CAPÍTULO 28 - Ameaças
Começarei a narrar essa parte da história evidenciando dois fatos que devem ser considerados sobre o deus da mentira. Um: ele é extremamente obstinado. Dois: raramente fala a verdade, mas quando isso acontece, pode ter certeza de que manterá sua palavra até o fim.
Como cheguei a tais conclusões? Confesso que este foi um processo demorado que poderia ter sido encurtado se eu não fosse tão teimosa e demasiada orgulhosa. Mas, desdobrarei sobre ele a seguir.
※
Após o passeio com Balder, depois que Loki saiu de meus aposentos deixando a sua promessa sobre o início de um perigoso jogo pairando no ar. Cheguei à conclusão de que deveria ter levado com seriedade a profundidade de seu olhar recaído sobre mim ao declarar sua ameaça com tanto fervor.
Acontece que, para minha infelicidade, sempre fui puramente orgulhosa e demasiada destemida, portanto, em nenhum momento, deixei me abalar com as curtas palavras de intimidação que Loki proferiu com tanto fervor. Tal lamentável inconveniente relacionado à minha personalidade, ofuscou minha racionalidade, pois nem sequer pude me precaver dos futuros incidentes que a deus da mentira colocou e em meu caminho.
Tencionado a não perder seu tempo precioso, os jogos de Loki começaram no dia seguinte, quando eu já nem me lembrava de sua ameaça.
Em uma determinada noite, eu havia combinado com Acme de fazermos um curto passeio pelas redondezas de Asgard. Assim, quando bateram em minha porta logo pela manhã, acreditei que se tratava de minha amiga. No entanto, ao contrário do que eu esperava, era Balder que inesperadamente viera a minha procura.
— Bom dia. — cumprimentei, franzindo o cenho confusa ao fitar o deus que me encarava com seu exuberante par de olhos misteriosos.
Balder, estranhamente, percorreu seu olhar toda extensão do meu corpo, que se encontrava coberto apenas por uma fina roupa de dormir, e em seguida, mordeu os lábios carnudos em um gesto de puro desejo.
Cruzeiros os braços ao meu entorno, tentando, inutilmente, esconder minha indecência.
— Precisei te ver. — Um sorriso malicioso se apossou de seus lábios — Senti sua falta. — Completou com a voz rouca.
Achei sua atitude um tanto esquisita. Estava certa de que no dia anterior, tínhamos chegado ao acordo de sermos apenas amigos.
— Balder, não é um bom momento. Estou à espera de uma amiga. Então, se me der licença, preciso me arrumar para encontrá-la. — Comecei a fechar a porta, entretanto ele a bloqueou com a mão e rapidamente adentrou no meu quarto.
— Balder... — Tentei chamar a sua atenção, porém fui interrompida pelo deus que agilmente me pegou em seus braços, envolveu minhas pernas ao redor de seu corpo, imprensou-me contra a porta e selou nossos lábios com avidez.
Não perdi tempo analisando aquela estranha situação e reagi dando-lhe uma forte mordida em seus lábios que imediatamente começaram a sangrar.
— Maldição, Erieanna! Isso doeu! — exclamou, o deus, pondo-me no chão, levando as mãos aos lábios machucados.
— Vá embora Loki! — bradei, furiosa.
O bastardo sorriu, exibindo os dentes manchados de sangue.
— Como descobriu que era eu? — Imediatamente, o deus voltou a sua real aparência.
Encarei-o com uma fúria que fazia meu sangue efervescer sob minha pele. Não podia acreditar que Loki havia, novamente, tentado me enganar.
— Balder jamais agiria dessa forma. Ele tem bons modos, sabe? — respondi, rispidamente, caminhando em direção ao baú em que eu guardava os vestidos.
— Ou talvez não tenham avançado a esse ponto, por isso achou tal atitude fora do contexto. — Arqueou a sobrancelha, lançando-me um olhar desafiador.
— Suposições Loki. Apenas suposições. — Deixei a dúvida pairar no ar.
O maldito mentiroso ficou em silêncio por algum momento, tentando encontrar as palavras certas para me intimidar.
— Não importa, Coração de Gelo. Temos a eternidade para nós divertirmos nesse joguinho. — declarou, ele, sugestivamente.
Naquele momento, dei-me conta de que precisava, urgentemente, colocar o deus em seu lugar e mostrar-lhe que eu estava no controle daquela situação, por isso fixei meu olhar nos seus e avisei com firmeza:
— Se tentar me beijar mais uma vez, terá muito mais que um lábio sangrando. Não se esqueça que Odin me concedeu a permissão de me defender de qualquer indivíduo que ouse me atacar. Você, com certeza, não é uma exceção.
Não esperei que Loki dissesse algo. Minha paciência para com ele havia acabado. Ignorei-o como de costume, seguindo para o cômodo ao lado e comecei a me preparar para o passeio com Acme.
Enquanto me vestia, escutei o estrondo da porta sendo fechada com demasiada força. Cheguei à conclusão, de que Loki, outra vez, fora embora carregando uma grande fúria dentro de si.
※
Naquele mesmo dia, Acme pediu para que uma criada viesse a me avisar que ela lamentava, mas não poderia comparecer ao passeio que havíamos combinado, pois se sentia indisposta. Confesso que fiquei chateada, a jovem era minha única companhia dentro da morada dos deuses Aesir.
Todavia, por mais que eu apreciasse tê-la por perto, cada vez mais, Thor a mantinha distante de mim. Tudo que eu desejava era de alguma forma ajudá-la com os misteriosos desafios que teria de enfrentar, mas raramente a via, e quando tentava investigar com qualquer pessoa a respeito de tais desafios, elas se esquivavam e encontravam um jeito de me manter as escuras sobre eles.
No íntimo do meu ser, eu nutria a certeza de que ninguém confiava em mim. E não podia culpá-los pela desconfiança, era difícil condenar alguém por tal ação, quando eu mesma não confiava em mim.
O destino seguiu o seu curso em Asgard e a roda da vida continuou a girar. Com o passar do tempo, lamentavelmente, pouco se foi alterado a respeito da minha rotina naquele lugar repleto de pessoas esnobes. Simplesmente permaneci cercada de ministérios intrigantes que assombravam meus sonhos e pensamentos; mistérios que ameaçavam me sufocar.
※
Um padrão monótono se estabeleceu no lar dos deuses Aesir. Todos os dias o Sol surgia de manhã se escondia a noite, e, cada vez mais, eu me sentia solitária em Asgard.
Loki, contudo, não desistiu da sua promessa de tentar arrancar a verdade de mim. Em uma outra ocasião, ele aprontou mais uma de suas artimanhas. Daquela vez, tomou a forma de Acme, porém, para seu desgosto, levei apenas um curto período de tempo para descobrir que estava de fato, dialogando com o deus da mentira.
Em um outro, o trapaceiro tomou a forma de uma das minhas criadas. Depois, por Thor, seguido por Frigga e até mesmo Odin. Só que de uma forma ou de outra, eu sempre descobria seus disfarces.
Aqueles foram longos dias, os quais precisei me manter atenta com qualquer pessoa, pois Loki poderia passar por qualquer um, tentando inutilmente extrair a informação que ele tanto desejava; informação que eu estava disposta a manter em segredo. Por conta de determinado jogo desgastante, no final do dia eu sempre me encontrava totalmente acabada.
Mas tudo na vida tem início e um fim, assim a rotina cansativa que eu havia estabelecido com Loki, também se findou.
Recordo-me exatamente o dia em que consegui fazê-lo a interromper sua insistência em atormentar com seus disfarces. Quando me lembro de tal situação, não consigo evitar com que uma gargalhada escape de meus lábios, pois a cena que me vem à memória, remete uma imagem um tanto engraçada. Entretanto, naquela ocasião, confesso que não achei tanta graça de tal acontecimento que discorrerei a seguir.
