Chào các bạn! Vì nhiều lý do từ nay Truyen2U chính thức đổi tên là Truyen247.Pro. Mong các bạn tiếp tục ủng hộ truy cập tên miền mới này nhé! Mãi yêu... ♥

𝐂𝐀𝐏𝐈𝐓𝐔𝐋𝐎┊𝟎𝟑𝟔

┅━━━╍⊶⊰⊱⊷╍━━━┅

Sob um céu cinzento, um antigo abatedouro erguia-se no horizonte daquele caminho tortuoso. Amara permitiu abrir os olhos durantes alguns momentos da viagem: quando sentia curvas fechadas ou a estrada se tornar mais arenosa. Ela estava longe do centro e de qualquer civilização, indo diretamente para um verdadeiro matadouro. O plano de Helena era para ser prático e dar um fim rapidamente a tudo. Amara fingiu estar inconsciente com a chegada dos capangas de Andrea, levada até aquele lugar distante. Ver a garota ser morta não fazia parte dos planos, mas agora teria que agir sozinha. Achar Thomas era a primeira tarefa.

Embora estivesse em choque com o que acabara de acontecer, Amara tentou não demonstrar medo. Sabia muito bem como era estar entre homens como Mancini, cujo medo era o melhor aroma para homens sádicos como ele. O corpo de Helena estava no meio de uma enorme poça de sangue. A Shelby evitou encarar o que restara da cabeça da menina e sentir o cheiro de sangue. O estômago revirava com um misto de medo e preocupação. Era óbvio que Andrea não manteria uma garota em meio aos seus planos e a usaria até que conseguisse o que realmente queria. Infelizmente, agora Amara era a garota da vez.

— Cadê o Thomas? — Amara perguntou. Mancini coçou o espaço da sobrancelha.

— Isso é fascinante. — Andrea sorriu de lado. Deu um passo largo até ela. — Está correndo perigo e mesmo assim se importa com a vida daquele homem.

— Aquele homem é meu marido!

— É claro que é. — Andrea confirmou entredentes. Acenou rapidamente para os dois outros homens. — A leve para os fundo e a amarre na cadeira.

— O que você vai fazer? — Amara se debateu quando braços fortes a seguraram. Seria inútil lutar contra aqueles dois homens que tinham o dobro de seu tamanho, mas não costura tentar.

Andrea não respondeu. Amara foi arrastada sob protesto até uma sala escura, sendo presa em uma cadeira de madeira velha e desconfortável. Foi deixada sozinha e porta trancada. Embora estivesse frio, ela sentia o suor escorrer do cabelo para a nuca. O coração estava acelerado e todos seus pesadelos pareciam tomar forma naquela escuridão. Horas se passaram, foi o que Amara deduziu e talvez não estivesse errada. A claridade invadiu o quarto escuro novamente, mas dessa vez vinha das lâmpadas do pátio. Andrea entrou arrastando uma cadeira, onde um barulho soava doloroso nos ouvidos da mulher. O olhar verde e cortante foi erguido na direção do homem. Ele sorriu de forma diabólica, estava adorando o espetáculo.

— Por que ainda não me matou? — Amara sentiu a garganta seca. Andrea sentou-se na cadeira e cruzou as pernas. Usava o terno caro e os cabelos pareciam molhados, provavelmente do lado de fora estava chovendo e se confirmou quando um trovão bradou estridente do lado de fora.

— Porque agora que a tenho, sei que será muito fácil de matá-la. — Umedeceu os lábios ao dizer aquilo. — Olhe, trouxe algo para ler para você. — Andrea puxou um livro. Amara apertou os dentes quando pôde ler o que havia na capa: O Império de Mooney. — Às vezes a frieza é a única defesa de quem um dia já sofreu muito ou foi bom demais. Seria esse o caso de Kevin Mooney? — Andrea fechou o livro ao terminar a passagem. — Lembra dessa frase? Você a escreveu no fim do capítulo trinta e nove. Não faz ideia do quanto tem razão.

Por baixo do olhar escuro e divertido, Andrea escondia ódio e desprezo. Amara engoliu em seco, estava com sede e com fome, mas não ousaria pedir nada àquele homem. Ela se manteve em silêncio, estudando como sairia dali e onde estaria Thomas.

— Não parece curiosa para saber o motivo de tudo isso estar acontecendo. — Andrea cruzou as pernas. Umedeceu os lábios a estudando. — Não. Você é uma mulher calculista, Amie. Então provavelmente está pensando em como sair daqui e como vai encontrar seu marido.

— Até que para um invejoso e psicopata de merda, você não é tão burro. — Falou de modo grosseiro. Ele sorriu com vontade. Amara revirou os olhos, irritada.

Andrea se inclinou para frente, estreitando o olhar com o da mulher. Jogou o livro para o chão quando apoiou os cotovelos acima dos joelhos.

— Antes de Richard adotar você como o bichinho de estimação, ele tinha a mim. — A voz se tornou rouca e grave. Andrea desviou o olhar para as mãos, agora vazias. — Ele me deu tudo e me tirou ao mesmo tempo. Quando ele morreu, era para mim que todas aquelas coisas deveriam ter ficado, mas era seu nome que estava lá. — Fechou as mãos em um punho apertado. Amara prendeu a respiração quando Andrea ergueu o olhar, ainda mais sombrio. — Felizmente, ainda pude controlar tudo, mesmo sendo você na frente das decisões. Não era tão ruim, afinal, mas eu sempre fiquei com o serviço mais difícil, enquanto você fazia a frente dos negócios.

Andrea se recordava bem do passado. Durante uma parte da infância viveu em um orfanato após perde a família para um incêndio ainda na Itália. Embora suas condições naquele lugar fossem ruins, Mancini era objetivo e otimista, acreditava que seus dias melhores viriam. Foi transferido da Itália para Nova York ainda aos onze anos, após delata abusos sofrido por parte de alguns funcionários. Ao ver todos seus amigos do novo lar ganharem famílias, Andrea passou acreditar que deveria fazer tudo sozinho. Aos dezoito anos, quando não tinha mais idade para viver no orfanato, ganhou as ruas e roubava carteiras para sobreviver. Foi em um deslize ao bater uma carteira, que um generoso homem cruzou seu caminho: Richard Abbott. Sem filhos, o homem ofereceu uma oportunidade quase única ao jovem, que não hesitou em recusar. Em poucos anos, Andrea se tornou um advogado, trabalhando como braço direito de Richard, até a chegada de Amara, uma americana metade cubana cheia de opiniões a frente do tempo e um olhar verde flamejante.

— Eu deveria ter demitido você na primeira oportunidade...

— Deveria, mas não fez. — Ele se levantou da cadeira. Uma mão pousou sob o queixo de Amara, apertando-a. — Ao invés disso você se entregou para mim tão facilmente. — Sorriu recordando-se das vezes que possuiu aquele corpo curvilíneo. — E aí eu pensei, talvez possamos nos casar e depois disso, eu a ponho em seu devido lugar, em casa, cuidando dos meus filhos. — Andrea afundou os dedos no rosto de Amara, fazendo-a emitir um baixo ruído de dor. — Mas você viajou e voltou casada com outro homem e então meus planos foram por água abaixo. Mesmo que eu pudesse roubar-la dele, não seria fácil, e eu não estava tão disposto a isso. Então tudo piorou. Seu marido começou a se meter em assuntos que não era chamado. Você passou uma parte do controle para um deles, o jovem Michael Gray. Foi quando eu não só passei a odiar somente você, como passei a odiar Thomas Shelby e toda aquela escória que ele chama de família.

— E como achou que me matando teria tudo? Você deu um tiro no próprio pé. — Amara sorriu de modo sarcástico.

Andrea se afastou, passando a mão pelo cabelo.

— Mesmo depois de tudo, ainda sou o segundo nas empresas Abbott. — Deu um passo na direção dela novamente. — Você não tem filhos porque é fraca demais para isso. Então com sua morte e logo a do seu marido, tudo seria meu. Todos os negócios, até mesmo seu precioso jornal.

— Você deixou que a ganância o cegasse! — Amara cuspiu as palavras.

— Não, Amara. Eu só deixei que ela abrisse meus olhos. — Ele disse, seguro. Seus olhos escureceram ainda mais. 

Amara parou de ouvir qualquer coisa quando uma arma foi puxada e apontada para sua cabeça. Andrea sorriu ao tirar a trava. Morrer daquela forma não era como ela esperava, mas se preparou para o final. Amarrada, sentiu as cordas ferirem os pulsos. Fechou os olhos e esperou pelo fim chegar, mas não foi o que aconteceu.

Alguém chamou Andrea do lado de fora, talvez um dos capangas. O homem saiu em passos carrancudos pela porta. Amara voltou a respirar, sentia o rosto molhado devido ao suor e lágrimas que caíam silenciosamente de seus olhos. Ela precisava fugir. Não pensou muito quando jogou todo o peso do corpo para o chão, caindo violentamente sobre o piso de cimento gelado. A cadeira era velha, mas parecia firme, ela precisaria de muito mais esforço. Com um gemido de dor, Amara forçou os braços com intenção de ceder às cordas, mas nada aconteceu, o nó estava apertado.

A luz que invadia a brecha da porta, iluminava parcialmente o cômodo. Amara olhou em volta, vendo uma serra sobre uma mesa. Ainda no chão, rangeu os dentes para se levantar, felizmente não tinha os pés amarrados, mas ainda estar presa a cadeira não facilitava nada. Ela se arrastou até outro lado da sala, tentando a todo custo fazer o mínimo de barulho possível. Perto da mesa, se assustou ao ouvir dois disparos. A única coisa que pensou foi em Thomas. Só podia ser ele em algum lugar daquela fábrica.

Teve que agir rápido, erguendo a cadeira somente com a força das pernas, tentando não se render à dor das câimbras. Gemeu dolorosamente quando a serra a cortou ao invés de partir a corda. Ela tentou outra vez, mas era impossível enxergar por cima do ombro ou com a escuridão. Contudo, Amara não iria desistir. Deveria dar um basta naquilo. Andrea tinha que morrer.

┅━━━╍⊶⊰⊱⊷╍━━━┅

Era noite. Novamente Thomas se via em meio ao nevoeiro espesso. Ele sabia que nada viria a seguir a não ser as vozes que diziam palavras indecifráveis. No entanto, agora estava tão escuro que mal pôde deduzir se o que via diante dele era uma rua de paralelepípedos ou uma parede de tijolos.

Thomas acordou, percebendo estar em uma sala mal iluminada e espaçosa. O ombro parecia queimar de dor, assim como sentia frio ao ponto de bater o queixo. Havia perdido muito sangue e imaginou que ali realmente era seu fim. Nunca deveria ter saído de perto dos Peaky Blinders, mas agora era tarde demais para se lamentar. Amarrado em uma cadeira, Thomas apertou os olhos antes de abri-los com dificuldade para a luz forte que invadia a entrada principal. Viu uma silhueta se aproximar de modo cauteloso. Deduziu que fosse uma mulher, fazendo-o se sentir aliviado, ao mesmo tempo que mais horrorizado.

Amie... — Murmurou, ofegante e cansado.

— Não sou tão gracioso. — Aquela voz. Thomas abriu os olhos se deparando com Andrea. — Ah, perdeu tanto sangue que agora está delirando.

— Por que não me solta daqui e resolvemos tudo como homens? — Thomas se sentia fraco, mas ainda daria conta de arrancar o riso cínico no rosto daquele italiano.

— Thomas Shelby é realmente difícil de derrubar. — Andrea passou a língua entre os lábios. Se afastou do cigano. Logo Thomas morreria e isso se devia apenas pela quantidade de sangue que era perdida a cada minuto. — Você não parece nada bem, mas logo fará companhia para sua esposa.

— Se você tocar em um fio de cabelo dela, eu juro que arranco seus olhos com você ainda vivo! — Thomas trincou o maxilar. Andrea inclinou o rosto, ligeiramente divertido.

— Quando ela chegar, vou fazer questão de matá-la na sua frente. — Andrea deu passos para trás, deixando Thomas Shelby sozinho entre gritos e urros de raiva.

Protestar naquela cadeira só piorará a situação. Thomas apertou o maxilar sentindo dor pelo corpo e logo caindo em um sono exaustivo. Quando retornou consciente ouviu o barulho do carro, gritando por socorro imediatamente, mas ninguém veio. Alguns minutos depois, um disparo no andar de baixo fez com que todos os instintos do cigano entrassem em estado de alerta.

Alguém havia morrido.

Thomas traçou uma forma de fuga. No entanto, viu as horas passarem rapidamente mais uma vez. Quando a porta foi aberta, o Shelby se preparou para o que deveria fazer. Fingiu estar inconsciente. Nem mesmo os tapas que recebeu no rosto foram possíveis de tirar alguma reação do homem.

— Cigano maldito. — Ouviu as palavras serem ditas com nojo.

Foi nesse instante que ele agiu. Primeiro chutou as partes baixas do outro homem. Depois se atirou na direção dele com a cadeira com toda a força que podia. Thomas gritou de dor, o ombro ainda o lembrava que precisava de cuidados. O capanga rolou para o lado, nesse mesmo instante Thomas se livrava das cordas e o puxava pelos suspensórios, derrubando-o no chão. Foi então que o Shelby avistou uma arma, e soube que precisava dela.

A adrenalina entrou no sangue do cigano, fazendo com que parasse de sentir qualquer dor e buscasse apenas causar. Thomas girou o punho na direção do outro homem, ouvindo algo quebrar quando os dedos colidiram com o queixo. O capanga de Mancini era grande, mas não era tão bom em lutas corporais. Com vantagem, Thomas acertou outro chute no homem, fazendo-o ir ao chão.

A arma caiu do coldre, deslizando para o chão. Thomas foi ágil em apanhá-la e retirar a trava. Ouviu um pedido de misericórdia, mas isso cabia apenas para Deus e não a Thomas Shelby, o diabo de Small Heath. Com o olhar azul e mais frio que tinha, disparou no homem duas vezes. Agora precisava encontrar Amara e matar Mancini.

┅━━━╍⊶⊰⊱⊷╍━━━┅

— O que pensa que está fazendo? — Um homem entrou na sala. Amara parou onde estava. — Sua vagabunda!

Em um passo largo o homem estava diante dela. Amara engoliu em seco com a aproximação. Sentia o cheiro de suor e chuva no homem, a deixando enjoada. O homem, cujo olhos escuros não a intimidava, a segurou pelo pescoço. Amara rangeu os dentes quando a língua áspera e fedida foi raspada no rosto dela. O gesto repugnante trouxe não só sensações ruins, mas como lembranças do que acontecera-lhe há muito tempo.

— O Sr. Mancini deveria usar você da forma certa. — Falou no ouvido dela. Amara prendeu a respiração, sentindo aos poucos a corda ceder em suas costas.

— Eu tenho uma ideia. — Arriscou falar. O homem ergueu as sobrancelhas, curioso.

— Então você realmente não passa de uma vadia. O que tem em mente, doçura? — Perguntou.

Amara sentiu o interior congelar quando deixou que as cordas caíssem para o chão, assim como a cadeira. Um riso cruel passou pelos lábios da mulher quando ela conseguiu agir mais rápido do que o homem, atingindo a clavícula dele com a serra.

— Matar você, imbecil. — Olhos escuros estavam presos na mulher. Amara tirou a serra enfiando na altura do coração. Aproximou o rosto para o ouvido do homem, ouvindo com nitidez os músculos e artérias abrindo lentamente até o fim. — Espero que queime no inferno, mas guarde um lugar para seu chefe.

Amara sabia que poderia acabar com toda a raiva que sentia esfaqueando aquele corpo inúmeras vezes. Contudo, optou por deixá-lo definhando, arrancando dele a arma e a munição. Com um pedaço do próprio vestido, fez um curativo no braço ferido — era um corte feio, mas ela sobreviveria. No pátio, ouviu o estrondo de um trovão. Pelo que parecia a tempestade iria ser o plano de fundo daquela perseguição. A mulher olhou em volta, estava em um lugar grande e poderia encontrar Thomas ou Andrea em qualquer lugar. Não sabia por onde começar, mas queria que tudo acabasse logo. O corpo de Helena ainda estava no mesmo lugar, fazendo com que Amara torcesse o nariz ao passar por ela e corresse para o corredor do lado esquerdo.

Odiava o fato de estar usando vestido e sapatos inapropriados para aquela situação. Um jeans e tênis poderiam facilitar muitas fugas, principalmente durante a chuva. Amara verificou o tambor da arma, estava cheio e dentro do sutiã ainda carregava mais balas. Se tivesse sorte, usaria todas em Andrea. O barulho de pisadas fez com que Amara parasse onde estava se preparasse para atirar.

— Devo admitir, vocês são espertos. — Ouviu a voz de Andrea ecoar no corredor. Ele ainda estava longe, mas falando alto o suficiente para poder ser ouvido. — Formam um belo casal de suicidas.

Andrea não teve uma resposta. Após encontrar os dois capangas mortos, viu que estava sozinho. Agora, o caçador vira caça.

— Você não me queria? Vem me pegar. — A voz de Amara ecoou alta e divertida.

Andrea chutou uma porta, invadindo um corredor estreito e longo. Uma risada feminina veio logo depois. Ele olhou em volta, perdido.

— Você não faz ideia para onde está indo. Estamos em um labirinto traiçoeiro, Mancini. — A voz de Amara soou de um outro corredor.

Era um jogo. Andrea desconhecia esse lado da Sra. Shelby. Era novidade para Mancini ver como ela se tornava uma versão sombria de si mesmo. Interessante, ele se sentia excitado por isso, não negava que gostasse do lado obscuro de Amara. No entanto, não poderia se cansar, esse jogo era arriscado e o fim era a morte, mas não seria ele que morreria naquela noite. Contudo, teria que ser cauteloso, aliás, Thomas Shelby também caminhava vivo pelos corredores do abatedouro.

— Vamos brincar, Andrea. — Amara levantou a arma na altura do rosto quando deu passos silenciosos. Ela sorriu silenciosamente ao se deparar com o homem no fim de um corredor escuro. — E está com você.

Mancini estava perdido, da forma que Amara pretendia deixá-lo. Era uma presa fácil. Mesmo sentindo o punho tremer, atirou quantas vezes pôde. Andrea gemeu com dor quando algo perfurou seu corpo. Havia sido baleado na altura da coxa. Ele girou, atirando na direção da mulher. Amara entrou em uma sala e retribuiu os tiros, mas sabendo que não tivera a sorte de acertar nenhum novamente. Foi então que uma terceira onda de tiroteios aconteceu. Amara sentiu o coração acelerar e um nome fluir de seus lábios em um suspiro pesado.

Thomas!

Novos passos foram ouvidos pelo corredor. Amara sentiu as pernas fraquejarem ao sair pela porta. Thomas parou no meio do caminho, ofegante e molhado como se estivesse na chuva. Ele se apoiou na parede no mesmo instante que a esposa correu para ampará-lo. O Shelby queimava como fogo, e isso foi o que preocupou Amara imediatamente. Thomas estava ferido no ombro e possuía uma palidez preocupante.

— Preciso tirar você daqui. Precisamos de um médico. — Ela olhou para trás, vendo rastros de sangue. — Andrea, onde ele está?

— O desgraçado correu quando eu atirei. — Falou ofegante. Thomas deslizou para o chão com a esposa.

Mais um pedaço do vestido que Amara usava serviu para um curativo improvisado e bem apertado. Se continuassem se ferindo durante o ataque, logo seu vestido mal cobriria as coxas. Thomas rangeu os dentes com dor. Quando a adrenalina é dissipada, as dores voltam como uma avalanche impiedosa por todo o corpo. E o cigano se sentia assim, quase à beira da morte, mas ele não morreria ali.

— Eu tenho que ir atrás dele. Preciso terminar com isso! — Amara segurou o rosto de Thomas. Os olhos azuis não tinham brilho e os lábios volumosos estavam secos e rachados. — O carro que me trouxe aqui ainda deve estar lá fora. Você precisa dirigir e buscar ajuda.

— Eu não vou deixar você aqui! — Thomas uniu todas as forças para falar. — Eu vou matar aquele desgraçado.

— Eu faço isso. — Ela o segurou contra a parede. Thomas enrijeceu com a autoridade da mulher. — Se você der mais um passo é capaz de cair sem forças.

Aquele não era um momento para discussão. Thomas suspirou cansado, rendendo-se contra vontade para a decisão da esposa. Amara se levantou novamente e contou quantas balas havia restado no tambor da arma e no sutiã; no total havia sete. Aquilo seria mais que o suficiente para matar Andrea. Thomas ergueu o rosto para ela. Ver a esposa concentrada era sempre tranquilizador para ele. Contudo, nesse instante, a calmaria só antecede a agitação. Ouvir a esposa provocar Mancini foi o que fez o Shelby ver o quanto a mulher era criativa e muito cruel, uma face sombria, escondida por detrás de muitas camadas boas que ela demonstrava.

Era possível sentir a raiva de Amara em pequenos movimentos. Ela estava inquieta, consumida inteiramente pela adrenalina e vingança. Quem diria que aquilo até a deixava mais bela. Cavalos lentos e mulheres rápidas eram as ruínas dos Shelby, assim o patriarca da família dizia. Após conhecer Amara, Thomas entendeu o motivo de furacões e tempestades levarem o nome de mulheres. Amie era uma bela ruína para qual ele perderia tudo de bom grado.

— Na família Shelby, as mulheres são mais perigosas que as armas de fogo. — Ele falou. Amara se ajoelhou no chão.

— Eu aprendi muitas coisas com meu marido, e uma delas é que o ataque é a melhor defesa. — Falou antes que o puxasse para um beijo demorado e salgado.

┅━━━╍⊶⊰⊱⊷╍━━━┅

Deixar Thomas para trás não era do gosto de Amara, no entanto, ela sabia que o marido não se encontrava em boas condições para lutar. Nessa guerra, ele ficaria de fora. Havia marcas de sangue pelos corredores. Amie foi cautelosa ao segui-las. O que poderia ser algo útil para achar Andrea, poderia ser também uma isca para uma emboscada. Aquele era um jogo mortal e traiçoeiro.

Amara subiu dois lances de escadas. Notou como a quantidade de sangue aumentava à medida que se aproximava do final do corredor. Uma porta estava aberta permitindo que um vento frio e a gotas de água geladas atingissem a mulher. A chuva do lado de fora era impiedosa. Os raios iluminavam o céu como se o quisesse parti-lo ao meio. Cautelosa, ela atravessou a porta. De uma hora para outra ela estava do lado de fora do abatedouro, em um telhado alto, sentindo a chuva a atingir com força.

Ergueu o punho, se preparando para atirar a qualquer momento. Estava escuro, tanto que teve que abrir mais os olhos para poder enxergar algo à sua frente. Seus pés afundaram em uma poça rasa de água. Naquele instante, Amara não se importava mais em estar completamente encharcada ou com um vestido destruído. Um vulto chamou atenção da mulher, foi então que uma silhueta tomou forma diante dela.

Era Andrea. Ele mancou, mas manteve uma distância considerável da mulher. Amara o estudou. Mancini estava machucado, um dos tiros o atingira na coxa direita e outro, provavelmente dado por Thomas, o atingira na mão esquerda. O riso doloroso foi grande o suficiente para Amara ver. Andrea não queria demonstrar dor, embora fosse isso que sentisse no momento.

— Acabou para você. — Ela deu um passo para perto. Andrea não estava armado. Estranho.

— Aí está a Amara que eu sempre quis conhecer. — Ele tossiu. — Onde está sua decência?

Amara sorriu secamente. Sentia o cabelo molhado e pesado colado na nuca, assim como o vestido. As gotas da chuva se misturavam ao suor da mulher, descendo pelo rosto, pingando generosamente pelo queixo, entrando pelo vestido e escorrendo por todas as curvas. 

— Eu não sou tão decente quanto pareço. — Disse Amara. — Eu sou maldosa, vingativa e até insensível quando se trata de proteger a mim mesmo ou minha família. — Ela deu mais um passo para frente quando Andrea deu outro para trás. — Eu já fiz coisas ruins antes, e eu não me importaria de fazer novamente para me proteger, Andrea.

— Belo discurso. — Ele abriu os braços. — Você me tem agora, então me mate. — Fez uma pequena pausa antes de continuar. — Mas se eu voltar, então será toda sua família que eu irei matar. Um por um.

— Eu vou garantir que você não saia do inferno! — Amara deu um passo largo.

O primeiro disparo cortou a chuva no mesmo instante que um raio bradou no céu. O vermelho se tornou ainda mais vivido na camisa branca. Andrea estava inexpressivo, assimilando o que acabara de acontecer. A dor de um tiro era quase inexplicável, queimava e ardia ao perfurar a carne. Outro disparo veio em seguida, dessa vez o atingindo no ombro. Andrea quase perdeu o equilíbrio. Os outros tiros não o atingiram, mas fizeram com que ele recuasse ainda mais.

Com um passo para trás, Andrea deduziu o que restava para ele. Um outro passo foi decisório, fazendo com que o corpo caísse de modo pesado no vazio. Amara gritou, correndo até a beira do telhado. Com a tempestade, o rio que passava aos fundos da fábrica parecia feroz, quebrando as ondas em grandes rochas pontiagudas. Parecia fundo, assim como deveria ter quilômetros de floresta adentro. Amara não sabia onde aquele rio desaguava, mas esperava que fosse em um lugar longe o suficiente para que Andrea jamais voltasse.

De volta ao andar de baixo, Amara se desesperou ao encontrar Thomas quase inconsciente. O ferimento no ombro estava infeccionado e se eles não saíssem logo dali, poderia ser pior para o Shelby.

— Thomas... — Amara segurou o rosto suado entre as mãos. O homem piscou, enxergando duas mulheres a sua frente.

— Amie... — Murmurou. — Acabou?

— Você precisa andar, vamos. — Ela o ergueu com toda a força que ainda restava.

O caminho para fora da fábrica pareceu se tornar maior. Thomas era pesado e seus passos eram lentos. Dentro do carro, Amara tentou afastar o nervosismo enquanto dirigia praticamente às cegas na tempestade e na escuridão. Ela não conhecia a estrada, tampouco sabia onde estava. Se guiou pelos elementos que viu antes de chegar ao abatedouro: uma fazenda e logo adiante uma cabine de telefone vermelha.

Thomas tremia, encolhido no banco de couro. Pesadelos e alucinações o assolavam devido à febre alta. Amara afundou o pé no acelerador, tentando fazer com que o automóvel fosse mais rápido, mas isso ainda era muito possível. Viver naquela época era está limitado há muitas coisas. Encarou o marido ao lado, dizendo que tudo ficaria bem. Tentou acreditar nisso, embora fosse um pouco difícil.

┅━━━╍⊶⊰⊱⊷╍━━━┅

HORAS DEPOIS

A movimentação na entrada do hospital chamou atenção do Dr. Hathaway. Nicholas deixou alguns pacientes aos cuidados dos olhares atenciosos das enfermeiras, partindo em direção a recepção. Não era comum ver agitação naquele hospital, por isso, qualquer situação fora dos conformes era um indício de alerta para o médico. A primeira surpresa foi ver um Shelby baleado ser colocado em uma maca. A segunda foi encontrar Amara em uma situação não tão diferente da do marido, mas diferente dele, ela não parecia ter ferimentos graves.

Nicholas acelerou os passos, parando próximo à mulher. O olhar clínico de Hathaway caiu sobre ela. Amara estava abatida, com olheiras escuras e molhada devido à tempestade. O vestido estava sujo e rasgado. Era como se ela tivesse saído de uma guerra.

— Nick! — Amara o chamou, surpresa.

— Pelo amor de Deus, o que aconteceu com vocês? — Ele perguntou. Nesse momento Thomas já havia sumido em um corredor com uma equipe de enfermeiros.

— Tanta coisa. — Amara falou. Estava cansada. O Corpo começava a dar sinais de exaustão.

— Você está ferida. — Nicholas desviou a atenção para o braço da mulher, onde um pedaço de pano cobria cruelmente um machucado.

— Eu vou ficar bem. — Ela se encolheu. Olhos verdes brilharam na direção do médico. — Só preciso que salve meu marido, por favor. Nick, é tudo que peço!

— Eu vou ver o que posso fazer por ele. — A tranquilizou. — Você precisa de cuidados também, precisa ir para enfermaria. — Nicholas acenou para algumas enfermeiras. Quando Amara sumiu por um corredor, ele seguiu para outro.

Nenhuma pessoa iria morrer em seu turno.

┅━━━╍⊶⊰⊱⊷╍━━━┅

Amara sentiu um pequeno déjà vu. Foi como a primeira vez que esteve em um hospital da década de vinte. As enfermeiras a encaravam com olhares questionadores, assim como a Shelby se sentia perdida. Não sentiu quando o ferimento do braço foi cuidadosamente suturado ou quando teve algumas partes do corpo limpas por uma mão delicada. Amara queria que Ariana estivesse ali, seria mais reconfortante.

Horas se passaram. Amara não havia visto mais Nicholas ou nenhuma notícia da situação de Thomas. Andando de um lado para o outro, a mulher orou em pensamento. Passava da meia-noite. Ouviu quando a porta dupla foi aberta e Nicholas passou por ela. Amara apressou os passos, sentindo um nó na garganta ao proferir as primeiras palavras após longas horas em silêncio.

— Ele está bem? Posso vê-lo? — Perguntou com um olhar dançante. Nicholas limpou a garganta.

— Thomas Shelby é forte como um cavalo. — Sorriu levemente ao completar a frase. — A cirurgia foi um sucesso, mas ele precisa de repouso.

Amara voltou a respirar. Por algumas horas havia esquecido como fazia isso.

— Posso vê-lo?

— Sim, mas ele está dormindo por conta da morfina. — Explicou. — Por aqui, venha.

Amara seguiu Nicholas. O coração estava acelerado e as mãos congelando, mas não pelo frio. O médico parou na porta, dando espaço para que a mulher entrasse. O quarto era amplo, com cerca de dez leitos vazios. Thomas se encontrava no último. Cautelosamente, Amara se aproximou da cama, não conseguindo conter as lágrimas. O marido estava sedado para não sentir dor. A cor da pele parecia estar voltando ao normal, assim como os lábios. Ela sentou-se ao lado dele, passeando a mão pelos fios escuros e macios da cabeça.

Foi quando percebeu estar passando pelo que ela mesmo dissera a John há anos. "Uma mulher para viver no meio de homens como você e seus irmãos, não deve temer nada. Deve estar preparada para todas as confusões que virão. Aguenta as perdas e seguir em frente mesmo despedaçadas". Amara estava seguindo em frente, como sempre. Ela não iria temer mais nada e nem iria permitir mais perdas. Mesmo que se sentisse um pouco despedaçada, ainda era uma Shelby e muito mais perigosa que uma arma de fogo. O combate com Mancini só havia servido para deixar isso claro. E como Richard disse-lhe, a sua força não iria ser usada apenas para o sofrimento.

Respirem fundo, bebam algo porque o folego daqui para a frente vai faltar rs.

Capitulo postado dia (06/03/2022), não revisado.

Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro