JESSICA.

Logo depois do café da manhã, eu meti o pé o mais rápido possível pra casa, esperançosa que chegasse antes de JJ acordar. Repenso diversas maneiras de conseguir passar pela porta dos fundos ou engatinhar pelo chão da casa até o meu quarto sem fazer qualquer barulho. Optei pela opção mais fácil, que era deixar a moto ali perto e seguir o resto do caminho andando, não arriscando com o sono leve que JJ tem. Aliás, parece que o som de sua moto é seu despertador. Ele conhece bem melhor do que eu.

Estou certa de que consegui executar meu plano com excelência quando tiro meus sapatos antes de entrar em casa, abro a porta na menor velocidade possível, ando na ponta dos pés e estou em frente a porta do meu quarto. Solto um suspiro aliviado. Menos uma dor de cabeça logo no início do dia.

━ Aonde você estava?

Quero berrar pelo susto. Também quero xinga-lo por ter chegado tão do nada. Mas, diante do momento que nós nos encontrávamos, eu havia acabado de me enfiar numa puta fria. Fecho os olhos, me amaldiçoando mentalmente por mesmo que houvesse tentado, não consegui fazer uma entrada digna de um filme hollywoodiano de espiões. Agora, precisaria estar preocupada em saber me explicar pro meu irmão.

━ Bom dia ━ viro meu corpo calmamente na sua direção. ━ Eu te avisei que iria sair.

━ Você dormiu fora de casa. Onde você tava? ━ seu tom de voz é sério.

Parecia um pouco ameaçador, até. Mas, pra qualquer outra pessoa. Eu não tenho um pingo de medo de JJ.

━ Não te interessa, cara. ━ deixo minha bolsa de lado e amarro os cabelos num coque.

Ando até o meu quarto e JJ vem atrás de mim. Reviro os olhos violentamente antes de abrir meu guarda-roupas.

━ Tá me escondendo alguma coisa? ━ ele pergunta.

━ Por que acha isso?

━ Porque eu sinto. Você não para mais em casa, não anda mais comigo e com os seus amigos de verdade. Que merda tá acontecendo? Tá dando pra alguém ou arranjou outros amigos?

Eu paro de procurar minhas roupas. Respiro fundo, me viro de frente pro meu irmão novamente e com toda a paciência do mundo, rebato seu comentário.

━ Me respeita. Eu não sou as suas amiguinhas. ━ ele travou sua mandíbula. ━ Quem sabe da minha vida sou eu. Para de tentar bancar o meu pai, porque você não é.

━ Eu sou tudo pra você ━ JJ quase cospe na minha cara. ━ Sou seu pai, sou seu irmão, sou seu melhor amigo. A gente só tem um ao outro. Por que decidiu do nada se virar contra mim?

━ Ah, me poupe, JJ ━ viro pro guarda-roupas de novo. ━ Você fez as suas escolhas.

━ Que merda isso significa, Jessica? ━ agora ele está irritado.

━ Nem você e nem eles souberam respeitar os meus limites. Não sou obrigada à andar do lado de Sarah Cameron só porque vocês decidiram do nada ignorar completamente que essa garota é uma desgraçada filha da puta. ━ puxo um conjunto de short e top de crochê. ━ Cada um decide o que é melhor pra si mesmo.

━ Achei que você tivesse esquecido dessa história. ━ JJ murmura.

━ Qual história? Todo o inferno que ela fez na minha vida e na sua ou a narrativa que ela usa com vocês para conseguir o que quer? ━ caminho até o banheiro.

Como o esperado, meu irmão me segue.

━ Narrativa? ━ questiona, confuso.

━ Ela conseguiu manipular o John B e agora tá conseguindo manipular todos vocês. Mas a mim, ela não vai conseguir. De jeito nenhum. ━ nego pra mim mesma.

━ Esquece isso, Jessica. A gente sente a sua falta.

━ Você é terrivelmente egoísta, puta merda. ━ resmungo, quase fechando a porta do banheiro na sua cara.

━ Não dá as costas pra mim, Jessica ━ esbraveja. ━ A gente tá conversando.

