𝟰𝟬
[NOME]
Chuva...
Chuva sempre me deixa melancólica. Meu quarto está meio escuro, apenas uma pequena luminária acesa, deixando o ambiente num tom amarelado. Estou deitada na cama, fitando a janela e vendo as gotas caírem.
Desde que cheguei da casa de Suna, não saí da cama. Algumas horas já se passaram e a noite caiu. Uma parte de mim se sente culpada, não sei por quê. Fizemos a coisa certa ao ir embora, já que nos deixaram sozinhos. Além do mais, não queríamos que acontecesse outra discussão entre Yin e Suna.
Estou pensando demais.
A chuva fica cada vez mais forte, então me levanto para fechar a janela. A última coisa que quero é que meu quarto fique todo molhado. Sempre que me aproximo dessas cortinas, me lembro das vezes em que interagi com Suna daqui.
Quando, por fim, chego até a janela, meu coração para.
Suna está naquela cadeira onde o vi pela primeira vez, as mãos segurando a parte de trás da cabeça, os olhos fixos no chão.
Pisco para me certificar de que não é coisa da minha imaginação. Suna está ali, sentado, com a chuva caindo sobre ele. Está encharcado, a camiseta branca colada ao corpo. O que ele está fazendo? Estamos no outono, pelo amor de Deus, ele pode pegar um resfriado.
Pigarreio.
⎯ O que você está fazendo aí?
Tenho que levantar a voz, porque o barulho da chuva a abafa. Suna levanta a cabeça para olhar para mim. A tristeza em seus olhos me deixa sem fôlego por um segundo, mas um sorriso gentil surge em seus lábios.
⎯ Meu bem.
Engulo em seco. Toda vez que me chama assim, me destrói.
⎯ O que está fazendo? Vai ficar doente.
⎯ Está preocupada comigo?
Por que parece estar tão surpreso com isso?
⎯ É óbvio. -nem penso direito antes de responder.
De alguma forma, acho uma ofensa Suna não ter certeza de que eu me importo.
Ele não diz nada, apenas desvia o olhar. Vai ficar parado ali?
⎯ Quer subir?
Independentemente da nossa situação atual, não posso deixá-lo debaixo da chuva parecendo tão triste. Sei que há algo errado com ele.
⎯ Não quero incomodar. -responde suna.
⎯ Você não vai me incomodar. Só seja legal enquanto estiver aqui e vai dar tudo certo.
⎯ Ser legal? Do que você está falando?
⎯ Nada de tentar me seduzir.
⎯ Está bem. -ele levanta as mãos.
Suna sobe, e, assim que põe os pés no meu quarto, me dou conta de que talvez não tenha sido uma boa ideia chamá-lo para vir, primeiro porque ele está sexy demais com essas roupas encharcadas, e segundo porque está molhando todo o meu carpete.
⎯ Você tem que tirar essas roupas.
Ele me olha surpreso.
⎯ Achei que não era para eu te seduzir.
Desvio o olhar.
⎯ Você está ensopado. Nem pense em tentar nada e tire a roupa no banheiro. Vou ver se consigo encontrar algo que caiba em você.
Obviamente, não encontro nada que sirva em Suna, só um roupão de banho que minha mãe ganhou há muito tempo e nunca usou. Fico na frente da porta do banheiro.
⎯ Só encontrei um roupão.
Suna abre a porta, e eu espero que ele esteja se escondendo atrás dela ou algo do tipo, mas não, ele sai do boxer como se fosse a coisa mais normal do mundo. Deus do céu, como ele é gostoso.
Minhas bochechas ficam vermelhas e eu olho para o outro lado, estendendo a mão com o roupão para que ele o pegue.
⎯ O que foi? Esta vermelha?
Não respondo, numa tentativa de parecer casual.
⎯ Está sim, mas não sei por que se já me viu pelado.
Não me lembre disso!
⎯ Já volto.
Ele segura minha mão, o desespero evidente em sua voz.
⎯ Aonde você vai?
⎯ Estou fervendo leite para fazer um chocolate quente. -relutante, ele me solta.
Quando volto, ele está sentado no chão encostado na cama. Ele fica fofo com esse roupão de banho branco. Entrego a caneca de chocolate quente e me sento ao seu lado.
Ficamos em silêncio tomando o chocolate, observando a chuva bater no vidro da janela. Embora a distância de nossos corpos seja o suficiente para eu não encostar nem meu ombro no dele, ainda sinto aquele nervosismo de quando ele está por perto.
Ouso olhar para Suna, e seus olhos estão ausentes, perdidos, encarando a janela.
⎯ Está tudo bem?
Ele baixa o olhar para a caneca de chocolate quente em suas mãos.
⎯ Não sei.
⎯ O que aconteceu?
⎯ Algumas coisas. -ele passa o dedo pela borda da caneca. ⎯ Relaxa, vou ficar bem.
Suspiro.
⎯ Você sabe que pode confiar em mim, né?
Ele olha para mim e sorri.
⎯ Sei.
Não quero pressioná-lo; sei que quando ele se sentir pronto vai me contar o que está acontecendo. Aqui, admirando a chuva e com uma xícara de chocolate, ficamos em silêncio, simplesmente apreciando a companhia um do outro.
SUNA ISCARIOTE
É bom estar aqui.
Nunca pensei que ficar em silêncio com alguém pudesse ser tão reconfortante, especialmente com uma garota. As únicas coisas que havia compartilhado com garotas até agora tinham sido silêncios desconfortáveis, olhares estranhos e muitas desculpas para afastá-las. Mas, com [Nome], até o silêncio é diferente. Tudo com ela tem sido diferente pra caramba.
Desde a primeira vez que nos falamos, [Nome] foi imprevisível; foi a primeira coisa que me chamou atenção. Quando esperava uma reação dela, ela fazia o exato oposto, e isso me intrigava. Gostava de provocá-la, fazê-la corar e ver aquele vinco na testa dela quando ficava brava. No entanto, nunca planejei sentir algo a mais.
É só diversão.
Repeti isso para mim mesmo milhares de vezes quando me pegava sorrindo como um idiota pensando nela. Só estou sorrindo assim porque é divertido, nada de mais.
Foi tão fácil eu me enganar, embora não tenha durado muito. Soube que alguma coisa tinha mudado quando comecei a rejeitar outras garotas por não sentir nada por elas.
Era como se a [Nome] tivesse dominado todos os meus pensamentos, e isso me apavorava. Sempre tive o poder, o controle sobre a minha vida, sobre o que quero, sobre outras pessoas. Não podia abrir mão desse poder e deixá-lo nas mãos dela.
Nessa batalha interna, machuquei-a diversas vezes. Sei que cada golpe e cada palavra foram muito dolorosos para ela. Queria acreditar que ela desistiria e que minha vida voltaria ao normal, mas, no fundo, rezava para que não se rendesse e esperasse um pouco mais até que eu arrumasse minha bagunça.
Ela esperou, mas também se cansou.
Ela quer que comecemos do zero? Quer que eu lute por ela?
Por que não?
Se alguém merece meu esforço, essa pessoa é ela.
É o mínimo que posso fazer depois de todo o sofrimento que lhe causei, e estou grato por ela pelo menos estar me dando esta chance de fazer por merecer. Agradeço também por ter me convidado para subir, estava precisando da tranquilidade e da paz que ela me trás.
Termino meu chocolate e coloco a xícara de lado, então estico as pernas e deixo as mãos ao lado do corpo. Atrevo-me a olhar para ela, que ainda está assoprando o que restou de seu chocolate. Acho que para ela parece mais quente do que para mim, eu estava com muito frio quando o tomei.
Aproveitando sua distração, observo-a com calma. O pijama é do tipo que vai da cabeça aos pés, com um zíper no meio e um capuz com orelhinhas para cobrir a cabeça. O cabelo dela está em um coque bagunçado, como se ela tivesse se virado na cama várias vezes. Não conseguiu dormir?
Sem conseguir me controlar, meus olhos fitam seu rosto e param em seus lábios, que se separam quando ela assopra o chocolate outra vez.
Quero beijá-la.
Quero senti-la contra mim.
Sinto que já passou uma eternidade desde a última vez que provei seus lábios, mas só faz uma semana. Percebendo que está sendo observada, [Nome] se volta para mim.
⎯ Que foi?
Estou com tanta vontade de pegar seu rosto em minhas mãos e te beijar, sentir seu corpo colado ao meu.
Balanço a cabeça de leve.
⎯ Nada.
Ela desvia o olhar, o vermelho invadindo suas bochechas. Amo o efeito que causo nela, porque ela causa o mesmo em mim, mas ainda mais. Cerro os punhos; não posso tocá-la, ela me deixou entrar aqui, não posso afastá-la de mim agora.
Suspiro, ouvindo as gotas de chuva batendo na janela. Sinto que estou muito melhor agora. Só de tê-la ao meu lado faz com que me sinta melhor.
Estou tão ferrado.
Sinto sua mão sobre a minha no carpete, o calor de sua pele me preenche e me conforta. Não me atrevo a olhar para ela porque sei que, se o fizer, poderei perder o controle e implorar por seus beijos.
Com os olhos fixos na vidraça molhada, digo:
⎯ Meu avô está internado.
Por um instante, ela permanece em silêncio.
⎯ Ah, o que aconteceu?
⎯ Ele teve um AVC e desmaiou no banho. -meus olhos seguem uma gota que desce devagar pela janela. ⎯ Os médicos da casa de repouso demoraram duas horas para encontrá-lo inconsciente, então a gente não sabe se ele vai acordar ou se vai ter sequelas graves.
Ela aperta minha mão.
⎯ Sinto muito, Suna.
⎯ Duas horas... -murmuro. um nó se forma em minha garganta, mas o engulo. ⎯ A gente nunca devia ter deixado meu avô ser levado para aquele asilo, tem dinheiro de sobra para pagar uma enfermeira para cuidar dele em casa. Ele estava bem em casa, e a enfermeira sempre checava tudo, estava de olho nele. Tenho certeza de que, se ele estivesse em casa, essa merda não teria acontecido.
⎯ Suna...
⎯ Devíamos ter lutado contra essa decisão, fomos uns covardes. Meus tios queriam que ele fosse para o asilo, tenho certeza de que torceram muito para que ele morresse, para poderem reivindicar a herança. Meus tios, meus primos... -faço um gesto de desgosto. ⎯ Eles me dão nojo. Você não faz ideia do que o dinheiro pode fazer com as pessoas. Meu pai foi o único que decidiu não viver do dinheiro do meu avô, ele só pegou um pouco emprestado para começar seu negócio e, depois que deu tudo certo, pagou de volta. Acho que é por isso que meu avô sempre foi mais próximo de nós; de alguma forma, ele admira meu pai. -[nome] acaricia minha mão de uma forma tranquilizadora enquanto eu continuo contando.
⎯ Meu avô sempre amou tanto a gente, e ainda assim a gente deixou que o levassem para um lugar desses. E agora ele está... -respiro profundamente. ⎯ Me sinto tão culpado. -olho para baixo. [nome] se ajeita e senta no meu colo. o calor do corpo dela acaricia o meu, e as mãos seguram meu rosto, forçando-me a olhar para ela.
⎯ A culpa não é sua, Suna. Não foi sua decisão, você não pode se responsabilizar pelas ações de outras pessoas.
⎯ Devia ter lutado um pouco mais, sei lá, ter feito alguma coisa.
⎯ Garanto que, se você tivesse encontrado outra solução, teria feito alguma coisa. Você não vai chegar a lugar nenhum se torturando desse jeito, agora só nos resta esperar e ter fé de que tudo vai dar certo, de que ele vai ficar bem.
Fito os olhos dela.
⎯ Como você tem tanta certeza?
Ela me dá um sorriso sincero.
⎯ Eu só sei. Você já passou por muita coisa, acho que precisa de um descanso. Seu avô vai ficar bem.
Incapaz de me conter, puxo seu corpo e a abraço, enterrando meu rosto no pescoço dela. Seu cheiro invade meu nariz, acalmando-me. Quero ficar desse jeito, com ela junto comigo. [Nome] me deixa abraçá-la e acaricia minha nuca.
É libertador dizer a alguém o que sente, tirar um pouco o peso dos ombros, como se estivesse compartilhando a dor. Inalo seu cheiro numa respiração profunda e enterro o rosto ainda mais no pescoço dela.
Não sei quanto tempo ficamos assim, e agradeço por ela não ter se afastado, por ter me deixado ficar com ela grudada em meu corpo.
Quando ela finalmente se afasta de mim, quero protestar, mas não o faço. Meus dedos percorrem seu rosto com delicadeza.
⎯ Você é tão linda. -digo a ela e a observo corar. as costas de sua mão acariciam minha bochecha.
⎯ Você também é lindo.
Uma sensação gostosa preenche meu peito.
Então isso é ser feliz. Este momento é perfeito: a chuva batendo na janela, ela sentada no meu colo, suas mãos em meu rosto, nossos olhos numa conexão tão profunda que palavras não conseguiriam descrever.
Nunca pensei que viveria algo assim. Acreditava que o amor era uma desculpa para deixar outra pessoa te machucar, que deixar uma garota entrar no meu coração me tornaria fraco. Agora estou aqui, deixando-a entrar, e o medo diminuiu, ofuscado por esse sentimento acolhedor e maravilhoso.
Lambo meus lábios e observo cada detalhe do rosto dela, quero memorizá-lo. O som da chuva se mistura com sua respiração suave, e meus batimentos ecoam em meus ouvidos.
Abro a boca e digo antes mesmo de terminar de pensar:
⎯ Eu te amo.
Os olhos dela se arregalam, a mão para em meu rosto. Sei que ela não estava esperando, porque nem eu estava, as palavras saíram da minha boca antes que pudesse contê-las. Fica um silêncio, e ela abaixa a mão para apoiá-la sobre o peito, hesitando, a indecisão evidente em seu rosto.
⎯ Tudo bem, não precisa responder nada. -asseguro-lhe, fingindo um sorriso. ⎯A última coisa que quero é te pressionar.
⎯ Suna... Eu...
Seguro seu rosto e me inclino em sua direção; dou um beijo em sua bochecha e, depois, sigo em direção ao seu ouvido.
⎯ Eu disse que está tudo bem, meu bem. -minha respiração em sua pele a faz estremecer, e eu gosto disso.
Quando me afasto, ela ainda parece indecisa, movendo-se em cima de mim. Dou meu melhor sorriso, apertando seus quadris.
⎯ Não se mexe muito, tem um limite que eu consigo suportar.
O sangue corre para o rosto dela, e ela abaixa o olhar.
⎯ Idiota.
⎯ Maravilhosa.
Ela olha para mim de novo, vermelha feito um tomate, e se levanta. Minhas coxas ficam frias sem sua proximidade. Caramba, o que há de errado comigo? É como se eu estivesse implorando desesperadamente por sua atenção, por seu amor. Quem diria? Eu, implorando por uma garota, dizendo a ela que a amo e sem receber uma resposta. Bufo, sorrindo, tirando sarro de mim mesmo.
Lembro-me das palavras de [Nome] aquela noite no bar de Osamu depois de me excitar e ir embora: O karma é uma merda. Ah, e como. [Nome] recolhe as canecas do chão e as põe sobre a mesa do computador para então se virar e me lançar um olhar desconfiado.
⎯ Está rindo de quê?
⎯ De mim mesmo. -respondo, sincero, e me levanto.
⎯ Já está tarde. -sussurra, cruzando os braços. sinto que ela está na defensiva, cuidadosa, e não posso culpá-la. ela tem medo de que eu a machuque de novo.
⎯ Quer que eu vá embora?
O medo na minha voz me surpreende. Ela só me olha sem dizer nada, e eu pigarreio.
⎯ Está bem. -ando em direção à janela e vejo que a chuva parou, mas ainda está garoando.
⎯ Suna... Espera.
Viro para ela de novo. [Nome] está apoiada na mesa do computador, os braços ainda cruzados.
⎯ Hum?
⎯ Pode... ficar. -a voz dela é suave. ⎯ Mas nada de...
⎯ Sexo. -termino a frase por ela.
[Nome] abre a boca para dizer algo, mas a fecha e apenas assente.
Não consigo evitar o alívio que percorre meu corpo. Não quero ir embora, a companhia dela é tudo de que eu preciso. Eu sei que estar com ela na mesma cama vai ser uma tentação difícil de suportar, mas farei o esforço.
[Nome] arruma a cama, joga as almofadas de lado e abre espaço para nós dois. Ela se deita, rastejando sob as cobertas, e eu a imito, deitando de lado para olhar para ela. A cama tem seu cheiro e é muito reconfortante. Ela está deitada de costas, o olhar grudado no teto.
Estamos perto o suficiente para que eu possa sentir seu calor, e minha mente viaja para a noite em que a toquei nesta mesma cama e ela quase foi minha.
Não pensa nisso agora, Suna.
Mas como não vou pensar? Eu a desejo tanto que aperto as mãos para me impedir de tentar alcançá-la. Rolo até ficar de costas, preciso parar de olhar para ela. Fecho os olhos e me surpreendo quando sinto [Nome] se arrastar para perto de mim. Ela passa os braços pela minha cintura e descansa a cabeça no meu ombro, abraçando-me de lado. Meu coração acelera, e estou com vergonha que ela pode escutá-lo.
⎯ Vai ficar tudo bem. -sussurra ela, e dá um beijo na minha bochecha. ⎯ Boa noite.
Sorrio como um idiota.
⎯ Boa noite, meu bem.
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