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𝐂𝐇𝐀𝐏𝐓𝐄𝐑 𝐄𝐈𝐆𝐇𝐓𝐄𝐄𝐍

𝐅𝐀𝐌𝐈𝐋𝐘 𝐌𝐄𝐄𝐓𝐈𝐍𝐆

⛈︎彡𝐃𝐚𝐥𝐥𝐚𝐬, 1963, 𝐝𝐢𝐚𝐬 𝐚𝐭𝐮𝐚𝐢𝐬, 𝐜𝐨𝐧𝐬𝐮𝐥𝐚𝐝𝐨 𝐦𝐞𝐱𝐢𝐜𝐚𝐧𝐨.

— OLHA, EU TÔ COMEÇANDO A ACHAR que nosso pai tá evitando a gente — disse Cinco, observando o carro de Reggie se afastar do consulado. Sua voz era amarga, exausta. Parecia que estavam todos correndo atrás de respostas que ninguém podia dar.

— Ele não é nosso pai. Ainda — corrigiu Celeste, resmungando, irritada, com o coração ainda disparado pela descoberta na festa.

Ao lado dela, Cinco suspirou, aliviado por tê-la encontrado novamente. Não parava de se perguntar o que teria acontecido com ela enquanto o sueco o atacava. Ela estava bem? As mãos dele tremiam com a tensão. Não conseguia imaginar o que faria se não a tivesse reencontrado. Inspirou fundo e pousou a mão, com cuidado, nas costas dela. Celeste percebeu que ele estava nervoso.

Ela também estava, mas de um jeito diferente. Sentia-se traída. Cinco, por sua vez, pensava em como contaria sobre Anthony a ela, sem saber que ela já havia descoberto. Lila se aproximou, com os saltos altos nas mãos, exibindo um ar desconfiado. Cinco a olhou de soslaio, irritado. Quando estava lá em cima, sendo atacado pelos suecos, Lila escolhera salvá-lo em vez de Diego. Para ele, aquilo só confirmava as suspeitas que sempre tivera.

— Pessoal, odeio bancar a chata, mas tá na hora da gente cair fora — resmungou Lila, olhando ao redor com apreensão, como se já estivesse a um passo de sair dali. Afinal, haviam sido atacados recentemente.

— Quando você diz "a gente", tá se referindo a quem mesmo? — perguntou Cinco, levantando uma sobrancelha com desconfiança, a voz impregnada de ironia.

— Eu acho que fui bem clara — rebateu Lila, incrédula, com uma risadinha sarcástica. Seus olhos se estreitaram enquanto encarava Cinco.

— Escuta. Eu não sei quem você é ou de onde você veio — Cinco começou, irritado. — Mas seja lá o que for, é melhor voltar pro seu buraco.

Celeste também desconfiava dela. Apesar disso, achava Lila divertida e gostava dela, mas a desconfiança pairava, escondendo qualquer simpatia naquele momento. Diego, ao lado, cruzou os braços com um suspiro desanimado. Ele também começava a suspeitar, embora relutasse em admitir.

— Ela tem razão, temos que sair daqui — disse Diego, tenso.

Celeste, vendo que Cinco estava a ponto de explodir, segurou gentilmente sua mão.

— Eu acabei de salvar a sua vida, seu pirralho de merda — argumentou Lila entre dentes, irritada com a desconfiança de Cinco. Seus olhos brilhavam com sarcasmo, e ela esboçou um sorriso irônico enquanto continuava: — Se eu não tivesse me metido, só teriam sobrado seu blazer e umas meias ensanguentadas.

— E esse é o problema — resmungou Cinco, respirando fundo e sentindo os dedos de Celeste apertarem sua mão trêmula. — Você é boa demais, faz perguntas demais, sabe demais... luta como quem sabe o que está fazendo.

Celeste lançou um olhar rápido ao redor, buscando qualquer sinal de perigo iminente. Precisavam sair logo dali, mesmo que a desconfiança fosse algo a ser resolvido. Finalmente, voltou o olhar para Lila, que parecia realmente querer ficar.

— Ele tem razão — disse Celeste, firme. Estava exausta. Queria encerrar logo aquela situação e, quem sabe, dormir um pouco. Não queria pensar mais um segundo sequer em Anthony, Thomas ou Samantha. Pobre garotinha...

— Então, só porque eu sei me defender, sou uma vilã? — provocou Lila, com uma pitada de ironia, incrédula.

— Seja quem for, tá me atrapalhando — disse Cinco entre os dentes, irritado mais do que o habitual. Deu um passo ameaçador à frente, com um olhar frio. — Se eu te ver outra vez, eu te mato.

Lila olhou para Celeste, esperando que ela a defendesse. Mas Celeste não o fez. Cinco sussurrou um "Vamos, minha querida", apertando firme a mão delicada dela e, num instante, a teleportou para longe. Ao chegar ao novo local, Celeste olhou para trás e viu Lila, ao longe, discutindo com Diego, que parecia impassível, quase triste. A preocupação por Diego tomou conta de Celeste, e ela quase se esqueceu de Anthony e do ataque dos suecos.

Ela suspirou, abatida, e baixou o olhar para a área externa do consulado. Parecia exausta. Quando levantou os olhos e encontrou o olhar preocupado e aliviado de Cinco, sentiu seus próprios olhos se encherem de lágrimas. Ele era seu porto seguro naquele momento.

— Ei… está tudo bem — disse ele, a voz levemente trêmula. Com cuidado, puxou-a para um abraço, envolvendo-a em seu peito. Suas mãos deslizaram até os cabelos ondulados dela, acariciando-os suavemente. Celeste, encostada no blazer dele, segurava o choro, mas a dor da traição transbordava. Por que Anthony fizera isso com ela? O que ela havia feito para merecer?

Abraçada a ele, lembrou-se de tantos momentos juntos: das idas ao restaurante na esquina para comemorar aniversários, das vezes que assistiam Thomas jogar beisebol no campeonato da escola, das noites em frente à televisão, e até de Samantha, que resmungava tanto que era quase cômico. Eles confiaram em Celeste para cuidar de Samantha, quem ela buscava e levava da escola todos os dias. Recordou o primeiro Natal que celebrou com alguém — uma festa que sua família sempre desprezou, que, para pessoas normais como os Blake, era um momento ótimo. Eles lhe ensinaram o que era uma vida normal, uma felicidade simples. E agora... por que haviam traído-a?

Ela já não conseguia segurar as lágrimas e soluçava baixinho, o rosto escondido nos ombros dele. Sentindo seu desespero, Cinco a apertou contra si, dando-lhe o conforto que podia. Quando ela percebeu que o choro não mudaria nada, parou, aos poucos. Cinco permaneceu quieto, esperando que ela quisesse se afastar. E, quando finalmente o fez, ele levou a mão ao rosto dela, limpando as lágrimas com o polegar. Seu olhar era intenso, como se sentisse sua dor profundamente. Ele sabia que era raro vê-la tão vulnerável.

— Você descobriu, não? — perguntou ele, baixinho, encarando-a. Celeste o olhou, confusa. Como ele sabia?

— Está falando do Tony? — perguntou ela, amarga, limpando o rosto enquanto desviava o olhar, nervosa.

Cinco hesitou, quase gaguejando, tentando escolher as palavras com cuidado, como se cada sílaba pudesse fazer o coração dela quebrar ainda mais.

— Sim, Celly. — A voz dele era pacífica, quase um sussurro. — Eu… já desconfiava dele. Quando ele se apresentou… eu já havia ouvido aquele nome.

Celeste soltou uma risada amarga, descrente, a ironia estampada em seu rosto. Era uma piada para ela, algo absurdo.

— Como você poderia? Esteve preso por trinta anos em um Apocalipse e depois foi para aquele lugar horroroso.

— Exatamente — Cinco respondeu calmamente. Celeste entendeu o que ele quis dizer. No Apocalipse, estava sozinho, mas na Comissão…? Ele estava rodeado por figuras de outras linhas do tempo. Pessoas fragmentadas das suas próprias histórias.

— Anthony… era… e-ele…

Ela lutava para acreditar, para digerir.

— Um assassino. Como eu.

Celeste sentiu as mãos tremerem. A dor parecia cada vez mais profunda, cada vez mais cruel.

— E… por que eu? — perguntou ela, com uma calma desesperadora, as sobrancelhas franzidas, os olhos confusos, quase sem esperança.

Cinco engoliu em seco. Ele estava sendo sincero, e sabia que aquilo não a confortava. Mas não poderia mentir. Ela precisava da verdade.

— Porque ele me odeia — respondeu Cinco, dando de ombros, como se quisesse evitar mais perguntas que a ferissem. Ele queria resolver tudo ele mesmo, poupá-la de mais sofrimento. — Como você descobriu? — Perguntou rapidamente, tentando desviar a atenção dela.

— A garota da empresa.

— Hm?

— Se chama Celeste — ela riu, um riso triste. — Irônico, não?

Cinco franziu o cenho, ainda mais preocupado.

— Falou com ela? — perguntou, segurando os ombros dela.

— Falei. — Celeste deu de ombros. — Na verdade… ela que falou comigo. Eu estava com Thomas uma hora... — explicava rapidamente. Cinco sentiu uma pontada de raiva pelo garoto. — ...e de repente ela me puxou. Contou que o papai pagou Anthony. Não sei pra quê — concluiu, resignada.

