𝟱𝟰
SUNA ISCARIOTE
Nunca fui de ir a festas de aniversário.
Na casa dos Iscariote já tem muito tempo que não damos festas, apenas jantares de aniversário que terminam em silêncio e sorrisos incômodos. De alguma forma, o clima mudou muito depois de tudo o que aconteceu. E, entre meus amigos, comemoramos essas datas especiais em bares ou boates, mas também não chegam a ser festas de aniversário.
Apesar de não ter esse costume, estou curtindo, o ambiente é familiar e confortável. Não é uma mesa comprida com um jantar nem uma boate barulhenta, então está ótimo. As pessoas batem papo à vontade ao redor. Na minha frente, Ryunosuke e Atsumu falam sobre alguma coisa da escola.
Para ser sincero, se agora eu curto festas de aniversário não é só por causa deste ambiente, mas sim por causa dela: [Nome]. Observo a garota de cabelos macios e olhos expressivos que se infiltrou por completo em minha alma. Ela dá um sorriso enorme para algo que Sophia diz, e todo o seu rosto se ilumina. Está linda. Se uma festa de aniversário a faz sorrir assim, sou capaz de ir a todas e até organizar outras com prazer.
Nunca pensei que ela seria a pessoa que me faria sentir tudo isso. Nas lembranças da minha infância, eu a vi várias vezes do outro lado da cerca da minha casa, mas foi só há pouco mais de um ano que a enxerguei de verdade. Ainda me lembro do dia em que a peguei me olhando de sua janela. Eu me fiz de desentendido, lógico, e fingi que não tinha reparado. De alguma forma, seu olhar curioso começou a me interessar e passei a querer saber mais sobre ela, do que ela gostava, o que fazia, em que local estudava.
Sua curiosidade sobre mim despertou a minha sobre ela.
E então um dia nossos caminhos se cruzaram e, embora ela não tenha percebido, ainda lembro claramente.
⎯ Vamos sair daqui. -tanaka boceja enquanto caminhamos entre todas as exibições e barracas da feira do colégio de sophia.
Ainda não entendo por que ela saiu da nossa escola e veio para esta.
Eles organizaram uma feira para arrecadar fundos destinados aos projetos escolares e pessoais dos alunos. Tanaka me arrastou para dar uma força para a Sophia, que é uma amiga próxima dele também, mas ela vendeu tudo o que trouxe e já foi embora. Então não temos mais o que fazer aqui.
Mas, passando entre as pessoas, vejo ao longe várias mesas com itens dos alunos à venda. Uma mesa em especial chamou minha atenção: [Nome], a garota que passa o tempo todo me observando da janela.
Ela está em um lado da mesa, oferecendo pulseiras feitas à mão a todo mundo que passa, mas ninguém dá bola. Sua mesa está cheia de pulseiras arrumadas e intocadas; duvido que ela tenha vendido alguma. E tem uma plaquinha dizendo "Arrecadação para pagar meus equipamentos de vôlei ".
Vôlei?
Paro de andar porque, por alguma razão, não quero que ela me veja. Tanaka para do meu lado, achando estranho.
⎯ O que foi?
⎯ Vai indo para o carro. Já te alcanço.
Ele me olha desconfiado, mas segue seu caminho. Ao passar pela mesa da [Nome], ele a cumprimenta e ela sorri.
Ela tem um sorriso muito bonito.
Uso as pessoas como escudo para observá-la sem ser visto. Seu rosto é muito expressivo, é como se eu conseguisse saber exatamente o que ela está pensando só de olhá-la.
O que está fazendo, Suna?
Minha consciência me repreende. Mas é só curiosidade.
Ela suspira e se senta atrás da mesa, com expressão de derrota. Seus lábios fazem um biquinho de frustração, e seu rosto é tomado pela tristeza. Não gostei disso. Vê-la assim me incomoda, nunca nem falei com ela, mas mesmo assim ela já me afeta desse jeito.
Não vendeu nada, olhos curiosos?
Procuro entre as pessoas alguém conhecido e encontro um garoto que às vezes joga futebol com a galera, e dou dinheiro para que ele compre todas as pulseiras que estão expostas na mesa. Fico observando de longe como a expressão arrasada de [Nome] passa para incredulidade e logo para felicidade e animação. Ela agradece várias vezes ao garoto e lhe entrega uma sacola cheia de pulseiras.
