08 | Oito
Antes de começar qualquer coisa entre nós
Você era meu melhor amigo
O único que com quem eu andava e conversava
Quando eu e meu namorado começamos a
ter problemas
Você costumava dizer: Vai ficar tudo bem
Sugeria coisas legais que eu poderia fazer
E quando eu ia pra casa a noite e me deitava
Tudo que eu parecia pensar era você
Neste momento, a situação está saindo do controle
Eu nunca quis machucá-lo
Mas eu tenho que deixá-lo ir
E talvez ele não entenda isso
Enquanto tudo isto está acontecendo
Eu tentei, eu tentei lutar contra isso
Mas esse sentimento é muito forte...
— You Make me Wanna; Usher
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Saint Helier, Jersey
28 de dezembro, 2:00pm
M E L I S S A
Não era justo comigo mesma o quanto eu estava pensativa hoje. Cada dia que havia passado com os conselhos de Henry e Benjamin em minha mente, só pareciam piorar minha situação interna. E ontem definitivamente havia sido o ápice. Com tudo o que conversamos, tudo o que revelamos um para o outro, mesmo em tantas entrelinhas…
Deus! Eu mal havia conseguido dormir. De novo!
Ele definitivamente estava tirando meu sono.
E eu podia perceber, pelo seu tom de voz e cada palavra dita, que não era intencional. Ele não queria me deixar nesse estado, nesse impasse em minha mente. Mas entendia sua urgência em me falar aquilo. Henry merecia seu próprio alívio interno, e não o teria até que fosse sincero comigo.
Coisa que eu não estava conseguindo ser com ele. Não totalmente.
— Pode parar aqui, pai. Termino o caminho com a Peach. — Aviso, tocando seu ombro pelo banco de trás, sentindo quando ele desacelera o carro.
— Tudo bem..
Havíamos juntado as duas famílias para almoçar, e agora estávamos voltando em carros separados. Mas como cão de suporte emocional, Peach não saía do meu lado enquanto eu estivesse fora de casa. E agora eu aproveitava o clima mais ameno para deixá-la passear pelo parque.
— Se cuide!
— Irei, mãe.
Não era como se fosse em outro bairro. A casa estava logo no fim da rua.
Desci do carro, levando apenas carteira e celular comigo, e ajustei a guia nela, deixando os outros seguirem de volta para casa. Ela parecia animada, e deixei que cheirasse as coisas na rua. Não estava pensando demais hoje e queria apenas que ela pudesse se divertir um pouco. Sabia que gostava de caminhar e o parquinho daqui não era bem como o Holland Park, em Londres.
E então seguimos pela pracinha, comigo sorrindo do jeito dela e fotografando algumas das marcas que suas patas imensas faziam na neve. A senti me guiar e permiti que fosse, chegando a um banco numa área mais reservada, onde as crianças não estavam brincando de guerra de bolas de neve.
E então ela se sentou.
— Não quer andar mais? — Pergunto, percebendo como ela permanece ao lado do banco e me olha.
Tento mudar de direção, imaginando que talvez já tivesse se cansado e queria voltar. Talvez para a companhia de Kal. Mas ainda assim ela não se move. Me dando por vencida, sento no banco, ao lado dela, sentindo o pouco sol esquentar um pouco aquele dia tão cinza.
Queria que pudesse clarear meus pensamentos também.
Ou me dizer com todas as letras o que fazer.
— Quer apreciar o sol? Hm? Talvez estivesse mais alegre se Kal estivesse aqui, não?! Correndo com você.
Converso com ela, como tinha costume de fazer, percebendo quando ela estende a pata sobre a minha perna. Um prévio sinal de ansiedade pela minha parte. Não que eu não imaginasse. E já podia sentir.
— Está tudo bem, Peeps. Eu estou bem, por mais que não pareça.
Por mais que ele vivesse em minha mente desde que cheguei aqui, como se não sobrasse espaço para outra coisa ou pessoa. Mesmo essa outra pessoa sendo meu próprio namorado. E isso não estava certo.
Não podia escantear Gerrett desse jeito. Por mais desconfiança e detalhes que eu queria deixar passar, a última coisa que seria era infiel. E sempre achei que isso começava no pensamento. Por isso sempre fui tão pulso firme com Henry enquanto estive com ele. Sabia que um deslize já seria o suficiente.
