CAPÍTULO 57 - O último Teste dos Deuses
Porque se eu me levanto, quebro meus ossos
Todo mundo gosta de ver uma queda
Não há ninguém desistindo
Porque ninguém dá a mínima
Levante-se, e quebre meus ossos
Todos querem o que eles simplesmente não podem suportar
Não há ninguém orando por mim
(Seether - Nobody Praying for Me)
No decorrer da minha fatídica vida, sempre fui obrigada a esperar pelo pior. Conviver junto aos escandinavos que fizeram me fizeram de escrava, contribuiu para que eu, constantemente, permanecesse a espera de que algo ruim pudesse acontecer. Contudo, apesar de eu ter a certeza de que eram quase inexistentes as chances de Acme matar o tão temido dragão, eu não conseguia antecipar-me em aceitar sua sua iminente derrota; o grande fracasso que consequentemente, indicava sua perda.
Eu me agarrava a um fraco fio de esperança e insistia em não soltá-lo. Uma esperança tão vazia quanto o meu coração em outrora.
Todavia, naquela altura dos acontecimentos, o êxtase do baile havia se dissipado e os dias tornaram-se cada vez mais sombrios.
O frio agressivo do inverno, fazia-se — a cada dia — mais impetuoso. O Yule anunciava sua chegada, a noite mais longa dos ciclos da Natureza, em breve retornaria.
Guardo em minhas lembranças a cruel certeza de que o assombroso período antes do o último dos Testes, trouxe consigo um sentimento fúnebre que se instalou por toda a Asgard. Ninguém ousava a falar da possível morte de Acme, mas em contrapartida, podia ser visto estampado nos olhares de cada pessoa, a dura verdade sobre o fim de Acme; todos sabiam que seria um final triste e doloroso.
Balder, o deus que um dia também havia cogitado um plano para salvar a jovem grega, apenas desapareceu por completo, deixando o mudo de suas esperanças vazias ecoando pelos quatro ventos. Não sabia se Acme tinha recusado a seguir plano do deus mais belo de Asgard, contudo, o dia do último Teste, infelizmente chegou, e sua chegada deixou claro que Acme manteve sua palavra de enfrentar o último — e o mais temido — , Testes dos Deuses.
Lembro-me que naquele dia tão sombrio quanto o terror que espreita as noites mais atribuladas, o frio de inverno atingiu a todos com sua força total. Nenhum mísero brilho da luz do Sol era capaz de perpassar qualquer nuvem negra, que despejava uma grossa camada de neve do céu. Quando coloquei os pés para fora do palácio dos deuses Aesir, senti que a Natureza estava se lamentando pelos acontecimentos que ocorreriam naquele dia. O uivo do vento impiedoso era um misto de tristeza e fúria. Algo terrível estava prestes a acontecer... meu sangue, minha pele e meus ossos sentiam que uma escuridão emergia das sombras e ela estava determinada a engolir qualquer esperança que ousasse a crescer naquelas ríspidas terras. O meu mundo e o de muitos estava prestes a ruir.
Ainda em repleto silêncio depositei meus pés sobre a densa camada de neve cobria todo solo de Asgard, e ao caminhar pelo extenso manto branco, não pude evitar que lembranças ruins surgissem em meus pensamentos. Neve e frio impiedoso lembravam-me da fria Escandinávia e de todo sofrimento que passei enquanto era escrava do povo que lá habitava.
Pensei em desistir de enfrentar o frio, por um momento pareceu-me mais seguro permanecer em meus aposentos. Porém, carregando uma imensa tristeza em meu coração, a passos rápidos e precisos eu optei por seguir até o início da floresta que permeava todo o entorno de Asgard. Uma oração deveria ser feita em nome de Acme, talvez a Natureza fosse forte o suficiente para protegê-la de todo o mal; talvez em algum lugar da imensa Yggdrasil, haveria alguma esperança a qual se agarrar.