Percebo que ele segura na minha mão por cima da superfície de madeira e aquele maldito sentimento horroroso invade o meu corpo. Eu preciso respirar fundo pra tentar acalma-lo, mas infelizmente, ele consegue ser mais forte que eu. Todas as vezes.

━ Se você encostar em mim de novo JJ, eu juro por Deus, eu saio daqui algemada mas eu quebro todos os ossos da sua mão.

E JJ percebe que aquilo estava acontecendo de novo. Depois de mais um episódio da minha crise de raiva na casa de Rafe, agora estava acontecendo novamente.

Nos últimos dias, tem rolado com mais frequência. Isso estava me deixando louca.

━ Jessica, por favor, me escuta...

Ele apertou minha mão, tentando me convencer à falar com ele.

E eu reagi como meu corpo mandou.

Eu bati a porta com JJ atrás. Consegui vê-lo pulando de trás do móvel sem se machucar, mas eu repeti esse processo diversas vezes. Eu batia a porra da porta com tanta força no batente que em questão de minutos, a superfície plana de madeira começou a se destruir. Um pedaço caiu, depois outro, e outro. Até eu conseguir desprender aquilo da parede.

━ Jessica! Jessica!

JJ me agarrou em seus braços. Instantaneamente eu começo à gritar e a socar seu peito. Quero afastar seu corpo de mim, não quero tê-lo por perto tão cedo. Me sinto rejeitada, fragilizada e traída. Porque, simplesmente, meus melhores amigos e o meu irmão estão pouco se fodendo para como eu me sinto. Perto de Sarah, longe de Sarah, mas sabendo que ela está conseguindo fazer a cabeça das pessoas que eu considero a minha família.

Ela não faz parte disso. Ela não faz parte do lado bom da minha vida e nunca fará.

Quando eu consegui me acalmar naturalmente, eu já chorava no colo do meu irmão. JJ acariciava os meus cabelos e eu sentia sua respiração contra a minha testa. Ele sussurrava palavras como "eu estou aqui" e "já passou".

Eu queria acreditar nisso. Mas a verdade é, que enquanto eu estivesse no meio desse fogo cruzado, nada ia acabar. Nem tão cedo.

Afastei o meu rosto do peito de JJ. Encarei seus olhos, seus traços da face exageradamente parecidos com os meus e eu nego com a cabeça. Nego porque sei que a decisão que tomo é dolorida e me deixa totalmente tonta. Mas, da mesma forma, JJ parece não perceber o que me abala tanto. Ele beija minha testa e me diz para descansar, que as coisas iriam melhorar.

Eu fui para o trabalho, fiz meu serviço normalmente e sorri para Kiara e pros clientes como uma verdadeira pessoa genuinamente feliz. Cheguei do meu serviço, tomei um banho e bebi algumas cervejas com o meu irmão. Assim que ele beijou minha cabeça e me desejou boa noite, eu sabia que seria agora ou nunca.

Espero um certo tempo que eu sabia que JJ já estaria adormecido. Vou até o meu quarto, coloco minhas poucas roupas na mochila e os meus pertences em outra bolsa. Com as lágrimas escorrendo pelo meu rosto, eu sabia que essa decisão seria, provavelmente, a mais louca que eu tomaria na vida. Olho pra trás, vendo que deixei minha prancha ali, pendurada e com toda a minha personalidade marcada nela. Letras, adesivos e um "irmã do JJ" que ele mesmo escreveu.

Diante disso, eu fecho os olhos e mordo meu lábio inferior. Que merda de vida louca.

Quando estou do lado de fora da minha casa, pronta pra ir pro outro lado da ilha e ficar um tempo longe de toda essa bagunça, meu celular vibra. A mensagem que chegou dizia, com suas exatas letras, o que apertou o meu peito profundamente.

"Rafe: Boa noite, rainha das ondas."

Eu suspiro. Agilizo meus dedos em digita-lo de volta.

"Espero que você saiba onde me encontrar."

Guardo o celular na mochila e olho pros meus pés. Seria uma puta de uma caminhada.