Chào các bạn! Vì nhiều lý do từ nay Truyen2U chính thức đổi tên là Truyen247.Pro. Mong các bạn tiếp tục ủng hộ truy cập tên miền mới này nhé! Mãi yêu... ♥

𝐂𝐀𝐏𝐈𝐓𝐔𝐋𝐎 (𝟎𝟎𝟗)

Vampirismo é denominado como uma palavra abrangente que se refere a uma tradição no Egito antigo e se relaciona diretamente ao ato de retirar o sangue de uma pessoa de maneira involuntária mediante ataques ou de forma voluntária por intermédio dos voluntários. Vampiros são seres mitológicos e descritos de muitas formas através do tempo e de religiões. Sendo assim, não se sabe ao certo quando o primeiro vampiro surgiu, mas fontes históricas apontam que tudo iniciou com Vlad III, que viveu durante a idade média na Romênia. Conhecido como "O empalador", o príncipe de Valáquia ficou conhecido não só por sua vasta riqueza, mas também pela brutalidade que tratava seus prisioneiros de guerra — os empalando sempre após suas guerras. Devido a isso, histórias antigas contadas pelos povos da Europa, garantem que o grande governador fora amaldiçoado pelo diabo a viver alimentando-se eternamente de sangue humano. Tudo que se sabe do início dos tempos até agora, é que o vampirismo ganhou muitas versões e personagens famosos, principalmente na chegada do século vinte e um.

Em parte, Natalie gostaria de acreditar que o estava vivendo não passava de um grande e, fodido, pesadelo. Contudo, querer e poder eram coisas diferentes, e ela não teria tanta sorte de sair ilesa desse perigoso jogo que havia se metido. Charlotte Matthews poderia ser de fato uma vampira, e a pior parte nem estava em confirmar algo que se tornava muito mais óbvio com o passar dos dias, mas sim, como acabar com esse mal definitivamente. Por isso, quando um novo dia surgiu, a loira não teve muito ânimo para sair da cama. Aquela não era só uma sexta qualquer do calendário, mas sim seu aniversário. A data chegou depressa, trazendo sentimentos melancólicos e a ligeira sensação de que iria colapsar a qualquer momento. Seu corpo estava pesado, com dores que deixavam claro uma noite mal dormida. Os olhos verdes carregavam olheiras pesadas por virar a madrugada lendo fóruns de ocultismo e blogs abandonados em dois mil e nove. Mesmo sob protesto, Natalie meteu o pé para fora da cama, gemendo a cada movimento que deveria fazer até o espelho que mais parecia um cabideiro de tantas peças penduradas. Reparou primeiro na palidez que carregava, sabendo que mesmo que o sol fosse capaz de fritar seus neurônios lá fora, jamais seria capaz de lhe dar um bronzeado descente.

Inclinou o rosto e passou as mãos pelos braços nus. A pele branca estava limpa, sem sinais da agressão vivida há poucos dias. Natalie recordou-se então daquela manhã que acordou livre dos hematomas. Subitamente, um calafrio perpetuou por sua espinha quando se recordou de um dos trechos lidos em um dos blogs que visitou durante a madrugada: sangue de vampiro é capaz de curar enfermidades humanas, assim como é capaz, também, de transformar humanos em bestas sanguinárias. Ela salivou, talvez fosse alguma pegadinha da imaginação, mas teve a nítida sensação de sentir o gosto metálico de sangue na boca. O estômago revirou e ela engulhou e engasgou. Mesmo que não tivesse nada para pôr para fora naquela hora, correu até o banheiro ajoelhando-se aos pés do vaso. Fez força para vomitar, mas não teve sucesso. Ter sangue de vampiro em seu organismo já era uma tremenda loucura, mas ter o sangue de Charlotte Matthews a deixava ainda mais em pânico. Tudo que queria naquela hora era pôr para fora o que nem deveria ter entrado, mesmo que isso de fato a tivesse curado, mas e se de alguma forma fosse uma moeda de troca daquela diaba de saias? Natalie não queria dever nada a ninguém, principalmente para àquilo que estava em posse da herdeira Matthews.

Enfiou dois dedos no fundo da garganta, dessa vez, tendo sucesso em colocar para fora algo preto e gosmento. O amargo inundou sua boca quando o vômito mudou de preto para amarelo ovo, dando sinais de que agora o estômago estava expulsando sua própria bile. Encarando o fundo do sanitário enjoada, deu descarga duas vezes para que não restasse mais nenhum vestígio de sangue. Fechou a tampa e pôs os pensamentos em ordens antes que escovasse os dentes duas vezes e tomasse a ducha mais fria que podia.

— Mãe? — Chamou a loira. Vera estava em pé, com uma xícara nas mãos e os olhos presos na casa do vizinho assassinado recentemente. Felizmente, Joe já havia partido para o trabalho logo cedo, então não teria que lidar com seu mau-humor. Natalie seguiu o olhar para o que a mãe encarava, deparando-se com uma pequena mudança. — Os Clark vão embora?

— Ou tem alguém chegando. — Murmurou a mãe, ainda distante. Natalie deu de ombros e serviu-se com um pouco de café preto. — Mas de qualquer forma, se estiverem indo embora, eu não os julgo, quem suportaria ficar em um lugar que alguém morreu?

Natalie entendia bem as palavras de Vera, tanto, que elas causaram uma pequena inquietação em seu peito. Seus aniversários eram assim, e sua mãe sempre se mostrava mais distante nesses dias — muito mais do que costumava ser. Aquela era uma data insuportável para todos, principalmente para Natalie. A garota largou a xícara na mesa, sem apetite.

— Talvez hoje eu volte tarde para casa, tem algum problema? — Perguntou ela. Vera separou os lábios e deu de ombros.

— Eu ainda fico receosa de que um dia você me dirá que não vai mais voltar para casa. — Falou ao virar-se para a filha. Foi quando Natalie percebeu que a mãe também carregava olheiras fundas e semblante pesado. E sobre o que ela dissera, era um pensamento que passava pela cabeça da jovem, mas deixar a mãe com um pai agressivo talvez fosse a única coisa que ainda lhe prendia naquela cidade.

— Deixa de bobagem, mãe. Eu só vou sair com um amigo, ficará tudo bem. — Natalie abriu um sutil sorriso, feito com muito esforço, já que tudo que queria passar ali era que ela estaria em casa em alguma hora da noite ou madrugada. E ficar bem era como pretendia permanecer até quando pudesse.

— Venha cá. — Vera chamou. Natalie pigarreou, levantando-se da cadeira. Sentia que o looping de comparações e choradeira iria começar naquele momento, mas Vera não fez isso. Os olhos verdes e maduros fitaram a jovem à frente. — Eu amo você, querida, não esqueça.

— Eu sei, mãe. — Natalie desviou o olhar para o chão quando os próprios olhos queimaram devido às lágrimas.

— Ah, meu bem, você sempre será meu pequeno milagre. — Mães sempre costumam ser sentimentais durante os aniversários de seus filhos, mas Vera carregava motivos maiores para se sentir sensível naquele dia. Puxou a filha para um abraço e permaneceram assim por um longo tempo, até Natalie se dar conta que estava atrasada para o que deveria fazer.

▬▬▬▬▬▬▬【☪】▬▬▬▬▬▬▬

A East Zigma School se encontrava quieta demais, e ao julgar a ausência de Charlotte Matthews, entendeu claramente o motivo. Escondida entre as sombras de uma árvore, Natalie acendeu um cigarro de maconha, enquanto sua atenção se distanciava entre os jovens ainda conversando antes do anúncio do primeiro horário. Aquele era um dia de calor, um dos últimos do verão, por isso, estava um pouco mais ensolarado e quente que o esperado, e, em contrapartida, a noite provavelmente seria escura e fria. Questionando-se em silêncio, a Scatorccio deduziu que talvez esse fosse o motivo do sumiço da rainha do ensino médio, dias quentes e abafados como esse deveriam ser difíceis de lidar, considerando o que ela provavelmente era agora. Olhou em direção à entrada coberta da escola, onde as The Storm estavam sentadas nos degraus, impedindo qualquer passagem dos outros meros mortais. Olivia que se encontrava no topo, estava em pé e com as mãos na cintura, assim como parecia determinar algo às demais colegas de time. Natalie daria um milhão para saber o que o grupo que pertencia — ou que um dia pertenceu — parecia tanto debater. Seus olhares cruzaram por um momento, e tudo que a loira nas sombras fez foi balançar os dedos da mão em um tchauzinho seguido de um mal-educado dedo do meio. A capitã do time fez uma careta e a ignorou, indignada.

Em outros tempos, Natalie faria questão de tentar provar seu valor naquela equipe só para ter uma chance de um futuro melhor, mas agora, diante tantos acontecimentos brutais, sabia que não restaria nenhum momento para a dedicação ao futebol. Foi bom enquanto durou, e se optassem por expulsá-la oficialmente do time, não se importaria. Sua cabeça estava em outro lugar e sua motivação sendo movida por outra coisa — ou alguém. Natalie tragou o baseado, não era o melhor café da manhã, mas precisava de algo para tranquilizá-la naquele dia. Dois minutos depois, foi surpreendida por Greg dirigindo o carro da mãe. Usando óculos escuros e um boné cobrindo rosto, o garoto encarava os lados como se a qualquer momento fosse ser parado pela polícia por ter tido cometido o pior dos crimes: cabular aula.

Natalie adiantou alguns passos até o lado do passageiro, se debruçando na janela aberta. Sorriu de maneira maldosa, enquanto soprava a fumaça do cigarro na direção de Greg.

— Por que está disfarçado? Não vamos assaltar um banco. — Natalie gesticulou, achando muito drama da parte dele.

— Entra logo, e apague esse cigarro, minha mãe me mata se sentir cheiro disso nos bancos. — Respondeu o garoto, olhando para os lados.

Tá! — Natalie apagou o cigarro como se tivesse recebido a pior das ordens. Abriu a porta do carro e entrou. — Tem certeza que quer fazer isso? Eu posso continuar as pesquisas sozinhas.

— Meio tarde para me dar essa opção, Natalie. — Greg colocou a primeira marcha e acelerou.

A escola ficou para trás, e o centro da cidade surgiu logo à frente. Na escola não encontrariam o que precisavam, e para uma pesquisa mais profunda, somente a biblioteca da cidade poderia ajudar, já que uma parte sua era repleta de livros de ocultismo. Greg estacionou o carro, e Natalie foi a primeira a sair. Caminharam juntos ao velho lugar onde haviam iniciado os estudos sobre vampiros no dia anterior, longe do alcance da curiosidade não só de outras pessoas, mas como da bibliotecária mal-humorada. Livros novos e velhos rapidamente preencheram a mesa, assim copos de cafés e post-its rabiscados. Algumas histórias chegavam ser absurdas demais, e a maioria dos relatos de vampiros do mundo real não passava de pessoas comuns praticando maldade — como o caso da condessa sangrenta, que assassinava jovens garotas para banhar-se no sangue delas com a intenção de ficar mais jovem. As informações sempre entregavam o básico que já sabiam aquela altura, mas não o que possívelmente Charlotte Matthew poderia ser, pois obviamente, ela era uma criatura muito maior e perigosa do que aqueles livros podiam dizer.

— E então, qual a melhor maneira de matar um vampiro? — Natalie fechou o livro de capa dura sobre a mesa. Seus olhos verdes fixaram-se no colega do outro lado, que começava a bebericar o terceiro copo de café. — Os livros dizem tantas formas, que fica difícil de saber qual a que dá mais certo. Quer dizer, podemos usar estaca de madeira ou prata. Crucifixos são bons amuletos e não eliminaremos minha parte favorita: cortar o vampiro em pedaços e queimar. Mas qual desses é realmente eficaz?

— Gosto da ideia de arrancar o coração, me soa poético e dramático. — Greg respondeu com humor.

— Ou podemos fazer tudo junto.

— Você não quer realmente matar um vampiro, né? — Greg piscou. Natalie bateu um dedo no queixo. — Quer dizer, você realmente tem coragem de enfiar uma estaca no coração da Lottie se ela for uma dessas coisas?

— Aposto que ela pensaria duas vezes em fazer o mesmo se fosse comigo.

— Olha, Nat, a Charlotte é perigosa, isso é um fato. Ela já foi atrás de você uma vez, e isso pode acontecer novamente. Acredito que temos que primeiro ter certeza do que ela é, para depois pensarmos em como agir.

Entretanto, Natalie nunca foi o tipo de pensar primeiro e agir depois. Não. Sua fama não era das melhores e o destaque da sua personalidade difícil era a impulsividade. Ela gostaria de ser um pouco mais sutil e contida, mas nitidamente esses atributos estavam longe de serem alcançados por alguém tão imprudente. O telefone vibrou sobre a mesa, capturando a atenção dos dois jovens. Spencer Monroe insistia em uma ligação, mas quando suas chamadas foram direcionadas a caixa postal, tentou enviar mensagens. Natalie suspirou, sabendo o motivo de tanta insistência. Por alguns milésimos, esquecera completamente que estava comemorando aniversário naquele dia e em algumas horas, deveria encontrá-lo para ir ao show.

— É melhor responder seu namorado. — Greg pigarreou, tentando não mostrar interesse em quem mandava tantas mensagens em curtos intervalos de tempo. Natalie revirou os olhos.

— Não é meu namorado.

— Então quem é?

— Ninguém importante. — Desligou a tela do telefone, virando-o para baixo. Spencer era um grande cuzão insistente quando queria. — É só um cara que me vende coisas bacanas quando preciso. Como hoje é meu aniversário, ele me deu ingressos para um show de covers de rock, mas ainda não decidi se irei.

— Não me disse que era seu aniversário. — Greg jogou o corpo para trás, separando os lábios, em choque.