E venho me contendo como posso.
Mas não é a mesma coisa. Jamais será. Gerrett não me ama da mesma forma intensa e tão ardente quanto Henry. E poderia pagar uma nota apostando que ele jamais diria palavras como as que meu melhor amigo usou para me descrever. Mas isso com o Henry já estava sendo um ioiô há tempo demais.
Ele havia sido o pivô para que eu começasse um novo relacionamento.
— Você se lembra do seu pai? Hm? Ele está em casa… Logo voltaremos também.
É. Era o que eu esperava, na verdade. Que Gerrett estivesse em casa.
Porque, sim, no fim das contas, eu havia escolhido ele.
Um pouco pelo medo e insegurança de continuar sozinha após tanto tempo, e um pouco pela exaustão de ter tantas recaídas com Henry e não saber mais onde iria dar. Temia que acabássemos como aqueles casais que escondem tudo pelo resto da vida e nunca se assumem. Mas também tinha medo de me assumir com ele de novo. Gerrett foi meu ponto final disso.
Se eu entrasse num relacionamento, seria de cabeça, sem recaídas ou medo. E foi o que aconteceu.
Pelo menos até antes da minha viagem para cá.
— Porquê ele tinha que estar aqui, hm, Peachy? Teria sido tão mais fácil.
Um latido, é a resposta que tenho.
Ele tinha que estar aqui para abrir meus olhos como sempre fez. Para me falar mil coisas, e finalmente me fazer sentir amada. Para me dar conselhos porque quer o meu bem de verdade, e não para me influenciar. Mesmo gostando de mim.
Henry era alguém que eu podia confiar de olhos fechados na borda de um abismo. Jamais iria me arrepender.
Mas quando ele falava dos seus sentimentos por mim, quando falava dos nossos momentos e do nosso passado de uma forma tão apaixonada… Era difícil. Era quase doloroso, por que eu queria voltar no tempo e fazer tantas coisas diferentes!
Algo em mim queria retribuir aquilo e amar Henry daquela forma também. Incansável, interminável. Como eu sabia que amava por dentro. Como o meu melhor amigo de uma vida inteira. Mas ele, assim como eu, merece mais do que isso. Ele merece muito mais do que eu posso dar.
Logo eu, contente com um relacionamento com data marcada para o fim.
— Já está bem óbvio, não é, Peep?! Acho que eu só não quero enxergar.
Eu não quero ver o que há por trás. O que ele esconde quando mente para mim, para onde ele vai quando não me fala, de onde ele vem quando chega atrasado. Eu não quero saber, e não quero ter que terminar para descobrir também.
Não quero deixar Gerrett e jogar fora tudo o que eu me esforcei para construir. Mesmo sabendo que para ele não fará falta. Tenho meu trabalho, minha casa, minha vida e minha independência. Mas não tenho ele. Pela distância emocional que, só agora pude perceber ser tão grande, Gerrett não é meu.
Mas eu precisava estar longe para enxergar isso.
A questão era ter coragem de dar o primeiro passo e dizer que era o fim.
Não dizer para ele, mas para mim mesma, primeiro. Dizer que as noites em claro foram em vão, que as lágrimas nunca curaram nada. Que o meu tempo gasto poderia estar sendo muito melhor aproveitado com outra coisa.
Com outra pessoa.
Eu era quem não estava pronta ainda.
— Vamos para casa, amorzinho? Se eu continuar aqui, meu cérebro vai entrar em pane.
Me concentro na caminhada e no retorno, tomando novamente um tempo para observar minha antiga casa quando passo pela frente. E continuo guiando Peach ao meu lado calmamente, percebendo as crianças apontando para ela com admiração, mas respeitando o colete de cão de serviço e não se aproximando.
Ao menos eram bem educadas.
— Melissa? Melissa Windsor?
A voz me tira toda a atenção enquanto eu girava o aro da chave no dedo, me fazendo parar para encarar quem havia me chamado. Christian Alguma-Coisa. Não fazia questão de me lembrar, mas ele havia me reconhecido.