O garoto me traz as pulseiras e vai embora, e eu continuo ali, segurando a sacola e contemplando a garota curiosa cujo sorriso eu gosto de observar.
⎯ Suna?
Volto à realidade. Atsumu franze as sobrancelhas, esperando uma resposta a algo que não escutei. Seus olhos vão de mim a [Nome], e ele então parece se dar conta.
⎯ Você está vidrado nela.
Não me dou ao trabalho de negar, e Tanaka balança a cabeça ao colocar a mão no ombro do meu irmão.
⎯ A gente perdeu ele.
⎯ Eu sei, e você ainda tem que me agradecer. Foi graças a mim.
⎯ Shhhh! -eu o mando ficar quieto porque não quero que conte a tanaka como tudo começou.
Minha mente nostálgica viaja para outra lembrança:
⎯ Você precisa que eu o quê? -atsumu franze a testa, confuso.
Suspiro, incomodado.
⎯ Já te expliquei.
⎯ Mas não entendo para que você precisa que eu faça isso.
⎯ Só faz e pronto.
⎯ E você acha que ela vai acreditar em mim? Suna, ela sabe que temos dinheiro. Como vai cair nessa conversa de que não temos internet e estamos roubando a dela?
⎯ Ela vai acreditar.
⎯ Se você quer falar com ela, por que não vai lá e fala?
⎯ Não quero falar com ela.
Atsumu ergue a sobrancelha.
⎯ Sério? E por que não vai você mesmo até ela e diz que está roubando o wi-fi?
⎯ Porque eu quero prolongar isso o máximo possível, quero que ela sofra um pouco. Ela merece, por ficar me perseguindo.
Alice entra com um cesto de roupa recém-lavada.
⎯ Ah, reunião de irmãos, isso é novidade.
Atsumu não hesita em contar para ela, apesar de eu fazer sinal para que cale a boca.
⎯ Suna quer me usar para falar com a vizinha.
Alice dá uma risada.
⎯ Ah, é sério? Está procurando novas vítimas, Iscariote?
Olho para eles com cara de poucos amigos.
⎯ Não é isso.
Alice põe o cesto na cama.
⎯ Então é o quê?
Eu a ignoro e olho para Atsumu.
⎯ Você vai me ajudar ou não?
Atsumu se levanta.
⎯ Bom, vou fazer isso hoje à noite. -e sai do quarto.
Em silêncio, Alice arruma minha roupa no armário, com um sorriso se insinuando nos lábios.
⎯ O que foi? -pergunto. ⎯ Fala.
Ela continua sorrindo.
⎯ Não tenho nada para falar.
⎯ Diz logo o que você quer me dizer.
Ela termina a arrumação e se vira para mim, apoiando o cesto vazio no quadril.
⎯ Que bom que você finalmente decidiu falar com ela.
⎯ Não sei do que você está falando.
Alice sorri. Não entendo qual é a graça disso tudo.
⎯ Nós dois sabemos do que estou falando. Foi muito divertido ver vocês dois espiando um ao outro. Sempre achei que ela tomaria a iniciativa, mas pelo visto você não aguentou mais esperar.
⎯ Você está falando um monte de besteira. Espiando um ao outro? Como se eu precisasse ficar atrás de alguém.
Alice faz que sim. Sua expressão irônica está me irritando um pouco.
⎯ Se você está dizendo, Iscariote, tudo bem... Mas pedir ajuda a Atsumu já mostra o quanto está interessado na garota.
⎯ Você enlouqueceu, Alice, não é o que está pensando, só quero dar uma lição nela.
⎯ Desde quando você investe seu tempo e energia em dar lição numa garota? Por que resolveu planejar isso com tanto cuidado?
Mordo os lábios.
⎯ Não vou ter essa conversa com você.
Alice me faz uma reverência.
⎯ Como quiser, senhor. -e vai embora, ainda sorrindo.
Sorrio com essa lembrança, voltando a olhar para [Nome]. Talvez desde o princípio eu tenha demorado tanto para falar com ela, para encará-la, porque sabia que ela seria a garota que mexeria comigo dessa forma, que teria meu coração nas mãos. Talvez eu soubesse desde o começo e por isso relutei tanto, e, mesmo mantendo a distância, guardei esse tempo todo debaixo da minha cama a sacola com as pulseiras feitas à mão, como uma recordação concreta de que naquela noite eu tinha feito a garota que me olhava da janela sorrir, e esse sorriso estaria gravado em minha memória para sempre.
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