— Ele agiu impulsivamente. Ouvi a conversa dos majestosos no consulado quando… — ele continuou, amargo — ...quando te deixei sozinha.

— Eu não estava sozinha, eu-

— Thomas queria nos separar — interrompeu Cinco. Ele engoliu em seco, ansioso. Suavemente, deslizou a mão pelo braço dela até alcançar sua mão, que ele apertou carinhosamente. Foi então que notou uma marca no pescoço dela. — Mas que merda...

Seu rosto se contraiu em uma expressão de fúria e preocupação. Soltou a mão dela e ergueu seu rosto, examinando a marca, chocado. "Vou matar o desgraçado que fez isso", pensou. Sentia-se um péssimo namorado por tê-la deixado sozinha.

— Quem fez isso? — perguntou ele, controlando a raiva.

Celeste percebeu sua tensão e não queria piorar as coisas. A culpa não era dele; os atacantes eram homens do antigo trabalho dele, afinal. Cinco também tinha seus próprios perigos para enfrentar.

— Um dos suecos — disse ela. — Depois que falei com a garota, subi pelas escadas de emergência... queria chegar mais rápido até você e… — tentava explicar com calma, mas Cinco deu um sorriso amargo, com a raiva transparecendo no rosto. Passou a mão pela face, irritado. — ...Cinco?

— Eu vou matar aquele imbecil — ele resmungou, para si mesmo.

— Ei, se acalma aí, tá legal? — ela pediu, preocupada. Sabia o quanto Cinco era impulsivo quando o assunto era ela. Não queria que ele perdesse o foco. Eles estavam ali para impedir o Apocalipse, não para se vingar. Aquelas coisas continuariam acontecendo, ele gostando ou não. — Eu tô bem, não tô morta nem nada. Foi só um sustinho e ele também não deve estar tão bem assim. Você vai ter seu tempo de vingança, mas agora temos coisas mais importantes pra resolver, beleza?

Ele respirou fundo, desviou o olhar, tentando conter o turbilhão de emoções. Quando olhou para ela de novo, encontrou seus olhos castanhos, que lhe transmitiam tanto carinho. Ele assentiu.

— Beleza.

— Isso aí — ela sorriu, orgulhosa.

Ele tinha essa habilidade rara. Dois minutos antes, Celeste se afogava na dor da traição de quem confiara por seis anos. Agora, aquilo parecia insignificante ao lado dele. Cinco tinha esse dom. O dom de tornar os dias dela melhores.

｢· · • • • ⛈︎ • • • · ·｣

Mais tarde, ao chegarem, Celeste manteve-se em silêncio, absorta em seus pensamentos. Encontraram Luther e Elliot desmaiados, provavelmente desacordados de tanto rir. O gás do riso estava praticamente vazio, e logo entenderam que eles se drogaram com aquilo até desmaiar. Não houve tempo para conversar com Luther; Diego e Cinco o arrastaram até o sofá para que descansasse. Celeste, ainda atordoada pelos eventos da festa, foi para o quarto antes de Cinco, que ficou discutindo com Diego e resmungando para Elliot, visivelmente incomodado com o que haviam descoberto.

Na cama, Celeste chorou em silêncio, soluçando no travesseiro. Não queria que ninguém percebesse sua vulnerabilidade. Ela adormeceu entre lágrimas, se culpando por ser tão ingênua, tão cega.

Na manhã seguinte, acordou aninhada nos braços de Cinco e ficou imediatamente preocupada. "Ele deve ter visto o travesseiro molhado pelo meu choro patético", pensou. Mas, no fundo, sentia gratidão. Acordar assim, acolhida por ele, tornava aquele despertar menos amargo. Com cuidado, tentou se soltar para que ele não acordasse, mas Cinco despertou num pulo, assustado, encontrando-a diante de si com o rosto inchado de sono e os cabelos em desordem. Ele também não estava muito diferente, com os cabelos bagunçados e, surpreendentemente, sem nenhum vestígio de baba no rosto.

— Bom dia — disse ele, forçando um sorriso, mas a careta que fez ao encarar o sol vindo da janela o traiu. Passou a mão no rosto, ainda cansado. Celeste abaixou os olhos, murmurando.

— Não queria ter acordado você.

— Está tudo bem. — Ele deu de ombros. Ela tentou sair da cama, rolando por cima dele, mas Cinco a puxou de volta, prendendo-a com os braços ao redor de sua cintura, fazendo-a se recostar no lado esquerdo da cama. — Onde pensa que vai? — perguntou, com um sorriso malicioso, ainda sonolento. Ele se aconchegou na curva do pescoço dela, quase cedendo ao sono de novo, sentindo o conforto daquele abraço.

— Lavar o rosto e tomar banho — respondeu. "Francamente!", pensou. Mas resmungou ao sentir os beijos dele em seu pescoço, e, num instante, o mau humor matinal desapareceu. Aqueles beijos delicados a faziam sorrir de orelha a orelha. — Ei! — protestou, rindo. Quando os beijos desceram para sua clavícula, ela ficou paralisada. — O que pensa que está fazendo?

— Te beijando — ele deu de ombros, e Celeste pôde sentir o sorriso dele contra sua pele.

Ele se deitou sobre ela, e Celeste ficou imóvel, a boca entreaberta, sem conseguir falar nada. Estava simplesmente perplexa. E estava gostando muito daquela atenção repentina. Ele afastou suas pernas com o joelho, posicionando-se gentilmente entre elas, e voltou a beijar sua clavícula com carinho. Eram beijos puros, ternos, que faziam com que ela se sentisse frágil, como porcelana.

— Bom dia — repetiu ele. Dessa vez, parou de beijá-la e a olhou nos olhos. "Perfeito. Sem mau humor", pensou Cinco, satisfeito. Ela revirou os olhos, sabendo que ele estava se sentindo convencido. "E com razão", admitiu a si mesma. Quase sorria feito boba, incapaz de entender como ele conseguia deixá-la assim. Ela o empurrou, ainda sorrindo.

— Ok, vá se arrumar — ordenou. Ele suspirou e se jogou na cama, preguiçoso.

Minutos depois, os dois saíram do quarto. Ele, já trocado, e ela, com banho tomado. Conversavam animadamente, até que Celeste se deparou com Luther e lembrou que as coisas não tinham terminado bem entre eles. Ainda havia um clima tenso, embora os dois tivessem vontade de se desculpar. A ausência de suas famílias por tanto tempo — especialmente para Luther — fazia com que percebessem que, no fundo, não se odiavam.

Celeste se jogou numa cadeira da cozinha, ainda sonolenta, enquanto Luther cozinhava ovos. Ele, surpreendentemente, ofereceu-se para preparar um para ela também. Ela aceitou e começou a passar manteiga no pão caseiro, com gestos lentos. Diego, no batente da porta, já iniciava uma discussão, esbravejando para todos os lados. De certa forma, aquele caos era quase acolhedor: Luther cozinhando, Cinco encostado no balcão e Diego no batente, resmungando.

— Não, não, não. Eu não tô entendendo — disse Diego, irritado. — Eles ficam me seguindo.

— Pera aí — Luther interrompeu, confuso, querendo saber de quem ele falava.

— Os sociopatas holandeses.

— São suecos, Diego — corrigiu Celeste, levantando uma sobrancelha com um tom sarcástico.

— Assassinos pagos para nos erradicar, e para que a linha do tempo não piore ainda mais — Cinco explicou para Luther, que franziu a testa, preocupado.

— Mas por que agora? Eu fiquei ótimo... — Diego fez questão de dar ênfase ao "ótimo", estalando os dedos — ...durante três meses. Até você aparecer.

— É. Eu fiquei um ano aqui e ninguém se meteu comigo — acrescentou Luther, dando de ombros. Quando terminou os ovos, colocou a frigideira na mesa. Celeste rapidamente pegou uma colher para colocar um pouco em seu pão, e deu uma mordida com fome, satisfeita.

— Tenho que concordar — murmurou ela, a boca cheia de pão com ovo. Cinco bufou, resignado. No fundo, sabia que eles estavam certos, ainda que não quisesse admitir.

— Mesmo que fosse culpa minha, o que não é — enfatizou, com um tom de reclamação —, só temos seis dias até o fim do mundo, e o mais próximo que chegamos do papai foi naquela festa, na entrada do consulado.

— Olha... — começou Luther, olhando para Cinco, hesitante. Havia um brilho de tristeza em seus olhos, e Celeste, observando ao lado dele, notava o quanto ele estava tentando esconder a dor de ser ridicularizado. — ...não é bem assim.

Os outros três voltaram suas atenções para o loiro. Celeste, ainda mastigando o pão com ovo, ergueu uma sobrancelha, desconfiada.

— Como assim? — Cinco perguntou, pegando a xícara de café e se inclinando, curioso.

Luther hesitou, engolindo a comida com dificuldade, quase como se precisasse de coragem. Trocou olhares com os outros antes de finalmente dizer:

— Eu fui vê-lo.

Luther então relatou sua história. Quando chegou a Dallas, havia decidido procurar o pai, apenas para ser humilhado por ele, que não se importou com seu estado lamentável. Sem dinheiro, sem banho há dias, ele gastou tudo o que tinha para encontrá-lo, mas acabou sendo rejeitado em público, em meio a uma festa. E, segundo Luther, aquilo nem foi o pior. "Tá brincando? Foi bem pior quando ele praticamente me ameaçou de morte", resmungou.

Ele então mencionou uma garota, da idade física de Celeste, que chamou sua atenção. Naquela festa, desesperado por encontrar seus irmãos, a viu e, por um instante, sua angústia aliviou. Mas, quando correu na direção dela, acreditando que tinha encontrado um rosto familiar, Reginald surgiu, furioso, expulsando-o do local. Luther disse que o pai parecia extremamente protetor com a garota, que carregava um gato preto nos braços.

— Foi a coisa mais estranha que já vi. O papai parecia... cuidar dela. Mesmo odiando crianças e muito menos gatos — Luther concluiu, e tanto Celeste quanto Cinco trocaram olhares de desconfiança. Era óbvio que falavam da "outra Celeste". — O pior é que... eu achei que fosse você — continuou Luther, abatido. — Fui até ela, feliz, abri os braços esperando uma recepção, e em troca levei um chute... daqueles — desabafou, fazendo uma careta de dor. — E... depois, um soco. Ela sabia se defender, com certeza.

— Toda essa história de humilhação foi patética — Diego comentou, mordaz.

— É, foi uma merda mesmo — Celeste concordou, surpresa com a crueldade do pai.

— Ao menos ele não me esfaqueou — retrucou Luther, olhando para Diego.

— Não, cara. Ele partiu seu coração.

Luther deu de ombros, aceitando que, ao menos, não tinha sofrido uma humilhação física. Voltou a comer os ovos mexidos, concentrado. Celeste terminou seu pão e foi até a bancada para encher sua xícara de café. Naquele instante, Elliot, que vinha do corredor em direção à sala e, inevitavelmente, passava pela cozinha, notou algo.

— Esse é o meu roupão? — perguntou, fitando Luther. Não parecia querer ser confrontador, afinal, Luther era... intimidador, no mínimo.

— Não — Luther respondeu com a boca cheia. Era óbvio que usava o roupão de Elliot, mas ele tentou fingir que não se importava.

Celeste, com a xícara de café nos lábios, quase se engasgou, sorrindo. "Elliot tem medo do Luther", pensou, divertindo-se. Apesar de Luther ser fisicamente imponente, Celeste sabia que, na maior parte do tempo, ele era quase gentil. Cinco, ao seu lado, acariciou-lhe a nuca, mexendo nos fios de cabelo que escapavam do rabo de cavalo.

— Celly, você encontrou uma garota na noite em que fomos à empresa, não? — Diego perguntou, confuso, como se só agora estivesse ligando os pontos.

— Ah, sim — respondeu ela, ácida. — Celeste, o nome dela. Nosso pai é bem criativo, não é?

— Como sabe que o nome dela é esse?

Celeste congelou por um momento. Diego podia ser realmente lerdo. Respirou fundo, segurando a vontade de ser ainda mais sarcástica.

— Eu literalmente falei que encontrei alguém igual a mim — disse, enfatizando o "igual" com uma calma forçada. Mesmo assim, Diego não parecia convencido. — Falei com ela ontem no Consulado.

— E o que ela disse? Que vocês são gêmeas perdidas? — ironizou Diego, como se aquilo fosse motivo de riso. "Era pra ele estar preocupado, isso sim!", pensou Celeste, irritada.

— Disse que a família que eu confiava era uma farsa, que nunca se importaram de verdade comigo. — Ela respondeu séria, a voz carregada de mágoa, quase mordendo Diego com o olhar. Detestava quando ele fazia tantas perguntas.

— Não tem ninguém nessa cozinha que não esteja completamente ferrado? — perguntou Diego, com uma expressão cínica.

— Acho que não — Cinco deu de ombros.

— Eu não! Me sinto ótimo e tranquilo — Elliot gritou da sala, ouvindo a conversa.

— Você não está na cozinha, Elliot — Cinco o lembrou, cortando-o. — Enfim, nada disso importa. Ele sabe alguma coisa sobre viagem no tempo.

— E por que você não faz o seu lance e viaja no tempo de volta? — Elliot perguntou, entrando novamente na cozinha, como se tentasse entender uma questão que não lhe saía da cabeça. Era claro que ainda não compreendia as complicações da viagem no tempo.

— Alguém pode explicar? — Cinco perguntou, de forma amigável, enquanto enchia novamente sua xícara. Celeste, ao lado, suspirou e voltou a se sentar, já cansada de toda aquela discussão.

— Da primeira vez que ele tentou, se perdeu no apocalipse — explicou Luther, resumidamente.

— Na segunda, ficou preso nessa idade — acrescentou Diego.

— E da última vez que tentei, espalhei minha família por diferentes anos em Dallas — completou Cinco, dando de ombros com um ar resignado.

Celeste, de volta à mesa, bufou.

— Sem contar a inconsistência de sempre — resmungou. Cinco, adivinhando a frustração dela, suspirou. — Primeiro, foram trinta anos para ele, quinze para a gente. Dessa vez, ele nem esperou nada: avançou rápido demais e depois teve que voltar. Eu esperei seis anos, Luther um pouco mais de um, e Diego, sortudo — ela ergueu as sobrancelhas, invejosa —, apenas dois meses.

— E mesmo assim foi o suficiente para ele ser internado num manicômio — Cinco apontou, exasperado, passando a mão pelo rosto. Diego resmungou, aborrecido. "Vocês nunca vão esquecer, não é?!".

— Não me surpreende — comentou Luther, baixinho, e Diego quase revirou os olhos.

— É, e tudo isso provavelmente desencadeou o fim do mundo — concluiu Cinco, levando a xícara à boca. Elliot fez uma careta. — Mais alguma pergunta, Elliot?

— Não... nenhuma — ele respondeu, com um sorriso amarelo.

— Vocês estão ignorando o contexto — Diego interveio. — Nosso pai é o líder de um complô sinistro que quer matar o presidente.

— Um complô? — Luther perguntou, confuso, ainda tentando se situar nos acontecimentos.

— Ignora ele — Celeste sugeriu, tomando outro gole de café. Luther deu de ombros.

— Olha, na minha opinião, só temos uma opção — Cinco disse, afastando-se da bancada e se aproximando de Celeste.

— Ah, é? E qual é? — perguntou Diego, endireitando-se na cadeira, curioso.

— Está na hora de reunir a Umbrella Academy — respondeu Cinco. Luther resmungou, irritado, enquanto Celeste suspirava, já sabendo onde aquilo daria. Diego murmurou um "Que ótimo, reunião de família", com o mesmo tom de reclamação.

— Alguém pode buscar a Allison? — perguntou Luther. Diego e Celeste franziram o cenho, curiosos. "Qual o problema dele com a Allison?", ela pensou.

— Por que você não pode? — ela perguntou, estreitando os olhos.

— Ainda se curtem? — Diego perguntou, com um sorriso malicioso. — Temos que conversar?

Luther, amargo, comeu outro pedaço de comida, como se mastigasse as lembranças ruins.

— Não. Ela se casou — respondeu, frio. Celeste quase se afogou com o café, tossindo surpresa. "Ela se casou?!". Diego ergueu as sobrancelhas, espantado, mas Cinco apenas observou, sem reação, como se o detalhe fizesse parte da vida de todos, inevitavelmente.

— Nossa — Diego murmurou, perplexo.

— Não esperava por isso — resmungou Celeste, ainda se recuperando.

Um pensamento cruzou sua mente: e se Cinco tivesse voltado do futuro casado? Durante os quinze anos de ausência, ela manteve a esperança de que ele voltaria, de que valeria a pena esperar. E quando, enfim, ele retornou, foi como um alívio imenso, uma confirmação de que ela não estava errada. Estavam juntos de novo.

— É difícil — Diego disse, em apoio a Luther.

— Eu vou superar.

— Eu e Celly podemos buscá-la — Cinco interveio. Celeste resmungou, sem vontade de sair dali, mas aceitou. — Luther, consegue pegar a Vanya sem matar ela no caminho?

— Vou tentar — Luther respondeu, revirando os olhos.

— Beleza, vamos nessa — disse Celeste, suspirando enquanto se levantava da mesa.

Cinco já se dirigia para fora da cozinha, seguido por Diego. Quando Celeste ia acompanhá-los, Luther a chamou, hesitante.

— Celly.

Ela se virou, curiosa. Agora, apenas os dois estavam na cozinha, e ao longe se ouviam os resmungos de Cinco para Diego.

— Hm? — ela perguntou, parando no batente da porta.

— E-eu... — ele murmurou, claramente desconfortável, buscando as palavras certas. — Sinto muito. Pela última semana, sabe? Pelo… lance no seu pescoço e toda aquela idiotice.

Ele falava baixo, mas a sinceridade em sua voz era clara.

— Tudo bem — disse ela, com um leve encolher de ombros.

— Não, não estava tudo bem — ele retrucou, sério. Levantou-se, imponente, quase quarenta centímetros acima dela, e estreitou os olhos, tentando ser o mais honesto possível. — Acho que... eu estava frustrado, entende?

— Celly! Vamos! — Cinco gritou das escadas, apressado.

