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𝐂𝐀𝐏𝐈𝐓𝐔𝐋𝐎┊𝟎𝟑𝟐

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Tudo aconteceu novamente, mas dessa vez, lento e doloroso. Como poderia um único momento se tornar uma série torturante de ser assistida? Amara não sabia, mas com certeza todo aquele choque a deixou traumatizada. O momento trágico do evento tornou-se a repetir. Agora, Amara sentia o corpo de Thomas cair sobre ela, fazendo com que ambos fossem ao chão. A pequena marca vermelha logo se expandiu por todo paletó branco. Olhos azuis e vivos se tornaram cinzas e inexpressivos. Era como se o pesadelo que ela tivera há anos, estivesse acontecendo apenas em locais diferentes, mas em todos, Thomas morria em seus braços. Um grito doloroso foi emitido sem nenhum som. Amara sentiu as cordas vocais queimarem, mas nada saiu de lá. Um turbilhão de luzes acendeu diante seus olhos, então ela piscou repetidas vezes até acordar.

O suor escorria do cabelo para nuca. O coração batia tão forte quanto o de um cavalo. Por alguns segundos Amara tentou similar onde estava, desconhecia todo o ambiente ao redor. Quando a porta foi aberta, reconheceu o rosto familiar. Sua amiga, Ariana, andou em direção a ela com um olhar sereno, o mesmo que deu quando a viu pela primeira vez. Amara sentiu o colchão afundar quando Ariana sentou-se à sua frente. Tentou puxar do fundo da mente como havia acabado ali, no quarto, ainda por cima, sem a presença do marido.

— Onde está o Tommy? — Perguntou. Sentiu a voz pesada, como se tivesse dormido por diversos dias.

— Vamos primeiro ver como você está. — Ariana a empurrou novamente para a cama.

Amara murmurou baixo, se sentindo uma criança enquanto a Lowry fazia todos seus procedimentos médicos. Não demorou para que Nicholas se unisse a ela. Agora Amara recebia o dobro de cuidados. Seria invasivo se não fosse necessário.

— Como o John está? — Fez outra pergunta. Ariana desviou o olhar para Nicholas. Amara não gostava do semblante do homem.

— Ele vai ficar bem, não se preocupe. — Nick disse com uma leve calmaria.

— Preciso falar com ele, também preciso falar com meu marido. — Amara colocou os pés para fora. O choque térmico do chão a fez estremecer, fazendo com que ela se sentasse novamente na cama. Foi então que reparou nas roupas que vestia. Usava uma camisola de cetim rosa. A pulseira dada por Polly ainda jazia em seu pulso.

Quem colocou aquela roupa nela? Thomas? Mary ou Ariana?

— Thomas não está em casa. — Ariana se acomodou ao lado dela. — E o John está dormindo.

— O que foi que aconteceu, depois... — Amara uniu as sobrancelhas com a dor de cabeça.

— É melhor não fazer muito esforço. — Nicholas se aproximou da Shelby. — Passou por um susto muito grande, então é comum que tenha um pequeno choque de ansiedade.

— Eu me sinto bem. — Amara ergueu o rosto.

Bem era o termo mais adequado para ser usado por ela, aliás, mesmo depois de tudo, ainda estava viva. Risadas infantis do lado de fora, acompanhadas de passos rápidos a fizeram endireitar a postura na cama.

— São os filhos de John, todos os cinco. — Ariana respondeu antes que a amiga formulasse a pergunta. — Thomas mandou que buscassem as crianças, segundo ele, elas vão ficar mais seguras aqui.

— Céus... - Amara fechou os olhos. — Devo dizer para Mary guarda todos os vasos caros. — Disse assim que se levantou novamente, mas antes que pudesse dar alguns passos, perguntou. — Onde está o Tommy?

— Ele só disse que tinha algo para resolver, mas logo estaria em casa. — Foi Nicholas que respondeu. Amara sentiu a garganta arranhar e o estômago pedi por comida.

— O senhor Shelby sempre tem problemas para resolver. — Disse Amara de forma amarga.

— Ei... - Ariana levantou-se da cama e aparou a amiga nos braços. — Ele estava muito assustado, foi terrível, para todos nós. Mas você e o John estão vivos, só isso que importa. Agora vamos descer, Mary preparou uma sopa reforçada para quando acordasse.

— Não gosto de sopa. — Amara reclamou com uma careta.

— Tudo bem, acho que Nicholas e eu damos conta de segurar você e alimentá-la à força. — Uma sombra de riso passou pelos lábios de Amara com as palavras ditas por Ariana. Sem protestar, saiu do quarto após vestir um robe. Foi recebida por lambeijos de Anúbis e desviou das crianças acomodadas em sua casa.

O dia prometia ser longo e difícil.

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BIRMINGHAM

Havia aqueles que dissessem que até o próprio diabo possuía mais misericórdia que Thomas Shelby. Era verdade, Thomas não negava. Como Arthur mesmo dizia: Deus habitava seu coração, enquanto o diabo suas mãos. Porém, não Thomas Shelby. O líder dos Peaky Blinders sabia que o diabo o possuía da cabeça aos pés, principalmente quando a raiva se encarregava da sua alma. Ele era o diabo de Small Heath e não tolerava traições, chantagens e olhares feios. Muito menos, tentativas de homicídio, principalmente contra sua esposa.

Thomas olhou em volta. O galpão era afastado de qualquer lugar, escondido o suficiente para que os Peaky Blinders pudessem fazer seus esquemas mais sujos - aqueles que não trariam orgulho ao nome Shelby ou a mulher que ele amava. A iluminação era quase medíocre e o lugar possuía apenas uma saída - portas duplas de ferro, bem longe de onde estava. Com a ausência de janelas, o galpão se tornava quente principalmente nos dias de verão, mas durante o inverno, era frio e úmido. Aquele dia estava propício para ventos fortes e nuvens escuras, mas nada estava tão nublado como o coração do cigano Shelby.

Com as mangas dobradas para cima, Thomas checou o estado dos punhos. Estavam feridos, quase em carne viva devido aos dentes que haviam se colidido aos ossos. Ele suspirou exausto, enquanto se apoiava em uma pequena mesa de madeira com ferramentas de torturas, imaginando o que faria a seguir. O cheiro de sangue, urina e talvez fezes, impregnava o ar, mas aquilo não o incomodava enquanto não chegasse ao principal objetivo de estar ali.

— Ele é duro... - Ouvir Arthur dizer. — Não vai falar!

— Ele vai falar. Vamos fazê-lo falar! — Thomas se virou para o irmão.

Desviou de Arthur para a direção do atirador. Thomas puxou uma cadeira, arrastando até o homem desmaiado. Agora, mal podia deduzir como era o rosto do sujeito, sangue e hematomas preenchia o lugar que antes era pele e ossos. Thomas sentou-se, acendendo um cigarro. Puxo o relógio de dentro do bolso da calça, fazia três horas que estava naquela sessão de tortura. O cigano tinha teorias a respeito do homem. Talvez ele fosse um atirador enviado pelos russos, graças ao trabalho recusado, era esse o preço do acordo quebrado. Quem sabe o homem fosse enviado por outros inimigos, Thomas sabia que tinha muitos. Quem quer que ele fosse, estava com um foco determinado, mas acabou errando os tiros.

— Acordem ele. — Ordenou o Shelby.

Um balde de água gelada foi jogada no homem, o despertando de modo ofegante. Thomas tragou o cigarro, levantou-se da cadeira, parando bem próximo do atirador.

— Bem-vindo de volta. — Falou.

— V-vai se foder. — O homem respondeu entredentes.

— Ah, que boca suja. — Thomas estalou a língua e apertou o cigarro no rosto do atirador, fazendo com que o homem gritasse de dor com a queimadura. — Vou te dar mais uma chance para dizer quem é. Você trabalha para os russos?

— Não vou responder nada! — Cuspiu as palavras.

Thomas deu de ombros. Sinalizou para Arthur agir com uma barra de ferro, enquanto ele voltava para a cadeira. O barulho do ferro fundido com ossos ecoou pelo galpão. Thomas quase pode sentir a dor de ter um joelho quebrado. O homem gritou, se retorcendo na cadeira. Talvez se não tivesse amarrado por cordas, se contorceria no chão como uma cobra decapitada.

— Eu acho melhor você falar. — Arthur disse.

— Eu fui pago! — O homem gritou.

— Por quem? — Thomas ergueu uma sobrancelha.

— Eu não sei... — O atirador arfou. Era incapaz de dizer qual parte do corpo mais doía. Ele tinha certeza de que algumas costelas estavam quebradas; dentes faltavam na boca e agora o joelho estava aos pedaços iguais ao nariz.

— Não sabe? — Thomas emitiu um breve sorriso.

— Não... — O homem tentou abrir o olho, o único que ainda enxergava. — Eu apenas recebi uma carta, com um nome e uma foto. Pagaram pelos meus serviços, eu deveria matar essa pessoa.

— De quem era o nome e a foto? — Thomas cruzou as pernas, tragando novamente o cigarro. Ele não estava calmo, muito pelo contrário, seu interior fervia como o inferno.

Amara Shelby. — Disse o nome com clareza.

Thomas sentiu algo subir do estômago e parar na garganta. Tomado por uma raiva acentuada, saltou da cadeira para o colarinho do atirador. Sentiu a têmpora doer novamente, assim como o coração acelerou.

— Encomendaram a morte dela. — O homem disse. — Eu não sei quem pagou. Só sei que querem ela morta e não vão parar até ela morrer.

— Você está trabalhando para o Churchill? Esse é o modo dele se vingar por causa do serviço que eu recusei, hein? — Thomas proferiu as palavras com força.

— Eu não sei! Eu já disse, só me enviaram tudo que eu precisava. — O homem choramingou.

— Quem era o remetente?

— Não tinha endereço, nada...

Thomas cerrou os dentes se afastando. Percebeu que os problemas haviam triplicado. Os tiros, na verdade, nunca foram para ele, e sim para sua esposa, mas que infelizmente, atingiram John. Amara estava correndo perigo de vida, aquilo o deixava aflito. Era como se fosse um campo minado, Thomas não sabia onde pisar e qualquer passo em falso poderia ser o fim de quem ele amava.

— O que vamos fazer com ele? — Arthur perguntou, quando viu Thomas se afastar.

— Matem, cortem em pedaços e dê para os porcos. — Thomas ordenou antes de dar passos pesados para fora do galpão. Ele só queria chegar em casa e proteger a mulher que amava.

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ARROW HOUSE, WARWICKSHIRE

Thomas desviou de três crianças, enquanto procurava por Amara. Soube por Mary que a Sra. Shelby se encontrava na área dos animais, nos estábulos. Precisando correr, Thomas chegou ofegante até a porta de madeira. Deu passos até o lado de dentro, recebido por lambidas de Anúbis. Amara estava distante em pensamentos, debruçada em uma pequena porta que a separava do contato com os animais. Thomas sabia o que estava tomando a atenção da esposa ao ponto de fazê-la ficar submersa de tudo que a cercava. Se tratava do novo membro da família, o recém-nascido de Vega com o sangue puro de Lestat. Era da consciência dos Shelby que aquela pequena miniatura de animais excepcionais seria grandioso na fase adulta, além de ter uma mesclagem de cor absurdamente bela.

De modo cauteloso, Thomas se aproximou. Amara parecia saudável, o deixando mais calmo. Na noite passada, quando a acolheu após o acidente, percebeu que a esposa ficara inconsciente em seu braço após um choro quase eterno. Em casa, o resto da noite foi zelosa. Thomas foi o responsável por retirar o vestido, agora vermelho, limpá-la e vesti-la com a camisola preferida. Ele não dormiu, sentia os olhos pesados e a cabeça dolorida. Antes mesmo do amanhecer, a deixou sob os cuidados de Nicholas e Ariana e partiu para o interrogatório.

Ele pigarrou, finalmente tendo a atenção que queria.

— Amie, meu raio de sol. — Deu um passo largo até ela. Puxando-a para um abraço apertado. Ele suspirou novamente. Nada e nem ninguém a afastaria dele. — Como se sente? — Voltou a encará-la, segurando o rosto feminino entre as mãos. Amara tinha os lábios secos e levemente rachados. Os olhos estavam sem o brilho afiado que ele tanto admirava.

Bem. Eu estou bem. — Respondeu mesmo não sendo uma verdade. Puxou a mão de Thomas para baixo, se assustando com os ferimentos. — Tommy, o que aconteceu? — Ergueu o olhar, percebendo como o marido se retraiu diante da pergunta. Amara sentiu a boca seca. — Não minta para mim!

— Eu... — Ele puxou sutilmente a mão, talvez devesse ter cuidado dos ferimentos antes de ir ao encontro dela. Seus olhos foram em direção às safiras verdes, fazendo-o se sentir rendido. Ele não poderia mentir. — Estava em um interrogatório.

— Interrogatório? — Amara ergueu uma sobrancelha. Se afastando do marido em um passo curto.

— Com o homem que atirou em você. — Disse de modo baixo.

Amara piscou, não sabendo o que responder. Não seria novidade para ela que Thomas investigaria a fundo o que de fato havia acontecido. O gângster gostava de manter tudo sob controle. Ela mordeu os lábios, antes de encarar o marido.

— Tem algo que devo saber? — Questionou.

Thomas encarou o chão por um brevemente.

— Você era o alvo. — Disse. Ergueu o olhar para Amara novamente. Viu uma palidez quase instantânea se apossar da pele da mulher. — Alguém a quer morta.

— O quê? — O coração bateu depressa. Amara engoliu o sabor amargo da bile. Os cavalos fizeram barulho como se pudessem sentir a aflição que os donos transmitiam naquele momento. — Quem?

— Eu não sei. — Seu tom saiu lento e frustrado.

— É algum inimigo seu? — Ela lançou um olhar curioso para o marido. — Você tem escondido coisas de mim.

— Eu sei. — Thomas deu um passo para frente. — Eu não queria enchê-la com meus problemas, eu prometi que nunca mais a envolveria com meus outros... negócios. — Fez uma pausa. — Há algumas semanas recebi uma proposta de Churchill, deveria me envolver com os russos, mas recusei, por sua causa. Isso poderia nos trazer problemas. — Deu outro passo. — Fiquei aflito em relação a isso, ninguém que recusa um serviço do Churchill, continua vivo. Mas quem invadiu nossa festa ontem, veio por ordens de outra pessoa.

— Deus... — Amara fechou os olhos e suplicou por forças. Ouviu o tilintar da pulseira e olhou diretamente para o pulso.

Será que ela realmente a havia salvado ou John teria tido muito azar em entrar no caminho dos disparos?

— Eu estou com medo. — Thomas confessou. Amara encarou o marido. Não era de costume ouvir aquelas palavras saírem da boca dele. — Tenho medo de perder você. Temos que pensar em uma forma de protegê-la. Talvez... — Thomas pensou em algo. - Talvez devesse ir para Boston, ficar por lá e...

— Boston?! — Amara o interrompeu. Perplexa.

— Eu quero proteger você! — Falou ao encurtar de vez o espaço. Segurou os braços da esposa, estreitando o olhar para o dela. — Eu não sei quem pode ter feito isso. Suspeito que possa ser alguém de perto. Talvez realmente sejam os russos ou quem sabe os irlandeses. Seja quem for, precisamos ficar longe da mira deles.

— E quanto ao John? A instituição e as crianças?

— John vai ficar bem. — Disse. — As crianças também vão ficar bem no novo lar. Você não pode arriscar ir a público agora. Deve se preparar, logo os principais meios de notícias vão saber a respeito do atentado e precisamos proteger você dos assédios de jornalista intrometidos.

Amara ponderou tudo que ouvira, assim como tentou não se ofender com o termo usado por Thomas a sua profissão. Se imaginou deixando o lar de Warwickshire e voar até a América. Ao menos com as novas linhas áreas mais seguras, não sofreria os imensos enjoos em navios. No entanto, algo a incomodava. Se esconder talvez fosse o certo a se fazer naquele momento, aliás, sua cabeça estava em jogo, mas pelas palavras de Thomas, ele pretendia fazer algo sozinho.

— Você virá comigo, sim? — Perguntou ela de forma baixa.

Thomas tinha planos de ficar e resolver o que precisava, mas também sabia que não poderia deixar a esposa partir e não garantir a segurança dela pessoalmente. Ele se sentiria menos culpado se estivesse perto dela.

— Sim. — Respondeu sem hesitar.

— E por quanto tempo ficaríamos em Boston?

— O tempo necessário. — Falou. — É importante que não avise ninguém, não podemos confiar em qualquer um.

Amara acenou. Fechou os olhos quando foi puxada para um abraço apertado, lembrando-a de que tudo que ela precisava, estava ali com o marido.

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O peito doeu como se as adagas quentes estivessem sendo enfiadas na carne sem misericórdia. John abriu os olhos e murmurou um palavrão na língua cigana ao sentar-se. Encarou uma faixa atravessada no corpo. A porta foi aberta e duas crianças entraram animadas. Ele também se sentiu mais feliz, mas torceu o rosto em uma careta quando o Henry, o filho mais novo, pulou na cama.

— Acordamos você, papai? — Katie perguntou com os olhos escuros e brilhantes. Era a mais velha dos filhos. Com os 14 anos completados, estava ficando cada vez mais parecida com a mãe, Martha. — Falei para a Gypsy e o Henry não ficar pulando na cama, mas eles não me obedecem. - Ela lançou um olhar feroz para o pequeno.

— Eu estou bem, filha. — John emitiu um leve sorriso. — E você, trate de não dar trabalho para sua irmã ou seus tios. — Falou ao filho. O garoto sorriu de modo travesso.

— A senhorita Lowry cuidou de você, disse que ficaria tudo bem. — Katie se aproximou do pai. — Ela até me ensinou a fazer seu curativo, caso precise. Também ajudou a trocar a fralda do Albert.

— Ah... — John suspirou. — Às vezes esqueço da bondade de Ariana.

— Ela fez doces, papai! — Henry ficou de joelhos na cama. — O Nick também ajudou, mas a Sarah comeu a metade.

O nome masculino dito pelo filho fez com que um sabor amargo preenchesse a boca do Shelby. John levantou-se da cama, se recordando que uma parte do pesadelo ainda não acabara. Presenciar o pedido de casamento foi como ser empurrado para o fundo do poço, tão doloroso quanto levar alguns tiros horas depois. John tropeçou sendo amparado pela filha.

— Acho melhor ficar deitado. Eu vou pedir a Mary para trazer...

— Eu preciso andar, meu bem. — Ele passeou a mão pelo cabelo castanho de Katie. — Só preciso tomar um ar, já sobrevivi a coisas piores.

Sob o olhar preocupado da filha, John vestiu uma camisa e atravessou a porta do quarto. Era fim de tarde, ele podia ouvir latidos e vozes no andar de baixo, conhecendo imediatamente. Gypsy era curiosa, assim como Sarah, ambas enchiam Nicholas de perguntas a respeito de órgãos. Sentiu falta de Elliot, talvez o garoto estivesse na cozinha procurando por doces.

John achava exagero por parte de Thomas ter uma casa tão grande, onde corredores facilmente se tornavam labirintos. Em alguns minutos, o Shelby chegou à porta principal, sendo recebido por uma rajada fria, fazendo-o se lembrar do ferimento. Era só uma dor, ele suportaria. Seus passos foram dados para fora, um pouco sem rumo. Lembrou-se do caminho que daria à área dos animais, mas não era aquele percurso que ele gostaria de fazer. Girou os pés para o outro lado, indo em direção ao jardim de Amara.

O cheiro de rosas que desabrocham invadiu as narinas do Shelby, mas nada foi comparado ao suave perfume feminino que o envolveu após uma sutil brisa o atingir. Foi então que John a encarou, sentada à beira do chafariz imenso, passeando a mão pelas águas cristalinas, provavelmente brincando com os peixes que jaziam ali. O cabelo solto enchia as costas dela como cascatas, assim como a água que era jorrada das estátuas de mármore. Ariana ainda era mais bela que as ninfas esculpidas ao lado dela.

Provavelmente ele pisara em um galho, já que a mulher se assustou com um pequeno estalo, olhando diretamente a ele.

— Não deveria estar fora da cama, ainda mais pegando sereno! — Ela usou um tom de voz semelhante ao que John ouvia da mãe quando mais novo. Ele deu passos para perto, de modo lento. — Qual problema de vocês Shelby serem tão teimosos?

— Deve ser algo no sangue. — Brincou. — Eu estou bem.

Ariana retraiu a mandíbula quando John sentou-se ao lado dela.

— São carpas. — Ela comentou quando John deu um olhar confuso aos peixes na fonte.

— Obrigada. — Ergueu o rosto. — Você me salvou, Ari.

— Eu fiz um juramento quando me formei. — Ariana falou. — Jurei curar todos. Não gosto de ver pessoas morrendo.

— Eu também não gosto de perder pessoas. — Disse ele.

O silêncio foi quase absoluto entre eles. Ariana voltou a encarar os peixes, enquanto John deixava o olhar cair para a aliança que ela usava. Talvez se tivesse a chance de fazer as coisas diferente, seria uma aliança dada por ele que estaria ali.

— Conseguiu esquecer tudo? — John perguntou.

— Acho que dei morfina demais para você. — Ariana ergueu uma sobrancelha.

— Ari. — A mão do Shelby pousou no pulso fino. O toque foi quase eletrizante e frio. — Pretende mesmo se casar com ele?

— Você se casou duas vezes. - Disse ela, entredentes. — Eu mereço ter minha vida. Mereço ser amada de verdade por alguém, acima de tudo, respeitada, algo que você não soube fazer quando teve a oportunidade. 

— Eu amo você! — Disse confiante. — Posso te dar tudo, você sabe.

— Eu acho que não! - Ela se afastou dele. — E tudo que eu quero está em Nicholas, então por favor, não insista no que já acabou.

— Ari... — John se levantou, assim que Ariana deu passos para longe.

— Chega, John! — Ela se virou novamente. — Chega! acabou. Tivemos um ao outro na adolescência, agora somos adultos, e escolhemos caminhos diferentes. Eu amo o Nicholas e ele me ama. Você ama seus filhos, não é?

— Com todas as minhas forças! — Disse de modo seguro. John tentou amar Martha, assim como tentou com Esme, mas seu amor estava mesmo nas crianças que elas lhe deram. Seus filhos eram a única coisa boa que ainda restava nele e por aquelas crianças, ele enfrentaria uma guerra.

— Então, pelo amor que sente por eles, me deixe ir. — Os olhos azuis como o mar brilharam. John pensou que Ariana fosse derramar uma lágrima, mas ela não fez isso. Com passos decididos, ela voltou para dentro de casa, enquanto John caiu novamente na beirada do chafariz.

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Thomas não esperava encontrar John fora da cama naquela hora, muito menos o ver bebendo. Silenciosamente, se uniu ao irmão mais novo. O copo de uísque estava em uma mão, enquanto a atenção estava presa no fogo da lareira. Não era todo dia que o Tommy encontrava a casa cheia de pessoas e crianças. Pelo menos trancado no próprio escritório, poderia ter um pouco de paz.

— O que descobriu? — John cortou o silêncio. Ele sabia da saída do irmão através de uma ligação que recebera do Arthur.

— Que ainda tenho muita coisa para investigar. — Thomas respondeu. Se esticou na poltrona, bebendo um gole generoso de uísque. — Vou para Boston com a Amara.

— Pensei que odiasse esse lugar. — John sorriu de lado.

— Não odeio o lugar. Odeio só algumas pessoas que vivem lá.

— Uma pessoa em específico — John encarou o irmão sentado ao lado. — O Arthur, Ada e a tia Polly já sabem da decisão?

— Só você sabe, John. — Thomas virou o rosto para encará-lo. — Preciso tirar minha esposa desse lugar antes que algo pior aconteça.

— E acredita que em Boston ela vai estar segura? Porra, você precisa dos Peaky Blinders.

— Ela vai ficar segura, porque vai estar comigo. — Disse Thomas. — Boston é longe de qualquer perigo.

John terminou de beber o uísque irlandês, dando uma boa olhada no copo.

— Acho que podem ter sido os italianos. Eu briguei com um deles por causa da Lizzie. — John falou. — O filho da puta estava assediando-a, e eu tive que defendê-la. Ninguém mexe com nossas funcionárias.

— Assim como podem ter sido eles, pode ter sido qualquer outra pessoa. — Thomas gostaria de revelar que Amara era o alvo de alguém que a queria morta. Até o momento, sabia que a esposa não estava envolvida em nenhum problema com os italianos e assim esperava que continuasse.

— E como vai ser? Vão sair de férias?

— Férias... — Thomas sorriu levemente. — Vou controlar as empresas de lá, não vou parar de trabalhar.

— Amara também?

— Ela precisa ficar longe do trabalho por um tempo. — Suspirou. — Ela está exausta e nem se dá conta disso, o que me preocupa, é claro! Espero que me obedeça enquanto estivermos lá.

Obedecer. — A palavra fez com que John sorrisse. — Uma mulher desobedeceu a Deus comendo o fruto proibido e você acha que uma, sendo sua esposa, logo a Amara, vai te obedecer?

— Bem, é o que eu espero. — Thomas levantou-se da poltrona, jogando o resto de uísque no fogo.

— Ei! — John chamou. — Vocês vão ficar bem. Arthur e eu resolvemos as coisas daqui. Somos mais que Peaky Blinders, somos irmãos. E tem algo mais...

— O quê?

— Eu vou seguir seu conselho. Ariana está feliz com outro, então, eu não vou interferir. — Ele falou. Thomas encarou o irmão. — Quando amamos uma pessoa, a deixamos ir. Acho que aprendi isso com você e espero que um dia ela possa voltar para mim como a Amara voltou para você.

John parecia abatido e Thomas sabia haver uma causa maior que somente a dor dos tiros. Tommy conseguia reconhecer um coração partido a quilômetros de distância. Sabia que nada que dissesse poderia consolar o irmão, então fez a única coisa que podia. Ele deu passos largos até John, abraçando-o com cuidado. Eles realmente eram muito mais que só uma gangue perigosa. Era uma família.

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— ... Você é o menor e o mais faminto... Ah... — Duas risadas vinda da cozinha preencheram os ouvidos de Thomas. — Acho que faz parte do sangue Shelby serem teimosos... — Amara fingiu estar brava, mas Tommy conhecia bem o falso tom de reprovação da esposa.

Ele parou na entrada da cozinha, em silêncio. A esposa estava sentada de costas para a porta, alimentando ou tentando dar mingau ao pequeno Albert, de dois anos. Um riso pousou nos lábios do Shelby quando o bebê bateu com a mão no pequeno prato, se sujando por inteiro. Amara ficou ligeiramente nervosa com toda a bagunça e não evitou sorrir quando Albie fez o mesmo. Eles estavam se divertindo mesmo com toda a sujeira. Aquele momento leve e descontraído também o divertia em silêncio. Thomas abriu os lábios, puxando o fôlego para os pulmões quando Amara se levantou para pegar um pano limpo, mas ainda não se dando conta da sua presença ali.

Amara era cuidadosa. Cantarolava uma música em espanhol, a mesma que cantara para ele dias atrás, enquanto limpava o sobrinho. Ela seria uma boa mãe, mesmo que esse sonho parecesse distante. Thomas sentiu os olhos arderem ao lembra-se do aborto espontâneo que a esposa sofrera no fim do primeiro mês de gestação, alguns meses após a voltar da segunda lua de mel em Nova York. Foi difícil para ambos, mas Thomas sempre teve que se manter firme, aliás, ele era o bote salva-vidas da esposa, impedindo-a que se afundasse em tristeza. Depois daquele dia, uma parte deles estava quebrada, mas pelo menos, tinham um ao outro para seguir em frente.

— Thomas! - Amara exclamou. — Você me assustou.

— Não tive a intenção. — Ele deu um passo para frente. Albert bateu as mãos sujas na mesa, dando gritinhos. — Bagunceiro igual ao John quando tinha a mesma idade. — Observou. — Onde estão suas amigas?

— Ariana está com Nick, subiram depois do jantar. — Amara desviou o olhar para o bebê, limpando as mãozinhas sujas de mingau. — Krishna está com Michael na cidade, e não me pergunte fazendo o quê. Já as crianças, devem estar dormindo, menos esse garotinho aqui... — Ela deixou um beijo rápido no topo dos cabelos escuros do menino, ele era uma cópia de John, mas com fortes sinais da mãe. — Ainda não acredito que a Esme teve coragem de abandoná-lo.

Thomas não respondeu.

— A propósito, não tive a chance de falar direito com John depois que ele acordou, parece tão distante. — Amara pegou Albert no colo com uma facilidade impressionante. — Ele não apareceu no jantar.

— Ele vai ficar bem, só precisa pensar um pouco. — Thomas falou. Ouviu outros passos serem dados para a cozinha. Mary apareceu, erguendo os braços para o bebê no colo de Amara.

— Sra. Shelby, deixe que eu dê o banho nele e o coloque para dormir. — Pediu com serenidade. — A senhora deve descansar.

— Eu me sinto bem, Mary. — Amara se desviou dela. Segurando a criança no colo com sutileza e agilidade. — Eu posso dar banho nele e pôr para dormir, não vai me incomodar ou exigir muito de mim.

— Está tudo bem, Mary. — Thomas falou. — Acho que já pode se recolher, boa noite.

— Se assim querem. — O tom submisso aos chefes era algo que incomodava Amara, mas isso não era algo em que a Sra. Shelby gostaria de discutir naquele momento. Mary acenou a eles, antes de sair.

— E então? — Thomas se aproximou da esposa com o sobrinho. Passeou a mão pelos fios lisos do menino. — Vamos dar banho nesse garotinho?

A face de Amara se acendeu com alegria. No andar de cima, Albert se divertia com toda a espuma ao redor. Tanto as vestes, quanto os cabelos de Thomas e Amara se encontravam molhados, mas aquilo não os incomodava. Assim como era impossível não serem contagiados com a energia do Shelby mais novo. Amara se questionava se era sempre assim na hora do banho, John deveria ter muito trabalho para controlar o garotinho no banho, algo que ela dificilmente se cansaria.

Horas depois, Thomas carregava Albert até o quarto das crianças, deixando-o no antigo berço que comprara para o próprio filho, e que ainda não possuía coragem de se desfazer. Albert fechou os olhos, consumido pelo cansaço de todas as aventuras que vivera na banheira com os tios.

— Você é um Shelby, garoto. — Thomas sussurrou. — E eu invejo a sua paz.

Capitulo postado dia (06/02/2022), não revisado.

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