Ao chegar a uma clareira junto os densos pinheiros cobertos de neve, por um longo momento, apenas fiquei parada entre as árvores, mantendo meus olhos fixos no céu cinzento enquanto observava os flocos de neve se desprendem das nuvens num ritmo lento e inebriante. Senti vontade de chorar e liberar toda a tristeza que me devorava de dentro para fora, no entanto eu nunca fora boa em libertar o choro, que vez ou outra, implorava para escapar de dentro de mim. Naquela a manhã não foi diferente, as lágrimas permanecerem presas, não era o momento delas caírem.
Uma oração sucinta, porém verdadeira fora entregue a Natureza. O destino de Acme já não dependia mais de mim. A mais severa das verdades a qual eu tive de aceitar, é que, talvez, ele nunca dependeu.
Os mundos sempre foram lugares cheios de incertezas, entretanto, naquele determinado dia, uma única certeza emergia do vazio: haveria sangue derramado nas raízes da Yggdrasil; um dragão morreria, ou a imponente fera mataria uma mortal.
Ainda com o coração tomado pela angústia, apertei fortemente o casaco em torno do meu corpo e retornei para Asgard. Ao chegar no palácio dos Aesir, minha primeira ação foi a de procurar por Acme em seus aposentos, mas logo soube que ela não se encontrava em tal localidade, e tampouco estava nos aposentos de Thor. Percebi que não era do desejo da jovem grega receber qualquer visita antes do seu embate final. Portanto, restou a mim apenas aceitar o sua reclusão, por mais dolorosa que ela fosse.
Como não encontrei aquela por quem meu coração doía, decidi ir a biblioteca de Asgard a fim de ocupar minha mente com os livros, mas antes de alcançar meu destino, ouvi sinistro badalar dos sinos da Arena soarem rispidamente, indicando o que o último Teste dos Deuses, em breve teria seu início.
Naquele momento, meu coração começou a disparar num ritmo assustadoramente rápido. Um zunido estranho tomou conta de meus ouvidos enquanto eu seguia em direção a Arena trocando passos involuntariamente descompassados.
Fazia um frio de atingir os ossos, mas de alguma forma, minhas mãos transpiravam como se o pior dos verões tivesse atingido a morada reclusa dos deuses. Tive a vaga impressão de que uma eternidade havia se passado até eu chegar na Arena que já estava lotada. E embora minha visão tivesse turva enquanto eu passava por todos os malditos asgardianos, ao encontrar o olhar de Acme, eu a vi perfeitamente, e por um breve momento, tudo à minha volta deixou de existir; o mundo tornou-se apenas eu e a bela jovem grega que me olhava com seus tristes olhos verdes a medida em que um sutil sorriso começava a surgir em seus lábios perfeitamente esculpidos. Foi aquele o exato momento em que eu senti a esperança, e pela primeira vez, fui capaz de pensar que tudo poderia terminar bem. Dessa forma, eu lhe devolvi o meu melhor sorriso que lhe dizia muitas coisas, mas principalmente, afirmava que eu jamais a abandonaria. Instantes depois seus olhos desviaram-se dos meus e só então eu me dei conta do quanto a plateia estava em silêncio. Não havia qualquer buchicho no ar, ouvia-se somente o aterrorizante som do vento que nos envolvia em seu abraço frio e cruel.
Recordo-me que não tardou para que Odin surgisse ao palco acompanhado de sua bela esposa Frigga e seu filho Thor que posicionou-se ao lado de Acme e segurou sua mão num singelo gesto de conforto. E foi ali, na frente da Arena, enquanto contemplava os rostos das pessoas acima do palco, o momento que senti a presença de Loki ao meu lado. Não foi necessário olhar para o lado a fim de comprovar que ele havia se aproximado de mim, eu era capaz de detectá-lo antes mesmo de ouvir sua voz. Era como se uma força invisível nos unisse e nos atraísse. Não havia mais o Laço do Sacrifício nos unindo, mas ainda assim, uma estranha ligação ainda existia entre ele, — um Deus — e eu — uma mortal.
— Acha que ela vencerá o último Teste? — Loki indagou num baixo.
Não ousei virar meu rosto em sua direção, já havia muita dor reverberando dentro de mim, não precisava adicionar a imagem de tal deus em minhas confusões. Para tanto, apenas continuei mantendo meu olhar fixo ao palco quando respondi:
— Ninguém esperava que ela chegaria até aqui, entretanto ela chegou. Então creio que ela pode surpreender a todos novamente e sair vitoriosa desse último Teste. Nada está definido até que seja decretado o fim.
