𝐂𝐚𝐩. 𝟖. ♡ 𝐖𝐇𝐀𝐓 𝐖𝐄𝐈𝐆𝐇𝐒 𝐌𝐎𝐒𝐓 𝐎𝐍 𝐓𝐇𝐄 𝐒𝐂𝐀𝐋𝐄
“Luzes da cidade se estendem diante de nós.
E seu braço estava bem enrolado em meu ombro.
Tive a sensação de pertencer.
Eu tinha a sensação de que poderia ser alguém.”
— TRACY CHAPMAN ♡ FAST CAR
Quinta-feira, 30 de setembro de 1997.
Com o trabalho de literatura em mãos, caminhei até Scott que estava guardando seus livros no armário azulado.
— Hillary me contou sobre o trabalho que eu tinha de literatura com você. - entreguei as folhas presas em um clipe amarelo. — Essa é a minha parte do trabalho. - o garoto folheava meu trabalho, sem prestar atenção no que eu dizia.
— A gente deveria fazer junto. - retirou uma pasta amarela do armário, guardando minha parte dentro dela.
— E a gente fez! - levantei as sombrancelhas, apoiando meu corpo no armário ao lado. — Eu só quis acelerar as coisas. - dei de ombros.
— Sobre acelerar as coisas você entende bem. - minhas bochechas queimaram. — Fiquei sabendo que você e o capitão do time de basquete namoraram pra caralho anos atrás.
— E daí? - franzi o cenho, cruzando os braços.
— Nada, só achei legal comentar. - sorriu de canto, levantando os ombros.
— Grande merda, toda a escola sabe disso. - ri, agarrando as alças minha mochila. — Droga! - praguejei quando ouvimos o barulho do sinal tocando.
— Eu tenho álgebra e você? - Scott segurava um livro de capa azul.
— Inglês. - bufei.
— Puxa, Boa sorte! - bateu no meu ombro, sorrindo. Que sorriso do caramba.
— Obrigada, Bank tower. - girei meus calcanhares, rumo ao segundo andar.
★
De todas as disciplinas, inglês era a minha inimiga. Eu sou ótima nessa matéria, mas a professora Barton não me suporta e vice-versa. Para não fugir do costume, acabei chegando atrasada.
— Atrasada novamente, senhorita Carter? - a voz irritante dela ecoava pela sala. Não olhei para trás, sentando-me na última classe.
— Bom dia pra senhora também. - risadas baixas aumentavam o meu ego. E eu gostava disso. — Como está o coração? - perguntei, inocentemente. Talvez nem tão inocente assim, mas cá entre nós, a sua paixonite pelo inspetor Peterson já estava de ralhar com nossas cabeças.
— Muita engraçado, mocinha. - sorriu, e no mesmo momento fechou a cara. É o que eu chamaria de transtorno bipolar. — Peguem seus livros na página 512. - tirei o livro alaranjado da mochila, abrindo-o em seguida.
— Alguém poderia ler a frase de Jane Austen? - a mulher de óculos maiores que seu rosto, pediu.
Um papel amassado caiu na minha mesa. Levei para o meu colo, desamassando-o.
"Você está pisando em ovos, Carter!"
Olhei para o lado, fitando Jonas acenando para mim. Mostrei minha mão, lançando meu dedo do meio para ele.
— Poderia ler para nós, Carter? - a voz de Barton ousou em chamar minha atenção. — O assunto parece estar muito interessante com o senhor McFly, mas você está na minha aula. Aqui não é lugar para vadias.
— Vadias? Quem você pensa que é para me chamar de vadia?! - empurrei a classe com força, me levantando. — Não sou eu que está louca para dar uns amassos quentes no inspetor Peterson.
As risadas tomaram conta da sala de aula, deixando Barton vermelha e calada.
— Você sabe muito bem que eu posso mudar a sua nota, não sabe? - caminhou lentamente até mim.
— Faça isso, então. - dei de ombros. — Vamos jogar esse maldito jogo. - sorri de canto.
— Pra fora, Megan. - apontou para a porta.
— Com todo o prazer. - guardei meu livro na mochila novamente, jogando-a para cima dos ombros. — Mais uma coisa... - olhei de relance para Barton, focando em Jonas. — Se mais um desses bilhetinhos chegar para mim, considera-se um homem morto! - os burburinhos e vaias aumentaram, e Jonas engoliu em seco. — Recado dado. - serpenteei até a saída.
Os corredores estavam vazios e o ar gélido tomara conta. O outono tem um clima muito desfavorável; a mistura dos ventos fortes e algumas tardes de sol me fazem lembrar que as coisas podem virar de cabeça para baixo em um estalar de dedos. É até estranho dizer isso na bagunça que me coloquei com a Barton. Todos da escola a chamam pelo sobrenome, uma forma de mostrar respeito ou de caçoar com a cara achatada dela. A Riverview sabe do que a Barton é capaz, e as consequências são bem ruins para aqueles que não seguem a linha que ela criou. Sinceramente? Eu estou com medo. Medo de que tuuudo isso chegue nos ouvidos de Julie. Ela já tem problemas demais para lidar.
— Megan! - girei os tornozelos, dando de cara com um Scott de cabelo bagunçado e de casaco com o zíper aberto, mostrando a sua camiseta dos Beatles. — Eu preciso te mostrar uma coisa. - correu até mim, pegando meu pulso e me puxando.
— Pra onde a gente tá indo, garoto! - resmunguei, me soltando de sua mão.
— Você já subiu no terraço? - perguntou, ofegante.
— O que? - soltei uma lufada de ar. — Você está louco? - apontei para minha cabeça.
— Você quer vir comigo ou não? - estendeu sua mão. — Última oferta. Te pago uma porção de fritas qualquer hora dessas.
— Eu não preciso dos seus caprichos, Scott. - peguei-a, correndo para seja lá onde for.
★
— Então é isso? - agarrei meus joelhos, sentada no concreto do terraço enquanto observava as casas que pareciam meros pontos que viviam debaixo da sombra de Riverview.
— É um máximo, não é? - o loiro estava fascinado com a vista. — Isso mostra o quanto nós somos pequenos. - deu um meio sorriso, colocando o capuz azul claro do seu casaco. — Somos tão pequenos que as coisas fluem ao nosso redor e a gente nem consegue dar conta de tudo ao mesmo tempo.
— Falando desse jeito até parece que você tem mil e uma responsabilidades para colocar em um pódio e ver qual pesa mais. - dei de ombros, rolando os olhos.
— Eu desisti de escrever uma carta de recomendação para a universidade de Columbia. - virei meu rosto para ele, surpresa. É o que Peterson está fazendo para entrar lá. — Daria tudo certo: Meus professores me ajudariam com a carta, e meu amigo em Nova York me daria um teto até que eu fosse para alguma fraternidade. - baixou o olhar para chão. — Então minha mãe perdeu o emprego e as nossas dívidas aumentavam cada dia mais. Eu trabalhava em um posto de gasolina, mas o que eu ganhava não era o suficiente para que pudéssemos manter a casa que nosso pai nos deixou. E sabe o que mudaria tudo? A mudança de Los Angeles pra cá. - apoiou sua cabeça em uma das mãos que estavam sobre os joelhos dobrados. — Minha avó mora aqui e daria todo o suporte que minha mãe precisa. - nossos olhares se encontraram, mas ele desviou. — Eu peguei o meu sonho de ir para a universidade e a ajuda que minha mãe precisaria com meus irmãos, colocando tudo isso em uma balança. - fez mímica de uma balança, com as mãos indo para baixo e para cima. — E adivinha? Minha família pesou mais. Não estou querendo dizer que eles são um peso, nunca diria isso! Eu só decidi abrir mão do meu sonho pela minha família. - suspirou. — Família é isso, Megan. Você abre mão dos planos da sua vida para estar aqui quando a sua família precisar de você.
— Você se arrepende? - olhei para o céu limpo. — Se arrepende de ter desistido de você? - foquei no garoto de olhos verdes bem mais claros que os meus.
— Eu não desisti de mim, Meg. - virou seu corpo em minha direção. — Se eu quisesse realmente desistir de mim, provavelmente já estaria metros debaixo do chão. Eu não desisti de mim, apenas dei uma pausa. - sorri. — Você se arrepende de algo?
— Eu me arrependo de muitas coisas. Todos os dias eu lembro que poderia ter feito as coisas de um jeito diferente. - dei de ombros, bufando.
— De que forma?
— Eu poderia não ter me envolvido com Steve desde o começo. Ele sempre foi desse jeito que ele é hoje. E como o ditado diz: vaso ruim não quebra. - ri, sentido o calor do sol bater no meu rosto. — Eu faria várias coisas de maneiras diferentes.
— Ele parece um daqueles babacas que se acham a merda de um deus grego. Ele nunca chegaria aos pés de um! - soltou uma risada nasalar.
— Steve é definitivamente desse jeito. - o acompanhei na risada. — Ele pensa que é aquele tal de Eros, sabe? Ridículo. - revirei os olhos, grudando minhas órbitas para o garoto que jogava a cabeça para trás de tanto rir.
— Bom, nós concordamos com alguma coisa. - mostrou-me um meio sorriso.
— É um bom sinal. - sorri também, estendendo minha mão. — Amigos, certo?
— Amigos para o que der e vier. - apertou minha mão com certa confiança, arrepiando os pelos do meu corpo.
— Posso te perguntar uma coisa? - fitou nossas mãos unidas.
— Manda.
— Por que você cortou os pulsos? - lembrei da cicatriz que envolvia o meu pulso.
— Eu não gosto de falar sobre isso. Não é da sua conta.
— Tudo bem, eu não vou mais tocar nesse assunto. - segurou o meu pulso. — Eu estarei aqui agora, Megan. Para o que você precisar.
Sorri, sentindo meu coração aquecer.
Caramba, o que Scott Maxwell está fazendo comigo?
A noite chegara de forma cautelosa e a brisa gélida do outono tomava conta da casa, novamente. Horas após o nosso jantar, Julie insistia em permanecer acordada para assistir o episódio da sua série policial preferida — que eu nem fazia questão de saber como funcionava — em um desses canais abertos da nossa televisão de tubo.
— Eu sonhei com Eduard noite passada. - sua voz saiu falha ao mencionar ele.
Kate já havia ido dormir, deixando-me mais a vontade para conversar.
— Em todos esses pesadelos, o maldito quer a sua cabeça. - praguejou, puxando um maço de cabelo com certa acridez. — Isso me deixa em uma pilha de nervos. - escorregou seu corpo pela poltrona.
— Ele só vai parar quando eu estiver debaixo da terra, não é? - perguntei mais para mim mesma do que para minha tia.
— Ele não vai ter o que quer. - ela estava convicta de suas palavras. — Ele ainda vai ter o que merece. Você não perde por esperar. - relutou em levantar, e eu fiz o mesmo para dar suporte a ela.
— Precisa de ajuda? - toquei no seu ombro, cruzando meu outro braço em volta de sua cintura.
— Não se preocupe, querida. - tocou meu rosto delicadamente, sorrindo. — Você tem aula amanhã. Descanse e nada de ficar escutando música no walkman até tarde! - recomendou, desvencilhando das minhas mãos e subindo a escada até seu quarto. — Boa noite, Meg. - desliguei a luz por meio do interruptor, admirando a penumbra que se instalava em toda a sala devido as janelas da nossa casa.
Eduard me quer bem longe daqui; de preferência fria e com uma etiqueta do necrotério. Subi degrau por degrau até o sótão. Entrando no meu quarto, puxei o corrimão maleável, levando toda a escada para mim e trancando a única entrada com um trinque enferrujado. Esse tipo de trava é geralmente usada em porões, mas Julie pressentiu que precisava de uma tranca no sótão logo que decidiu me acolher em sua casa pelos próximos doze anos.
Os meus planos referentes aos almejos de Eduard estavam me sondando a bastante tempo. Muuuito tempo mesmo, enquanto me dava a liberdade de me arriscar em tentar me enturmar com as gêmeas e até mesmo com Scott. Eu imaginei que poderia recomeçar do zero, mas depois do que Julie me fez lembrar, a idéia de acabar com tudo voltou novamente e agora eu me sentia mais segura de que Julie ficará bem se eu for. Todos ficarão, inclusive o próprio Eduard. Eu não estou pensando no bem-estar dele, mas ele estando bem, minha família ficará também.
Já comprara os remédios necessários e segundo meus cálculos, seria daqui cinco dias. Sairia perfeito; sem interrupções e covardia dessa vez.
Megan Carter iria para algum lugar em breve; um lugar de que ela não se orgulhasse tanto, mas não tivera escolha. Já perdeu tudo e não tinha medo de perder a si mesma. Portanto, ninguém a salvaria de ser levada como uma bandeira branca.
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