Estava eu, numa bela manhã em Asgard, desfrutando de um momento de descanso sob a sombra de uma robusta macieira enquanto me alimentava de seu fruto, agraciando-me da deliciosa sensação da grama sob o meu corpo. O clima estava em uma temperatura agradável, cujo vento cálido embalavam suavemente as folhas das árvores, propiciando um leve frescor ao tocar minha pele. O mais nítido tom azul pintava o céu límpido. Havia ali, naquele jardim esquecido pelos deuses, uma tranquilidade que somente a Natureza era capaz de me conceder. Era um dos raros momentos de verdadeira calmaria que eu tinha naquele palácio. No entanto, o curto período de paz que a qual eu me deleitava, fora abruptamente interrompido quando senti algo frio e escorregadio percorrer por meu pescoço e deslizar pegajosamente pela extensão do meu braço.
Direcionei meu olhar no animal que rastejava sobre mim e fiquei encantada com a beleza da cobra que se enrolava em torno do meu antebraço.
— Olá. — sussurrei, admirando sua pele tão branca como a neve, quase translúcida.
Nunca tive medo de qualquer animal. Como filha da natureza, eu possuía uma conexão inexplicável com todos os seres que ela abrigava, por isso tínhamos uma relação de respeito mútuo. Aquela cobra de beleza peculiar jamais me assustaria.
A cobra me fitou com seus olhos amarelos, antes de tonar a deslizar por meu corpo. Deixei que me explorasse. Permiti que vagueasse pela pele exposta de meus braços, ombros, pescoço e os ossos abaixo dele. Mas, quando a ardilosa tentou escorrer por entre meus seios, imediatamente a segurei pela cabeça e levei sua minúscula cabeça angulosa rente ao meu rosto.
Segurei fixamente meu olhar nos olhos amarelos da cobra, que se debateu desesperada em minhas mãos.
— Loki, Loki, Loki... Veja como está tão impotente agora! — eu disse, manhosamente, ostentando um sorriso maldoso em minha face.
Aumentei a pressão em torno da cabeça da cobra que, desesperada, alargou a boca exibindo suas presas afiadas.
— Posso te matar, nesse exato instante! Deveria ter tomado a forma de uma cobra maior, meu querido. — Olhei atentamente para o animal que eu segurava. — Essa é a última vez que deixarei escapar imune desses seus malditos disfarces. Da próxima vez, Loki, juro que a situação acabará com a extinção de da minha ou a sua existência. Sangue será derramado, meu caro, então sugiro que reflita sobre suas decisões a partir deste momento. — ameacei, com muita segurança. Não haveria dúvidas em relação as minhas frias palavras que carregavam um perigoso aviso.
Agressivamente, joguei a cobra para longe. O deus da mentira pareceu desesperado quando deixou o disfarce cair. Ainda desajeitado, ele se colocou em pé. Loki tossiu engasgado, massageando o seu pescoço que ainda carregava as marcas avermelhadas dos meus dedos.
— Maldição, Erieanna! — praguejou, ofegante. — Achei que iria me estrangular até a morte! — exclamou, espantado.
— Confesso que esse pensamento passou por minha cabeça. — revelei, fitando as minhas unhas, tentando demonstrar o meu tédio evidente — Desisti, apenas, porque não estou interessada em explicar para as divindades de Asgard, o motivo que me levou a matar o deus da mentira.
— Como você consegue ser tão fria? — Loki inquiriu, indignado, à medida em que caminhava minha direção.
Soltei uma bufada indicando que não estava disposta a respondê-lo.
— Como consegue descobrir que sou eu sob os disfarces? — Balançou a cabeça, completamente intrigado.
Voltei meu olhar frio em sua direção.
— Porque você sempre tenta me tocar de um jeito indecente. Quando se passou por Acme, você ficava suavemente percorrendo a mão por meu cabelo e face, como se ela tivesse esse hábito estranho. — Rolei os olhos impaciente — O mesmo aconteceu quando tomou o a imagem da minha criada. E continuou a agir de modo esquisito quando se passou por todas as outras pessoas. Suas mãos tolas sempre lhe entregaram. — expliquei, constando o fato de que para um astuto deus, ele fora terrivelmente negligente em suas ações.
Loki sorriu e se abaixou, alinhando seu olhar ao meu.
— Não pode me culpar por não conseguir manter minhas mãos longe de ti. Não consigo tomar as rédeas de minhas ações quando estou ao seu lado. Você me atrai, Coração de Gelo. Me atrai de um jeito que eu não sou capaz de resistir. — E quando pronunciou aquelas sedutoras palavras, havia um brilho no seu olhar que eu não consegui de decifrar.
— Precisa parar com isso, Loki. Esse jogo não acabará bem. — adverti, com seriedade, na esperança de que o teimoso deus me ouvisse.
— Tens minha palavra de que vou parar, eu juro! Prometo que deixarei de te incomodar assim que acabar com dúvida que assola meus pensamentos. Por favor, Coração de Gelo, diga-me se permitiu compartilhar seu corpo com Balder. Conceda-me um descanso para minha mente perturbada, pois não saber disso está consumindo com o pouco que ainda resta da minha sanidade. — implorou, apertando meus joelhos com firmeza.
Segurei meus olhos nos seus por um longo momento. Loki permaneceu imóvel, com os lábios entreabertos, aguardando por minha resposta. Eu já sabia exatamente o que lhe diria. Contudo, decidi estender o suspense para fazê-lo sofrer com a ansiedade da espera.
— Meu caro Loki... — comecei em tom manso — Você me enganou cruelmente. Fez com que eu morresse por alguém que nunca existiu. Portanto, não merece nenhum ato de compaixão de minha parte. Levará essa dúvida contigo até o Ragnarök. Nesse caso, meu querido, se não quiser que a eternidade se torne um mártir, é melhor que comece a torcer para que essa fatídica batalha ocorra o quanto antes, pois, assim, o seu sofrimento finalmente terá um fim. — concluí, com dureza, retirando as suas mãos que estavam sobre mim.
Exalando uma essência de pura raiva, Loki se levantou e me desferiu um olhar cheio de ira que fez os pelos de minha nuca se arrepiarem.
— Tenho outros meios de extrair a informação que desejo. E a descobrirei bem antes do que imagina, Erieanna.
— E o que fará quando descobrir a verdade, seja ela qual for? — perguntei, curiosa.
— Espere e verá!
Loki não aguardou que eu me manifestasse mediante a última frase proferida. Apenas deixou as palavras soltas no ar e desvaneceu diante de meus olhos.
Pela primeira vez em minha existência, eu me senti ameaçada por alguém. Senti a terrível sensação da ameaça de Loki pairar acima de minha cabeça, em um aviso constante de que eu me encontrava no meio de uma tremenda enrascada.
Também queria poder dizer que as surpresas do dia cessaram por ali. Mas esse não foi o caso. Assim que retornei ao palácio, um dos emissários de Odin me interceptou pelo corredor e me informou que o deus supremo solicitava a minha presença com urgência.
Mal compreendia eu — em minha plena ignorância — as promessas que me aguardavam naquela reunião.
Ninguém sabe como o destino trabalha, tampouco como se sucede a roda da vida. No entanto, aquele foi o dia em meu futuro começou a ser desenhado. Naquele dia as últimas palavras de meu pai nunca fizeram tanto sentido.
"Está tudo entrelaçado." – Foi o que ele me disse.
O sábio druida sempre esteve coberto de razão.___________________________________
(CAPÍTULO SEM REVISÃO)
Postei e sai correndo. A faculdade está me consumindo todo meu tempo.
Não se esqueçam de votar.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro