos se arregalaram ao perceber a quem pertencia aquela voz.
Leia Organa.
A voz estava mais jovial, menos cansada, mas era a voz da princesa Leia. Não havia como ter dúvidas.
Aquela era uma transmissão antiga de Leia quando mais jovem, da época quando os rebeldes lutaram contra o Império. A época em que Luke e Leia se conheceram e descobriram que eram irmãos gêmeos. A época em que um Jedi, um piloto e uma princesa foram essenciais para a derrota daqueles que aterrorizavam a galáxia.
R2-D2 realmente sabia como atingir o emocional de alguém.
— Agora, sim, apelou — disse Luke.
— ... é um momento de desespero — a voz de Leia prosseguiu na transmissão. — Ajude-me, Obi-Wan Kenobi. É minha única esperança.
Senti meu coração errar uma batida, mas logo me recompus ao fechar os olhos por alguns segundos e respirar fundo. Saí das sombras a passos lentos e andei na direção de Luke Skywalker. Ele estava sentado, a parte superior do corpo curvada enquanto olhava fixamente para a imagem que estava sendo projetada por R2 de sua irmã quando nova.
Luke ergueu os olhos e me fitou, mas nenhum som saiu da sua boca, então também fiquei em silêncio.
Ainda sentindo seu olhar sobre mim, me aproximei do meu antigo mestre e fiquei em pé ao seu lado, observando a princesa Leia Organa na projeção.
Leia devia ser um pouco mais nova que eu naquela transmissão, julgando pela sua aparência. Ela usava um vestido branco longo com capuz, o cabelo totalmente castanho preso em tranças laterais em formato circular. Tão nova e já com tantas responsabilidades sobre seus ombros. Leia merecia cada um dos títulos que conquistou ao longo dos anos, sua força e determinação inspirou e continuava a inspirar muitos seres nos quatro cantos da galáxia. Era um orgulho para mim tê-la em minha vida.
— Ela precisa de você — falei, finalmente, para Luke, sem desviar os olhos da transmissão.
Escutei Luke suspirar.
— Lyra...
Eu o interrompi:
— Ela precisa de você da mesma forma que precisou dele naquela época — engoli em seco, movendo meus olhos para que eles encontrassem os de Luke. — Mestre, não importa o que houve no passado. Você precisa nos ajudar agora, no presente, para que tenhamos um futuro.
Luke prontamente se arrastou um pouco para a sua esquerda e abriu o braço, me convidando para sentar ao seu lado, e assim o fiz. Ele colocou o braço em volta dos meus ombros, me abraçando com ternura. O mundo pareceu ter dado uma pausa por causa da tranquilidade que seu abraço transmitiu, a quentura e o amor fraternal me confortando dos problemas afora, trazendo um quentinho para o coração.
Skywalker aproveitou a proximidade para observar cada traço do meu rosto com mais atenção, os olhos movendo-se depressa, como se ele ainda não acreditasse que eu estivesse bem na sua frente. Seus olhos azuis brilharam, impressionados.
— Você cresceu tanto — murmurou Luke praticamente para si mesmo, sorrindo com admiração. — Nem parece mais aquela garotinha apreensiva, mas determinada, que eu acolhi para treinar.
— O tempo passou depressa — comentei.
— Como na velocidade da luz.
Sorri.
— Mas os anos foram gentis com você, mestre — brinquei, o empurrando de leve com o ombro.
Luke riu.
— Eu não diria isso, mas acho que não estou tão mal como eu poderia estar.
Ele ficou em silêncio e voltou a me observar com lentidão, analisando cada centímetro do meu rosto, mas focando especialmente nas minhas roupas e no meu sabre de luz que se encontrava na minha cintura.
— Você se tornou uma Jedi! — disse, impressionado e surpreso ao mesmo tempo. — Como? — franziu o cenho, murmurando. — Eu era o único mestre. O único que estava treinando uma nova geração de Jedi.
— O único mestre vivo — respondi, sorrindo levemente com humor.
— Um fantasma da Força? — indagou Luke em um único fôlego, as sobrancelhas arqueadas. Assenti.
Os olhos do meu antigo mestre, que se arregalaram em surpresa e maravilha, ganharam um brilho diferente.
— Quem? — ele perguntou, curioso. Eu conseguia ver as engrenagens do seu cérebro funcionando para descobrir a resposta para aquela questão, o que quase me fez rir. No entanto, ao notar meu olhar, Luke balançou a cabeça em negativa, fazendo um som com a boca. — Nem pense em não me contar, jovem Lyra.
Eu gargalhei, não me contendo.
Bom saber que ao menos a curiosidade de Skywalker não havia mudado.
— Eu não contei para Leia — argumentei, desviando meus olhos dos seus.
— E desde quando Leia precisa que contem algo para ela? Minha irmã sempre sabe das coisas, e, quando não, as coisas não ficam escondidas dela por muito tempo. Ela deve saber quem te treinou mesmo sem você ter dito, mas eu não sou minha irmã. Me conte.
Um riso escapou da minha boca por causa do seu comentário, pois, embora tenha sido engraçada a forma que Luke falou da irmã, era verdade. Leia Organa era uma pessoa muito esperta, uma das mais espertas que eu conhecia. Não era à toa que ela era a líder dos rebeldes.
Os cantos da minha boca se curvaram em um sorriso tranquilo.
— Anakin Skywalker.
Ergui o olhar para ver a reação de Luke.
Os olhos azuis do meu antigo mestre estavam arregalados, refletindo surpresa e outros sentimentos intensos. Sua boca se abria e fechava sem parar.
— Mas... — ele balbuciou, a voz morrendo.
— Seu pai me treinou, Luke — continuei, a voz séria, mas suave. — Fiquei nove anos isolada em um planeta distante para o meu treinamento. Anakin esteve ao meu lado desde meu primeiro dia naquele planeta. Eu estava me sentindo perdida, devastada, sozinha. Em um minuto, eu tinha tudo, e no outro, eu tinha nada. — eu estava desabafando sobre aquele assunto pela primeira vez. Era estranho, doía, mas ao mesmo tempo aliviava. — Então, Anakin apareceu, e eu não estava mais sozinha. — sorri, lembrando do sorriso do meu mestre quando o vi pela primeira vez. — Ele me aconselhou, me guiou, me amou e cuidou de mim da melhor forma que podia, que sua situação como um fantasma da Força permitia.
Os olhos de Luke estremeceram, o azul deles mais intenso, carregando emoções similares as que eu estava sentindo. As principais que identifiquei nele eram: dor, por ele não ter estado comigo quando eu mais precisei; alívio, pois alguém esteve ao meu lado e não me deixou cair; paz, porque duas pessoas que ele amava puderam se encontrar.
Luke respirou fundo, como se quisesse se recompor.
— Ele completou seu treinamento, então?
As palavras de Luke saíram mais como uma afirmação do que como uma indagação, mas respondi mesmo assim.
— Sim. Eu treinei com você por uns oito anos, certo? — ele balançou a cabeça em concordância. — Mestre Anakin adaptou meu treinamento para que eu conseguisse me juntar à Resistência o mais rápido possível. Ele sempre soube o quanto eu queria ajudar os rebeldes a derrotar o Lado Sombrio.
— Como mestre Yoda fez comigo para que eu derrotasse o Império — concluiu Luke em um murmúrio para si mesmo.
— Seu pai não quer falhar comigo — continuei. —, ele sabe qual é a sensação de estar tanto no lugar daquele que falha com alguém quanto no lugar daquele que sente a falha de seu mestre. Por isso ele me treinou por tanto tempo e com muita dedicação.
Luke olhou para um ponto qualquer à sua frente e suspirou, mergulhando por suas memórias, então sorriu com nostalgia.
— Meu pai... — sussurrou. — Faz anos que não o vejo, ele nunca mais apareceu para mim. Acho que a última vez que o vi eu tinha sua idade, Lyra.
Eu não sabia como responder àquilo. Era estranho pensar que eu estive ao lado de Anakin por mais tempo que seu próprio filho. Que tive a oportunidade de conviver diariamente com ele durante longos anos enquanto Luke só pôde vê-lo algumas vezes.
— Aqueles que amamos nunca nos deixam, mestre — falei, depois de refletir um pouco. — Eles sempre estão com a gente, cuidado de nós e tentando nos ajudar. Eles estão bem aqui. — guiei minha mão até seu peito, em cima do coração. — Podemos não vê-los, mas eles estão conosco.
Sorrindo levemente, Luke voltou a me encarar, colocou sua mão sobre a minha e a apertou com ternura. Entretanto, seu sorriso desapareceu tão rápido quanto surgiu, e percebi que o assunto que viria a seguir não seria tão agradável e caloroso.
— Como você sobreviveu àquele dia? — perguntou mestre Luke, uma pequena névoa de dor e tristeza cobrindo sua voz. — E-ele... a deixou ir?
Negando com a cabeça, recolhi minhas mãos sobre minhas coxas e olhei para baixo, sentindo um peso no meu corpo. Comecei a mexer nos meus dedos.
As chamas daquele dia nublaram minha visão e aqueceram a minha pele por um segundo.
— Ben não chegou a me ver naquele dia — murmurei. — Eu estava longe quando o vi perto do Templo em chamas. As chamas iam para todos os lados, tudo estava destruído, e Ben... aquele não era o Ben. — engoli em seco. — Eu... eu fugi.
— Fez o certo em fugir, está viva agora — disse Luke com rapidez, na tentativa de me consolar.
— Então por que é tão difícil conviver com isso?
— Porque nós nos culpamos pela nossa impotência, de uma forma ou de outra, mesmo não tendo culpa. Ficamos presos em hipóteses e não nos focamos na realidade. Pensamos se as coisas seriam diferentes se tivéssemos feito algo diferente, se estivéssemos em outro lugar, se tivéssemos ao menos um pensamento diferente — ele colocou sua mão sobre as minhas, me impedindo de continuar mexendo em meus dedos. — Ao sobreviver, carregamos memórias e dores que não queríamos carregar, inclusive memórias daqueles que partiram. Não é fácil ser um sobrevivente, jovem Lyra.
— É solitário ser uma sobrevivente — comentei em um murmúrio.
— Mas não precisa ser.
— Então me ajude, mestre — pedi. Ergui os olhos para olhá-lo. — Me ajude a ajudar a Resistência a derrotar a Primeira Ordem, a derrotar o Lado Sombrio como você já fez uma vez. E treine Rey, por favor. A garota precisa de treinamento, é perigoso para ela usar a Força sem conhecimento, você sabe disso.
Luke balançou a cabeça, entristecido, os olhos pesados.
— Eu não posso.
— Por que não? — inclinei a cabeça, fitando-o com um olhar solidário. — O que o atormenta tanto, mestre? Compartilhe comigo. Compartilhe suas dores e aflições comigo.
— Eu já não sou o mesmo homem de antes, Lyra, não posso ajudar a derrotar a Primeira Ordem — disse Luke, roucamente. — E eu não vou treinar mais ninguém. Você viu o que aconteceu da última vez. — balançou a cabeça mais uma vez. — Eu não posso.
Luke abaixou a cabeça e fechou os olhos com pesar, a postura curvada em derrota. Senti meu coração se apertar ao vê-lo daquele jeito e lágrimas se formaram em meus olhos. Apertei sua mão que estava em meu colo.
— Ben Solo não foi culpa sua, mestre, ao menos não toda. Todos nós falhamos com ele. Não vimos o que o Lado Sombrio estava fazendo com ele bem diante de nossos olhos — respirei fundo, a consciência pesada. — Eu devia ter notado o que se passava com ele. — minha voz se rachou e minha boca tremulou. — Mestre, se eu ao menos tivesse percebido, talvez eu pudesse...
Luke rapidamente passou os braços em volta do meu corpo e me trouxe para o seu peito. Eu comecei a chorar, soluçando algumas vezes e molhando as vestes do meu antigo mestre. Consegui ser forte em esconder minhas emoções quando a minha conexão com Ben voltou, mas, ali, com Luke Skywalker para me consolar, não consegui mais me segurar.
Lágrimas quentes e pesadas caíam livremente dos meus olhos, e permiti que elas escorressem pelo meu rosto. Minha garganta se incomodava pelos soluços, mas deixei que todo o peso que eu estava carregando há muito tempo saísse em partes naquele choro. Eu bem sabia o quanto eu precisava daquilo.
Ficamos naquela posição por mais alguns minutos até eu me acalmar e as lágrimas pararem de escorrer. Quando percebeu minha respiração voltar ao normal, Luke me afastou apenas o suficiente para me observar. Sua expressão, bem como os seus olhos, estava mais leve.
— Os momentos de mais plena felicidade dele eram ao seu lado, sabia? — comentou, gentilmente, depois de limpar minhas lágrimas com delicadeza com seus polegares.
Funguei e apoiei minha cabeça em seu ombro, o qual foi envolvido pelo seu braço.
— Tenho que trazê-lo de volta, mestre, eu tenho que tentar — sussurrei. — Anakin teve alguém que lutou para fazê-lo voltar, Ben precisa disso também.
Luke acariciou meu ombro com uma mão e segurou minha mão com a outra, ficando em silêncio por alguns segundos.
— Fico impressionado a cada dia com o laço que nos une — comentou, um sorriso pequeno no rosto.
— É algo inquebrável — retribuí o sorriso.
— É, sim — ele suspirou, deixando o silêncio dominar o ambiente por mais um tempo. Por fim, falou: — Vou treinar a garota Rey.
Meus olhos se iluminaram.
— Obrigada, mestre.
— Mas também vou mostrar por que os Jedi têm que acabar — Luke completou.
Dessa vez, foi a minha vez de ficar em silêncio, refletindo sobre suas palavras, e, depois disso, virei a cabeça para encará-lo com atenção.
— Sei que perdeu sua esperança depois de tudo, mestre, mas a minha permanece intacta — falei. — E, com todo o respeito, talvez os Jedi não tenham que acabar, apenas mudar.
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