Esperei que o deus da mentira rebater minhas convicções, contudo, Freya que estava ao seu lado, foi mais rápida ao disparar:
— Seria melhor se aceitasse a derrota de sua amiga. Milagrosamente ela foi capaz de vencer os testes anteriores, porém esteja ciente que ela não obterá êxito no último deles. Os Testes dos Deuses não foram feitos para conceder a vitória a qualquer mortal, eles foram criados para impor um duro limite a qualquer homem ou mulher que tinha a ousadia de desejar usufruir dos privilégios que deve pertencer apenas as divindades; têm o único propósito de estabelecer o fracasso, para comprovar que nenhum mortal é merecedor de experimentar o gosto da eternidade. Serve, somente, para decretar que a linha entre homens e deuses não deve, jamais, ser transposta. Trata-se de manter o equilíbrio... Nenhum homem deve ter aquilo que só cabe aos deuses, pois se um deles se tornar imortal, é uma questão de tempo até que todos cheguem à conclusão de que qualquer um pode ser um deus. Se algum dia isso acontecer, nós, os deuses, iremos nos tornar apenas um mito e os mitos... — ela soltou um leve riso de escárnio — Sequer existem. — Completou sombriamente.
Cerrei os punhos com tanta força que senti as unhas rasgarem minha pele. Todos tinham tanta certeza de que Acme morreria, e o que mais me deixava revoltada, é quem ninguém se importava com sua morte.
— Talvez essa data fique conhecida como um marco significativo na história entre deuses e mortais. Talvez hoje seja o início de uma nova espécie de relacionamento entre os Aersir e os homens. Talvez, aqui seja decretado o início dos tempos em que a linha que separa ambos os seres comece, enfim, a se dissipar. Talvez sejamos testemunha de um novo ciclo na qual todos finalmente perceberão que de nada valem os deuses sem os homens, mas que os mortais, por sua vez, são perfeitamente capazes de viver sem os deuses. Então a eternidade de nada valerá, pois do que vale a eternidade, se para sempre se serão esquecidos?
Freya, assim como o deus que acompanhava, ficaram espantosamente calados. Não aguardei por qualquer réplica que pudesse sair dos lábios de tal casal, apenas finalizei a frase que carregava duras verdades e segui meu caminho. Entretanto, antes de deixá-los, senti os dedos de Loki roçarem na minha mão numa vã tentativa de fornecer-me qualquer tipo de conforto. Contudo, ele não poderia me auxiliar em nada, ao contrário seu toque parecia me queimar. Loki e todas suas lembranças deveriam permanecer soterradas no passado. Ele jamais faria parte do meu futuro. Sendo assim, após estar convencida de que meu destino era o mais longe possível de Asgard, eu rapidamente me desvencilhei do seu toque ácido e afastei-me de ambos os deuses e toda a toxidade que eles emanavam.
Permaneci na outra extremidade do palco, ainda mantendo meus olhos fixos em minha amiga. Logo, fosse para o bem ou para o mal, tudo estaria acabado e finalmente eu estaria livre para partir.
Olhei para a multidão a minha volta e o semblante no rosto de cada pessoa parecia ser o reflexo da minha própria imagem: havia um misto de medo e ansiedade por trás de cada olhar. Todos estavam ansiosos pelo desfecho, mas também temiam por algo que eles desconheciam. Talvez a ira do destino mantinha seus olhos afiados em cada um de nós, no entanto ninguém estava preparado para pagar pelos erros cometidos. Talvez jamais estaríamos.
Tirando-me completamente do meu devaneio, a voz de Odin se propagou pelo ar e alcançou toda plateia que ocupava a Arena. Seu tom apresentou-se diferente das outras ocasiões... Não era grave e tampouco baixo. Era apenas uma voz repleta de um único sentimento: resignação.
Não sei dizer se o deus supremo teve outra escolha a não ser prosseguir com o último Teste, entretanto posso afirmar que seu único olho estampava um nítido olhar de tristeza. Ele pouco se importava com Acme, porém Odin amava seu filho Thor, e por amá-lo, o deus sabia que ele sofreria se porventura visse sua amada morrer diante de seus olhos.
Conforme as típicas palavras de abertura dos Testes Saiam por sua boca, mais negro se tornava o céu que nos encobria. Então Odin soltou um profundo suspiro e, uma densa nuvem de vapor escapou da sua boca entreaberta. Seu único olho incorporou uma expressão vazia enquanto ele permanecia mudo e completamente paralisado em cima do palco.
Todos os espectadores ficaram imóveis tanto quanto o deus o qual observavam, até mesmo o vento interrompeu o movimento e só voltou a retomar sua dança pelo ar, quando Odin piscou seu único olho inundado em tristeza e finalmente retomou o seu discurso que também havia mudado de tom. Foi lamento o que senti no timbre de sua voz.
— Sabe... - começou Odin ainda parecendo incerto de suas ações. Sua esposa que que estava atento à sua postura, entrelaçou os dedos no dele e lhe concedeu o apoio necessário. O deus, portanto, recobrou a coragem para prosseguir: — A última vez em que presenciei o último Teste dos Deuses, Thor ainda estava protegido pelo ventre de sua mãe e eu me lembro de ter pensado "Que bom que meu filho será um deus. Que bom que eu o privei de qualquer sofrimento em busca pela imortalidade". Mas vejam como o destino é traiçoeiro, aqui estou eu nesse dia sombrio, presenciando com muito desgosto o fato de que ele é uma das peças fundamentais no desfecho de mais uma longa temporada dos Testes dos Deuses. — Ele soltou um suspiro enquanto lançava um olhar triste para seu filho. — E no fim eu não o protegi da dor. No fim eu não pude poupá-lo do sofrimento pela busca da imortalidade, porque no final das contas, a cada Teste, a cada desafio, sei que ele sofreu por sua Acme. Eu apenas torço para que ele não precise mais sofrer. Torço para que a imortalidade seja concedida a sua amada. Torço para que possam viver felizes pela eternidade. — Odin desviou seu olhar para Acme que o fitava com demasiada atenção. — Mas, infelizmente, minha querida Acme, embora eu seja um deus, eu nada mais posso fazer para alterar seu destino... Ele depende apenas de você, única e exclusivamente, de você. — Odin inalou o ar com força — E você precisará de muito mais do que sorte para vencer o último dos Testes. Talvez, a sorte, minha querida, não seja o suficiente para derrotar um dragão. — finalizou ele fazendo com que todos os presentes, exceto aqueles que já sabiam de tal informação, ficassem espantados com sua declaração.
Acme, obviamente nem se abalou com o que fora dito, ela já está a conformada com o fato de que duelaria com um temido dragão. Odin, entretanto, lançou a jovem grega um olhar cheio de desconfiança. Ao certo, soube naquele momento, que Acme já sabia o que a esperava. Odin não era o único a ter espiões em Asgard, mas disso ele também já sabia.
Finalmente um leve rumor começou a se espalhar pela multidão. Dragões não eram tão comuns na grande Yggdrasil, mas menos habitual ainda, era que uma mortal lutasse com uma dessas criaturas. Por isso ninguém acreditava que tal fato pudesse ocorrer.
— Posso garantir, meus caros, vocês ouviram perfeitamente o que eu disse. Acme deverá enfrentar um dragão em seu Último teste. — Uma agitação tomou conta de todos, mas não era o sentimento pavor que pairava no ar; era um sentimento de ansiedade, todos desejavam ver o dragão e pouco se importavam com a jovem que o enfrentaria. — Mas não qualquer dragão... — continuou Odin aumentando a voz fazendo com que a multidão se calasse — Ela enfrentará o dragão cujos os anões tiveram de lutar para conquistar Nidavellir; o único, e mais temido, inimigo do povo anão. — Novamente a plateia ficou espantada. Ninguém sabia que o segundo dragão havia sobrevivido à batalha que levou o seu companheiro a óbito. — Por muito tempo vocês acreditaram que os anões com sua bravura haviam derrotados tais feras — retomou Odin num tom de voz sereno — Mas acreditem, essa não é a verdade, está longe de ser. Um deles sobreviveu e está à espera de retornar para vingar o que todos acreditam ser o seu irmão que fora morto nos solos de Nidavellir. O dragão exilado, atualmente habita os cantos mais longínquos de Svartalfheim e lá, dizem que ele planeja seu retorno para conquistar a terra que um dia lhe pertenceu. Enquanto isso, a Lança de Dagda, a mesma que penetrou as duras escamas e cravou-se no fundo do coração de um dos dragões, permanecia em Nidavellir a espera de que um bravo guerreiro a empunhasse e marchasse até o dragão para matá-lo, para assim pôr, para sempre, um fim nessa linda história de guerra. — estendeu a mão para Acme que aceitou e tomou o lugar ao seu lado. — Acme, minha querida, por sua bravura ao ter vencido os outros Testes dos Deus, acreditamos que você é capaz de matar esse dragão e por isso foi escolhida para ser destemida guerreira que pode pôr um ponto final nessa história. Se vencer esse último Teste, você não terá apenas conquistado a tão desejada imortalidade, mas também terá a gratidão eterna do povo anão, que serão, eternamente, seus servos mais leais.
Mal Odin terminou a frase e a plateia explodiu em aplausos. O deus supremo era assim, sempre conseguia distorcer um momento ruim quando pronunciava suas belas palavras que escondiam terríveis verdades. Todavia, seu olhar não mentia, ele também temia o acontecimento daquele dia, a morte de Acme poderia trazer um grande caos para dentro da sua casa. Talvez até perderia seu filho e nem Odin era capaz de suportar tanta dor.
— Dessa vez ninguém poderá te ajudar a vencer. Essa é sua luta. Haverá, hoje, apenas uma morte: a sua ou a do dragão. Um não pode viver enquanto o outro ainda respirar. — Ele cravou seu único olhar sombrio nos de Acme — Compreende o que eu digo?
A jovem grega engoliu a seco, e apenas balançou a cabeça afirmativamente.
— É de seu desejo prosseguir com o último Teste? — indagou na esperança de que desistisse, porém não foi o que ela fez.
— Prosseguirei. — afirmou com altivez. E foi ali que todos souberam que Acme conquistaria a liberdade, ou morreria tentando.
— Se este é o seu desejo... Que seja feita a sua vontade. O dragão está a sua espera. Não se preocupe, o atraímos para um local onde terá ao menos, um pouco de vantagem. — Odin, então, mudou sua atenção para o público e exibiu um largo e forçado sorriso. — Acredito que é do desejo de todos contemplar o desfecho do último Teste. Pois bem, saibam que não os privarei de testemunhar tal importante evento. Eu, juntamente com Heimdall, conseguimos organizar tudo para que vocês, o povo de Asgard, possam ser testemunha do que ocorreu no início, no meio e no fim do último Teste dos Deuses. Assim, quando eu desvanecer, a Bifrost surgirá por entre essas densas nuvens negras e os transportaram para Svartalfheim, exatamente no local onde o dragão foi habilmente posicionado. Hoje será um dia de derramamento de sangue. Fiquem contentes apenas porque, desta vez, o sangue não serão o seus. Mas sempre existe o Ragnarok e mais cedo ou mais tarde, o sangue de todos mancharão a terra e se juntaram as raízes da Yggdrasil e tudo terminará, exatamente onde começou.
Odin preferiu não contemplar a imagem de terror estampada em cada face dos asgardianos. Ele apenas concluiu a sombria frase e desvaneceu para Svartalfheim levando Acme consigo.
Instantes depois, como fora dito, os raios coloridos da Bifrost penetram as densas nuvens e indicaram o caminho para que pudéssemos desvanecer ao encalço do deus supremo dos Aesir.
Quando aterrissamos na terra por mim desconhecida, percebi que havia uma estrutura de bancos montada logo acima de um abismo cravado como uma imensa ferida no centro de uma montanha rochosa; um abismo sem rota de fuga, um círculo fechado que seria protegido pelo próprio Odin. Alim no meio daquelas rochas escuras, seria decidido o destino de Acme. Se ela viveria ou morreria, ninguém tinha certeza, no entanto todos sabiam que o dragão já estava presente, encurralado pelas paredes de pedras, sendo observado por centenas de pares de olhos que ao mesmo tempo que o temiam, também o idolatravam. Uma criatura imponente, uma fera indomável que mesmo de longe parecia ser invencível.
Lá de cima do rochedo observei Odin transportar Acme para o centro da montanha. Quando seus pés tocaram o solo rochoso, o deus lhe passou o porte da Lança de Daga, sussurrou algo em seu ouvido e depois desvaneceu para o alto do penhasco juntando-se a sua esposa e filhos. O imenso dragão negro que graciosamente voava em círculos observando toda a movimentação ao seu redor, direcionou seus ágeis olhos amarelos em direção ao solo e avistou Acme, que segurava a Lança em suas mãos. Ao perceber que a pequena jovem estava em posição de ataque segurando a mesma arma que matou seu suposto irmão, a fera se tornou a própria fúria, bateu suas longas asas negras e disparou com extrema velocidade rumo a fenda da montanha na esperança de alcançar o céu. No entanto, logo ele soube que estava preso naquele lugar, pois ao alcançar a saída, a criatura se chocou com uma parede invisível que o impediu de realizar a sua fuga. Por três vezes o dragão se chocou agressivamente na parede invisível e por três vezes por ela foi bloqueado. Seus olhos voltaram-se para a plateia que o assistia e quando seu olhar recaiu em Odin, notei que ele teve a certeza de não sairia dali sem que tivesse de lutar.
Meu coração se apertou pelo dragão, nem mesmo ele merecia a morte.
Uma raiva brutal tomou conta da fera tão negra quanto a noite sem luar. Uma labareda de chamas saiu de sua boca antes que ele aprumasse suas asas, e num rasante, disparasse em direção Acme, devidamente pronto para matá-la.
Meu coração acelerou suas batidas e quase saiu pela boca ao ver a criatura, a cada instante, se aproximar da minha amiga. A jovem por sua vez fincou os pés no chão e permaneceu a espera do seu oponente que abriu a boca e lançou uma linha de chamas em sua direção. Mas, por sorte, Acme conseguiu desviar no último momento e em seguida jogou a Lança de Dagda nas asas do dragão que soltou um urro pavoroso quando aponta da Lança penetrou suas escamas e a rasgou por completo.
Acme havia acertado o dragão, mas não foi um tiro certeiro, a criatura ainda vivia e tornou-se ainda mais furioso com a jovem que o atacava sem motivo algum.
Possuído pela ira de um monstro raivoso, o dragão começou a lançar chamas e mais chamas de fogo escaldante em direção a Acme, que apenas conseguia desviar do ataque, mas não era capaz de alcançar sua arma que havia caído na outra extremidade, bem atrás do dragão.
Mais uma vez meu coração bateu num ritmo acelerado, pois não fazia ideia de como Acme conseguiria escapar daquela terrível situação. Eu tinha que tentar ajudá-la de alguma forma, tinha de encontrar ao menos uma forma de distrair o dragão. Foi quando percebi que o escudo de magia apenas impedia a fuga do dragão, pois ele fora projetado para conter a fera, todavia, qualquer um podia penetrá-lo com facilidade. Por isso eu, discretamente, conjurei a magia e movi uma grossa camada de terra que sob as garras da feroz criatura o fazendo desequilibrar. O breve momento de distração foi o suficiente para que Acme desligasse por entre suas pernas e alcançasse a Lança de Dagda.
Em completo desespero a vi escalar os desnivelados degraus de rocha até ficar cara a cara com o imenso e pavoroso dragão negro que fixou em minha amiga seus medonho olhos amarelos carregados de uma brutalidade cruel. A fera raivosa abriu a boca mais uma vez e ficou pronto para lançar sua labareda alaranjada de fogo escaldante. Entretanto, a chama se prendeu em sua garganta, pois a Lâmina de Dagda foi arremessada em sua direção. O dragão que não era tolo, ao ver a arma traçar uma linha reta rumo a sua garganta, bateu suas enormes asas e o vento por elas produzidos, fez com que a Lança perdesse a velocidade, assim, ele agilmente foi capaz de pegar a Lança em seus lábios, sem sofrer nenhum arranhão, e logo em seguida a disparou contra Acme.
Num ritmo assustadoramente lento, observei com muita tensão a Lança cortar o vento e ir de encontro a minha única amiga. Senti uma dor aguda tomar conta do meu coração quando percebi que Acme não seria capaz de desviar da arma que ferozmente a perseguia. Meus músculos enrijeceram e minha respiração falhou. Lembro-me que gritei por seu nome enquanto uma lágrima de desespero escorria por meu rosto. Sem pensar pulei a estrutura de madeira e me arremessei abismo adentro numa insana e desesperada tentativa de salvar Acme. No entanto, quando pisei no solo rochoso, apenas fui capaz de ver a Lança penetrar o grosso couro de sua armadura e atravessar seu corpo de fora a fora... Naquele instante, o mundo se desfez sob meus pés.
Não havia mais nada nada a minha volta; nada além da imagem de Acme caindo num ritmo assustadoramente lento em direção ao chão. Sangue já escorria por seus lábios, no momento em que consegui chegar até ela e segurá-la em meus braços. Seus olhos verdes estavam inundados em lágrimas e sua mão pendia sobre a Lança que fora fincada bem no centro de sua barriga. Ela abriu a boca e tentou dizer algo, mas a vitalidade já se esvazia dentro de si. Eu envolvi sua cabeça em meu peito e lhe disse, repetidamente, que tudo ficaria bem; que tudo estava bem. Queria poder ter lhe salvado, porém nada consegui fazer a não ser chorar como uma viúva histérica.
Por um momento eu me esqueci que o dragão ainda nos espreitava. Por um momento tudo que me importou foi consolar Acme em seus últimos instantes de vida.
Senti o calor das chamas do dragão se aproximar de nós e pensei que estava pronta para morrer ali, no meio daquelas rochas, com Acme em meu braço. Respirei fundo, fechei os olhos e esperei que a chama tocasse meu corpo e me queimasse por completo. No entanto, o calor não veio e nenhuma faísca de fogo me tocou, pois Loki lançou um escudo protetor sobre nós e barrou o ataque do dragão. Naquela altura, tudo que restou de Acme fora seu corpo junto ao meu, que jazia sem vida em meus braços.
Os olhos azuis de Loki repleto de tristeza se encontraram com os meus e então eu desabei. Gritei tão alto que as montanhas tremeram. Senti toda dor se agarrar a mim como um maldito parasita. Senti tanta tristeza que não podia ser colocada em palavras.
Loki gentilmente se agachou perto de nós e sem dizer qualquer palavra, nos envolveu em seus braços e desvaneceu conosco para longe do dragão, para longe de Svartalfheim e de todos os malditos asgardianos que não foram capazes de mover um músculo sequer para livrar Acme da morte.
Não fiz questão de saber para onde Loki nos levou. Tudo o que importava era continuar a segurar Acme em meus braços e sussurrar feitiços e mais feitiços para trazê-la a vida enquanto eu chorava desesperadamente, pois sabia que nada do que eu dissesse poderia devolver-lhe a vida.
Acme estava morta. Tão morta quanto os deuses de Asgard estavam para mim.
Olhei mais uma vez para sua bela face desprovida de qualquer indício de vitalidade e pensei que ela não merecia aquele fim. Com imensa tristeza fechei seus vidrados olhos verdes cujo brilho havia se apagado e depositei um suave beijo em sua testa que começava se se tornar tão fria quanto as terras que a consumiram.
"Acme está morta" aquele foi meu último pensamento, antes de apagar por completo e deixar toda dor me consumir. Então cada pedacinho de mim começou a ruir. E no íntimo da minha dor, todos os medos foram mortos.
Nada jamais seria o mesmo. A vida se tornaria um maldito caos.
(CAPÍTULO SEM REVISÃO)
Olá gente, tudo bom?
Depois de uma longa espera, eu finalmente postei um capítulo. Estou me esforçando a máximo para concluir a história, mas a faculdade está realmente de me sugando!
Espero que tenham gostado do capítulo e até breve!
Por favor, comentem o que acharam, estou na reta final e fico morrendo de medo de estar fazendo tudo errado!
Bjus, tia Lua.
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