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𝐂𝐇𝐀𝐏𝐓𝐄𝐑 𝐓𝐖𝐄𝐍𝐓𝐘 𝐅𝐎𝐔𝐑

𝐓𝐇𝐄 𝐀𝐋𝐓𝐄𝐑𝐄𝐃 𝐇𝐈𝐒𝐓𝐎𝐑𝐘

ÀS DOZE HORAS do primeiro dia de outubro de 1989, algo extraordinário aconteceu: dezesseis mulheres, espalhadas por diferentes partes do mundo, deram à luz. O detalhe mais surpreendente? Nenhuma delas estava grávida quando o dia começou.

Sr. Reginald Hargreeves, o excêntrico bilionário e aventureiro, ficou imediatamente fascinado pelo estranho fenômeno das crianças nascidas sem explicação. Determinado a desvendar o mistério e moldar o destino dessas crianças, ele embarcou em uma missão ambiciosa: localizar e adotar o maior número possível delas. Após uma longa busca, conseguiu adotar sete.

Mas o que poucos sabiam é que essa obsessão já tinha raízes profundas. Anos antes, em 1963, o encontro inesperado com os seus supostos filhos mudou o rumo de tudo.

Durante o jantar leve no prédio chique, ele conheceu Celeste, uma garota que o intrigou profundamente por lembrar, de forma inquietante, sua filha adotiva, Celeste Hale. 

A conversa no prédio Southi and Life revelou segredos impressionantes. Celeste falou de eventos: uma luta com Vanya, que a havia levado ao limite físico, mas também lhe proporcionado algo extraordinário — a capacidade de interromper o rejuvenescimento constante que seus poderes causavam. Esse detalhe ficou gravado na mente de Reginald como uma chave para algo maior.

Quando Celeste Hale desapareceu misteriosamente, Reginald sentiu o vazio como um desafio a ser superado. Decidiu recriá-la. Mas recriar algo tão singular exigia sacrifícios... e riscos.

Na tentativa de impedir que a nova versão de Celeste rejuvenescesse ao usar seus poderes, Reginald optou por medidas extremas. Submeteu-a a uma série de cirurgias experimentais, cada uma mais invasiva que a anterior. Ele queria forçar o corpo dela a revelar os poderes escondidos, mesmo que isso significasse destruí-lo no processo. O resultado foi devastador, mas, de certa forma, eficaz.

Celeste desenvolveu habilidades impressionantes: o controle sobre a água e o fogo — e claro, o mais importante, envelhecia normalmente. No entanto, o preço foi alto. Seu corpo ficou marcado por cicatrizes, resultado de cirurgias desnecessárias e sucessivas intubações. Em um golpe cruel do destino, suas cordas vocais foram danificadas irreparavelmente. Ela se tornou completamente muda.

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⛈︎彡𝐃𝐢𝐚𝐬 𝐚𝐭𝐮𝐚𝐢𝐬, 2019... 𝐧𝐨𝐯𝐚𝐦𝐞𝐧𝐭𝐞.

"Temos visita?", perguntou a outra versão de Celeste em Libras. Suava como se tivesse corrido uma maratona, com uma expressão que misturava paranoia e desespero. Ben, ao lado dela, parecia tão incomodado quanto, franzindo o cenho. Apesar de todos os sinais de irritação – coceira, suor e sintomas desconcertantes – que tomavam conta dela, ele parecia ainda mais agastado, mesmo que estivesse completamente bem.

Celeste sentiu o coração disparar. Como se aquele desconforto já não fosse suficiente, estar cara a cara com aquela versão dela mesma era insuportável, uma sensação parecida com se jogar de um penhasco – e saber que não poderia evitar. Era óbvio que ambas estavam sob o mesmo efeito. A psicose do paradoxo. Cinco e Luther trocaram olhares apreensivos, claramente cientes do perigo.

— Mas que… — Luther sibilou, perplexo. O olhar dos irmãos oscilava entre a versão alternativa de Celeste e a Celeste original, como se buscassem sentido naquele caos.

Lentamente, Luther se aproximou de Ben. Ele não era mais o mesmo garoto de antes. A postura rígida, a aparência impecável e o olhar frio eram um choque para todos. A simples ideia de uma outra versão de Celeste e Ben estar ali, viva e diante deles, era inacreditável.

— Alguém pode me explicar por que estou de frente com... eu mesma? — Celeste perguntou, com a voz cada vez mais tensa. O nervosismo se transformava em agressividade. Cinco e Luther engoliram em seco, hesitantes entre focar em Ben ou nela.

"O que está acontecendo aqui, pai?", perguntou a outra Celeste com as mãos. Ela recuou, encostando no ombro de Ben, como se ele pudesse protegê-la ou, ao menos, oferecer alguma explicação. Mas nenhum dos dois respondeu. Reggie, por sua vez, apenas observava. Se sabia algo, fazia questão de manter o caos.

— É você mesmo? — Luther perguntou a Ben, incrédulo. Deu um passo à frente, como se estivesse vendo um fantasma.

— Quem são os esquisitões ali em cima? — Diego perguntou, praticamente gritando. A tensão no ambiente estava no limite, e ele queria respostas imediatamente.

Irritada, Celeste deu um passo à frente, coçando o pescoço sem parar. Estava à beira de um colapso. Cinco colocou a mão em seu ombro, tentando acalmá-la.

— Celly, calma. — Cinco disse em um tom suave, quase sussurrando.

Celeste se virou para ele como uma tempestade prestes a explodir.

— CALMA?! — Ela berrou, a voz ecoando na sala. A psicose estava claramente afetando sua sanidade. Em contraste, a outra versão dela parecia estranhamente serena, mesmo que os sintomas físicos fossem iguais.

— Eu não quis dizer isso. Eu-

— Não me peça pra ficar calma quando você claramente INVENTOU mais uma das suas loucuras! — Ela gritou, agarrando o blazer de Cinco com força. Ele piscou, confuso. "Inventei?", pensou, sentindo o suor escorrer pela testa. A situação era uma bomba prestes a explodir. Celeste estava claramente paranóica.

— Eles são os Sparrows — Reginald interveio, a voz firme. Celeste girou nos calcanhares, ainda segurando o blazer de Cinco, e o encarou com os olhos faiscando. — Meus filhos.

— O quê?! Espera aí! — Cinco quase rosnou, soltando-se do aperto dela e começando a andar de um lado para o outro. — Como assim "seus filhos"? Isso não é possível, velhote.

— Claro que é! Eu saberia se não fosse, não acha? — Reginald rebateu, sem a menor paciência. No mezanino, a Sparrow descia apressada, visivelmente curiosa. Celeste, a original, rangeu os dentes, sentindo-se à beira de perder completamente o controle. Ela queria bater em alguém. E não sabia nem o porquê.

— Então… — Klaus interrompeu, os olhos estreitados e a mão erguida, como quem pedia atenção. — …todo mundo tá vendo o Ben vivo e a Celeste coberta de cicatrizes, ou é só impressão minha?

"Não fale das minhas cicatrizes, seu… estranho!", retrucou a outra Celeste em Libras, claramente ofendida. Klaus colocou a mão no peito, teatral. Ela parecia incrivelmente calma, irritantemente calma, em comparação com a Celeste que todos conheciam.

— Gostei do chapéu, cowboy. — Ben comentou, com um sarcasmo tão ácido que fez os Umbrellas estremecerem. A outra Celeste imediatamente empurrou o ombro dele, repreendendo-o. "Não zombe deles por mim", ela gesticulou com uma expressão de reprovação, como se quisesse defender a situação própria, sem precisar do irmão para aquilo.

— Eles se autointitulam a Umbrella Academy. — Reginald continuou, ignorando a crescente tensão. — São um grupo de malfeitores pérfidos e traidores que me atacaram no outono de 1963, quando eu estava a negócios em Dallas. Mas cuidado! Eles alegam que são meus filhos. — Ele terminou com um tom de desdém.

Celeste arregalou os olhos, a boca se abrindo em incredulidade.

— Isso é ridículo! — Ela gritou, avançando para cima dele. Luther foi rápido em agarrá-la, impedindo que ela causasse mais estragos. — SOMOS seus filhos! — Celeste gritou, se debatendo contra o aperto de Luther, que fazia o possível para segurá-la. Mas era evidente que, no estado em que estava, ela era um perigo iminente.

— Talvez... alguém devesse dar um calmante pra ela? — Klaus sugeriu, erguendo as mãos, enquanto Celeste lutava como se fosse derrubar o mundo com as próprias mãos..

— Como assim "alegam"? — Allison perguntou, a voz carregada de desespero e confusão. Seus olhos saltavam de Cinco para os outros, como se implorassem por respostas. — Cinco, o que tá acontecendo aqui?

— Ainda não sei, mas tô preocupado. — Ele respondeu, inquieto, o olhar correndo pelos cantos da sala como se buscasse encaixar todas as peças de um quebra-cabeça impossível. Mas a verdade é que era coisa demais para processar.

— Me solta! — Celly resmungou, se debatendo. Luther respirou fundo e a segurou firme, tentando mantê-la no lugar. Só depois de um instante, relutante, ele a soltou. Livre, ela cruzou os braços com um olhar emburrado, igual uma criança fazendo birra.

— Ele tá falando a verdade? — Marcus, o mais alto e de postura imponente, perguntou. Sua pele negra brilhava sob a luz, e seus olhos carregavam um peso de autoridade. Ele ergueu o queixo, o nariz empinado, dando um passo à frente.

— Não a parte sobre sermos traidores. — Vanya respondeu com sinceridade, franzindo a testa. Tudo bem que os Sparrows não os conheciam, mas acreditar nisso? Era loucura!

— Não, nós somos tretadores, no máximo. — Klaus murmurou, jogando as mãos para o alto com um suspiro exasperado. Para ele, aquilo já estava numa escala de maluquice insuportável.

— Mas somos filhos dele — Vanya continuou, tentando achar um argumento enquanto a confusão transbordava em sua expressão. — E essa é a nossa casa!

— É! A gente cresceu aqui! — Luther concordou com firmeza, tentando reforçar a lógica na situação.

— "É, a gente cresceu aqui" — Alphonso imitou, a voz afinada de propósito e carregada de sarcasmo. Ele soltou uma risada que fez ecoar pelo salão. Os outros Sparrows tentaram segurar o riso, mas foi inútil. Jayme apenas sorriu de forma travessa, como se estivesse se divertindo com um espetáculo particular.

Celeste se aproximou da mulher de cabelos escuros e médios, Jayme que cochichou algo em tom brincalhão: "Sloane tá de olho no grandão." O comentário escapou aos Umbrellas, completamente absorvidos pela discussão que fervia ao redor. Mas a outra versão de Celeste pareceu se divertir com o comentário.

— Eu acho que a gente teria percebido vocês. — Sloane interrompeu com um tom irônico, mas sua voz surpreendentemente soou gentil, quase doce. Seus cabelos loiros brilhavam sob a luz, os olhos azuis fixos em Luther, que ficou momentaneamente sem reação.

— Oi. — Ele sorriu, um sorriso meio bobo, enquanto dava um passo à frente e estendia a mão num gesto exageradamente simpático. — Eu sou o Luther.

— Se recomponha, seu frouxo! — Celeste disparou, irritada, batendo no braço dele. "Como ele pode estar tão desconcentrado mesmo com esse caos?!", ela perguntou-se. Luther fez uma expressão teatral de indignação, fingindo estar ofendido.

— Olha só! Aqui não é o lugar de vocês! — Allison explodiu, a paciência claramente no limite. Estava exausta, desejando apenas uma cama e um chuveiro. Os Sparrows explodiram em risadinhas e comentários abafados.

— Ah, então acho que a gente devia fazer as malas e ir embora. — Fei retrucou, debochada, com um biquinho forçado que só aumentou o tom de provocação.

Antes que Allison pudesse retrucar ou Celeste soltar um comentário tão ácido que pudesse iniciar uma guerra, Christopher — o cubo brilhante e o sétimo Sparrow — emitiu um som em outra língua. Sua voz, embora universal, era confusa à primeira escuta. Os Hargreeves franziram a testa, tentando captar o sentido, mas sem sucesso imediato.

O que quer que Christopher tenha dito, provocou risadas entre os Sparrows e arrancou de Ben um: 

— Você me mata, Chris!

E então, como se a situação já não fosse bizarra o suficiente, Grace entrou na sala com um prato de cookies fumegantes, interrompendo as risadas dos Sparrows. O cheiro doce e acolhedor dos biscoitos pareceu, por um breve momento, trazer paz ao caos. Celeste suspirou, como se o aroma tivesse um efeito mágico.

Cinco, porém, permaneceu tenso ao lado dela, enquanto Diego parecia completamente atordoado.

— Eu não estava esperando visitas. — Grace disse, com um sorriso gentil e um olhar de desculpas silenciosas. — Isso foi o melhor que consegui fazer... às pressas.

Sua voz tinha um leve tom de falha, como se o sistema lutasse para completar as frases. Mas ela parecia genuinamente feliz em vê-los, mesmo no meio de um ambiente tão caótico.

Os irmãos Umbrella se entreolharam em silêncio, a tensão no ar era quase palpável. Cinco engoliu em seco, os olhos fixos na figura de Grace. Havia algo de inquietante nela, uma espécie de fragilidade disfarçada. Celeste, por outro lado, oscilava entre encarar sua versão alternativa – ambas compartilhando olhares paranoicos e carregados de psicose – e a própria Grace, que parecia trazer uma estranha sensação de conforto, quase suficiente para abafar as perturbações do paradoxo temporal.

— Mãe... — Diego sibilou, a incredulidade marcada em sua voz.

O momento poderia ter se tornado um reencontro comovente, mas Jayme rapidamente o cortou com um comentário ríspido:

— "Mãe"? Ela é um robô, seu taradão!

— Ela não é um robô! — Diego rebateu, indignado. Era óbvio que os Sparrows haviam sido criados de maneira completamente diferente dos Umbrellas.

— Ei, não chamem ela assim! — Luther pediu, quase ao mesmo tempo que Diego.

— Ou o quê? — Ben retrucou com uma provocação, avançando um passo em direção ao outro, sua postura nitidamente ameaçadora. A tensão na sala atingiu o pico.

— Por que você não chega mais perto pra descobrir? — Luther respondeu, firme.

A ameaça velada fez com que alguns recuassem, mas não Celeste. A versão Umbrella observava a cena com um brilho malicioso nos olhos, ansiosa para liberar toda a raiva acumulada. Coçou o pescoço, um sorriso perverso brincando em seus lábios.

— Gente! — Vanya exclamou, tentando apaziguar a situação. — Calma aí!

O esforço dela foi inútil. A sala virou um caos de vozes sobrepostas.

— Calem a boca! — Diego berrou, frustrado.

— Cala a boca você! — Marcus devolveu, irritado, sua paciência já esgotada. Por fim, elevou a voz, sua autoridade ecoando pelo ambiente: — Já chega!

O silêncio se instaurou. Todos olharam para Marcus, que os encarou com desdém.

— Eu não sei de que circo vocês escaparam ou como passaram pela nossa segurança, mas isso acaba aqui. Vocês têm trinta segundos pra sair da nossa casa.

Celeste, os olhos fixos em Marcus, deu um passo à frente.

— E se não sairmos? — perguntou com uma calma perigosa, sedenta por violência.

Marcus estreitou os olhos, claramente não intimidado.

— Então resolveremos isso à moda antiga.

Alguns Umbrellas suspiraram, mas Celeste quase sorriu, planejando como iniciar uma briga violenta com os Sparrows. Cinco, percebendo o que se desenrolava, aproximou-se de Celly. Ele parou tão perto que sua voz soou quase como um sussurro no ouvido dela.

— Seja lá o que você está planejando… pare. Agora.

Celeste se sobressaltou, girando nos calcanhares. Ela o encarou, desconfiada, mas deixou que ele continuasse.

— Respire. Só isso. — Ele falou, sério. — Pode se acalmar? 

Celeste soltou um suspiro exasperado, traiçoeira, e agarrou o rosto de Cinco com uma mão firme, apertando suas bochechas e forçando-o a encará-la diretamente nos olhos.

— Vou te dizer como você pode me acalmar, garoto — ela resmungou, sua voz carregada de um sarcasmo perigoso. Cinco estreitou os olhos, curioso, esperando o que ela falaria. — De duas uma: ou um orgasmo, ou você me ajuda a matar alguém.

Cinco engasgou, seu cérebro tentando processar aquela declaração absurda. "Pelo amor de Deus", ele pensou, incrédulo. Inspirou fundo e calmamente afastou as mãos dela de seu rosto. Seus olhos varreram a sala — ninguém parecia notar o pequeno diálogo vergonhoso que se desenrolava ali. Todos estavam imersos na discussão acalorada com os Sparrows.

Baixando a mão dela, ele olhou diretamente em seus olhos, sua voz firme, doce e gentil como sempre.

— A psicose do paradoxo tá te deixando… sincera ou sem noção, querida. — Cinco falou, ainda meio relutante. Como se conseguisse adivinhar o que ela faria em seguida, ele ergueu as sobrancelhas, vendo a garota ficar irritada.

— Eu não estou com a psicose, seu idiota. — Ela retrucou, irritada, negando como qualquer pessoa sob aqueles efeitos faria. "Acertei. Negação", ele pensou, cheio de si.

— Tenho 90% de certeza que eu não teria ouvido você falar o que acabou de falar se estivesse sã.

— Eu não me importo com o que você teria ouvido ou não! — Ela rebateu, entredentes. Coçou o pescoço, irritando-se. — Eu fui sincera. — Ela retrucou, cruzando os braços.

— E no momento, não faremos nenhum dos dois, beleza?

Apesar do tom sério, ele sentiu o rosto corar levemente. Já tinha identificado a segunda coisa que humilhava Celeste além do álcool: a psicose do paradoxo. 

Celeste inclinou a cabeça, um sorriso malicioso surgindo em seus lábios. O brilho traiçoeiro nos olhos dela só aumentou. 

— No momento? — Ela ergueu uma sobrancelha, claramente se divertindo enquanto o desafiava. Cinco quase revirou os olhos, mas se forçou a manter a compostura, mesmo sentindo o calor da vergonha subir. — Está considerando qual das duas opções? A de transar comigo ou a de me ajudar a matar um desses bocós?

Ele sabia que precisava assumir o controle. Buscando qualquer coisa para distraí-la, disse a primeira frase que passou por sua mente — e se arrependeu assim que as palavras saíram, sentindo o próprio rosto corar de nervoso — mesmo que a reação dela tivesse sido completamente prazerosa.

— Eu prometi não matar mais.

Celeste congelou por um instante. Seus olhos se arregalaram, e seu rosto rapidamente ganhou um tom avermelhado. Mas, em vez de recuar, um sorriso lento e astuto surgiu em seus lábios.

Ela abriu a boca, claramente pronta para lançar alguma provocação venenosa, mas o momento foi interrompido pelo caos ao redor. Ambos voltaram a focar na sala: a discussão entre os Sparrows e os Umbrellas não apenas continuava, mas parecia ter escalado a um nível ainda mais intenso.

Cinco suspirou, frustrado, enquanto Celeste soltava uma risada baixa, claramente achando graça da situação. A bagunça ao redor deles só piorava, mas, de alguma forma, aquele breve

— Isso é adorável. — Ela disse por fim, com um tom traiçoeiro, mas antes que pudesse prosseguir, os dois foram interrompidos pelo som da discussão que recomeçava ao redor deles. — Toda essa briga… — ela sussurrou, como satanás em busca do caos. Cinco olhou de soslaio para ela. — E você dando em cima de mim também me deixa bem desconcertada. É fofo, sério.

Ela continuaria tagarelando com ele. Mas o diálogo com Klaus e Ben estava ficando pior. Ela parou, estreitando os olhos para prestar atenção. 

— Você fica muito melhor vivo do que morto. Não acha? Tirando esse corte de cabelo. — Klaus comentou para Ben, casualmente.

Cinco e Celeste se entreolharam, perplexos. Klaus claramente ainda não tinha entendido que aquele Ben não era o mesmo que ele conhecia. A sala estava um pandemônio, e o caos estava longe de terminar.

Não era para soar como uma ameaça, mas dizer a alguém que jamais lidou com realidades temporais que é "melhor vivo do que morto" definitivamente não foi a escolha mais sábia. Ben interpretou aquilo exatamente como não deveria.

— O que foi que você disse? — Ele perguntou, olhos cerrados, sua incredulidade transbordando.

Celeste, do lado dos Umbrella, mal conseguiu esconder o sorriso perverso que crescia em seus lábios.

— Vai dar briga. — Ela comentou, alisando as mãos como se estivesse se aquecendo para uma luta. Seu entusiasmo beirava o inquietante.

Cinco, ao lado dela, suspirou profundamente, a exaustão já evidente.

— Qual é, qual é! Para com essa hostilidade toda, senhor irritadinho. — Klaus interveio com seu tom debochado de sempre, aproximando-se de Ben quase como um irmão que não sabia quando parar.

Ele estreitou os olhos, examinando a grande cicatriz que cortava o rosto de Ben. O sorriso irônico de Klaus alargou-se enquanto ele soltava um comentário desnecessário:

— Nossa, bela cicatriz. Muy macho!

— Cala essa boca! — Ben retrucou, sua paciência esgotada.

Mas Klaus, como sempre, não sabia a hora de desistir.

— Cala a boca você e abraça logo o seu irmão!

Antes que pudesse abrir os braços para o gesto exagerado, Ben explodiu em raiva, desferindo um soco tão forte que Klaus foi direto ao chão. Ele piscou, atordoado, olhando para o teto como se ainda processasse o que havia acabado de acontecer.

— Aí! O que é isso? Não precisava disso! — Luther protestou, indignado.

— É claro que eu precisava! — Ben respondeu, sua raiva ainda evidente.

— Pois é! Ele fez! — Alphonso interveio, prepotente, com os braços cruzados e um sorriso satisfeito.

— A-ha! — Celeste gritou, visivelmente animada, mas havia algo errado naquele entusiasmo. Seu olhar estava levemente insano. — Vamos brigar-

Antes que ela pudesse incendiar ainda mais a situação, Cinco colocou a mão no rosto dela, tapando sua boca com um movimento rápido.

Celeste tentou continuar falando, mas sua voz saiu abafada, transformada em resmungos incompreensíveis.

— Desde quando a Cellyzinha não me defende..? — Klaus perguntou, chateado, enquanto se erguia do chão com dificuldade, massageando o rosto.

Os irmãos Umbrella estavam divididos entre o desejo de restaurar a paz e a crescente vontade de justiça. Celeste, claro, era uma exceção total. Suada, inquieta, e claramente desconfortável, ela parecia ser o caos em forma humana.

— Vem cá! Você vai pagar por isso! — Luther gritou, avançando em direção a Ben, claramente disposto a resolver aquilo com os punhos.

Antes que pudesse chegar perto, Marcus, o líder dos Sparrows, posicionou-se no caminho, decidido a defender seu irmão. O confronto se desenrolou em golpes frenéticos, ambos demonstrando uma força desumana.

Enquanto isso, Celeste lutava contra o braço de Cinco, que ainda a mantinha parcialmente presa. Ela balançava os pés, um sorriso perverso nos lábios, ansiosa para ver sangue e encontrar sua chance perfeita para descarregar toda a energia psicótica que a consumia.

Marcus acertou um chute em Luther com força suficiente para lançá-lo contra Klaus, que finalmente havia conseguido se levantar, mas ainda parecia derrotado emocionalmente. O impacto foi desastroso: Luther e Klaus foram arremessados para o sofá, que virou, derrubando a mesa atrás dele. O som de madeira quebrando ecoou pela sala, e Celeste riu como se assistisse a um espetáculo particular.

Luther caiu em cima de Klaus, esmagando-o com seu peso.

— Sai de cima! Sai de cima, Luther! — Klaus protestou, desesperado, enquanto dava tapas desajeitados no ombro do irmão.

Do canto da sala, Reggie observava tudo com uma expressão de puro desgosto. Sem uma palavra, virou as costas e deixou a sala, preferindo que os filhos resolvessem a situação por conta própria.

