
𝐂𝐀𝐏𝐈𝐓𝐔𝐋𝐎 (𝟎𝟎𝟑)
DIAS ATUAIS
Natalie sempre gostou de filmes, e o gênero terror era o seu preferido. Quando criança, fugia da cama só para poder reprisar os clássicos do horror que passavam tarde da noite. Ela não se assustava com as mortes e sangue, pelo contrário, adorava os efeitos especiais exagerados e como algumas atuações eram bem ruins. Contudo, o que via na TV não passava de ficção. Demônios, monstros, zumbis, alienígenas não existiam na realidade, então, obviamente, não tinha o que temer. Foi nisso que a jovem Natalie acreditou por um longo tempo. Agora, ela se questionava até quando os filmes possuíam um fundo de veracidade, talvez, eles quisessem mostrar algo de uma forma mais distorcida e caricata. Os monstros existiam, e talvez um estivesse a solta pela cidade fazendo um belo estrago. Só de pensar nisso, ela já sentia todos os pelos do corpo arrepiarem e o coração palpitar.
— Mãe, talvez esses ataques estão sendo causados por um lobo ou um urso. Pode ser que seja até algum animal que fugiu do zoológico e as autoridades não querem preocupar a população. Logo será resolvido. — Natalie falou na tentativa de tranquilizar a mãe. Ela não acreditava naquelas palavras, e Vera também não. No entanto, prefeririam não demonstrar uma à outra o que sentiam nas entranhas. — Vou para meu quarto, boa noite.
Cruzando o corredor até o quarto, Natalie jogou-se na cama com o notebook aberto na página principal de pesquisa. Enquanto o ponteiro piscava diante seus olhos, imaginou o que pesquisaria. Ela mordeu os lábios ao ponto de feri-los. O gosto de sangue inundou sua boca, salgado e quente. Natalie torceu a cara em uma careta e se achou uma idiota ao digitar "Ataques de Animais salvagens a humanos" no Google imagens. As pesquisas mostraram uma série de imagens onde animais como elefantes, tigres, ursos, cachorros e até patos, atacavam seres humanos. Nem de longe aqui que via parecia com os ataques descritos pelo jornal. Natalie digitou novamente na caixa de busca "morcegos", na intenção de achar alguma espécie que tem o sangue humano no topo da cadeia alimentar, mas as pesquisas não lhe entregaram o que queria. Se sentindo ainda mais idiota, digitou "vampiros" no google, mas teve receio de continuar as buscas.
Algo se chocou contra sua janela, roubando sua atenção. Em alerta, Natalie fechou a tela do notebook o empurrando para longe. Novamente, ouviu o barulho de um corpo pequeno ir ao encontro do vidro, dessa vez, abrindo uma passagem devido à força usada. Algo adentrou pelo espaço, indo em disparada ao armário de roupas que se encontrava semi-aberto. Natalie fechou as mãos em punhos quando um barulho semelhante a um pequeno grito veio de dentro do seu armário.
— Mãe... — Gritou, na esperança de ter alguma ajuda, mas não foi respondida. — Merda!
Praguejar não ia adiantar. Reunindo a pouca coragem que tinha, caminhou até o armário. Empurrou a porta, vendo que um morcego emitia um barulho insuportável aos seus ouvidos. Notou uma trilha de sangue no carpete do quarto, e viu que uma das asas do animal estava ferida. Muito provavelmente ele se cortou no momento que atravessou o vidro da sua janela. Mesmo que quisesse ajudar, Natalie não saberia por onde começar, assim como se aproximar de um animal daquela espécie era perigoso.
A garota estremeceu, sentindo os pelos da nuca eriçarem. Ela não sabia explicar, mas se sentiu observada. Virou o rosto para a janela, onde a cortina era empurrada sutilmente pelo buraco no vidro. Não tinha ninguém do lado de fora, muito menos no quarto. Talvez fosse só sua imaginação e o susto que levou. Engolindo seco, Natalie buscou algo para capturar o pequeno animal e por para fora. Usou uma fronha para poder alcançar o bicho, mas foi na tentativa de se aproximar, que um pandemônio se instalou a sua volta. De uma hora para outra, o morcego se recuperou, voando com fúria sobre ela. Suas garras traseiras afundaram na pele macias, fazendo-a gritar. Ela se debateu, tropeçando nos próprios pés até cair no chão, se defendendo da forma que podia.
Subitamente, o ataque parou. Foi nesse momento também que Natalie abriu os olhos, se dando conta que algo estava errado. Ela não via mais a cama bagunçada, o armário com uma porta quebrada ou as paredes tomadas por pôsteres de bandas de rock. Não, tudo que via era um céu sem estrelas e nuvens pesadas. Se movendo no chão, sentiu o mato seco pinicar a pele. O pavor apossou-se do seu corpo, ela com certeza não estava mais no seu quarto. Levantando-se de onde estava, tentou reconhecer o lugar. Era claramente uma floresta, com árvores, o qual o topo se perdia no céu escuro, e o silêncio perturbador. Respirando fundo, Natalie sabia que correr estava fora de cogitação, considerando que não saberia por qual direção seguir. Por mais louco que fosse, fechou os olhos e respirou fundo, convencendo a si mesma que estava em um pesadelo, outra vez. Muito provavelmente ao cair, bateu a cabeça e estava inconsciente no chão do quarto.
Ela ia acordar. Em algum momento sua mãe entraria brigando pela porta ou seu celular tocaria, finalmente lhe despertando. Então esperou, o que pareceu uma eternidade. Impaciente, Natalie arriscou a dar um passo, mesmo temendo pelo que lhe aconteceria. Com um pé na frente do outro, ela seguiu em frente. Uma coruja sobrevoou sua cabeça, pousando em um galho de uma árvore para lhe observar. Natalie sentiu que não estava em um lugar seguro, mesmo assim, controlou a todo custo a respiração. Um grito de horror fez com que tudo na floresta acordasse. Uma ventania violenta soprou de todos os lados. Os animais noturnos gralharam juntos e o chão pareceu tremer. Sem esperar mais nenhum segundo, Natalie correu, enquanto sentia a floresta ganhar vida para lhe capturar, puxando seus cabelos e segurando sua roupa.
Sem olhar para trás ou prestar atenção no que pisava, continuou correndo até o pé tropeçar em uma raiz grossa. Seu corpo foi ao chão, escorregando em um pequeno morro até aterrissar em algo. Levou alguns segundos até que Natalie pudesse se recuperar da queda. Sua mão tateou o espaço ao redor, até tocar a carne macia e molhada. Sua mão voltou vermelha devido ao sangue fresco, sendo o suficiente para arrancar um grito de horror. A garota saltou para trás, tremendo enquanto se afastava do corpo abandonado em meio a floresta. Sem segurar o que tinha no estômago, vomitou ao ajoelhar-se. Olhou por cima do ombro, em direção ao cadáver. Quem quer que fosse, se encontrava com um ferimento no pescoço e alguns outros hematomas no corpo. Em filmes de investigação, a última coisa que se deve fazer em uma cena de crime é mexer no cadáver. No entanto, Natalie não estava em um filme de investigação.
Ela se arrastou até o corpo, concluindo que se tratava de uma mulher, ou uma garota com uma idade próxima à sua. Mesmo com as mãos tremendo, retirou a quantidade de cabelo cacheado no rosto do cadáver, se arrependendo amargamente disso. Aurora Flanigan tinha os olhos abertos, mas não havia sinal de vida neles, ou nela. Natalie se afastou, apavorada demais para pensar em algo. Tudo que queria era acordar daquele pesadelo. Ir embora dali. Não muito longe de onde estava, ouviu uma sequência de galhos quebrando e avistou alguém surgir entre as árvores.
— Ei! — gritou Natalie. Embora estivesse escuro, ainda podia ver a silhueta feminina trajando um vestido longo branco, porém, encardido. Com todo o cuidado necessário, a garota arriscou dar mais alguns passos, mas parou definitivamente ao notar que o vestido, na verdade, era uma camisola e que sujeira não passava de sangue. A mulher se afastou e deu as costas, impedindo que Natalie visse seu rosto.
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Em um sobressalto, Natalie acordou pela manhã com o notebook aberto sobre seu corpo. Demorou um pouco para entender que estava em seu quarto. O sol estava quente e o calor era insuportável, isso explicava também o motivo da boca seca e o suor pelo corpo. Se sentiu aliviada por saber que o que viveu horas atrás não passava de um pesadelo, mas foi ao colocar os pés para fora da cama, que seu coração pareceu parar. Ela estava suja de terra e em seu cabelo havia folhas secas, assim como alguns arranhões recentes pelos braços. Natalie pulou da cama, gritando ao ponto do seu pai invadir seu quarto com um rifle em punho.
— O que aconteceu? — Perguntou ele. A garota se jogou no chão, encolhida no canto e tremendo. — O que aconteceu, Natalie? — Joe fungou, sentindo um odor ruim. — Que cheiro é esse?
Ela viu quando seu pai se moveu pelo quarto com uma carranca no rosto. Joe revirou tudo que encontrou pela frente, sentindo o odor pungente de sangue subir nas suas narinas, chegando a desconfiar do que sua filha fazia tanto naquele quarto bagunçado. Natalie deduziu que o pai procurava por drogas, inclusive, ela preferia dizer que estava sob efeitos alucinógenos do que explica o real motivo do seu pavor, mas infelizmente, estava sóbria demais para isso. Quando seu armário foi aberto, o odor se infestou por todo quarto. Joe retirou uma camisola suja de sangue e encarou a filha com desgosto.
— O que está acontecendo com você, hein? Está ficando inútil e louca como a sua mãe? Lave isso! — O pai esbravejou. Atirou a camisola aos pés da filha e saiu reclamando. Natalie se arrastou até a peça de roupa. Ela não usava camisolas como aquela, nem nunca tivera uma peça igual. O sangue também não era fresco, já se encontrando escuro e seco. A garota fungou, achando que de fato estava à beira da loucura como a mãe.
Olhando por cima do ombro, Natalie procurou pelo buraco na janela, mas não encontrou nada. Tudo estava intacto, como se nada tivesse atravessado o vidro furiosamente na noite anterior. Ela puxou o ar para os pulmões através da boca, enquanto os olhos queimavam em forma de lágrimas e as mãos amassavam o tecido. Não era possível que realmente tivesse saído no meio da noite, há anos não tinha episódios de sonambulismo. No entanto, cada recordação que tinha era vivida demais para dizer que não presenciara todo o terror de uma noite atrás. Olhou novamente para a peça nas mãos, tendo novas recordações.
— Não, não! — Balançou a cabeça em negação, atirando a peça de roupa para longe. Encolheu-se ainda mais no canto da parede. Ela conhecia aquela camisola, embora fosse muita loucura deduzir como aquilo havia parado no meio das suas coisas, tendo em vista que a pessoa que usou ele só estivera em sua casa uma única vez. Natalie afundou as unhas na palma da mão até sentir dor. Ela não seria prematura em achar-se louca, talvez herdasse isso com o tempo, mas agora, tinha certeza que algo estava errado com a volta repentina de Charlotte Matthews.
Sem tomar café da manhã, Nat caminhou o mais depressa possível para a escola. Ela não estava ficando louca. Não, nem um pouco. Tudo que estava vivendo era real, mas quem acreditaria nela? Greg? Sim, claro! Talvez o único amigo que possuía, e mesmo assim, era uma bela filha da puta com ele. Mas ela não podia mudar quem era. Após entrar na puberdade, passou a ser tratada duramente pelo pai, que se tornava violento com o passar do tempo. Natalie não tinha culpa se não confiava nas pessoas, por isso sempre esperava o pior acontecer. Ela era assim e ponto final.
No estacionamento escolar, percebeu que as mãos tremiam, sinal de que os calmantes que roubou da mãe ainda não estavam fazendo efeito. De casa até a escola, Natalie temeu se deparar com a trágica notícia do sumiço de Rory, mas o que parecia, era que aquele só seria mais um dia letivo entediante. A maior parte dos alunos ainda jogavam conversa fora, enquanto poucos se dirigiam para dentro do colégio. Em meio a multidão, procurou por Greg no estacionamento, mas não encontrou. Dessa vez, ela não abriria a boca para falar com qualquer um sobre as mil teorias que se passavam em sua cabeça. Gregory era o único que parecia confiar em suas palavras, mesmo que talvez, no fundo, a achasse um pouco louca.
Cansada de esperar pelo colega, direcionou-se para o banheiro feminino na intenção de lavar o rosto. Olivia Jones e Aurora Flanigan compartilhavam a mesma bolsa de maquiagem quando Natalie as surpreendeu com seus expressivos e alarmados olhos verdes. Olivia torceu os lábios e murmurou algo para a colega ao lado quando percebeu que a garota problema da escola a encarava como uma doida.
— Tá tudo bem com você, Nanaty's? — Rory perguntou, jogando uma mecha de cabelo cacheado pelo ombro.
— Sim, claro. — Natalie odiava aquele apelido idiota, mas estava aliviada em ver a colega ainda viva. Demonstrando um falso sorriso no rosto, se aproximou das outras garotas. Sentia a tremedeira parar gradualmente, assim como as vozes em sua cabeça falavam mais baixo. O calmante finalmente estava fazendo efeito, ou parte dele controlava a sua raiva naquele instante. — Como eu não ficaria bem após ser expulsa do time?
— Ah! Meu Deus! Você não foi expulsa do time, Natalie! — Olivia bufou ao bater um pé no chão. Natalie ergue as sobrancelhas, sabendo que a única pessoa que tinha o direito de ficar puta ali era ela. Sabia também que não valeria a pena se desgastar diante a decisão da capitã do time, por isso, se virou para o espelho e arrumou a franja mal aparada para o lado. Seu olhar se deslocou para Rory e um grito escapou da sua boca à medida que ela caia sentada no chão.
Em um piscar de olhos, a colega do time estava estirada no chão, com a garganta dilacerada e os olhos abertos já sem vida. Natalie levou as mãos para os rosto, cobrindo os olhos enquanto pedia para acordar de mais um pesadelo.
— Natalie? — A voz de Rory a trouxe de volta. Com as pupilas dilatadas destacando-se na imensidão verde, Natalie encarou a garota à sua frente, enquanto abaixava as mãos se dando conta que já estava acordada. — O que houve?
— Viu só? É por esse motivo que você teve que sair temporariamente dos treinos. — Olivia surgiu logo atrás de Rory, a encarando de cima a baixo, com o desprezo estampado na face. Natalie se sentiu tonta, ouvindo as palavras distantes. — Fiz pelo seu próprio bem, Natalie, e do time também. Se você não parar com as drogas e as bebidas, terei que realmente a expulsar. Vamos, Rory? — Perguntou a amiga. Aurora uniu as sobrancelhas, preocupando-se rapidamente com o estado catatônico da outra colega, mas por mais que estivesse curiosa para saber o que assustou Natalie, preferiu seguir Olivia para fora do banheiro.
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Greg arrumou os headfones laranja nos ouvidos enquanto escolhia uma música na playlist aleatória. Disperso com tudo à sua volta, mal teve tempo para se defender quando foi puxado pelo capuz do casaco para um cômodo onde eram guardados os itens de limpeza da escola. Apavorado, achou que estava sendo alvo dos valentões da escola, mas foi ao se deparar com uma figura de estatura média e cabelos loiros recém-tingidos, que sentiu seu pavor passar. Arrumando os óculos para poder enxergar melhor na escuridão parcial, percebeu que Natalie não tinha a melhor das expressões no rosto, assim como olheiras abaixo os olhos lhe deixavam com uma aparência ainda mais cansada do que provavelmente deveria estar.
— Nat, vou me atrasar para a aula. — Disse ele, sabendo que perder um dia de aula para Natalie não era uma preocupação. Ela balançou a cabeça, revirando os olhos com pupilas dilatadas. Ela estava drogada?
— Dá pra ser menos nerd por alguns minutos? Preciso falar com alguém antes de enlouquecer de vez. — Natalie ergue brevemente as mãos e as fechou em um punho, tentando tranquilizar algo em seu interior. Greg acenou.
— O que aconteceu?
— Eu não sei bem o que aconteceu, mas algo tem acontecido... Isso faz algum sentido?
— Natalie, você tá drogada? — Greg perguntou, recebendo um olhar feio em resposta. — Desculpa perguntar, mas é que você parece bem agitada e também muito cansada.
— Essa é a aparência de alguém que foi atacada por um morcego ontem a noite e depois foi parar no meio de uma floresta. — Ela passou a mão pelo cabelo. Realmente, Natalie Scatorccio não estava tendo o melhor dos dias e a semana só estava começando. Enquanto a garota puxava algo de dentro da mochila, Greg se questionava o quanto sua amiga estava sendo afetada desde que jurou ter recebido uma visita de Charlotte Matthews em sua casa. — Era um pesadelo, é nisso que quero acreditar, mas hoje pela manhã, eu acordei suja como se estivesse na mata e isso... — Natalie puxou um tecido encardido para cima. — Apareceu no meu quarto, mas não é meu.
— Isso é uma camisola? — Gregory enrugou o nariz com o odor. — Espera aí, isso é sangue?
— É da Charlotte! Ela usava essa camisola quando apareceu na minha casa.
Natalie sentiu a voz desafinar ao dizer aquilo com tanta convicção, mas era um fato, mesmo que não soubesse explicar como foi possível daquilo acontecer. Greg empurrou os óculos para trás, assimilando tudo que ouvia.
— Bem, eu... eu não sei o que dizer. — O garoto encolheu os ombros e coçou a cabeça. — Se a camisola é dela, então de quem é o sangue?
— Você não acha estranho que na mesma noite em que Charlotte Matthews apareceu, foi a mesma em que duas pessoas foram atacadas?
Dessa vez, Gregory sorriu, mesmo que tenha sido por puro nervosismo. Natalie encarou o pano nas mãos. E se tudo não passasse de uma brincadeira de mal gosto por parte de Lottie? Não seria a primeira vez que isso acontecia. Nat era sempre o alvo de brincadeiras e piadinhas por parte da filha do prefeito. Por outro lado, considerando o estado que se deparou com Charlotte e as coisas que aconteceram depois do encontro, começava a considerar que tudo tinha uma certa ligação.
— Ta achando que a Lottie atacou essas pessoas? O que ela seria? Um monstro? — Greg
— Não tenho certeza, mas acho que pode acontecer de novo... — Natalie ergueu os olhos para Greg. Lambeu os lábios antes de prosseguir. — Acredito que outra pessoa vai ser morta ou atacada. — O modo como falou fez com que o garoto a sua frente estremecesse. Só de imaginar Rory morta na floresta e depois no banheiro da escola, já sentia os nervos à flor da pele.
— Nat, eu acredito em tudo que diz, mas isso tá ficando muito estranho. — Greg segurou o braço da amiga. Os olhos claros e brilhantes encontraram os seus naquele cubículo. — Você claramente não está bem, então acho que deva deixar isso de lado e tentar pensar em outras coisas.
— No fundo, você não acredita em mim, né? — Natalie se afastou do colega.
— Não é isso, mas, pense bem. Se a Charlotte realmente voltou, por que ela ainda veio para a escola ou a notícia não se espalhou pela cidade? E tem mais, não acha que se você por isso na sua cabeça, não será um motivo maior para as garotas acharem que você ficou louca e aí será expulsa de vez do time?
— Sinto muito se não consigo esconder que tudo isso está saindo do controle, Gregory, ou se acho estranho tudo que tem acontecido. — Sem saber disfarçar a decepção, preferiu encerrar a conversa ali mesmo. — É melhor você ir para aula, não quero que pegue uma advertência por minha causa. Achei que você poderia me ajudar, mas sem problemas, vou dá um jeito de descobrir sozinha que porra tá acontecendo nessa cidade.
— Natalie, não era para você ficar chateada, era só para ter mais cuidado.
— Sim, claro, você se importa comigo e blábláblá... — Ela gesticulou irritadiça. Dessa vez, foi Greg que revirou os olhos e bufou.
— Eu vou me arrepender de dizer isso. — Ele ergueu o olhar para o teto brevemente. Respirou fundo e depositou toda a atenção novamente na garota a sua frente. — O que você está pensando em fazer e que posso ajudar?
Greg realmente estava certo em se arrepender de ter dito aquelas palavras, pois o sorriso acompanhado de um olhar travesso dado por Natalie fez com que ele desejasse que um buraco surgisse no chão e o sugasse para longe dela.
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— Você sabe que invasão domiciliar é crime? — Greg arregalou os olhos quando Natalie falou o que tinha em mente. — E que invadir a casa do prefeito é um crime ainda mais grave, né?
No entanto, era tarde demais. Natalie já se encontrava fora do carro, enquanto caminhava em direção aos enormes portões de ferro que levavam à mansão Matthews. Horas atrás, quando Gregory ousou perguntar como poderia ajudá-la, não imaginou que teria que invadir a casa de uma figura importante no meio político. Claro que Natalie só contou o que pretendia fazer ao chegar no lugar, sabendo que se falasse antes, provavelmente nem entraria no carro. Greg foi logo atrás, tendo que caminhar mais rápido que o de costume para alcançar a garota. Estavam do outro lado da cidade, onde a parte nobre e importante residia. Por ser um bairro de classe alta, não havia movimentação na rua, o que era perfeito para a Natalie.
Para uma mansão onde o prefeito vivia, achou o lugar decadente. A ausência dos seguranças ou cães de guardas também era suspeito. Após o sumiço de Charlotte, o boato de que a senhora Matthews havia caído em uma tristeza profunda ganhou toda a cidade. Durante três meses, Emilia e Malcolm Matthews se afastaram não só da profissão que levavam, mas de todos os holofotes, mesmo que a imprensa sempre os procurasse para saber como andava a busca por sua primogênita. Pelo que parecia, o boato era verdade, pois em toda sua vida, nunca tinha se deparado com um lugar tão abandonado como a mansão se encontrava agora.
— Os pais da Lottie nem devem mais morar aí, parece tudo tão... abandonado. — Greg estava ofegante, parado ao lado de Natalie.
— Ou querem que se pareça abandonado para não serem perturbados. — A garota andou de um lado para o outro.
Além dos enormes e pesados portões de ferros, no qual o brasão da família mais tradicional da cidade estampava gloriosamente o centro, um caminho de paralelepípedos levava a enorme mansão de paredes brancas. Mesmo ao longe, Natalie podia ver claramente as cortinas pesadas cobrindo todas as janelas e como a vegetação ganhava espaço no terreno selvagemente. Ela já havia chegado até ali e não pretendia ir embora sem bisbilhotar o que tinha do outro lado. Percebeu que o muro não era tão alto, e como tudo à sua volta parecia deserto, decidiu arriscar-se a entrar.
— Vem, me ajuda a pular o muro. — Disse ela.
— Não, Natalie, ficou louca? Vamos embora!
— Greg, nós já viemos até aqui. — Ela se virou para o colega. — Só vamos entrar, procurar a Charlotte e depois ir embora.
— E se ela não estiver aí? — Greg perguntou. — Não parece ter ninguém aí...
— Então vamos embora. Vamos, não vai demorar.
— E se...
— Vamos dar um jeito, tá certo? — Natalie respirou fundo.
Greg passou a mão pelo cabelo, desejando que de fato não houvesse ninguém na mansão, assim podiam entrar e sair sem serem vistos. Natalie se preparou para pular o muro quando o colega a segurou pelos tornozelos. Sua queda foi amortecida pelos arbustos, mas o garoto não pareceu ter a mesma sorte, caindo de cara na grama seca.
— Vamos, rápido. — Natalie o puxou para cima.
Natalie tomou a frente, enquanto Greg ainda retirava folhas secas do cabelo logo atrás. À medida que ela se aproximava da mansão, sentia os pelos do corpo arrepiarem e uma assombrosa sensação de ser observada aumentar. Quando um galho pareceu quebrar e passos rápidos virem a sua esquerda, Natalie parou, em alerta.
— Ouviu isso? — Perguntou ela, ao encarar os lados. O garoto esbarrou em suas costas, fazendo com que Natalie olhasse para trás. Não havia mais ninguém ali além deles, e tudo que via através dos portões era o carro da mãe de Greg, que ele usava para ir à escola.
— Não, o quê? — Greg franziu o cenho com a pergunta, olhando na mesma direção que Natalie.
— Nada, só pensei ter ouvido algo, vamos dá a volta pela mansão e tentar entrar pelos fundos.
— Já esteve aqui antes?
— Uma ou duas vezes. — Natalie voltou a caminhar, dando de ombros. — Eu não era amiga da Charlotte, então era raramente convidada para as festas que ela dava.
— Não entendo como pode se importar tanto com uma garota se era claro que vocês se desprezavam.
Natalie mordeu os lábios. Era um fato que Natalie Scatorccio e Charlotte Matthews tinham lá seus atritos, mas desprezo era uma palavra forte para definir o que uma sentia pela outra. Elas só eram garotas com gostos diferentes, vivendo realidades diferentes, mas que por ironia do destino, tinham que aprender a conviver juntas. E após os últimos acontecimentos, Natalie sentia algo a puxando para Lottie como um ímã.
Uma ventania forte fez com que os jovens estremecessem. Ainda estava longe de escurecer, mas o céu se encontrava cinza e com nuvens pesadas alertando sobre uma tempestade. Natalie foi a primeira a chegar à porta da frente, girou a maçaneta, mas a encontrou fechada. Tentou espiar pela janela, mas as enormes cortinas impediam qualquer visão do lado de dentro da mansão.
— Vamos... — Natalie chamou Greg para que atravessassem o jardim até chegar nos fundos. No entanto, a cada passo que davam, um odor de podridão crescia em suas narinas. — Que fedor é esse?
— Parece algo morto. — Greg fez uma careta.
Caminharam mais alguns metros até parar bruscamente, completamente em choque. Nos fundos, não muito distante da área de lazer, centenas de pássaros de todas as espécies se encontravam mortos e em um estado avançado de decomposição. Greg vomitou, enquanto Natalie piscava com o tremor crescendo de dentro para fora. Sentiu as pernas paralisadas, assim como a sensação de ser observada. Tomando coragem, ela se aproximou um pouco mais. Os pássaros não estavam feridos, só pareciam ter morrido subitamente naquele local. Os pássaros sempre sabem quando há perigo, podia ouvir a voz da mãe arranhar em seus ouvidos. Natalie ergueu a cabeça na direção que se encontrava o quarto de Lottie, e para sua surpresa, era a única janela que se encontrava com as cortinas abertas.
— Já chega, Natalie, vamos sair daqui agora! — Sem protestar, foi levada por Greg de volta para a entrada da mansão. Embora não quisesse, arriscou-se espiar novamente por cima dos ombros e dessa vez pode jurar ver uma silhueta feminina do lado de dentro da mansão.
Pássaros ficam em silêncio quando há algo ruim
Os pássaros sempre sabem quando há perigo
Os pássaros agora se encontram mortos...
E ai gente, qual a teoria de vocês?
Somos +2k, muito obrigado ♥
CAPITULO ATUALIZADO: 24/02/2024 - NÃO REVISADO
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