— Oi… Chris?
— É.. Um pouco mais alto e sem aparelho, mas sou eu. Quanto tempo!
Ele se aproxima, e mantenho minhas mãos para baixo, deixando claro que não queria qualquer contato físico.
— É, sim.. Vinte anos, ou mais.
— É… E você ainda está tão parecida… Continua linda. — Elogia, me fazendo dar um sorriso breve e amarelo.
— Agradeço.. Bom te ver, Christian. Espero que a família esteja bem. — Desejo, sendo sincera e sem querer estender mais aquela conversa.
— Estão sim. Você também, Mel! As duas famílias. — Ele sorri ao falar.
Não era qualquer segredo para os moradores mais antigos aqui a forma como as famílias Windsor e Cavill acabaram se tornando uma só com o tempo. Muito antes de Henry e eu existirmos. Nossa amizade aconteceu por conta de nossos pais, e nosso namoro, pela nossa longa amizade e companheirismo um com o outro.
Como uma bola de neve do bem.
Com um suspiro, abri o portão e deixei que Peach entrasse. Fecho, e então solto a guia, percebendo sua euforia para correr com Kal pela neve, com as crianças atiçando. Eles gastavam as energias uns dos outros, e pela noite, os pequenos e os peludos dormiam como se não houvesse amanhã.
— Voltou rápido.. — Escuto a voz de Henry, percebendo quando ele se aproxima, jogando um frisbee para Kal ir buscar.
Eu estava sensível demais internamente para conversar com ele agora, mas…
— É… Conversar com Peach não é legal… Ela não me responde. E quando responde, eu não entendo. — Brinco, percebendo como ele dá uma gargalhada suave e baixa.
Adorável.
— Pode conversar comigo, sempre. Sou seu psicólogo de boteco, Tampinha. — Ele diz, arrumando alguns fios de cabelo meus.
A proximidade, outra vez…
— Eu sei. E o melhor é que ainda é de graça!
— Eu devia cobrar, meus conselhos são bons.
— Devia mesmo. Quem não gostaria de receber conselhos do Henry fucking Cavill?
Ele me dá seu usual sorriso tímido, o que me faz sorrir leve. Sabia de seus problemas internos para se abrir, e como se sentia com toda a fama que tinha, e sabia que ele gostava de brincadeiras para aliviar isso. Era o meu dever, como sua melhor amiga.
— Bom… Disso você pode se gabar. Só você tem o melhor conselheiro do mundo. — Responde, me fazendo dar um riso baixo e negar.
— É uma maravilha ser tão exclusiva assim na sua vida. — Novamente brinco, percebendo outro risinho dele. — De verdade, Henry.
Com um sorriso tímido, o encaro, percebendo o olhar um tanto confuso dele, mas feliz. E, em um lapso de coragem, eu o abraço. Henry me abraça de volta, me confortando e me fazendo soltar um suspiro que provavelmente estava escondido. Precisava sair.
Escondo meu rosto contra o peitoral dele, sentindo quando ele sobe a destra e acaricia minha nuca e os fios soltos dali. Não queria me afastar. Precisava daquele carinho. De um conforto de colo e contato. As palavras já haviam me enchido, e meu lado carente estava aflorando muito mais agora.
E ele dava bons abraços. Porquê não aproveitar?
— Obrigado por tudo o que me disse e fez por mim desde que eu cheguei. Momentos, presentes, jogos, risos, brincadeiras… Você tem sido um excelente melhor amigo, como sempre foi. Obrigado mesmo, grandão.
O olhava para lhe passar minha sinceridade, deixando sorrisos bobos escaparem, e percebendo o sorriso dele também. O olhar mais doce e a forma como me dava carinho. E então deito a cabeça no seu peitoral também, confortável. Era disso o que eu precisava.
Estar confortável o suficiente para, até mesmo, utilizar um apelido que não usava há anos. E que eu sabia que ele gostava.
Nunca perdendo a oportunidade de relembrar que era mais alto que eu.
— Sempre que precisar, minha pequena. Sempre.
✧
Eu sou tão boiola por eles, caras.
Capzinho mais intenso, agora com os rumos realmente mudando.
Nos vemos no próximo, beijos! 🤍
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