Luther finalmente saiu de cima de Klaus com um pulo, como se só naquele momento percebesse o desconforto do irmão. No entanto, a briga entre ele e Marcus estava longe de acabar. Cada golpe era mais intenso que o anterior, enquanto Vanya e Klaus imploravam para que parassem. Mas era como se o destino tivesse outros planos, especialmente para Celly.

De repente, o caos estava instaurado: não era mais uma discussão. Era uma batalha completa. Até Vanya, relutante, foi forçada a enfrentar um oponente enquanto Klaus, fiel ao seu estilo, se esgueirava para longe sem a menor intenção de se envolver.

E como se o destino estivesse se divertindo às custas de Celly, quem surgiu da multidão foi exatamente quem ela queria enfrentar: a outra versão dela mesma. A chegada foi quase teatral, a outra Celeste movendo-se sorrateiramente, com aquele sorriso silencioso e traiçoeiro.

Celly estreitou os olhos, sentindo o sangue ferver. A outra versão ergueu o dedo indicador e o dobrou, chamando-a para a briga. Era um convite impossível de recusar.

Os documentos de 1963, que até então eram sua prioridade, foram jogados de qualquer jeito sobre a bancada. Nada mais importava. Ela avançou.

Celly iniciou com um chute direcionado ao tronco da outra versão, mas o golpe foi desviado com uma calma irritante. Cada tentativa de soco, cada investida, parecia ser evitada sem o menor esforço.

Enquanto isso, o restante da sala era um espetáculo de caos: Christopher, o cubo brilhante dos Sparrows, disparava rajadas alaranjadas contra Diego, que respondia com seu habitual sarcasmo:

— É o melhor que pode fazer?

Luther e Marcus continuavam a trocar golpes como se o chão fosse um ringue improvisado. Cinco e Ben estavam em sua própria luta, movendo-se entre a sala e o mezanino, enquanto Cinco tentava processar a gravidade da confusão absurda em que todos estavam metidos.

Do outro lado, a outra Celeste finalmente deu um passo para trás quando Celly lançou um objeto eletrificado em sua direção. O ataque a pegou de surpresa, e ela rangeu os dentes em dor, visivelmente irritada.

"Você é tipo o Super-Choque", gesticulou a versão muda, com um sorriso levemente impressionado e uma sobrancelha erguida.

"Se era pra eu me sentir ofendida, não funcionou", pensou Celly, estreitando os olhos em resposta.

Apesar da tensão, havia algo curioso na forma como ambas lutavam. A psicose parecia, aos poucos, dar lugar a uma estranha lucidez, e o duelo das duas quase tomava ares de um jogo.

A outra Celeste ajeitou o cabelo em um coque frouxo, as mãos apoiadas nos joelhos, claramente se preparando para o próximo ataque.

Celly não hesitou: deslizou pelo chão com a ajuda de sua energia e atacou com um chute direto no peitoral da outra. Mesmo atingida, a oponente segurou o pé de Celly, girando-o em um movimento rápido para desequilibrá-la.

Mas Celly reagiu com agilidade, girando o corpo no ar e pousando com elegância, aproveitando a proximidade para aplicar um chute que finalmente a empurrou.

A outra Celeste recuou, mas não cedeu. Rapidamente, ela ergueu o joelho e acertou o estômago de Celly, que soltou um gemido abafado. Sem dar tempo para a reação, girou o corpo e desferiu uma cotovelada certeira, seguida por um golpe com a lateral da mão diretamente na traqueia de Celly, deixando-a sem ar por alguns segundos.

Recuperando-se rápido, a outra Celeste invocou chamas que começaram a dançar em suas mãos. Celly franziu o cenho, perplexa. "Como isso é possível?", pensou, enquanto observava as labaredas ganharem forma.

Era óbvio que ambas eram diferentes, mas aquilo parecia um universo à parte: a versão alternativa, coberta de cicatrizes monstruosas, tinha poderes que ela mesma jamais imaginaria.

A outra girou com graça, as chamas envolvendo seus movimentos, e uma delas tocou a manga do casaco de Celly, incendiando a ponta.

Celly deslizou para trás, afastando-se da ameaça iminente. Sem perder tempo, bateu na manga com força, apagando o fogo antes que se alastrasse.

Do outro lado da sala, a outra Celeste se posicionava novamente. Mas Celly não estava disposta a perder. Esfregou as mãos rapidamente, tensionando a eletricidade ao seu redor.

Antes que Celeste pudesse lançar sua rajada de energia, um corvo surgiu do nada, cortando sua visão e arranhando sua pele. O susto a fez perder o foco. Quando recuperou a atenção, já era tarde demais: a outra versão havia comprimido uma labareda de fogo em uma esfera poderosa, com potencial para explodir ao menor toque. Sem cerimônia, lançou-a em direção a Celly.

Ela viu a bola de fogo avançando, mas não havia escapatória. Fechou os olhos, esperando pelo impacto inevitável. Então, em um piscar de olhos, estava no mezanino. Cinco a havia teletransportado no último segundo.

Celly soltou um suspiro aliviado, mas o alívio durou pouco. Um estrondo ecoou da sala, chamando sua atenção. Tanto ela quanto Cinco se sobressaltaram.

— É a outra versão. — Celeste deu de ombros, tentando disfarçar o nervosismo. — Eu tava dando conta.

— Claro que estava. — Cinco respondeu com sarcasmo, apontando para a manga do casaco dela, chamuscada. Celly fez uma careta, incomodada.

— Não tô morta — retrucou, como se isso resolvesse qualquer problema. Cinco resmungou, irritado. "Ela fica ainda mais difícil com a psicose", pensou.

— Desculpe pela demora. — Cinco limpou um pouco de fuligem do ombro dela, o tom de voz casual. — Eu tava ocupado lidando com o Ben.

Celeste quase agradeceu, mas sua atenção foi desviada por Jayme, do outro lado do mezanino. O sorriso irônico e prepotente da garota a irritou instantaneamente.

— Aí, bermudinha. Qual foi? — Jayme provocou, sua voz carregada de superioridade.

Celeste, já afetada pela psicose do paradoxo, sentiu o ciúme subir como uma onda. "Eu tô aqui também! Por que ela só olha pro Cinco?!", pensou, furiosa. Ela preferia mil vezes ser provocada do que ser ignorada.

Antes que pudesse falar qualquer coisa, Allison chegou ofegante, mal olhando para os dois.

— Vai lá ajudar os outros — Cinco pediu, em tom de comando. — A gente dá conta dessa aqui.

— Tá. — Allison concordou, descendo as escadas rapidamente, sem sequer hesitar.

Assim que ficaram sozinhos, Celeste e Cinco trocaram um olhar cúmplice, como se estivessem se preparando para algo grande.

— Vocês são o quê? Mascotes? — Jayme provocou, finalmente incluindo Celeste na conversa.

Celeste ergueu uma sobrancelha, contente por finalmente ser notada. Cinco olhou para ela, quase pedindo permissão para agir. Com um suspiro silencioso, Celeste deu um leve aceno, e isso foi tudo que ele precisou.

Num piscar de olhos, Cinco se teletransportou para trás de Jayme, acertando um golpe direto em seu rosto. Ela caiu, mas não sem um olhar cheio de fúria.

— Estamos mais pra campeões. — Cinco disse, seu sarcasmo cortante.

Mas Jayme não era do tipo que aceitava derrotas. Rapidamente, ela usou suas glândulas salivares, disparando um jato de gosma escura direto no rosto de Cinco.

— Que coisa nojenta, cara! — Cinco reclamou, tentando limpar a substância pegajosa. Mas já era tarde: o líquido havia penetrado na pele, e seus efeitos começaram a se manifestar.

Celeste observava tudo com atenção. Ainda tentando entender o poder de Jayme, perguntou, com um tom que misturava genuína curiosidade e provocação:

— Qual foi? O seu poder é cuspir nos outros?

— Posso te mostrar na prática. — Jayme respondeu, irritada, antes de cuspir novamente. Desta vez, Celeste conseguiu desviar por puro reflexo, mas agora ela entendia que aquilo não era só nojento: era perigoso.

Cinco começou a demonstrar os primeiros sinais de alucinação. Seus olhos vagavam pelo espaço, como se ele enxergasse algo que mais ninguém via. Ele parecia perdido, vulnerável, e isso fez o sangue de Celeste ferver.

"Então é isso que ela faz", pensou, cerrando os punhos. Mas não havia tempo para tirar Cinco daquele transe. Jayme não daria uma segunda chance.

Celeste avançou, iniciando uma luta frenética. Mesmo com a psicose nublando seus pensamentos, sua determinação era clara: derrotar Jayme e, de quebra, proteger Cinco.

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⛈︎彡 𝐂𝐢𝐧𝐜𝐨 𝐇𝐚𝐫𝐠𝐫𝐞𝐞𝐯𝐞𝐬.

— Sério mesmo? Nem para me deixar morta você serve? — A voz da Gestora ecoou com um tom cortante, preenchendo o ambiente enquanto ela subia as escadas e adentrava o mezanino.

Aquele som congelou meu sangue. Cada músculo do meu corpo tensionou, e a escuridão pareceu tomar conta da minha visão. Era como se o mundo estivesse se desintegrando ao meu redor. Não fazia sentido. Anthony havia atirado nela há poucas horas.

— Você está morta — falei, minha voz trêmula, quase falhando. A imagem do corpo dela no celeiro estava vívida na minha mente. Mas ali estava ela, na minha frente. Era impossível. Completamente impossível.

"Ela já sobreviveu a um tiro na cabeça uma vez", pensei, a dúvida se infiltrando como veneno. "Não pode ser. Ninguém sobrevive a um milagre assim duas vezes!".

— Tem certeza? Acho que estou bem viva. — A Gestora se aproximou, parada agora bem na minha frente. Sua ruga na testa parecia tão afiada quanto seu sorriso, uma mistura traiçoeira de superioridade e crueldade. — Quem não teve a mesma sorte foi sua namoradinha.

Ela fez um bico exagerado, fingindo tristeza, mas seu olhar cintilava de malícia. Meus olhos permaneceram fixos nos dela, desafiando aquele jogo perverso. Mas, então, ela desviou o olhar para o chão, forçando-me a encarar algo que eu não queria. Algo que eu não podia ver.

— Aconteceu de novo. — O sussurro da Gestora cortou o ar como uma faca. Sua voz soava fantasmagórica, como se estivesse dentro da minha cabeça. E, então, ela riu. Uma risada tão cruel, tão profundamente maléfica, que ecoou nos meus ouvidos e no meu peito, fazendo meu coração disparar.

Eu não consegui evitar.

Meus olhos desceram, contra minha vontade, e lá estava ela. O casaco manchado de sangue. Os olhos sem vida, opacos, fitando o vazio. O sangue escorria novamente de sua boca, exatamente como antes. Cada detalhe era um eco cruel da dor que eu havia sentido há tão pouco tempo.

As palavras voltaram a me assombrar: "Quero morrer olhando para você". "Olhe para mim, querido". Elas ecoavam na minha mente, mesmo sabendo que ela já estava morta.

— Is-isso… Não. Não, não! — murmurei, a incredulidade quebrando minha voz. Era impossível aceitar o que estava diante de mim. Tentei desesperadamente agarrar-me às memórias reais, aquelas em que eu a salvei, em que tudo tinha terminado bem.

Mas aquilo parecia tão real. Real demais. Meu coração martelava descontrolado no peito. Eu a salvei, pensei freneticamente. Eu a salvei.

E, mesmo assim, ali estava ela. Morta. De novo.

｢· · • • • ⛈︎ • • • · ·｣

A garota avançou contra Celeste com um impulso ágil, utilizando a proteção do mezanino para saltar. No ar, ela girou o tronco com precisão, pronta para derrubá-la de uma vez. Mas Celeste percebeu a intenção no último momento. Tentou recuar, mas não foi rápido o suficiente.

O impacto foi certeiro. Celeste perdeu o equilíbrio, tropeçando para trás e, no processo, empurrou Cinco, que rolou pelas escadas até o andar inferior. O baque de sua queda ressoou pela casa, libertando-o acidentalmente da alucinação que o prendia.

Celeste, por pouco, não seguiu o mesmo destino. Nos últimos segundos, conseguiu segurar-se no corrimão, evitando a queda. Enquanto Cinco resmungava no andar de baixo, ela sabia que ele precisava dela. Rapidamente, lançou uma rajada de energia contra Jayme. O golpe foi forte o suficiente para fazê-la se contorcer de dor, mas sem ser letal.

Com Jayme fora de combate momentaneamente, Celeste escorregou pelo corrimão, aterrissando ao lado de Cinco, que gemia de dor, segurando o braço. Mas, para ele, a queda não era o pior. A alucinação que Jayme havia provocado ainda o assombrava.

Celeste se ajoelhou ao lado dele, a preocupação estampada em seu rosto. O caos ao redor estava intenso, com lutas individuais tomando conta da casa, e alguns já percebendo que era hora de sair dali. Cinco apertava a articulação dolorida enquanto tentava recuperar o fôlego. Ele evitava olhar diretamente para ela, como se sua mente ainda estivesse presa no tormento que acabara de vivenciar.

— Ei, você tá bem? — Celly perguntou, sua voz firme, mas carregada de preocupação.

Cinco finalmente ergueu os olhos para ela. Vê-la ali, viva, mesmo em um estado deplorável, com o rosto suado e exausto, trazia uma sensação de paz inexplicável. Ele conseguiu esboçar um sorriso fraco.

— Estou. Eu... estou bem — respondeu, ainda um pouco confuso. Poucos minutos atrás, estava certo de que a tinha perdido. Agora, ela estava ali, viva e tão real. Aos poucos, a percepção de que tudo não passara de uma alucinação começava a se estabelecer.

Celeste, no entanto, sabia que ele mentia. Ela era especialista em detectar mentiras, especialmente as dele. Ainda assim, decidiu não insistir. Em vez disso, o ajudou a levantar, seus olhos atentos ao jeito que ele desviava o olhar. Ele não está nada bem, pensou, mas não havia tempo para se aprofundar nisso.

Com a adrenalina ainda correndo, a dupla olhou em direção à sala de estar. Luther continuava apanhando de Marcus, em um embate que parecia não ter fim.

— Mas que merda! Ele tá nisso há quanto tempo?! — Celeste murmurou, irritada. Enquanto isso, os outros Sparrows assistiam a cena como se fosse um show de entretenimento gratuito.

Antes que ela pudesse correr para ajudar, um grito ecoou do mezanino.

— Luther! — Vanya berrou, alarmada.

O tempo parecia desacelerar. Luther, vendo uma oportunidade, fugiu, deixando a mesa de centro onde estava sendo massacrado vazia por alguns segundos. Foi o tempo exato para Sloane, a mulher loira com habilidades gravitacionais, arremessar Vanya do mezanino direto para a mesa de centro.

Celeste observou a cena com um sorriso que beirava o sarcástico.

— A Paganini dá conta deles — comentou, confiando plenamente na capacidade de Vanya. Afinal, se alguém já destruiu o mundo duas vezes, lidar com um grupo de Sparrows seria brincadeira de criança.

Sem perder tempo, puxou Cinco pela manga do blazer.

— VEM LOGO! — gritou, apressada, enquanto ele, finalmente, voltava à realidade.

Cinco apertou a mão dela, retribuindo a urgência do momento. Sem questionar, ambos dispararam pelo corredor principal, buscando a saída secundária, já que o hall de entrada estava fortemente protegido.

O grupo precisou subir até os andares superiores para descer novamente, em direção aos quartos e às saídas de emergência. O corredor principal estava bloqueado, forçando Cinco a teleportá-los para o corredor secundário. Não havia tempo a perder.

No caminho, eles se depararam com Luther e Sloane, envolvidos em uma química que, sinceramente, não era o momento para admirar. Cinco e Celeste estavam apressados demais para lidar com a situação. Luther, agachado ao lado de Sloane, atrapalhava a passagem no espaço estreito.

— Luther, vambora! Vem logo! — Cinco berrou, sem paciência.

Quando percebeu que o irmão não ia sair da frente, simplesmente pulou por cima dele. Celeste, sem cerimônia, fez o mesmo, sem nem olhar para trás.

— Espera! — Allison gritou, correndo ao encontro deles. Finalmente, havia encontrado o grupo. Todos estavam fugindo ao mesmo tempo, mas o caos não parava de aumentar.

— Temos que ir! Vamos! — Celeste apressou, sua voz carregada de irritação.

Os passos apressados ecoavam pelo corredor enquanto os Umbrellas corriam freneticamente. Mas o som aumentou ainda mais quando Fei apareceu, soltando corvos que emergiam de seu corpo, voando em direção ao grupo como projéteis vivos.

— Mas que poder estranho é esse?! — Celeste reclamou, tentando se esquivar enquanto um corvo rasgava sua bochecha com as garras afiadas.

— É sério isso? — Luther reclamou, olhando incrédulo para os pássaros.

— Esses bichos arranham! Não deixem eles chegarem perto! — Celeste gritou, o rosto ardendo por causa do corte.

Os corvos avançaram com velocidade, obrigando Celeste a tropeçar no meio do caminho. Antes que caísse de vez, Cinco a teleportou para o lado dele, e ela se manteve de pé. A corrida continuava, todos ofegantes e frenéticos, tentando escapar daquele cenário surreal.

— Vai, anda, anda, anda! — Cinco apressava, enquanto eles viravam o corredor, se aproximando dos quartos e das saídas de emergência.

De repente, Cinco parou no meio do caminho, os olhos arregalados.

— A maleta! — ele exclamou, o tom urgente.

Celeste sentiu o coração quase sair pela boca. Por que, em nome de tudo, ele estaria pensando na maleta agora? Mas então percebeu: claro, voltar no tempo seria a única maneira de consertar aquela bagunça de linha temporal.

— CINCO! — ela berrou, quando ele desapareceu do nada, se teleportando para o hall de entrada.

— Odeio quando ele faz isso — Luther reclamou, com uma careta.

Sem escolha, Celeste, Luther e Allison continuaram correndo pelo corredor estreito. Viraram para dentro de um quarto, tentando despistar Fei. Era sua única opção viável.

— Fecha a porta! Fecha logo! — Allison gritou, apavorada.

— Entrem logo! — Luther berrou, enquanto usava o peso e a superforça para manter a porta fechada.

Celeste e Allison encostaram-se à parede, tombando a cabeça para trás e arfando de cansaço. Elas precisavam desesperadamente de um pouco de ar fresco e água gelada.

— Conseguimos. — Celeste sorriu, triunfante. — A gente é incrível.

O silêncio de alívio durou pouco. Logo, os bicos dos corvos começaram a perfurar a madeira da porta, quebrando-a em pedaços em questão de segundos. Allison e Celeste gritaram de susto, enquanto Luther recuava, tentando evitar ser atingido pelos fragmentos.

— O que vamos fazer?! — Allison perguntou, quase em pânico.

— A janela! Rápido! — Celeste gritou, já apontando para a saída.

Luther correu para abrir a janela, tão desesperado quanto as outras. Enquanto isso, Celeste, sem pensar duas vezes, concentrou sua energia e absorveu a força vital dos corvos. No mesmo instante, os pássaros caíram no chão do corredor, inertes.

— Vamos! — ela gritou, ajudando Allison a passar pela janela.

Com a passagem finalmente aberta, os três escaparam, deixando para trás o caos e a ameaça que os cercava.

｢· · • • • ⛈︎ • • • · ·｣

O sol castigava os rostos cansados dos Umbrellas enquanto Celeste, Luther e Allison seguiam adiante, discutindo a cada esquina sobre o caminho a seguir. Nenhum deles tinha a menor ideia de onde estavam indo — confiavam apenas na própria intuição, ainda que cada um tivesse uma direção diferente em mente.

Celeste sentia o peso do cansaço em cada músculo. Suas costas estavam destruídas, o cabelo grudava na testa com o suor, e seus olhos mal se mantinham abertos. O rosto ainda ardia com o corte deixado pelos corvos de Fei, mas o que mais a incomodava era o estado do casaco rosa. A manga estava chamuscada e manchada de sangue. "Perfeito. Esse casaco vai virar pano de chão até o fim de semana se continuarmos nesse ritmo", pensou, irritada.

Ao virar mais uma esquina, o trio acabou encontrando os outros irmãos. Era quase cômico: todos haviam optado por "caminhar sem rumo". Agora, juntos, formavam um grupo barulhento, cheio de queixas.

— Minhas costas nunca mais serão as mesmas... — Diego reclamou, estalando a coluna.

Celeste revirou os olhos. Estava tentando ignorar a bagunça que ainda rodava em sua mente. A psicose parecia ter passado, mas o peso do que havia dito durante aquele surto ainda a incomodava. Era o tipo de coisa que só se dizia em momentos de extremo descontrole. "Pelo menos agora eu posso culpar a psicose", pensou, tentando se convencer.

A caminhada sem direção finalmente os levou a um parque público, embora a palavra "parque" fosse generosa. Era mais um espaço urbano com bancos e mesas espalhados.

— Eu só vou sentar um pouquinho aqui... — Luther anunciou, derrotado, caindo em um dos bancos com um suspiro exausto.

Celeste não precisou de convite. Jogou-se em outro banco, sentindo cada parte do corpo doer. Cinco sentou ao lado dela, a expressão tão irritada e cansada quanto a dela.

— Que fiasco de missão! — Diego exclamou, ainda massageando as costas.

— Não foi nosso melhor trabalho — Cinco comentou, com um suspiro indiferente.

Celeste arqueou uma sobrancelha e soltou uma risada amarga.

— "Nosso melhor trabalho"? — ironizou. — Nós nunca tivemos um trabalho decente pra usar de referência. Se fosse pra premiar alguma coisa, a medalha ia direto pra Vanya pelo show no campo da Sissy.

Os outros murmuraram em concordância, o cansaço transparecendo em cada gesto.

Celeste virou-se para Cinco, notando um arranhão em sua testa.

— Você tá bem? — perguntou, inclinando-se para examinar o ferimento. Tocou a testa dele com cuidado, os dedos gentis contrastando com sua aparência desgastada. Cinco resmungou com a dor, mas nem era tão ruim assim. Ele apenas gostava de ver como ela se preocupava.

— Estou... bem, na medida do possível — respondeu, um sorriso mínimo surgindo no canto dos lábios.

Do outro lado, Klaus se espreguiçava preguiçosamente, soltando um gemido dramático.

— Eu tô todo moído — murmurou, deitando-se sobre a mesa como se o peso do mundo estivesse em suas costas.

Por um momento, o grupo ficou em silêncio. Era um silêncio estranho, mas de alguma forma, reconfortante. Eles precisavam daquele respiro.

— Você tá bem? — Allison perguntou a Luther, que estava sentado ao lado dela, visivelmente abalado.

— Eu ainda não sei — confessou ele, fazendo uma careta de dor.

Luther passou os dedos no cabelo, frustrado.

— Nunca levei uma surra como essa antes — admitiu, amargo. Fez um gesto com as mãos, como se estivesse entregando algo invisível. — Foi tipo... "toma aqui, toma", "toma aqui essa surra".

Allison olhou para ele, tentando processar a lógica da explicação. O silêncio que se seguiu foi cômico.

— Acho que o Luther tá com uma concussão — disse ela finalmente, no tom seco e divertido que usava para alfinetar.

Klaus se aproximou, com um sorriso brincalhão.

— Quantos dedos tem aqui? — perguntou, estendendo dois dedos na frente do irmão.

Luther revirou os olhos e ia responder, mas foi interrompido por um grito repentino.

— Ai, meu Deus! Cadê a Vanya?! — Luther quase berrou, a expressão mudando para uma preocupação desesperada.

Antes que alguém pudesse reagir, o destino tratou de responder. Vanya apareceu cambaleando pelo caminho, com alguns cortes no rosto, mas visivelmente viva.

— Ah, graças a Deus vocês estão vivos — disse ela, aliviada, mesmo mancando até o grupo.

O alívio coletivo foi quase palpável. Por um instante, todos esqueceram os próprios ferimentos e dores. Afinal, estavam juntos novamente.

— Tudo bem? — Celeste perguntou com a voz suave, o olhar pousando em Vanya, que parecia tão exausta quanto o resto deles. Vanya apenas assentiu, sem forças para responder. Sentou-se ao lado de Klaus, deixando escapar um suspiro que dizia tudo o que precisava ser dito.

— Pelo jeito, o Ben também tá... — Klaus murmurou com sarcasmo, brincando com a frase de Vanya. A menção ao nome de Ben provocou um resmungo coletivo entre os irmãos, como se fosse um reflexo automático. Era quase cômico. Todos ainda lembravam do antigo Ben com carinho, mas o dessa linha do tempo? Um completo pé no saco.

— É, ele é um idiota — Allison comentou com irritação evidente.

— Todos eles são idiotas — Diego retrucou, cruzando os braços.

— Idiotas bons de briga — Luther acrescentou, arqueando uma sobrancelha. Ele parecia querer enfatizar que, apesar de serem "idiotas", a rivalidade com eles não era exatamente fácil.

— É o seguinte, a próxima pessoa que disser idiota vai levar um soco na garganta — Cinco decretou, o tom impaciente e autoritário. Era um aviso sério, mas, considerando o público, ele deveria saber que seria inútil.

O que, claro, foi exatamente o que aconteceu. Todos repetiram "idiota" quase em uníssono, apenas para provocá-lo. Cinco ergueu as sobrancelhas, visivelmente frustrado, mas nem um pouco surpreso. Ao seu lado, Celeste riu baixinho e, para piorar, bagunçou os cabelos dele de propósito.

— Vocês são impossíveis... — Cinco resmungou, enquanto Diego mudava de assunto.

— Aí, o papai explicou por que chamou eles de filhos? — Diego perguntou, confuso. Ele parecia desesperado por qualquer resposta que trouxesse algum sentido àquele caos.

— Claro que explicou — Klaus respondeu com a sua habitual ironia, gesticulando dramaticamente. — Quer saber o motivo? O papai ficou com tanto nojo da gente lá no Texas que decidiu adotar outro grupo de crianças só pra não ter que criar a gente de novo.

Os irmãos soltaram um suspiro uníssono, irritados e frustrados. Mesmo que Klaus tivesse dito aquilo no tom de piada, o peso da rejeição era difícil de ignorar.

— Isso é bem a cara dele, né? — Diego comentou, dando de ombros. Havia algo de amargamente cômico naquilo.

Celeste, porém, franziu a testa, confusa.

— Então por que eu faço parte dessa linha do tempo? — perguntou, sentindo-se dividida. A ideia de ter sido escolhida enquanto os outros foram rejeitados não fazia sentido. — Se ele ficou com nojo da gente, não era pra mim ter sido adotada.

— Vai ver ele gostou de você — Klaus respondeu de forma casual, fazendo um bico pensativo. — Ou talvez tenha a ver com aquela outra você lá em Dallas. Talvez, quando descobriu que você existia no futuro, ele decidiu ir atrás e te adotar. Quem sabe, né?

O grupo caiu em silêncio novamente, perdido em teorias. Cinco estreitou os olhos, claramente ponderando as possibilidades, mas o desconforto estava estampado em seu rosto.

— Não é surpresa ele não querer o resto de nós — Cinco murmurou, com um toque de ressentimento.

— Mas ele queria a gente antes? — Vanya questionou, a confusão evidente. Celeste deixou escapar um riso seco.

— Ele já quis? — Allison completou, expressando o mesmo ceticismo. A rejeição de Reginald não era exatamente uma novidade.

— Viu? Eu falei que a gente não devia ter pedido ajuda dele em 63 — Luther comentou com aquele ar típico de "eu avisei".

Cinco bufou, irritado.

— Acho que vocês não estão prestando atenção — ele começou, levantando a voz o suficiente para silenciá-los. — Se o papai não nos adotou quando éramos crianças, isso significa que ele mudou a linha do tempo. E se ele mudou isso, quem sabe o que mais foi alterado?

— Não era pra você saber? — Allison perguntou, a ironia pingando da voz.

— Lamento, Allison, mas talvez eu precise de mais do que vinte minutos e uma lesão na cabeça pra entender tudo — Cinco retrucou, sem esconder o sarcasmo. Ele cruzou os braços. — Pode ser ou tá difícil?

Celeste arqueou uma sobrancelha, surpresa com o tom ácido dele.

— Não, na verdade, tá difícil — respondeu, a voz grave e séria. Estava tão perdida quanto os outros. Todos eles estavam.

— Gente, calma. Nós ainda temos a maleta da Comissão e aqueles documentos que a Celly pegou na empresa do Cinco — Diego apontou, tentando acalmar os ânimos.

— É verdade — Cinco concordou. Ele então olhou diretamente para Celeste, que estava sentada ao lado dele. — Falando nisso, querida... onde estão os documentos?

Celeste sentiu o coração gelar. "Do que ele está falando?" perguntou-se, confusa. A atenção de todos se voltou para ela, aguardando uma resposta. Parecia uma pegadinha, mas ninguém parecia estar brincando.

— Do que... do que vocês estão falando? — ela perguntou, soltando um riso nervoso.

Os olhares desconfiados continuavam fixos nela. Cinco franziu o cenho, enquanto Luther e Allison se entreolharam.

— Dos documentos... — Cinco repetiu, num tom de incentivo, como se explicasse algo óbvio.

Celeste sentiu o suor frio escorrer pelas costas.

Celeste sentiu uma sensação desconcertante, como se fosse uma criança tentando aprender a falar. Os adultos ao seu redor, impacientes e ansiosos, esperavam que ela dissesse a coisa certa, mas as palavras estavam faltando. Ela se sentiu perdida, como se sua mente estivesse jogando contra ela.

Uma risada nervosa escapou dos lábios dela. Não lembrava de nenhum documento, mas tinha certeza de que havia um. Era como se a memória tivesse simplesmente sumido. A ansiedade se acumulava em seu peito, e o ar parecia desaparecer. Onde diabos estavam os documentos? A vergonha tomava conta, e ela não conseguia escapar da sensação de que todos estavam esperando que ela falasse, mas ela simplesmente não conseguia.

— Podem parar com isso — Celeste disse, tentando soar mais firme, mas sua voz traía seu nervosismo. Ela achava que estavam brincando com ela. Mas Cinco, com uma calma tensa, pegou sua mão nas dele, aquecendo-a. Ele olhou para ela, os olhos cheios de uma mistura de curiosidade e preocupação. "O que está acontecendo com ela?" Ele se perguntava, sentindo algo mais profundo se formando.

— Celly… os documentos. Não estamos brincando. Você se lembra, não? — Cinco perguntou, suavizando sua voz, tentando alcançar a garota que parecia tão distante de si mesma.

Celeste engoliu em seco. Algo, uma centelha de lembrança, se acendeu em sua mente. Ela fechou os olhos, forçando sua mente a se organizar, a buscar aquilo que se escondia nas sombras de sua memória. Os documentos… sobre o que eram mesmo?

Sobre a Celeste de 1963!

— Ah, é! — Ela exclamou, como se uma pesada cortina tivesse sido retirada de seus olhos. Um alívio passou por ela, mas, ao olhar para os outros, viu que ainda estavam tensos, apreensivos.

— Lembrou? — Cinco perguntou, a voz trêmula de esperança.

— Sim, isso! — Celeste respondeu, coçando a nuca, visivelmente envergonhada. Ela odiava a sensação de estar falha, de não ser a pessoa que costumava ser. Como se sua mente, seu maior bem, tivesse decidido traí-la. "A memória… me traindo", pensou, um nó apertando seu peito. — Os documentos que pegamos com a Gestora. Em 1963.

Cinco deu um suspiro profundo de alívio, e seus ombros relaxaram. Ele agora parecia mais tranquilo, mas seus olhos ainda estavam fixos nela, preocupado. Os outros irmãos se entreolharam, sem saber o que fazer ou perguntar, como se houvesse uma indecisão no ar.

— Tudo bem — Vanya deu de ombros, tentando aliviar o clima tenso. Ela parecia perceber que estavam tratando Celeste como se fosse uma peça quebrada. Sua empatia fez com que tentasse resolver de uma forma mais leve. — Na pior das hipóteses, a gente volta no tempo e resolve.

— Ótimo! — Klaus concordou, fazendo uma careta e se jogando de volta no banco, como se já tivesse se cansado de pensar no assunto.

Mas, por dentro, Celeste ainda estava incomodada. Como pôde esquecer algo tão importante? A sensação de impotência era esmagadora. Como se algo essencial estivesse faltando em sua mente. Era como se suas memórias estivessem sendo desconectadas, como um sistema em curto-circuito. Ela odiava essa sensação de não controle.

— Legal, mas temos dois problemas — Cinco começou, percebendo que Celeste estava nervosa novamente. Ele segurou suas mãos com mais firmeza, tentando transmitir alguma calma. — Primeir-

— Ih, já começou — Klaus resmungou, se jogando para trás no banco, fazendo uma careta de tédio.

— …viagem no tempo é uma coisa muito complicada. — Cinco continuou, ignorando Klaus.

— A gente sabe. Seu trabalho é difícil pra caramba. Tá, e daí? — Diego perguntou, sarcástico, cruzando os braços. Cinco quase revirou os olhos, exasperado.

— Em segundo lugar... — Cinco prosseguiu, mantendo o foco. — Infelizmente, eu não tô mais com a maleta.

Os irmãos trocaram olhares incrédulos. Celeste franziu a testa, uma sensação de pânico começando a se formar em seu estômago. Como assim? Ela tinha certeza de que ele disse que iria pegar a maleta enquanto fugiam de Fei nos corredores, minutos antes.

— Cinco, onde tá a maleta? — Allison perguntou, levantando-se de onde estava sentada, o tom dela agora cheio de preocupação. Todos olhavam para ele, esperando uma resposta.

O silêncio entre eles se tornou pesado. Todos se entreolhavam, esperando que ele desse uma resposta. E a resposta, que parecia impossível, foi incrivelmente desanimadora.

— Eu não sei.

｢· · • • • ⛈︎ • • • · ·｣

— O que estamos fazendo aqui? — Allison resmungou, irritada e claramente exausta.

Os irmãos caminhavam juntos pelo grande parque, um cenário bonito e relaxante, mas de pouca ajuda diante da bagunça em que se encontravam. O calor era forte, mas, de certa forma, aliviava os músculos doloridos, como se a natureza tentasse suavizar um pouco a tensão no ar.

Ninguém ali sabia realmente o que fazer. Depois da sinceridade brutal de Cinco, que os havia forçado a andar para "espairecer a mente", todos estavam apenas vagando, sem rumo. Os burburinhos entre eles haviam se tornado um fardo para Cinco, que estava visivelmente impaciente com as perguntas incessantes.

— Ruminando? — Cinco respondeu com um sarcasmo quase afiado, a paciência já no limite.

Estavam perdidos no parque, sem direção alguma. Enquanto isso, Celeste tentava se afastar da memória que parecia lhe falhar. A perda dos documentos ainda martelava sua mente, mas não conseguia entender como tinha esquecido algo tão importante. Tudo bem, ela não tinha uma memória boa naturalmente. Mas nunca havia acontecido aquilo. Nunca.

— Por que todo mundo tá olhando pra gente? — Klaus perguntou, incomodado com os olhares que recebiam.

— Porque estamos com um estilo único, com roupas de frio em um calor de uns trinta graus — Celeste respondeu, sem perder a chance de soltar uma alfinetada. A ironia em sua voz fez Klaus se encolher, um pouco chateado. — Sem contar que fomos surrados e estamos todos arrebentados. Brigamos duas vezes seguidas!

— É, estamos parecendo o Village People depois de uma surra — Diego disse, roubando o chapéu de cowboy de Klaus e dando início a uma disputa silenciosa e física pelo objeto.

Mas Allison, já exausta de todo aquele clima desconfortável, não estava disposta a seguir com aquele passeio sem rumo. Ela queria resolver as coisas, e sabia que ficar ali não estava ajudando.

— Aí, beleza! — Ela resmungou, decidida. — Eu tenho que achar a Claire. Depois eu falo com vocês.

Ela se afastou, mas Vanya a deteve antes que fosse longe demais. Allison a olhou, ainda impaciente, mas também ansiosa para resolver as coisas com Claire.

— Ei, Allison, não — Vanya pediu, com calma, mas com um tom que a fez parar. — Primeiro vamos achar um lugar seguro, cuidar desses machucados e depois a gente vai atrás dela… — Sua voz foi diminuindo à medida que ela apontava para uma enorme placa de propaganda sobre um prédio, com os rostos de cada um dos Sparrows estampados ali, como se fossem estrelas de um show. O impacto foi imediato. O ar ficou denso de frustração.

"Eles são melhores em tudo", Celeste pensou, invejosa. "Nunca estivemos em uma placa desse tamanho. Quem sabe no começo... mas… eles são tão unidos…"

— Nossa, eu odeio esses caras — Luther murmurou, a inveja clara em sua voz. Todos os Umbrellas pareciam sentir o peso daquela comparação. Eles nunca tinham tido aquilo, na sua vez.

— Não odeia a loirinha, né? — Celeste perguntou com um tom irônico, dando um tapinha no ombro de Luther. Ele coçou a nuca, visivelmente envergonhado. Ela podia ver até a ponta das suas orelhas corando, mas ele não cedeu.

— Eles são idiotas e presun... — Luther tentou xingar, mas a palavra não saía. Ele não conseguia falar sem se lembrar de Sloane, mesmo com a impressão de que os outros Sparrows eram, na melhor das hipóteses, uma dor de cabeça.

— Você consegue — Klaus incentivou, com um sorriso debochado.

— Presun...

— Isso, você consegue — Klaus continuou, sussurrando como se fosse uma mantra.

— São presun... pre... presunção.

— Continua tentando, grandalhão — Klaus provocou, dando tapinhas no ombro dele. Celeste bufou, irritada. O tempo estava passando e ela sentia uma ansiedade crescente. Precisava se distrair de algum jeito.

— Mas é sério, o que a gente tá fazendo? — Allison retomou, a pergunta ainda pendente. Ela sabia que estavam sem rumo, sem noção do que fazer a seguir. O vazio do momento estava apertando. — Não podemos continuar aqui sangrando no meio desse parque.

— Eu não sei, mas é melhor a gente se equipar logo, antes que apareçam para o segundo round — Diego comentou, sem perceber que ainda estavam completamente expostos. Celeste quase revirou os olhos. Se estivesse com a psicose, quem sabe até concordaria. Mas, depois de serem humilhados da forma como foram, Diego ainda queria revanche?

— Por que você acha que eles viriam atrás da gente? — Vanya perguntou, um pouco confusa.

— Porque esse idiota viria — Celeste respondeu, direta, com uma certeza que só ela tinha. Diego deu de ombros, como se não fosse nada demais.

— É... a gente invadiu a casa deles... — Klaus disse, tentando se justificar, enquanto Allison murmurava um "nossa casa" por baixo da respiração. — E destruímos umas antiguidades lindas e tal.

— Pois é, esses combatentes do crime supernerds não vão deixar passar — Luther acrescentou, claramente irritado.

— Mas eles venceram — Celeste argumentou, franzindo o cenho. — Por que viriam atrás da gente? Já provaram que são melhores e...

— Querida Celly, — Diego começou, com aquele tom zombeteiro que ele adorava usar. Ele colocou a mão no ombro dela, fazendo-a parar de falar e olhá-lo. — Você gosta de vencer só uma vez na vida?

— Não, mas-

— Pronto — Ele interrompeu, colocando o dedo indicador na boca dela, forçando-a a ficar quieta. — Respondi sua pergunta. — Ele fechou os olhos, como se tivesse acabado de resolver o enigma. — Eles vão querer ganhar mais e mais.

— Vamos pensar em algum lugar onde a gente possa ficar sem chamar atenção — Cinco sugeriu, já com o olhar preocupado. Claro, não pensavam apenas em se esconder; banho e comida estavam começando a se tornar uma necessidade urgente.

— Em que tipo de lugar tosco a gente não vai chamar atenção? — Diego perguntou, segundos antes de todos olharem para Klaus, que estava, como sempre, alheio ao ambiente.

Klaus, que parecia estar em outro mundo, parou de girar quando percebeu que todos o observavam. Como se tivesse ouvido a pergunta de Diego, ele parou, com um sorriso presunçoso se espalhando pelo rosto.

— Eu sei um lugar.

Primeiro capítulo da season three 🔅
Espero que essa temporada agrade vocês, bjos! Até a próxima postagem, vote e comente 💗

revisão concluída ☑️💚