— Ela já vai! — Luther gritou de volta, e depois pôs a mão no ombro dela. — Acho que esperei tanto que você voltasse... que, quando demorou, achei que você não quisesse. E aí... descontei minha frustração em você. Eu... sinto muito, Celly. De verdade. — Ele suspirou e tirou a mão do ombro dela. — Você estava certa. Como sempre.

— Tá tudo bem. Eu peguei no seu pé, também. Nós dois erramos, não é? — Ela sorriu. — As pessoas sempre têm tempo para melhorar. Eu te desculpo. — Deu de ombros. — E espero que me perdoe pela rajada elétrica.

— Não posso te culpar. Foi legítima defesa — ele sorriu, com um toque de humor, e ambos saíram da cozinha, deixando para trás o peso daquele momento.

｢· · • • • ⛈︎ • • • · ·｣

A viagem de carro com Cinco trouxe um inesperado conforto para Celeste. Era como se tudo estivesse entrando nos eixos novamente — exceto, claro, pelo Apocalipse iminente, que mal sabiam como impedir. Passaram o trajeto inteiro conversando. Celeste contou a Cinco sobre o pedido de desculpas de Luther, e sentiu que aquele dia, apesar de comum, estava se revelando especial: acordara com o carinho de Cinco, recebera o perdão de Luther, e agora, estava a caminho de encontrar Allison em sua casa. Quanto a Klaus? Bem, nenhum deles fazia ideia de onde ele estava ou o que aprontava. Nem Cinco conseguira localizá-lo, e acabaram por decidir que ele ficaria bem, embora Celeste achasse que estavam o deixando de fora.

— Deve estar com saudades dela — Cinco comentou, parando o carro e desligando o motor. Olhou para Celeste, que parecia pensativa, com um sorriso suave nos lábios.

— Sim, estou — respondeu, deixando o olhar perdido por um instante. — Quase posso ouvir ela falando sobre... — Celeste sorriu, como se a lembrança não precisasse de explicação. Cinco franziu o cenho, curioso.

— Sobre o quê?

— Sobre nós dois, claro. — Ela sorriu, como se fosse a coisa mais óbvia do mundo. Cinco não perdeu tempo; antes que ela pudesse abrir a porta, se teleportou para fora e, em um instante, abriu a porta para ela, galante. — Cavalheiro. — Celeste fez uma careta divertida, sorrindo com orgulho.

Quando ela saiu do carro, os dois ficaram em frente à casa: simples, igual às outras da vizinhança. Mas algo naquela simplicidade parecia indicar uma morada cheia de memórias. Celeste sorriu, contente pela irmã, que havia encontrado uma família, de um jeito ou de outro. A lembrança de Claire, deixada no Apocalipse, surgiu, fazendo o coração apertar. Como Allison estaria se sentindo? Celeste ficou ali, refletindo por um instante, até sentir os dedos de Cinco pousarem em suas costas, guiando-a para frente, com um toque suave e carinhoso.

— Esperei a vida toda por um motivo para voltar para eles — ela murmurou, parando para olhá-lo com sinceridade. Cinco a escutava em silêncio, mas com atenção. — Só quando papai morreu, consegui desculpa para voltar para casa.

Ele sentia o peso daquelas palavras, respeitando cada nuance.

— É bom demais poder voltar sem precisar de um motivo. Espero que ela esteja bem. Seja quem for o sortudo, deve ser um homem bom. — Celeste disse, olhando para ele. Cinco sorriu ao lado dela, irônico.

— Sortudo, é? — brincou. Ele até concordava com Celeste, mas se sentia mais afortunado que o marido de Allison, fosse quem fosse. Afinal, ele tinha Celeste, que o amava de um jeito que ele nem sabia que merecia. — Se ele é sortudo, eu sou o quê?

— Não sei, o que acha?

— O homem mais rico do universo. — Ele respondeu sem hesitar, e com total sinceridade. Puxou-a para perto e beijou sua testa com carinho, as mãos segurando seu rosto com afeto. E naquele toque, Celeste sentiu-se intensamente amada, mas a felicidade foi ofuscada por uma preocupação repentina.

— Ah, não! — resmungou Celeste, com um tom de tristeza. Olhou para Cinco, que a fitava, preocupado e ligeiramente confuso. "Será que ela não gostou do beijo?", ele se perguntou, apreensivo, e se afastou um pouco. — Eles são racistas em 63! E... bem, também eram em 2019. — Ela fez uma careta de desgosto. Sabia que Allison havia sofrido com o preconceito em 2019, mesmo que seu poder de influência a tivesse ajudado a lidar com aquilo. Ainda assim, a preocupação pesava em seu peito. Existiam restaurantes, lojas, lugares inteiros que, naquela época, eram apenas para brancos. E Allison, provavelmente, enfrentava tudo isso de cabeça erguida, como sempre. Os protestos estavam crescendo com a chegada de Kennedy, mas Celeste sabia que eram violentos, perigosos. Sentiu o estômago revirar de repulsa ao imaginar o que Allison poderia estar passando só por causa da cor de sua pele. — Mas, querendo ou não, muita coisa mudou de lá pra cá. Deus... eu realmente espero que ela esteja bem. — Celeste sussurrou, preocupada.

Cinco soltou um suspiro, sereno. Allison era forte, sabia disso. E Celeste precisava confiar.

— Ela está bem, Celly. — Cinco afirmou com firmeza, dando ênfase em cada palavra. Ele sabia que Allison era capaz de resistir a qualquer coisa.

— É... Vamos descobrir agora, não é? — disse Celeste, forçando um sorriso preocupado. Então, os dois finalmente avançaram pelo gramado.

Atravessaram o jardim e subiram os pequenos degraus da varanda. Celeste não hesitou: ergueu a mão e bateu à porta, com o coração acelerado, ansiosa para que Allison estivesse em casa.

Logo ouviram vozes familiares se aproximando do outro lado. Risos e uma conversa descontraída — algo que Celeste não ouvia há anos. Reconheceu imediatamente as vozes: era Allison e Klaus, rindo juntos.

Celeste franziu o cenho. Como Klaus estava com Allison? E como não souberam de nada disso? A confusão não durou muito. A porta se abriu, revelando Allison, de cabelos alisados, pretos e com uma franja leve.

— …e desse jeito eles não vão mais… — Allison falava, divertida, até que parou, perplexa ao se deparar com Celeste e Cinco. Não os via havia quase três anos. Seu rosto se iluminou com um sorriso enorme e escandaloso, antes de gritar: — AI MEU DEUS!

— ALLIE! — gritou Celeste em resposta, sem conseguir conter a emoção. As duas se abraçaram com uma intensidade que só quem viveu aquela saudade entenderia. Ver Allison falando tão bem, mesmo depois de ter tido a garganta cortada por Vanya, era um alívio imenso para Celeste. Ela nem sequer pensara no fato de Allison poder voltar a falar daquela forma.

Allison, mais alta e mais forte, puxou Celeste para um abraço apertado, girando-a no ar enquanto gargalhava.

— A-HA! EU NÃO ESPERAVA VER VOCÊ AQUI!

Assim que Celeste foi colocada de volta no chão, uma nova figura surgiu. Klaus, com seu estilo despojado e cabelos longos até a metade do pescoço, chegou com um olhar curioso ao ouvir a gritaria na porta. Ao perceber Celeste e Cinco, ele sorriu, entendendo a situação.

— Então os dois pequeninos decidiram aparecer, hein?

Celeste nem pensou duas vezes. Saltou em Klaus, envolvendo-o em um abraço apertado. Porém, ao sentir o forte cheiro de bebida, ela se afastou rapidamente.

— O que você andou fazendo, hein? — ela perguntou, com um olhar que alternava entre carinho e reprovação. O tom de sermão apareceu tão rápido quanto o de reencontro, mesmo que, vindo dela, soasse até um pouco hipócrita. Cinco observava a cena de longe, com as mãos nos bolsos e um sorriso discreto.

— Estava largado às traças — respondeu Klaus com um ar de falsa tristeza.

Celeste não entendeu direito, mas, mesmo assim, Allison os convidou para entrar. Não hesitaram. Tudo foi muito rápido. A casa tinha um ar acolhedor, completamente. Um homem negro, alto, de aparência bondosa, veio cumprimentá-los. Allison parecia ligeiramente envergonhada pela situação. Afinal, seu marido, Ray, estava aos poucos descobrindo que ela tinha mais seis irmãos adotivos. Era muita coisa para ele processar de uma vez.

Celeste e Ray rapidamente se conectaram, começando uma conversa animada sobre literatura. De repente, ele se tornou uma de suas pessoas favoritas para discutir livros. Ele era realmente muito inteligente. Mas, infelizmente, o clima descontraído foi interrompido. Cinco explicou que precisavam voltar para uma reunião de família. Allison e Klaus aceitaram sem resistência, e, durante a viagem, Cinco mencionou que o Apocalipse estava próximo. Klaus provavelmente teria prestado atenção se não estivesse envolvido em um papo divertido com Celeste. Só Allison compreendeu a gravidade do que ele disse.

A viagem de volta foi tão agradável quanto a ida. Klaus fazia piadas sobre ser adorado pela sua "religião patética" — que até ele considerava uma piada —, Allison contava sobre Ray e como se conheceram, Cinco descrevia sua chegada recente, e Celeste falava sobre os anos que viveu ali, mas sem entrar em detalhes sobre os Blakes.

Quando chegaram à loja de eletrônicos, estavam todos tagarelando, o que só aumentava a dor de cabeça de Cinco. Klaus especialmente parecia contribuir para seu mau humor. Ainda assim, aquele reencontro, com todas as bobagens de Klaus, era reconfortante.

O burburinho na entrada chamou a atenção dos que estavam na loja. Diego, Vanya, Luther e Elliot, que esperavam no mezanino, vieram correndo para ver o que estava acontecendo. As piadas e as risadas de Klaus ecoavam pela loja. Celeste e Cinco continuaram em uma conversa entre eles; ela dizendo que estava feliz em tê-los encontrado, e ele, certo de que conseguiriam salvar o mundo — e não teriam mais que fazer isso novamente.

Quando Klaus avistou os outros no andar de cima, tirou os óculos de sol de forma exagerada. Vanya e Luther se entreolharam com sorrisos. Vanya, que ainda mal sabia que tinha uma outra irmã além de Celeste, olhava curiosa. Ela conhecia alguns detalhes, mas não os mais significativos. Celeste sentiu uma pontinha de tristeza e ansiedade. O que teria que fazer para reconquistar a confiança de Vanya?

— Ah, olha só... — murmurou Klaus, incrédulo, um sorriso surgindo enquanto olhava para os outros. — Eu sei que é impossível, mas todos nós ficamos mais gatos...

— Vanya... — murmurou Allison ao ver a irmã, com a emoção do reencontro transparecendo em seu olhar.

— Não acredito que tenho outra irmã! — sorriu Vanya, feliz. Ela não hesitou, descendo as escadas correndo e se jogando nos braços de Allison, como se uma conexão invisível já existisse entre as duas. Allison a abraçou com tanta força que quase parecia querer protegê-la de todo o sofrimento.

O murmúrio de vozes cresceu ao redor. Vanya e Allison riam enquanto conversavam; Luther e Diego trocavam resmungos; Klaus estava ocupado abraçando todos de maneira escandalosa; e Elliot observava tudo, envergonhado. Pela primeira vez em muito tempo, todos pareciam realmente bem.

Cinco, por outro lado, puxou Celeste pela mão, visivelmente paciente com ela, mas impaciente com o tempo que estavam perdendo em meio às conversas. O apocalipse estava se aproximando, e era essencial que a família fosse informada. Ele parou nas escadas, olhando para Klaus e arqueando uma sobrancelha com desconfiança.

— Klaus, o Ben tá aqui?

— É... não. — Klaus resmungou, desviando o olhar e fazendo uma expressão de tristeza exagerada, batendo as mãos no peito num gesto dramático. Celeste franziu o cenho, segurando o riso. "Ele é péssimo mentindo, misericórdia", pensou. — Infelizmente, fantasmas não viajam no tempo — concluiu ele. Ben, em sua forma espectral, bufou indignado ao lado, erguendo os braços em protesto com a mentira do Número Quatro. "Tá de sacanagem?!", resmungou ele, irritado. Mas nenhum dos irmãos pôde vê-lo para contestar Klaus.

— Tá legal, então. Vamos começar de uma vez — disse Cinco, apressado, subindo as escadas enquanto guiava Celeste com delicadeza, enquanto os outros finalmente deixavam a dispersão e o seguiam até o mezanino.

Assim que chegaram ao topo, Celeste soltou a mão de Cinco, observando os irmãos se acomodarem nas poltronas e sofás ao redor. Quando Klaus passou por ela, Celeste segurou a manga de sua camisa, barrando-o.

— Você mente muito mal. — Ela sussurrou, divertida. Klaus fez uma careta, jogando os ombros para trás em descaso.

— É só pra irritar ele — respondeu Klaus, traquinamente.

Enquanto isso, do outro lado, onde só Klaus conseguia ver, Ben tentava dar um tapinha no ombro de Celeste, mas, como sempre, sua mão atravessava o ar sem efeito, naquela maldita forma de fantasma.

— Que foi? Por que você tá tentando tocar nela? Você é burro? — reclamou Klaus, revirando os olhos. — Vai, deixa ela em paz.

— Deixar ela em paz? — retrucou Ben, irritado. Celeste só via Klaus falando com o nada, confusa. — Você é quem tem que me deixar em paz! É uma merda ter que te seguir até o fim. Você é um saco!

— Ah, é? Pois agora vou contar pra todo mundo o seu segredinho do dia sete.

Ben tentou avançar para cima dele, mandando-o calar a boca, enquanto Klaus gargalhava divertido, e Celeste só faltava achar que estava maluca. Era estranho não ouvir o que Ben dizia, mas ela quase conseguia imaginar perfeitamente.

— Vocês vêm ou não, hein? — Luther reclamou, impaciente. Todos já estavam acomodados, menos eles.

— Tá, vamos lá. — Celeste pediu, soltando a camisa de Klaus e ajeitando a manga para que não ficasse amassada. Em seguida, sentou-se no braço do sofá, focada em Cinco, assim como os outros, exceto Klaus, que se dirigiu à estante de bebidas.

— Certo. Primeiro, quero pedir desculpas — começou Cinco, sincero. — Sei que eu errei feio com essa história de voltar no tempo e prender todo mundo aqui. — Ele abaixou o olhar, ouvindo o murmúrio de concordância dos irmãos. Deu uma olhada rápida para Celeste, buscando coragem, e prosseguiu: — Mas o pior de tudo é que a gente trouxe o fim do mundo junto com a gente.

— Meu Deus do céu, de novo?! — exclamou Klaus, a voz à beira do desespero momentâneo. Ao ver os olhares de pena cômica de todos sobre ele, suspirou frustrado. — Vocês já sabiam... Por que eu sempre sou o último a saber sobre o fim do mundo? — Ele resmungou, levando a mão à cabeça com preocupação repentina. — Ai, meu Deus! Minha seita vai morrer de ódio, Cinco. Eu disse que tínhamos até 2019!

— Temos até segunda. Temos seis dias — interrompeu Celeste, séria, informando-o. Klaus inclinou a cabeça para trás, soltando uma gargalhada nervosa.

— Vai ser a Vanya? — Klaus perguntou, sem rodeios, encarando-os. Allison logo o repreendeu:

— Klaus!

— O que foi, gente? Costuma sempre ser a Vanya.

— Você tem alguma pista, Cinco? — Allison perguntou, com um olhar ansioso, ajeitando-se para ouvir a resposta com expectativa.

— Tenho, sim — respondeu Cinco, enquanto pegava uma pasta de documentos. Ele a abriu e entregou para Allison, mostrando uma foto de Reginald no gramado, no dia da morte do presidente.

— Puta merda. É o papai?

— É ele? — Vanya perguntou, olhando para a imagem borrada. Tentava decifrar quem ele era, uma figura desconhecida para ela após perder as memórias do passado.

— Sim, é ele. E ele está na praça — concluiu Diego.

— Eu, Diego e Celly tentamos conversar com o papai sobre o que isso significa, mas até agora, nada — Cinco explicou aos outros, com uma ponta de frustração na voz.

— Como assim nada? Sabemos que ele está planejando matar o Kennedy! — interveio Diego, com a confiança de quem achava ter descoberto o segredo do século.

— Talvez — rebateu Celeste, séria. Ela odiava a mania de Diego de tirar conclusões precipitadas. — Isso não é 100% certo. É só um palpite, e ainda assim, não sabemos quem ou o que desencadeia o fim do mundo. A prioridade é impedir o apocalipse, certo?

— Pode ser o Kennedy ou algo totalmente independente dele — Cinco acrescentou, lançando um olhar atento para cada um dos irmãos enquanto tentava encaixar as peças em sua mente. — Alguma coisa está alterando a linha do tempo, e precisamos corrigir isso.

— Como vamos corrigir se nem sabemos o que está errado? — Allison questionou, confusa. Para todos, principalmente Celeste, aquilo soava como um enigma insolúvel. Era como reviver o caos inicial, quando Cinco voltou do futuro e anunciou que o apocalipse aconteceria em uma semana. Naquela época, só tinham uma prótese ocular, que acabou sendo inútil.

— Ah, qual é?! Faz as contas — Diego replicou, com a irritação típica de quem adora ter razão. Ele cruzou os braços e continuou: — Sabemos que o papai está em reuniões suspeitas com pessoas suspeitas. Também sabemos que ele vai estar na praça daqui a três dias, provavelmente para matar o presidente. Acho que sabemos o que temos que fazer.

— Encontrar o papai — disse Cinco, ao mesmo tempo que Diego afirmou: "Matar o papai". Celeste riu discretamente, achando tudo aquilo meio absurdo. Klaus, passando ao lado dela, sussurrou: 

— Eles são pateticamente divertidos, né? — Celeste só assentiu, sorrindo.

— Não era para nenhum de nós estarmos aqui, lembram? — Vanya falou, hesitante. Sua insegurança era visível; ela não se lembrava do passado como os outros. — E se for por nossa causa? E se alguém aqui fez algo para bagunçar a linha do tempo?

O silêncio pairou enquanto cada um refletia sobre seus próprios erros e deslizes. Celeste fez um leve bico, desconfortável. Ela sabia que havia salvado uma garota de três anos da morte, mas será que isso poderia causar algum impacto?

— O Diego tentou matar o Lee Oswald — acusou Luther, em tom superior.

— E você trabalha pro Jack Ruby! — Diego devolveu, como se trocassem golpes.

— Allison se envolveu bastante com a política local — Klaus comentou displicente, jogado na poltrona.

— E você fundou uma seita — retrucou Allison, com seu tom firme, embora com um toque de gentileza, uma marca especial dela.

— Eu sou babá numa fazenda. Não tenho absolutamente nada a ver com isso — defendeu-se Vanya, levantando as mãos em rendição.

— Nem eu. Me tirem dessa — disse Celeste, endireitando-se no braço do sofá. Afinal, apenas Cinco sabia sobre a quase-morte de Samantha, e ela tinha certeza de que ele nunca a culparia.

— Talvez você tenha, só não sabemos ainda — Allison deu de ombros, pensativa. Um assobio ecoou pela sala, e todos olharam para Diego, que tentava atrair a atenção de todos.

— Presta atenção — ele retrucou, a voz firme e alta, para garantir que todos o ouvissem, mesmo com o burburinho crescente. — Todas as nossas vidas novas estão ligadas ao Kennedy. Não pode ser coincidência. O Luther trabalha pro Ruby, a Celly ficou na casa de um psiquiatra com ligação com o governo paralelo... — Celeste franziu o cenho, visivelmente incomodada. — É, o Cinco me contou. A Allison protesta contra o governo, nosso pai vai até a praça, o Klaus tá fazendo... uma coisa bizarra... mas deve ter alguma relação. Viu? Fomos enviados pra cá por um motivo especial. Salvar John F. Kennedy.

O silêncio se fez instantaneamente. Diego esperava que alguém falasse algo, mas, antes que pudesse processar a resposta, uma discussão intensa irrompeu. Todos começaram a se acusar mutuamente. Celeste afirmava que Anthony não seria suficiente para causar o apocalipse; Klaus dizia que um grupo de fanáticos religiosos por ele não mudaria nada; Allison se defendia, dizendo que os protestos existiriam, independentemente de sua presença em 63. Cada um tentava salvar sua própria pele, e Cinco, visivelmente irritado, se sentia como se estivesse falando para o vazio.

— Galera, todos vocês morrem. — Cinco interrompeu, a voz dura, pondo fim à discussão que estava tomando proporções desnecessárias. Ele olhou para Celeste, seus olhos refletindo um medo sutil.

Ele se lembrava bem de quando tudo começou para ele, na década de 60. Aterrissou no dia do apocalipse, com tanques de guerra atravessando as ruas e manchetes dramáticas nos jornais. Seus irmãos lutavam para sobreviver enquanto ele assistia ao caos: Vanya destruindo projéteis, Klaus conjurando seus fantasmas, Ben vagando como espectro, Luther se tornando um escudo humano, Diego e Allison enfrentando os inimigos com destreza. E Celeste... Destemida, como sempre, mas com um olhar que mesclava alívio e decepção por ele ter demorado tanto. Foi quando os mísseis russos começaram a se aproximar. Era tarde demais, e ele teve que tomar a difícil decisão de deixar a época, de deixar Celeste morrer, para voltar no tempo e tentar salvar a todos.

— Isso aconteceu da última vez — Celeste murmurou, sua voz baixa, enquanto lembrava do dia em que ele voltou pela primeira vez.

— Eu estava lá, eu vi — ele completou, a dor ainda presente em suas palavras. — Eu quero esquecer, mas não dá. Eu vi os mísseis russos destruírem o mundo com vocês dentro — Ele olhou para Celeste, um olhar pesado e cheio de dor, como se cada palavra fosse um golpe. Não queria reviver aquele momento. Sentiu o coração se partir ao deixar o dia do apocalipse de 63, sabendo que ela morreria. — Em uma guerra que nunca aconteceu até a gente trazê-la pra cá. E o Hazel... Ele perdeu a vida tentando nos salvar. Então, vocês precisam calar a boca e me ouvir agora — ele suspirou, tentando controlar a frustração. — Eu não sei se tudo isso tem alguma conexão. Não sei se há algum motivo para tudo isso, mas nosso pai vai saber. Antes que isso tudo acabe, a gente precisa falar com ele, ou então com a filha dele.

— Filha dele?! — Klaus exclamou, surpreso. Allison e Vanya trocaram olhares confusos. Aquilo não fazia sentido. Ele não tinha filha em 63, não era possível. — Nós somos filhos dele! — Klaus retrucou, enfatizando bem o "nós".

— Ah, essa é uma longa história — Celeste revirou os olhos, impaciente. — Uma maluca exatamente igual a mim. Eu não sei qual é a peça que falta nesse quebra-cabeça, mas ela é filha dele. Adotiva... Eu acho.

Ela se deu conta de que não sabia muito sobre o assunto, mas sentia que era crucial. A frustração a consumia. Luther parecia preocupado de alguma forma. Todos os olhares se voltaram para ela, esperando que ela explicasse mais.

— O que foi?! Eu não sei mais do que isso! — Ela deu de ombros, levantando as mãos em rendição.

— Tá legal, tô fora — Luther finalmente disse, levantando-se da cadeira e se dirigindo para as escadas, como se estivesse pronto para ir embora.

— Você me ouviu? — Cinco perguntou, irritado.

— É, ouvi. Ouvi um velho de quarenta e cinco anos que ainda quer que o papai dele venha resolver tudo. Então não conta comigo — o loiro retrucou, com um tom áspero. Ele já havia pedido desculpas para Celeste, mas naquele momento, isso parecia irrelevante. — Tá na hora da gente crescer, galera — completou, descendo as escadas enquanto seus irmãos o chamavam pelo nome, tentando fazê-lo voltar.

Celeste achava aquilo meio cômico. Mas, de certa forma, era bom ver Luther mais maduro. Afinal, em 2019, ele poderia ser descrito exatamente como "o homem que ainda quer que o papai dele venha resolver tudo". Celeste bufou, frustrada com tanta teimosia. Precisavam se manter unidos, não era?

Cinco se teleportou rapidamente, bloqueando o caminho de Luther, parando-o a um degrau da escada. Celeste saltou do sofá e correu até o parapeito do mezanino, observando a cena com atenção. Luther o encarava, seus olhos analisando Cinco de cima a baixo com uma mistura de desdém e desafio.

— Ninguém sai até sabermos o que fazer — Cinco ordenou, sua voz firme e carregada de autoridade. O olhar de Luther se estreitou, e Celeste percebeu que ele estava pensando em uma resposta rápida, talvez até suja. Então, Luther esboçou um sorriso traiçoeiro.

Foi tudo tão rápido que Celeste mal teve tempo de reagir. Luther agarrou o blazer de Cinco e, com um movimento brutal, o jogou escada abaixo. Antes que Celeste pudesse protestar, Cinco desapareceu, teleportando-se para fora da casa. Um susto imenso percorreu seu corpo. O coração disparou, e ela ficou ali, sem palavras, sem entender muito bem o que acabara de acontecer. Olhou para Luther, sentindo a raiva crescer dentro de si.

— Você está louco?! — ela gritou, a irritação transbordando.

— Eu queria descer e ele estava me atrapalhando — Luther deu de ombros, descendo as escadas sem sequer olhar para ela. A indiferença dele a fazia perder ainda mais a paciência.

Celeste respirou fundo, tentando não perder o controle. A última coisa que queria era se envolver em uma discussão idiota naquele momento. Quando olhou para trás, viu Klaus batendo no braço do sofá, impaciente, esperando que ela voltasse para fazer companhia.

— Que família impossível — Celeste resmungou, exasperada.

Com um suspiro resignado, ela se sentou no sofá novamente, preguiçosamente, o coração ainda batendo rápido pela adrenalina. Sabia que Cinco voltaria. Pelo menos, esperava que ele não tivesse se machucado. "Tomara que ele tenha se teleportado para um lugar seguro", pensou, mas a inquietação ainda a dominava.

— Olha, eu tô morrendo de vontade de comer uns tacos, sabia? — Klaus disse, quebrando o silêncio. Celeste, com uma sensação de culpa por ter se esquecido de comer, se deu conta de que estava com fome. Era estranho como ela sempre esquecia de cuidar de si mesma. Tinha tomado só o café da manhã, com pão e ovo, e agora já passava do horário de almoço. — Vamos?

— Não querem esperar? — Allison perguntou, a sobrancelha erguida, desconfiada, referindo-se aos irmãos que haviam saído.

— Ah, vocês sabem como eles são. Pode demorar um século para fazerem as pazes — Klaus resmungou, a voz cheia de um tom manipulador. — Vanya? Uns tacos? Celly? Você deve estar com fome.

— Tem algum jeito dos tacos causarem o fim do mundo? — Vanya perguntou, e Celeste não pôde deixar de achar graça. O alívio temporário de uma piada, mesmo em meio ao caos.

— A não ser que a Rússia fique com raiva e decida nos bombardear — Celeste respondeu, sua voz carregada de sarcasmo. Afinal, o novo apocalipse estava mais relacionado aos mísseis russos do que aos tacos. Mas a piada fez a tensão diminuir, por um momento.

Allison pegou sua bolsa, Celeste colocou seu casaco, e, finalmente, os quatro saíram da sala. O ambiente estava mais leve, mas as dúvidas e o peso da missão ainda pairavam sobre todos.

｢· · • • • ⛈︎ • • • · ·｣

A tarde estava se esvaindo rapidamente. Após almoçarem tacos em um restaurante mexicano, Allison sugeriu que se embriagassem um pouco. Não demorou muito para chegarem ao salão de beleza onde ela havia trabalhado por um tempo. Ela tinha as chaves, e logo estavam dentro, transformando o lugar no refúgio perfeito para os desabafos da família.

Compraram uma boa quantidade de bebidas — vodka, tequila e whisky. Era para cada um tomar um pouco, mas Celeste logo se apoderou da primeira garrafa, já tendo bebido um quarto dela enquanto Allison desabafava sobre seus problemas matrimoniais, Vanya falava sobre sua paixonite, e Klaus despejava toda sua raiva contra a homofobia da época.

Klaus estava em pé, fumando em frente ao espelho, enquanto Vanya fazia caretas para seu reflexo, analisando as pequenas rugas em sua testa. Celeste estava jogada na cadeira de cabeleireiro, os pés estendidos sobre um banco pequeno à sua frente. Era três horas da tarde, e ela já havia ligado para Cinco, contando que estava se divertindo com os irmãos. Cinco desejou-lhe uma boa tarde e pediu que ela passasse o telefone para Allison, que teve que prometer a ele que não deixaria Celeste beber. Mas, na verdade, a promessa foi apenas da boca para fora. Não prometeria nada. Não naquele momento.

— …Será que ele não me conhece?! — Allison estava visivelmente irritada, contando sobre os problemas com Reymond. — Não, o Ray sabe exatamente quem eu sou... Ele só não sabe lidar com isso! Eu estou tentando proteger ele!

— De quê? — Klaus perguntou, confuso. Todos estavam tentando se ajudar, de alguma forma, mas ninguém parecia entender os dilemas uns dos outros. Para a felicidade de Celeste, Vanya já não estava tão irritada com ela.

— Do fim do mundo, para começar.

— O mundo vai mesmo acabar em seis dias? Vanya perguntou, preocupada, sem acreditar completamente nas palavras de Cinco.

— Da última vez que acreditamos, aconteceu — Celeste deu de ombros, pegando mais um longo gole de bebida. Estava absorta em seus pensamentos até ouvir uma pergunta constrangedora que quase fez com que engasgasse.

— Aí, não seria estranho se o Cinco crescesse e ficasse mó gato? — Klaus perguntou, erguendo uma sobrancelha. Celeste se sentiu constrangida, mas sua imaginação, já vívida, não pôde deixar de visualizar Cinco como um homem adulto, atraente. Um sorriso malicioso surgiu em seus lábios. "Ah, como eu amo imaginar", pensou. Klaus, percebendo a reação dela, continuou com a brincadeira, tentando entrar no clima da conversa. — Não ia ser estranho?

— Ah, pra mim não — ela deu de ombros, sorrindo. Afinal, eles já eram algo, não era? Mas, de algum modo, ela se sentiu ansiosa para ver como Cinco ficaria quando adulto. Mentalmente, ele já era mais de quarenta, mas fisicamente... estava preso a seus dezesseis anos.

— Parem, eca — Allison interveio, claramente desconfortável.

— "Parem, eca. Anh, eca." — Klaus imitou a voz fina da irmā, zombando dela enquanto pegava a garrafa de tequila e se aproximava de Celeste. —  "Ain, Luther era meu amante" continuou, fazendo sons de beijo, rindo da própria piada.

— Ei! Para! Se for debochar, deboche da Celeste, porque eu e Luther nunca nos beijamos! — Allison ergueu as mãos em rendição, fazendo uma careta. Mas Klaus estava longe de deixar a história para lá.

— Ah, é verdade. A Celly e o Cinco se pegaram no quartinho de limpeza do boliche, no dia do apocalipse — Klaus disse, com um sorriso traiçoeiro e malicioso. Celeste quase se engasgou com a bebida. Sua face ficou vermelha imediatamente, e Vanya e Allison sorriram de forma doce, ainda sem saberem os detalhes completos. Klaus parecia estar adorando a situação, enquanto Ben, que só ele podia ver, não conseguia se conter. Havia sido tão constrangedor ver Celeste e Cinco se beijando tão intensamente, mas a fofoca era boa demais para deixar passar, e ele apareceu ao lado de Klaus, relembrando cada detalhe.

— Klaus! — Celeste quase engasgou, sentindo suas bochechas queimarem. Vanya e Allison a olhavam com um brilho divertido nos olhos, e Celeste não podia evitar se sentir exposta. Ela odiava que Klaus fosse tão fofoqueiro. Ou melhor, odiava quando a fofoca era sobre ela.

— Ah, é? Como você sabe disso, Klaus? — Allison perguntou, maliciosa. Ela colocou as mãos na cintura, e todos voltaram a olhar para Celeste, que agora estava completamente vermelha, tanto pela bebida quanto pela atenção indesejada.

— O Ben foi bisbilhotar e contou pra mim. Bons tempos em que eu ainda o tinha como fantasma — Klaus resmungou, cruzando os braços. Celeste quase jogou o copo nele, sentindo um misto de raiva e diversão. "Idiota mentiroso", ela pensou, rindo da situação. Mas Klaus não parava por aí.

— Será que fazer sexo com ele deve ser estranho? — Klaus perguntou, olhando para Celeste com um brilho travesso nos olhos. Ela fez uma careta, querendo responder que deveria ser ótimo, mas que tipo de pergunta era aquela? Klaus, apesar de estar muito mais divertido bêbado, estava sendo levemente invasivo. — Tipo, eles cresceram juntos... Deve ser diferente. Seria considerado incesto?

— Na real, cala a boca. — Celeste resmungou, sua irritação tomando conta.

— A-ha! Aí está a Celeste envergonhada! — Klaus sorriu, com um olhar traiçoeiro. — Aquela que finge estar durona, mas, na verdade, está com o estômago embrulhado.

— Eu não estou envergonhada — Celeste mentiu, cruzando os braços de maneira desafiadora. Ela deu mais um gole na bebida, olhando para Klaus com um olhar que transbordava impaciência e uma tentativa de intimidação. Mas Klaus, sempre provocador, não deixou barato.

— É? Então, o que acha de a gente falar sobre sexo? — Ele disse, com uma voz tentadora, quase desafiadora. Celeste estreitou os olhos, sentindo um calor crescente em seu rosto. Ela já podia perceber o rubor se espalhando por suas bochechas. Klaus, com um sorriso travesso, deu um passo à frente, como se quisesse explorar os limites dela. — Cinco... sexo... beijo... amassos… transar… — ele sussurrava as palavras, brincando com ela.

Celeste já estava realmente ficando vermelha. Sentia o calor tomando conta de seu corpo, mas não queria ceder.

— Klaus! Deixa a Celly em paz! — Vanya interveio, a voz firme, tentando proteger a irmã da provocação de Klaus. Allison e Vanya estavam achando graça da situação, mas também viam a leveza que Klaus estava trazendo. Ele, por sua vez, deu de ombros, dando um passo para trás, mas não sem antes lançar um último sorriso de diversão. Caminhou de volta para onde estava Allison, deixando Celeste respirar aliviada.

— Obrigada, te devo uma — Celeste sorriu para Vanya, a gratidão genuína em seus olhos. Ela arrastou a cadeira mais perto de Vanya e jogou um pouco mais de vodka em seu copo, tentando aliviar a tensão que Klaus tinha causado.

Vanya, no entanto, parecia mais focada no que importava no momento. Ela levantou as sobrancelhas e olhou para os outros.

— Aí, dá pra gente focar?! — Vanya reclamou, irritada, como se fosse óbvio que não iam salvar o mundo naquela noite. Ela suspirou, se endireitando na cadeira. — Tá na cara que a gente não vai salvar o mundo hoje à noite, mas talvez a gente pudesse salvar o meu casamento — ela continuou, lembrando a todos da situação de seu casamento.

Allison ficou pensativa por um momento, mas logo o peso das palavras de Vanya a atingiu. Ray ainda não sabia como lidar com a verdade sobre seus poderes, e, de alguma forma, ela sabia que ele temia algo nela. Mesmo sem admitir para si mesma, o medo de perder Ray, de ele se afastar, a incomodava profundamente.

— Não! Isso é como perguntar a uma freira se ela já transou com alguém — Klaus interrompeu, fazendo uma comparação que não poderia ser mais aleatória, mas, de alguma forma, fazia sentido para ele. Ele revirou os olhos dramaticamente. Celeste soltou um suspiro exasperado, já sabendo que Klaus não ia perder a oportunidade de falar alguma bobagem. — Olha, quem nessa família tem ideia do que é um relacionamento bom? Essa daqui tá apaixonada pela fazendeira — Klaus apontou para Vanya, com um sorriso travesso e um tom acusador.

— O nome dela é Sissy — Vanya corrigiu, sua voz séria e sem humor.

— Pelo menos é melhor que o último amor, que era pelo Serial Killer — Klaus riu, e a risada soou mais sarcástica do que divertida. Celeste o fulminou com um olhar, tentando, inutilmente, frear suas palavras.

— O quê?! — Vanya se assustou, a expressão horrorizada tomando conta do seu rosto. Não se lembrava de nada do passado, e a ideia de ter se envolvido com alguém assim parecia aterradora. Klaus ignorou o espanto da irmã e continuou com seu desfile de declarações.

— Enquanto isso, eu tô caidinho por um soldado que eu tecnicamente nem conheci ainda, e o Luther... bem, o Luther tá apaixonado pela irmã — Klaus continuou, como se a situação fosse das mais comuns.

— Para! Você sabe que todos nós somos adotivos — Allison interrompeu, dando um tapa de leve nas costas de Klaus, exasperada.

— É sério? Relaxa, já falei! — Klaus pediu, rindo de leve. Mas, logo, sua expressão se tornou mais provocadora. — O relacionamento mais duradouro e saudável que essa família já viu foi o do Cinco com a Celeste, que mesmo com todo esse apocalipse e tudo mais, nunca esqueceram um do outro, blá-blá-blá! Um clichê completo — ele comentou, fazendo uma careta de desdém.

— Você já ficou com alguém? — Vanya perguntou, curiosa, e todos os olhos se voltaram para Celeste. A tensão da conversa já tinha diminuído um pouco, e as perguntas se tornavam mais descontraídas, ou pelo menos mais diretas.

Celeste sentiu o estômago embrulhar. Odiava aquele tipo de conversa, e se pudesse, fugiria dali. Afinal, quem na casa dos trinta anos ainda era virgem? Ela se sentia ridícula. Havia esperado tanto tempo por Cinco, acreditando que ele poderia voltar, que se permitiu passar anos sem viver mais nada além desse pensamento. Claro, não se arrependeria. Não com ele, especialmente agora que ele havia retornado. Mas falar abertamente sobre o fato de nunca ter sido tocada por ninguém... era algo desconfortável. Principalmente porque todos ali já haviam se entregado a essas experiências. Ela se sentia como uma santa em um campo de pecadores.

— Não... — ela respondeu, a voz baixa, quase inaudível, tentando se esconder atrás de sua vergonha.

— Pera aí! Você é virgem?! — Allison exclamou, incrédula.

— Talvez...? — Celeste deu de ombros, tentando disfarçar a vergonha que estava queimando suas bochechas. Já se sentia uma idiota, e não sabia como lidar com isso.

— Uau. Isso sim é uma bomba de verdade — Allison ironizou, e então os três estavam olhando para Celeste, como se ela fosse uma atração estranha, um segredo a ser desvendado.

— Agora descobrimos! É isso que vai causar o apocalipse! — Klaus gritou, dando uma risada irônica e se aproximando dela. Ele se sentou ao lado de Celeste e, com um tom mais sussurrante, continuou: — Mas deve ser difícil ficar sempre nesse corpo adolescente, né? Os hormônios devem te deixar maluca.

Celeste olhou para ele com um olhar mortal, desejando que ele parasse de implicar. Ele não estava ajudando em nada.

— Já aprendi a lidar com isso — ela respondeu, pegando o copo de bebida e tomando um gole para tentar aliviar a tensão. — E... não tem como sentir falta de algo que nunca experimentei...

Por um instante, ela se perdeu nos próprios pensamentos. Cinco também seria virgem? Ela se pegou sentindo uma onda de insegurança, e uma necessidade crescente de perguntar isso a ele. Mas, claro, era um assunto extremamente constrangedor. E se ele já tivesse feito algo com outra pessoa? Será que… ele já teria se envolvido com alguém? E se, depois de tudo, ele tivesse vivido outras coisas enquanto estava longe? Ela sentiu um aperto no peito ao pensar nisso.

— A verdade, é que a única coisa que a Umbrella Academy sabe sobre o amor é como destruí-lo! — Klaus continuou, levantando a garrafa de bebida para o alto como se estivesse fazendo um brinde sarcástico.

— Saúde — Celeste sorriu, e a palavra foi repetida pelos outros, acompanhada do som dos copos sendo erguidos. Todos beberam, imersos naquele momento de familiaridade e humor. A sensação de conforto, de estarem juntos ali, com o apocalipse ainda distante, trouxe um alívio que ela não sabia que precisava. Ela queria que aquele momento durasse para sempre.

— Como vocês lidam com isso? — Vanya perguntou, a voz carregada de dúvida e melancolia. Estava imersa em seus pensamentos, tentando entender como cada um dos seus irmãos lidava com o caos ao redor. Os três se viraram para ela, como se estivessem esperando a pergunta, mas sem realmente saber como responder.

— Com o que? — Allison perguntou, franziu a testa e levantou uma sobrancelha, confusa.

— Com isso tudo... Viagens no tempo, ver fantasmas, sentir as energias das coisas... e o fim do mundo... — Vanya disse, com um tom cansado, quase de quem já não sabia mais como carregar tantos fardos sozinha.

Klaus sorriu com um brilho travesso nos olhos, e, como sempre, não perdeu a chance de brincar.

— Ah, eu fico bem chapado — ele começou, com uma energia inesperada. — A Allison mente pra ela mesma — acusou, apontando para a irmã, que imediatamente empurrou um pequeno banco até ele com os pés, irritada. — A Celly tem o Cinco pra ficar se agarrando — continuou, fazendo Celeste suspirar profundamente. — E você, Vanya... você esconde suas emoções tão bem, que um dia vai explodir essa porra toda.

Vanya olhou para o chão, triste, e sua voz saiu abafada, carregada de culpa.

— Eu não queria mais ter que fazer isso...

Ela sentiu o peso daquilo, como se fosse algo que a definisse e a sufocasse. Era difícil admitir, mas estava cansada de esconder suas emoções, de reprimir seus medos.

Klaus deu de ombros, tentando aliviar um pouco a tensão.

— Bom, você tem seis dias, mocinha — disse ele, como se fosse uma resposta simples a uma situação impossível.

Allison, que até então estava absorta nos próprios pensamentos, explodiu em frustração.

— E o que nós vamos fazer com seis dias?! — perguntou, irritada, olhando para o espelho enquanto tentava ajeitar sua franja com impaciência.

Klaus, com um sorriso provocador, fez uma afirmação que fez Celeste se revirar por dentro.

— Ah, até lá a Celly vai fazer sexo — ele disse, casual, como se falasse sobre qualquer outra coisa.

Celeste bufou, o rosto queimando de irritação. "Mas que merda, ele só vai falar disso agora?", pensou, sentindo o calor da raiva subir. Sem pensar, pegou o copo descartável vazio ao seu lado e jogou nele, tentando calar suas provocações. Klaus se envolveu na brincadeira, dando uma gargalhada maliciosa, exatamente como ele queria: irritá-la e deixá-la desconfortável.

Era claro que ele estava fazendo isso só para ver a reação dela, para brincar com suas emoções. "Vou matar ele", ela pensou, tentando ignorar o embaraço crescente.

Vanya, já mais tranquila, tomou uma decisão.

— Eu vou falar pra Sissy que eu a amo — disse com convicção, sua voz carregada de uma coragem que não costumava demonstrar.

Allison sorriu, pegando a garrafa de bebida alcoólica e se levantando, com a mesma determinação.

— É isso aí, tem razão. Se tudo vai explodir, pelo menos eu vou ser sincera com o meu marido — disse, quase com uma risada amarga. Ela se aproximou de Klaus, que estava fazendo uma careta. Ele se sentiu desconfortável com a ideia, mas a suavidade do momento se impôs.

— Ah... isso quer dizer que eu vou ter que contar pra seita... Eu odeio terminar em grupo — Klaus falou, com um tom de desgosto, como se realmente fosse a pior parte de toda a situação. — É por isso que eu parei de namorar gêmeos...

Celeste franziu o cenho instantaneamente, surpresa e um tanto escandalizada. Ela nunca pararia de se chocar com as histórias de Klaus. Ele realmente não tinha limites. Mas, ao mesmo tempo, não podia deixar de sorrir um pouco, pensando em como ele era único.

O silêncio pairou por alguns segundos, até que Vanya, com um sorriso mais leve, olhou para todos eles e disse, com um tom de orgulho, como se estivesse refletindo sobre a própria família.

— Essa família é incrível — ela concluiu, erguendo os braços em um gesto espontâneo, quase brincalhão. Aquelas palavras soaram como um abraço.

Os outros três se olharam e, em uníssono, caíram na gargalhada.

— Claro que é — Klaus disse, indo até Allison e a abraçando com força. — Vem cá, Vanya. Vem cá, Celly.

As duas se levantaram rapidamente e correram até ele, se juntando ao abraço coletivo. Naquele momento, os quatro estavam unidos, como qualquer família verdadeira deveria estar. Era um lar, uma proteção silenciosa em meio a toda aquela loucura.

E, por mais que o mundo ao redor estivesse prestes a desmoronar, aquele instante, aquela conexão, era tudo o que importava. E, ao mesmo tempo, era incrivelmente frustrante saber que tudo aquilo poderia acabar em seis dias.

Esse capítulo não focou tanto na Celly e no Cinco, mas os próximos vão compensar (se tudo sair como planejado KKKK)

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revisão concluída ☑️💚