— Como se fizesse alguma diferença se nasci nesse mesmo dia há dezoito anos. — Natalie revirou os olhos e pegou outro livro. — Eu não gosto de aniversários, e prefiro não lembrar do meu. — Embora tivesse dito essas palavras com tanta convicção, elas não eram verdadeiras. Não completamente. Natalie costumava gostar dos seus aniversários, principalmente quando criança, mas após alguns anos, a data passou a lhe trazer somente dor. — A Christine foi dada como morta, pessoas estão morrendo e a Charlotte é a nossa principal suspeita. Há tanta coisa estranha acontecendo de uma vez só que você acha que tenho cabeça para ir em uma festa só porque é meu aniversário?

— Acho que deveria ir, sabe? Só para o caso das coisas piorarem ainda mais daqui para frente e você não se arrepender de não ter curtido seus dezoito anos.

— Falando desse jeito, até parece que vou morrer amanhã.

— Não acho que a morte seja tão audaciosa de tentar isso com você. — Sorriu. — Já a Charlotte, por outro lado...

Natalie abriu um singelo sorriso, mas congelou quando percebeu que não havia motivo para tanta graça. Greg reparou, assumindo uma expressão mais preocupada.

— Nat, o que foi?

— Estou pensando... — Ela passou a mão pelo cabelo. — E se a Christine se tornou o mesmo que a Charlotte? Vampiros não são capazes de se reproduzir, mas podem criar outros vampiros.

— Me parece lógico, mas o que ela ganharia com isso?

— Não sei. — Natalie deu de ombros. — Mas, como uma boa narcisista, ela pode querer montar o próprio clã e nada melhor que pegar as aliadas do time.

— Charlotte sendo Charlotte. — O garoto encolheu os dedos e mordeu os lábios ao recordar-se do que mais o sangue de um vampiro era capaz de fazer. — Sangue de vampiro também cura humanos... Natalie.

— Você quer me perguntar algo? — A garota ergueu uma das sobrancelhas escuras. Ela sabia onde Greg queria chegar, mesmo sem ter coragem de mencionar as palavras exatas.

— Eu lembro dos seus hematomas, e de como eles sumiram magicamente no dia seguinte. — Tomou cuidado com as palavras, pois a última coisa que queria lidar era com uma Natalie furiosa. — Primeiro, o que seu pai fez com você é crime. Você deveria prestar queixa sobre isso. Segundo, e se a Charlotte ajudou você, dando o sangue dela para curar seus machucados? Você deu permissão para ela entrar na sua casa, e agora ela pode ir e vir quando quiser.

— Olha... — Natalie debruçou sobre a mesa, medindo o tom de voz para que não fosse repreendida por falar alto em lugar impróprio. — Denunciar o Joe não daria em nada, ele sabe usar tudo ao favor dele, principalmente o argumento de ter uma filha problemática. — Colocou uma mecha de cabelo atrás da orelha. Fez uma pausa e prosseguiu. — E hoje pela manhã vomitei algo estranho, provavelmente, o resto do que estava em mim que ainda não tinha sido absorvido pelo meu organismo, ou seja, sangue de vampiro. É obvio que a Charlotte esteve na minha casa e depois fez meu vizinho de lanchinho.

— Uma hora a Charlotte que te matar, em outra te salvar. A propósito, qual o jogo dessa garota? — Greg cruzou os braços.

— Ela me colocou nisso, e agora estamos aqui para desvendar. Não é?

— Contato que você não me faça visitar novamente a casa dos Matthews...

— Não se preocupe, da próxima vez que formos lá, iremos com uma estaca de madeira bem afiada.

▬▬▬▬▬▬▬【☪】▬▬▬▬▬▬▬

ÁREA NOBRE DA CIDADE — MANSÃO MATTHEWS

Charlotte decidiu não ir à escola, não depois da confusão que causou no dia anterior. Girou na cama e estalou a língua sentindo sede. Obviamente teria certos problemas para resolver na sua falsa vida de colegial quando pusesse os pés na East Zigma School, e lidar com as colegas de time era extremamente irritante. Ela mataria facilmente Olivia Jones se a loira ousasse chamá-la para mais um treino ou insistir em tirar selfies para atualizar as redes sociais. Saiu da cama após um longo processo. Os vampiros eram capazes de dormir, assim como também conseguiam entrar em um longo estado de vegetação, ela escolheria certamente a segunda opção se não tivesse trabalho a ser feito. Parou em frente ao espelho, tentando concentrar-se somente na visão da garota que era. Sua pele era firme e seus cabelos sempre bem alinhados. Ela sempre estaria impecável mesmo que tivesse nos piores dias, mas por baixo de toda aquela beleza, olhos demoníacos refletiam de volta. Charlotte era uma casca, por isso deveria ser conservada.

Com a audição apurada, conseguiu ouvir passos serem dados no primeiro andar. Eram pesados e firmes, sinal de que Malcolm Matthews estava em casa, e acompanhado por mais alguém. Charlotte fechou os olhos e sentiu os odores, enquanto um sorrisinho cruel percorria seus lábios. Desceu as escadas minutos depois, chegando rapidamente ao escritório do pai. Não precisou atravessar as portas para ouvir o que era dito lá dentro. As vozes se misturaram por alguns segundos, mas ela soube ouvir claramente quando o pai mencionou para onde as verbas de saúde seriam realmente direcionadas. Iriam para uma conta fantasma, criada em seu nome, mas em outro país, longe da fiscalização e impostos americanos. E era assim que os Matthews acumulavam riquezas e possuíam influência ao longo das gerações, graças aos grandes desvios de dinheiro público e falsificações.

— Preciso da assinatura da sua filha, agora que é maior de idade, é necessário que ela mesma autorize as transferências nesses valores. — Alguém disse. Charlotte bateu os longos cílios escuros. Não era do seu conhecimento ter contas bancárias estrangeiras em seus nomes, mas era satisfatório saber que agora seus pais possuíam ainda mais motivos para lhe obedecer.

— Não será necessário, forjamos a assinatura. Minha filha se encontra muito debilitada desde que retornou. — Malcolm falou.

— Não precisa se preocupar, pai... — A garota adentrou o escritório, arrancando um ruído de surpresa do senhor Malcolm que acreditava na sua ausência naquela manhã. Seu olhar fixou-se brevemente nos papéis da mesa e no outro homem usando paletó. Dinheiro não era mais necessário, visto que poderia conseguir o que queria com apenas um olhar concentrado e algumas palavrinhas de ordem. No entanto, faria questão de dificultar a vida do pai da mesma forma que ele dificultou a sua. — É só uma assinatura, aposto que nem irá doer... — Seus passos foram habilidosos até o homem ao lado da mesa. Malcolm sentiu que as coisas sairiam de controle em questão de segundos, e fazer aquela reunião em casa, não era seguro. — Não em mim.

Charlotte não deu tempo para que sua vítima reagisse ao ataque. Ela foi rápida e talvez menos cruel do que pretendia. Em poucos segundos, sua mão atravessava o corpo do homem desconhecido, arrancando um grito gutural do pai e deixando expressão de horror da face dele. A garota sorriu, trazendo uma quantidade de sangue nos dedos enquanto o corpo caía sem vida para o chão com a ausência de um coração. A vampira se inclinou sobre a mesa, e antes que assinasse o próprio nome em sangue fresco usando o dedo indicador, deu uma piscadela ao pai. "Charlotte Matthews" foi escrito em vermelho, escorrendo generosamente pelo papel branco, com direito a um pequeno coração no final. Avaliou a assinatura, e concluiu que aquilo estava péssimo. Bufou e rasgou os documentos, deixando somente uma pilha de papel picado sobre o mogno.

— Acho que cento e quinze milhões farão mais falta aos hospitais do que a conta dos Matthews. — Disse ela, lambendo os dedos melados de sangue.

— Você não tinha esse direito, sua... sua... — Uma veia saltou na testa do pai. Charlotte gargalhou.

— Su-sua? — Debochou dele, dando a volta na mesa. — Sua criação, pai. Sua filha!

— Você não é minha filha! — Disse entredentes. — Você é um demônio! — Charlotte suspirou e acenou.

— É, eu sou o que restou dela, o que você não conseguiu quebrar completamente. — Sua voz saiu baixa e ameaçadora. Ela queria arrancar o coração de Malcolm, e faria isso com prazer, pois certamente se ele não vivesse boa parte do tempo compelido, faria o mesmo com ela. Entretanto, precisava dele vivo enquanto fosse necessário. Seus olhos fixaram-se nele. — É melhor limpar essa sujeira e fazer um trabalho decente como prefeito.

— Você matou o advogado mais bem requisitado dos Estados Unidos.

— Agradeça por não ser você, o prefeito mais filho da puta dos Estados Unidos.

— Me mate, acabe logo com isso! — Ouviu o pai dizer quando deu as costas. Charlotte parou antes de se aproximar da porta. — Você voltou para isso, não foi? Se vingar do que fizemos com você. Então faça logo, Charlotte. Seja uma Matthews, e tenha coragem de eliminar o que te incomoda. Uma vez na vida pare de se comportar como uma garotinha mimada que está fazendo birra porque não ganhou sapatos novos.

Suas mãos fecharam em um punho. Talvez ele estivesse certo, ela deveria acabar com o mal de uma vez por todas. Seu corpo ardeu como se estivesse em brasas. Então Malcolm viu a própria face do diabo encarando-o de volta. Ele morreria naquele dia, tinha certeza disso. No entanto, percebeu que algo havia tomado atenção do monstro a sua frente. Charlotte farejou um novo cheiro na mansão, algo que ia muito além dos empregados. Não poderia ser, ainda era cedo demais, pensou enquanto seus pés deslizavam pelo chão até o segundo andar. Chegou ao seu quarto, encontrando as portas da varanda abertas, e antes que pudesse chegar até lá, foi jogada na cama. Pairando sobre seu corpo e com olhos afiados, o homem a encarou de cima a baixo. Charlotte poderia gritar, mas ela não estava correndo nenhum risco, não naquele instante ou por hora. O empurrou para longe só para que tivesse a chance de se mover para o outro lado do quarto, fechando a porta para que ninguém pudesse perceber na presença etérea deitada sobre os lençóis de cetim rosa da cama.

— Deveria ter me dito que viria. — Charlotte ergueu o queixo, evitando demonstrar surpresa. O homem cruzou as pernas, e seu sapato sujo soltou terra e grama seca sobre a cama. A aparência jovial e a beleza esmagadora poderiam enganar facilmente qualquer garota fissurada em vampiros, mas a única adolescente naquele quarto era incapaz de cair em seus charmes.

— E desde quando preciso avisar sobre quando farei algo, dragă mea? — O sorriso de dentes brancos e afiados cresceu nos lábios carnudos do rapaz. — Eu simplesmente faço.

— Eu só estou dizendo que poderia ter preparado um banquete para sua chegada. — A garota deu de ombros.

— Confesso que sou um grande apreciador de buffet e recepções. — Piscou para a jovem. — Tive a infelicidade de ouvir os desaforos do senhor Matthews, espero não ter atrapalhado seu momento triunfal em finalmente matá-lo.

— Você atrapalhou, mas acho que meu pai terá muito o que dizer quando derem por falta daquele advogado que matei. Então, isso também será parte do seu castigo. Enquanto eu puder prolongar o sofrimento dos meus pais, melhor.

— Lottie, Lottie, Lottie... — Ele sorriu e alcançou um travesseiro em forma de coração. — O tempo está se passando rápido demais, e você ainda não fez nada do que pedi.

— Eu já lhe entreguei uma... — A garota avançou contra a cama, tomando o travesseiro das mãos dele.

— Uma só é inútil! — Uma voz grossa ecoou pelo quarto. Bastou um piscar de olhos para que Charlotte fosse encurralada contra a parede. Ela gemeu com a dor que sentiu ao ter seus ossos esmagados. O vampiro farejou o ar, encontrando o medo instalado no quarto. — Você me disse que suas garotas eram fortes, mas só me entregou uma. Temos um acordo, Charlotte Matthews!

— Eu sei, preciso de mais tempo... — Ela tentou falar. Sentiu as unhas afiadas afundarem em sua pele, e o sangue negro escorrer pela garganta. — E-eu... acabei... de voltar...

— E está fazendo um belo estrago, pelo que vi.

— Tenho fome.

— E falta de controle! O que eu lhe ensinei não serviu de nada? — A soltou. Charlotte deslizou para o chão, sentindo o ferimento no pescoço curar rapidamente. — O que fez na escola colocou em perigo a nossa espécie. Você tem que ser mais cuidadosa ou todo trabalho que fiz durante os últimos séculos não valerá de nada.

— Eu não fiz nada de mais, não ataquei ninguém em público. — Defendeu-se. — Fui o mais discreta possível.

— Criança tola... — O homem estalou a língua ao passear pelo quarto. — Você tem levantando suspeitas. Aquela garota, como é mesmo o nome dela?

Charlotte encolheu-se ainda mais no chão.

— Que garota?

— Aquela que você decidiu que seria a primeira. Aquela que desistiu de entregar a mim. — Falou. Seus dedos gesticulavam no vazio, como se de alguma forma fosse trazer o nome à boca mais rápido. — Natalie.

— Eu já disse que ela não. — Levantando-se de onde estava, caminhou até ele. Os olhos azuis acinzentados queimaram Charlotte à medida que ela se aproximava. Sebastian carregava muito dons, e o maior deles era o seu olhar, capaz de aniquilar qualquer um com um simples gesto, mas Lottie não os temia mais como antes, principalmente quando se trata dos seus interesses particulares. — Ela não vai fazer parte do que prometi a você. Há outras, eu completarei a missão antes da primeira lua de sangue.

— Eu não duvido que irá cumprir com a sua parte do acordo. — Sebastian deu um passo para trás. — No entanto, você foi contra minhas regras em curar humanos. Você curou aquela garota, que agora, tem investigado sobre você.

— Como sabe de tudo isso?

— Enquanto você passa dias e noites a observando, eu observo você. — Ele sorriu. Charlotte mordeu o lado interno na boca. — Não esqueça quem eu sou.

— Não faça nada com ela. Eu levarei outra garota até o fim da semana. — Garantiu. — Eu não tinha a intenção de descumprir uma ordem sua, só estava ajudando uma velha amiga. Ainda não perdi completamente minha humanidade.

— Não foi a sua humanidade que a fez a ajudar, você sabe. — Um charmoso sorriso deslizou pelos seus lábios. Charlotte revirou os olhos. — E, além disso, e se eu fosse você, não subestimaria aquela garota.

— A Natalie? Ela não passa de uma pessoa com problemas maiores do que as outras pessoas imaginam. Ela não é um perigo, só é curiosa. — Charlotte sorriu ao dar de ombros. O homem do outro lado enterrou a mão no bolso da jaqueta que usava. Seus olhos cinzas se tornaram escuros. — O que foi?

— Nada. — Ele voltou a falar. — Me traga mais uma garota, Charlotte, você tem menos tempo agora.

— Mas...

Contudo, não havia mais ninguém no quarto, apenas a porta da varanda entreaberta e o balançar da cortina pela brisa da manhã. Charlotte bateu o pé no chão, irritada. Sua missão parecia uma maldita dívida que nunca terminaria. Quem diria que capturar algumas garotas burras e mimadas seria algo tão difícil, e quem sabe, ter ido atrás da Natalie primeiro, foi uma péssima ideia.

▬▬▬▬▬▬▬【☪】▬▬▬▬▬▬▬

CENTRO DA CIDADE — BIBLIOTECA

— Caramba! — Greg arregalou os olhos e virou o notebook para a colega à sua frente.

— Por favor, não me mostre outro vídeo de alguém sem noção se achando o conde Drácula. — Natalie apoiou o queixo em uma das mãos. Era quase o fim do dia e as pesquisas sobre vampiros haviam deixado de ser algo concentrado nos livros para vídeos aleatórios do YouTube.

No entanto, aquilo não parecia mais algo estupido gravado por pessoas sem noção. Na verdade, era uma manchete até recente, da cidade da Pensilvânia.

"Há cerca de dois meses, um grupo de jovens garotas universitárias foram dadas como desaparecidas durante uma festa da fraternidade. As mesmas garotas, tendo em torno de vinte e vinte cinco anos, foram encontradas mortas duas semanas depois. Os corpos estavam em estado avançado de decomposição e sem sangue, mas sem sinais de qualquer outro tipo de violência. As autoridades relataram ser um ataque animal".

— A Charlotte passou pela Pensilvânia antes de vir para cá? — Natalie encarou Greg com o semblante franzido.

— Embora eu ache que a Lottie tenha uma força sobrenatural, duvido muito que tenha matado essas pessoas sozinhas. — Disse ele. Seus dedos moveram o mouse, chegando aos comentários. — Foram dez garotas de uma fraternidade que foram brutalmente mortas, Nat. Dez! Por que ela mataria dez garotas? — "Os vampiros estão por perto". O comentário fez com que as sobrancelhas do garoto se erguessem. — Tem teorias de que são vampiros. — Disse ele.

— Charlotte não é só uma vampira. Vampiros comuns não tem reflexo, não saem em fotos ou muito menos são vistos durante o dia. Charlotte não carrega esses problemas, exceto pela foto e aquela coisa pairando sobre a aparência dela.

— Por isso ainda acredito que ela é algo demoníaco. — Greg declarou.

— Achou algo nos livros que pegou?

— Só o mesmo de sempre, e o que já sabemos.

— Ela voltou por algo, Greg. Os ataques estão acontecendo por um motivo maior que a fome. A Charlotte quer alguma coisa.

— Então temos que tomar cuidado, principalmente você. Ela ainda pode querer fazer de você uma vítima. — Alertou ele. Natalie mordeu os lábios.

▬▬▬▬▬▬▬【☪】▬▬▬▬▬▬▬

Natalie não pretendia seguir o conselho de Gregory, mas ser uma adolescente comum e se divertir por uma noite não parecia algo ruim. Era seu aniversário, e mesmo que odiasse a data, talvez nunca mais tivesse a chance de comemorar esse dia caso enfrentasse Charlotte e seu enigma sanguinário nos dias seguintes. No armário, escolheu um vestido preto tubinho, indo completamente contra seu estilo do dia-a-dia. Aquela peça de roupas prometia roubar atenções, já que marcava as poucas curvas que possuía. Arrumou o decote, achando meio exagerado a forma que seus seios se comportavam naquela roupa, mas tudo era uma questão de costume. Jogou a jaqueta de couro por cima, e nos pés, calçou as botas de salto grosso. No espelho, optou por caprichar em um delineado, porém, lhe faltava prática, então borrou o preto deixando que se tornasse uma sombra escura, onde seus olhos verdes se tornavam ainda mais intensos. Nos lábios escolheu um rosado, já que todo o resto era informação demais para um simples show.

Por uma única noite, Natalie prometeu a si que agiria como qualquer adolescente rebelde com uma identidade falsa no bolso da jaqueta. Seus problemas ficariam para trás e a enigmática Charlotte Matthews cairia em seu esquecimento por algumas horas.

— Ei, garota, para onde você vai? — Ouviu o pai dizer no momento em que cruzava o corredor até a sala. Ela xingou baixinho, encarando-o na entrada da cozinha com uma garrafa de cerveja nas mãos.

— Vou sair com um amigo. — Disse já dando as costas.

— Vestida igual uma puta? — Joe deu passos até a filha. Natalie fechou os olhos e contou até onde podia. Sentiu as mãos grossas e ásperas do pai a puxar pelo braço, forçando-a encará-lo. — Sabe, você está até parecida com sua mãe quando tinha sua idade. Os mesmos olhos verdes expressivos, o mesmo corte de cabelo bagunçado. Quase a mesma pessoa. — A encarou de cima. Natalie engoliu seco. — Ah, espere, que dia é hoje?

— Hoje é meu aniversário... — Seus lábios tremeram ao dizer aquilo. Uma sombra densa pousou sobre os olhos escuros de Joe.

— Ah, por um momento eu havia esquecido desse dia. — Seu olhar se tornou escuro. Natalie sabia muito bem quando seu pai estava bêbado, o que era quase sempre. Entretanto, naquele instante, ele não parecia bêbado, embora o cheiro de cerveja queimasse em sua face devido ao bafo quente. — Você está deixando de ser uma garotinha.

— Eu não sou mais uma garotinha há muito tempo, Joe. Me solta! — Se desvencilhou dele, correndo até a porta antes que o pai a impedisse. Sentiu o vento frio soprar seu cabelo para trás enquanto caminhava até o carro de Spencer já parado ali há alguns minutos.

— Já que não é mais uma garotinha, poderia começar a trabalhar para trazer sustento a essa casa. — Ouviu Joe gritar em suas costas. Natalie entrou no carro, fechando a porta com força a tempo de não ouvir mais atrocidades ditas pelo homem que a deveria proteger. Felizmente, o som estava alto o suficiente para Spencer não ouvir o que se passava do lado de fora.

— Uau, Natalie, você fica uma gatinha quando se arruma como uma menina. — Ou Spencer realmente acreditava que aquilo era um elogio ou só era um idiota completo.

— Eu sou uma menina, imbecil. — Ela puxou um cigarro do bolso da jaqueta, acendendo-o em seguida. Suas mãos estavam tremendo devido à raiva que sentia, mas Spencer não pareceu reparar em mais nada além de suas coxas nuas quando o vestido subiu. — Por favor, me faça ter uma noite inesquecível.

— Seu pedido é uma ordem, boneca.

Spencer acelerou o carro, aumentando o som de "Smells Like Teen Spirit" do Nirvana. Natalie tragou o cigarro. Em pensamento, listou tudo que odiava em seu pai: ele era agressivo, estava sempre embriagado ou de ressaca, e nunca parava em nenhum emprego. Era por esse motivo que ela precisava sair da cidade, temia acabar como a pessoa que mais odiava, mesmo que já estivesse no caminho. Natalie costumava ser uma boa filha — ou o melhor que conseguia — até permitir que uma tragédia acontecesse, e com isso, carregar o fardo da culpa por toda a vida. Foi após o ano de dois mil e treze que viu seu lar entrar na estatística de "família disfuncional". No início da adolescência, conheceu o caminho para as drogas e álcool na intenção de aliviar a culpa que a corroía de dentro para fora. Dessa forma, todos seus sentimentos poderiam adormecer e seus demônios se calarem, mas tudo não passava de mera ilusão. Sensações momentâneas. Prazeres passageiros. Natalie se odiava, mas teria que conviver consigo mesmo até onde conseguisse. Ela soprou a fumaça que prendia no pulmão, enquanto afundava no banco, imaginando o que mais viveria dali em diante.

No horizonte, uma antiga fábrica ergueu-se partindo o céu estrelado. Estavam do outro lado da cidade, longe de casa o suficiente para Natalie esquecer dos problemas por algumas horas. Ainda no carro, enquanto Spencer procurava pela melhor vaga, admirou-se com a quantidade de pessoas de idades distintas. Por um momento, se sentiu viva novamente. Ela só tinha dezoito anos e deveria aprender a viver do jeito certo antes que fosse tarde demais. Se sobrevivesse tudo aquilo que estava passando, então quem sabe daria uma chance para uma Natalie mais saudável. Spencer achou uma vaga entre um jipe e uma caminhonete, saltou do carro e correu até a porta do passageiro. Natalie sorriu, incrédula e um pouco tímida, ninguém jamais abriu a porta do carro, mas entendeu que o rapaz queria lhe dar uma noite completa de diversão.

Suas botas afundaram na terra macia e o vento frio bagunçou seu cabelo. Observou atentamente as pessoas ao redor, muitas ainda estavam do lado de fora conversando com cigarros e bebidas nas mãos. Antes que pudesse ir para a entrada, sentiu a mão boba de Spencer segurar sua cintura e atrazer para mais perto. Ela se afastou, tirando da cabeça dele qualquer intenção de aproximação maior do que realmente deveriam ter.

— O que ta fazendo?

— Você terá o melhor aniversário, põe isso na língua. — Disse ele com um pequeno papel na ponta do dedo. O emoji de coração com foguinho a fez revirar os olhos. Natalie esperava algo mais forte que LSD, mas aceitou.

— É bom que esses caras sejam bons e essa merda também. — Disse ela. Grudou o pequeno papel na língua antes de girar os calcanhares e ir em direção à entrada do show com Spencer em sua costa como um cão de guarda.

Do lado de dentro, se sentiu confinada entre o corpo de Spencer e toda a multidão. O lugar estava realmente cheio. Os odores de cigarros duvidosos, perfumes e bebidas a fez se sentir estranhamente em casa. Se espremendo entre as pessoas, Natalie conseguiu chegar até o bar. Mostrando sua identidade falsa, fingiu ter idade suficiente para beber, assim como o barman fingiu acreditar na falsa data de nascimento, e foi assim que ela conseguiu uma dose de uísque sem gelo. Sua atenção foi direcionada ao palco, onde a banda terminava uma música para começar outra. Foi quando tudo à sua volta começou a derreter e seu corpo a ficar mais leve. Natalie sorriu, encarando Spencer — que parecia se divertir com o efeito do alucinógeno também. Ela ergueu a mão direita, vendo seus dedos se alongarem com as unhas roídas e resquícios de um esmalte preto.

— Porra, Spencer. — Ela se afastou do banco, indo para o meio da multidão quando a banda anunciou a próxima música: "I Love Rock 'N Roll". Gritou eufórica puxando o rapaz em sua direção. De uma hora para a outra, se sentia em uma felicidade contagiante cantando o refrão mais alto que qualquer pessoa à sua volta.

— Eu vou ao banheiro, não sai daqui. — Spencer disse próximo ao seu ouvido. Ela acenou antes de ver seu par sumir entre as pessoas.

Seus olhos se fecharam e seu corpo moveu-se no mesmo ritmo que a multidão. A batida da música tocava diretamente seu coração, fazendo seu sangue pulsar freneticamente. Claro que parte das sensações era por conta da droga e do álcool, mas ela gostava assim. Estava completamente entregue ao prazer da liberdade que por alguns dias esquecerá completamente. Natalie passou a mão pelo cabelo e moveu os quadris. Estava imersa na diversão, até sentir um ombro esbarrar rudemente no seu, fazendo com que quase perdesse o equilíbrio. Com raiva, abriu os olhos e virou-se para xingar o babaca, mas as palavras desapareceram da sua boca no instante em que se deparou com um familiar sorriso. Ela não queria acreditar, mas seus olhos entregavam a verdade e, considerando que nada nos últimos dias sumia definitivamente, não estranhou o fato de Christine Barnes estar logo à sua frente. Com os cabelos mais negros e curtos, a velha colega de time exibia uma aparência saudável para quem fora dada como morta. O rosto estava mais angular e a maquiagem mais pesada. Natalie também reparou em algo a mais: os olhos estranhamente vermelhos. E não eram dessa cor por ingerir alguma droga, mas eram vermelhos por lembrar facilmente algo saído do inferno.

— Chris... — Foi tudo que Natalie conseguiu falar. E no piscar de olhos, da mesma forma que surgiu, desapareceu quando um jogo de luz foi aceso de forma psicodélica.

Sentindo-se tonta, Natalie procurou por Spencer entre os rostos que a cercavam. Havia dito que não sairia de onde estava, já que se perder no meio daquelas pessoas era tão fácil quanto perder uma agulha do palheiro. Caminhou para longe do centro, em direção às poltronas em um lugar mais reservado. Ela precisava sentar, ou cairia tanto pelas fraquezas que sentia nas pernas, quanto pela surpresa que recebeu justo quando pretendia se afastar das estranhezas por uma única noite. Ignorou o fato das mãos estarem tremendo naquela hora enquanto puxava o celular do bolso da jaqueta, quase o perdeu no chão, mas recuperou a postura enquanto tentava digitar algo.

— Merda. — Praguejou com a voz pesada.

"Chris está vivua". Escreveu enquanto as letras se tornavam um grande borrão à sua vista. Apertou em enviar e esperou por uma resposta de Gregory.

"Viva*". Foi a primeira mensagem que recebeu do amigo nerd. Natalie soltou um ruído de desaprovação. Aquela não era uma boa hora para conferir se escrevia certo ou não. "Como ela se parecia?"

"Como alguém que nunca morreu, mas que claramente voltou de algum lugar ruim". Lutando contra o efeito da droga, Natalie digitou com força, dessa vez enxergando perfeitamente cada frase. "Eu vou atrás dela, talvez eu descubra algo."

"Não! Sai daí agora, Nat!". Com a frase, uma sequência de emojis apavorados surgiram em sua tela. No entanto, Natalie já estava decidida. Se levantando da poltrona, pediu uma água no bar só para que pudesse se recuperar o suficiente para não confundir um rato com um coelho e cair em alguma vala.

Respirou fundo e enfrentou a multidão novamente. Spencer provavelmente a procurava em algum lugar por ali, mas ela tinha motivos maiores para mantê-lo afastado por alguns minutos. Encarou os lados e vasculhou cada ambiente de onde estava. Era um pátio enorme, e se chutasse quantas pessoas estavam ao seu redor, com certeza seria mais de quinhentas. Aquele show servia um banquete dos mais variados tipos de sangue para uma nova possível vampira. Não muito longe do palco principal, avistou uma escadaria que levava ao mezanino repleto de pessoas. Entre o aglomerado de estilos, avistou o que mais se destacava. Christine Barnes estava lá, procurando alguém como um leão prestes a atacar. A banda iniciou um cover de "Sonne" da banda Rammstein, trazendo calafrios a Natalie. As pessoas ao redor começaram a se mover no mesmo ritmo da sombria música, e mesmo que a canção fosse uma das favoritas da Scatorccio, naquele instante, só lhe trazia um imenso desconforto. Natalie prendeu o fôlego nos pulmões, notando que Christine conversava com um garoto. Aquilo não era um bom sinal.

Na intenção de escapar de um mar turbulento, Natalie caminhou para um espaço mais vazio, onde pudesse ficar mais escondida de Christine. Puxou novamente o celular do bolso, ignorando todas as mensagens e ligações perdidas de Greg. Colocou na câmera e apontou na direção da garota que costumava ser uma boa amiga. A velha lente do iPhone oito desfocou a imagem no topo do mezanino, mas quando Natalie finalmente conseguiu ajustar a luz e contraste, teve uma visão aterrorizante. Da mesma forma que a câmera sofisticada do amigo pôde capturar uma figura sobressaindo Charlotte Matthews, o seu velho telefone também. Era algo demoníaco, para não dizer bizarro. Christine não era mais humana, e aquela era a prova que precisava para saber que a filha do prefeito estava fazendo algo muito pior do que apenas matar. A loira apertou o botão da tela, fotografando para garantir que no dia seguinte tivesse a certeza que não estava sob efeito alucinógeno.

Não estava preparada para o que seguiria. Natalie arregalou os olhos e reprimiu um grito quando o rosto de Christine se desfigurou. Veias saltaram em sua pele pálida, assim como sua boca se tornou maior e repleta de dentes afiados. O rapaz com quem falava não se assustou, na verdade, nem reagiu quando a garota o puxou para frente cravando seus dentes na carne no pescoço. Natalie soltou o ar dos pulmões, decidindo entre gritar para alguém fazer algo ou só sair correndo o mais rápido possível dali. E como se soubesse que estava sendo observada esse tempo todo, Christine olhou diretamente para ela, sorrindo enquanto o sangue fresco pingava em seu colo generosamente.

Natalie mergulhou na multidão, na intenção de se misturar entre as outras pessoas. Seus passos se tornaram rápidos, e logo, percebeu estar praticamente correndo e esbarrando entre as pessoas. O restante da sua paz foi embora quando seu corpo colidiu com algo rígido como uma parede, fazendo-a cair sentada no chão. Se não fosse tão perigoso, ela permaneceria ali, e só levantaria quando tudo estivesse acabado. Ouviu uma risadinha debochada e soube exatamente quem a havia derrubado. Erguendo o rosto com um olhar enfurecido, se deu conta de quem estava à sua frente. E lá estava ela, diabolicamente exuberante. Os cabelos escuros estavam soltos e rebeldes, emoldurando seu rosto ironicamente angelical. O vestido vermelho acetinado era curto e decotado o suficiente para servir como um belo convite para olhares maliciosos. A isca perfeita para quem se atrevesse a chegar perto. Natalie concluiu que Charlotte era a visão mais tentadora do inferno. E a loira a odiava — principalmente por saber que era exatamente isso que aquela diaba de saias queria provocar nela. Charlotte deu um passo para trás, enquanto a humana ficava de pé novamente com o desgosto desenhado no rosto.

— Confesso que sempre quis ver você aos meus pés, docinho. — Disse sedosamente. Charlotte não havia falado perto, mas Natalie sentiu todo o calor da sua voz a envolver como se tivesse sussurrado em seus ouvidos. A morena se aproximou um pouco mais, deixando a loira estagnada no lugar.

E já diziam as más línguas, que serpentes conseguem hipnotizar suas presas. Natalie acreditava nessa teoria, embora não passasse de um mito. Nada tirava da sua cabeça que o fato de estar parada ali, enquanto Charlotte se aproximava cada vez mais, era por um único motivo: hipnose. Vampiros eram capazes disso e ela estava sob esse controle agora. O odor pungente de sangue e cereja invadiu suas narinas quando a vampira ficou somente a um palmo de distância do seu corpo. Ela era estranhamente quente, igual ao inferno, de onde provavelmente tinha saído. Puta que pariu, pensou Natalie. Esse conjunto todo era uma combinação perfeita para a garota à sua frente. Charlotte combinava com o perigo e maldade, que em parte, sempre fez parte da sua personalidade. A loira piscou, percebendo que um sorriso vermelho crescia charmosamente nos lábios da vampira, então reparou com mais atenção. Não era um batom, era sangue.

Natalie tentou se afastar, mas Charlotte a segurou. A coelha estava fugindo da serpente, mas não iria tão longe se tentasse. Erguendo uma mão, a vampira pousou bem acima do coração acelerado da humana. Uma chuva de sentimentos caiu ao seu redor. Charlotte sentiu dor, medo, angústia e tantas outras coisas que se questionou se Natalie algum dia já havia sentido algum tipo de felicidade genuína. Sabendo o que fazer, fez com que o coração disparado batesse mais devagar e a respiração, antes ofegante, se regulasse. Gradualmente, a Scatorccio assumia um estado calmo e sereno, se perguntando como isso era possível. Era estranho. Todo o terror que estava sentindo, simplesmente passou, enquanto outro sentimento, dessa vez completamente carnal, invadia sua carne queimando como brasa. Seu olhar pendurou-se novamente nos de Charlotte. Ambas eram obstinadas o suficiente para entrarem em uma longa disputa visual e fizeram isso por algum tempo.

— Melhor agora? — A vampira perguntou.

— O que você fez? — Mesmo que quisesse se afastar, Natalie não tinha coragem ou vontade. A sensação que Charlotte lhe deu era estranhamente agradável.

— Foi só uma mãozinha amiga.

— Eu não preciso de uma mãozinha amiga, muito menos a sua. — Sua língua chocou-se contra os dentes. Charlotte sorriu, aproximando-se mais ainda.

— Tudo bem. Então é assim que quer jogar? — Natalie sentiu cada palavra pronunciada atingir seu corpo como faíscas. — É assim que estou jogando, então não precisa ficar com medo, docinho.

— Não. Eu não tenho mais medo de você! — Declarou em voz alta e firme.

— Oh! É mesmo? — Charlotte debochou. — Você deveria estar, porque eu ainda posso ir à sua casa a noite e fazer o que eu bem quiser.

— E eu posso enfiar uma estaca no seu coração. — Rebateu a loira.

— Que garota corajosa. — A morena sorriu sem exibir os dentes.

— O quê? Você acha que eu não sei o que você é? — Natalie deu um passo à frente. Seus narizes quase se tocaram. Quase. Charlotte umedecer os lábios, adorando o enfrentamento. — Você é uma vampira maldita, Lottie.

— Então vamos lá, Natalie, me mate aqui e agora. — A morena puxou uma das mãos frias da jovem humana. Natalie arregalou os olhos quando sua mão foi colocada bem acima do coração da vampira, sobre o decote ousado. — Aqui é onde você tem que enfiar a estacada, bem fundo e com a medida certa de força. Agora só tome cuidado para não me deixar viva e eu fazer algo pior com você.

Natalie piscou, atordoada. O que Charlotte estava tentando fazer? E seu questionamento ia muito além das mortes causadas pela diaba. Sua respiração se desgovernou novamente, principalmente quando seus olhos caíram para os seios imprensados no vestido vermelho. Sua atenção percorreu cada detalhe que a vampira possuía. A pele bronzeada e imaculada. O pescoço esbelto e o rosto esculpido. Os olhos escuros e os lábios cheios. Charlotte era uma maldição em sua vida e suas novas atitudes a deixavam confusa no que realmente queria fazer. Sua mão abriu, deslizando o dedo sugestivamente pelo cetim do vestido. A morena arfou, sentindo seu corpo apertar e doer bem lá no fundo. Fechou os olhos brevemente, sorrindo enquanto deixava que a loirinha rebelde fizesse novas descobertas. A música tornou-se mais abafada, e por um instante, ambas sentiram que não havia mais ninguém ali e que poderiam fazer o que quisessem.

Não era nenhum truque vampírico, Charlotte sabia, mas sabendo também que Natalie jamais colocaria o orgulho de lado, a deixou acreditar que os sentimentos que estavam sendo desenvolvidos ali, eram parte de algum dom sobrenatural. Seus corpos uniram-se ainda mais, então, como se tudo houvesse sumido definitivamente, os lábios foram pressionados um contra o outro. A princípio, o gosto metálico de sangue foi o maior sabor que sentiu na vampira, depois o calor febril que ela exalava. Natalie moveu a boca, sentindo agora o adocicado gosto de cereja. O gloss realmente era uma delícia, assim como a maciez da boca de Charlotte. A loira cedeu ao beijo, sabendo que agora era tarde demais para retroceder o que já havia começado. Um gemido involuntário escapou da sua boca quando seu corpo foi encurralado contra a parede. Não era surpresa para Natalie que Charlotte era uma pessoa possessiva, mas ela fazia isso na medida certa. Sua língua pediu passagem, saboreando tudo o que aquela diaba de saia tinha a lhe dá. De uma hora para a outra, a loira sentiu um desejo que jamais pensou sentir em toda sua vida. Assim como descobriu que beijar garotas era bom — bem, talvez beijar Charlotte Matthews dava a ela essa sensação.

Charlotte sabia que depois daquilo, jamais conseguiria esconder o que sentia, assim como não tinha mais interesse nisso. Antes, ela precisava encobrir quem era, mas agora, era livre para ter o que quisesse e agir como bem entendesse. Sua mão deslizou para a cintura fina da outra garota e seu joelho invadiu o meio das pernas dela. Natalie gemeu outra vez, arqueando as costas na parede de tijolos quando o suave toque da pele da vampira foi ao encontro do tecido fino da sua calcinha. Charlotte sorriu entre o beijo, sabendo que se a loira permitisse, ela daria muito mais que somente algumas provocações. Sua língua saboreou o gosto humano, lambendo e chupando o que podia. Um trem desgovernado de emoções partiu seu peito, e o que ela ainda acreditava ser o coração. Aquele era o primeiro beijo que dava em muito tempo, mas felizmente, feito de modo seguro e experiente. Charlotte gostaria de mostrar o potencial que tinha, mas não sabia se Natalie estava preparada para receber tudo que ela gostaria de oferecer.

— Minha doce garotinha selvagem. — Charlotte sussurrou entre o beijo. Lambeu os lábios de Natalie, que se encontrava à sua mercê. — Sempre soube que, no fundo, você tinha a mesma necessidade que eu.

— Não... — Natalie lutou contra o sim pinicando sua língua. Sentiu Lottie lamber seus lábios, beijar seu pescoço, apertar sua bunda. Recuperando o mínimo de sanidade possível, usou toda força que tinha para empurrá-la para longe e abrir os olhos.

— Você ainda implorará para ter isso outra vez e várias vezes. — Disse a vampira. Aquilo fez Natalie cair de paraquedas no mundo real. Charlotte, que estava a sua frente a poucos segundos, desapareceu em um piscar de olhos, deixando-a na dúvida se aquela experiência havia sido real ou não.

A loira passou a mão pelo cabelo. Estava suando como se estivesse saído do inferno ou de uma dança intensa — Bem, o que fez foi pra lá de intenso. Foi então que sentiu o gosto de sangue na boca. Cada parte do corpo tocada pela vampira parecia queimar de uma forma fodidamente boa. Por mais louco que fosse admitir, Natalie Scatorccio sabia que tinha não só beijado, mas se entregado a Charlotte Matthews como se sua vida dependesse daquilo. E o pior de tudo era que havia gostado. Gostado muito.

Alguém em pé depois desse tombo?

CAPITULO ATUALIZADO: 25/05/2024 - NÃO REVISADO

Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro