𝐱𝐯𝐢. Contarei coisas que nunca disse
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❝ Deve ser exaustivo sempre torcer pelo anti-herói ❞ - taylor swift !
─ O que você pensa que está fazendo?
Emma parou um momento, o salgadinho alaranjado a poucos centímetros de sua boca, deixou o olhar vagar entre o lanche e a líder de torcida no degrau acima, tendo as mãos cheias das unhas pintadas segurando seus quadris por cima da saia colorida nas cores da Inarizaki e cabelos caindo como ondas pelos ombros.
Notando que a garota esperava por uma resposta, Emma ajustou sua postura e ergueu uma sobrancelha, os dedos sujos de laranja.
─ Comendo?
Nana Hirano torceu o nariz ao sentir o cheiro de queijo escapando da sacola nas mãos da loira-pálida e desceu um degrau, agora as pontas dos sapatos roçavam na saia plissada de Emma.
─ Tínhamos um plano, não é?─ Nana apontou, balançando o dedo para a figura da outra garota, a qual trançou o cabelo numa dupla trança francesa mal feita, possuindo cachos escapando na nuca e próximo ao rosto, emoldurando o rosto.─ Não tô vendo você avançando para lugar nenhum, Kimura.
Emma revirou os olhos e empurrou mais um punhado de salgadinhos na boca, recusando-se a responder Nana Hirano.
Certo que, teoricamente, ela estava certa quando tratava-se daquele assunto em específico, só o problema não é falta de tentativa. O problema é o próprio alvo que estava muito feliz em evitá-la como se uma espécie de demônio devorador, alterando seu lugar com o de Osamu nos últimos dias e negando-se a cair nas provocações que Emma lançava em sua direção, chegando até mesmo acertá-lo com um chute no refeitório com o objetivo de receber algum "saí pra lá, feiosa" naquele tom ridículo que sempre a deixava um passo da ebulição, pronta para derrubá-lo de um precipício. Mas o que receberia é um dar de ombros como se fosse uma mosca irritante e o afastamento mais rápido de toda sua vida.
Isso estava irritando-a profundamente. Mas, bem, se Atsumu queria distância após de quase dois anos infernizando sua vida, Emma aceitaria de bom grado, sentaria nas escadas e comeria o pior salgadinho que tinha na máquina de lanches.
( Ela tinha perguntado à Osamu o que estava acontecendo e o maldito gêmeo a olhou com certo conhecimento de causa junto a um sorriso misterioso demais. Alaina meteu-se no meio e comentou que Emma deveria perguntar pessoalmente à Atsumu se estava incomodando-a. Emma mandou os dois pro inferno.)
Ela mastigou a massa, sentindo-os grudar no aparelho e arrependendo-se na mesma hora de todas as decisões que tomou.
─ Tô tentando, tá legal?─ Comentou, encolhendo os ombros, cutucando a peça presa ao seu dente canino.
Nana Hirano aprofundou uma careta, parecendo uma versão mais nova da Professora Mahoshi, o que é um horror por si só, pois a mais velha não é conhecida por ser uma das pessoas mais agradáveis e Nana com certeza não é alguém fácil de conviver, sendo realmente o tipo de garota arrogante que merecia levar um soco.
─ Não tá tentando o suficiente!─ Ela exclamou, empurrando as mechas vermelhas para longe do rosto e a fitando com aqueles olhos cheios de irritação.─ Mei me disse que você tá fugindo do Atsumu e é melhor que ela não esteja certa, Kimura!
─ Ou o quê?─ Emma levantou-se, segurando com força o saco do salgadinho, ficando muitíssimo satisfeita ao vê-la recuar um passo.─ Aceitei fazer parte desse plano imbecil, não aceitei?
Nana torceu o nariz, um pontada de revolta manchando suas feições por ter alguém como Emma enfrentando-a.
─ Então, faça por onde!
Emma abriu a boca para retrucar, mas, preferiu erguer uma sobrancelha irritadiça quando a garota ruiva apontou um dedo rente ao rosto um tom de ameaça antes de apontar para uma das janelas, onde claramente poderiam ver as nuvens cinzentas deixando toda sua fúria cair sobre Hyogo e as paredes do ginásio mais próximo.
─ Atsumu está lá fora, Kimura. Faça ele se apaixonar por você e vê se não estraga tudo.
Emma queria socar Nana Hirano por inúmeros motivos ao longo dos dias, mas naquele exato minuto, pensar em afundar os nós dos dedos naquele rostinho bonitinho só por estar ridiculamente certa. E além de tudo, tinha razão disso. Não tinha planos para molhar os sapatos ou suas meias naquele dia, na verdade estava muito contente com o pensamento de esperar a chuva diminuir e evitar todas as poças possíveis durante todo o caminho até a estação. Só que uma maldita líder de torcida resolveu mudar isso e, agora, Emma quer se socar por aceitar fazer parte de um plano estúpido.
Em frente às portas do ginásio, ela esforçou-se para ouvir algum som que não fosse as gotas d'água atingindo as calhas de alumínio ou o chão de pedregulho, sopesando seriamente retornar para o conforto do prédio principal, onde ficaria na companhia de suas amigas, compartilhando os doces que trouxeram. Com um suspiro e mordiscando o lábio inferior, Emma subiu os degraus, equilibrando o guarda-chuva sobre um ombro enquanto ocupava as mãos em abrir as portas, sendo atingida pelo forte cheiro de gel e borracha.
Ela mergulhou para dentro, abandonando o guarda-chuva na soleira e sentindo-se num cenário de terror ao ver-se em frente as sombras, sem nenhum resquício de vida podendo ser enxergado ou ouvido ali dentro. Emma cogitou abandonar, se não fosse por o típico som de água corrente cortando a trilha sonora criada pela chuva fora dali.
Que Nana realmente estivesse certa e que fosse Atsumu em vez de algum fantasminha camarada.
Seus passos ecoaram contra as tábuas de madeira encerada, sendo trocadas por concreto ao virar um corredor e, então, parou. O som também. Mas Emma já sabia de onde vinha.
Nos vestiários, apenas uma luz encontrava-se acesa, é fraca demais para alcançar todo o ambiente, mas o bastante para que consiga vê-lo. Está sentado num banco de madeira em frente ao seu armário aberto, cabeça abaixada fazendo com que os cabelos loiros caíssem por sua tez, nublando suas feições. Vendo a forma com Atsumu Miya parecia tão... derrotado, Emma hesitou.
É uma visão diferente da que Emma estava acostumada a ter de Atsumu, o mesmo garoto que a insultava e afastava-a numa frequência que deixaria uma pessoa enlouquecida nos mais diversos níveis.
Ela estava acostumada a vê-lo como a encarnação da Regina George se jogasse vôlei e fosse um homem com uma arrogância desenfreada, seguro das próprias habilidades, sendo um garoto de ouro com espírito enganoso de uma raposa. Ela não deveria vê-lo daquele jeito de ombros abaixados e parecendo um garoto sem esperanças em seu uniforme de treino, sem aquela áurea costumeira de sucesso.
Ela não deveria estar aqui.
E é esse sentimento que explode em seu peito, oprimindo-a conforme os segundos se arrastam, fazendo-a tropeçar.
Atsumu ergue a cabeça na mesma hora. Olhos castanhos em olhos azuis-roxeados, surpresa podendo ser encontrada neles antes que um brilho incomum surgisse e os afastasse.
Emma o observa continuar a fitar seu armário por um momento antes de apoiar a cabeça em uma das mãos e dizer:
─ Não tô no clima hoje.
Ela fica sem palavras diante do tom baixo, tão incomum em uma pessoa tão barulhenta como Atsumu Miya.
Não deveria estar ali, ela...
Emma lançou um olhar para o corredor atrás dela e adentrou no vestiário, sentando-se ao lado de Atsumu com as mãos agarrando as bordas do banco, esticando as pernas a sua frente. Ela é desajeitada, ou pior, inadequada para estar ali.
Emma não é amiga de Atsumu. Nunca tiveram uma conversa sincera naqueles dois anos de convivência. Os silêncios entre eles são preenchidos por ofensas desenfreadas, chutes implicantes e olhares cheios de repúdio.
Mas, numa noite, Emma sentiu-se confortável o suficiente para compartilhar uma parte de si que guardava tão profundamente em seu peito, rezando silenciosamente para esquecê-la. E Atsumu ofereceu uma espécie de conforto que ela nunca soube o quanto precisava até ser rodeada por.
─ Também nunca tô no clima, ─ Ela comenta, não ousando arriscar uma olhadela para o garoto.─ mas você tá sempre atentando, não é, demônio?
Atsumu ri, não tem nenhum traço daquele deboche típico.
─ Tô falando sério, Emma.
Ela para e, por um momento, tem a sensação que ele também. Ambos surpresos, além da conta.
─ Você nunca...
Atsumu balança a cabeça, tentando impedi-la de continuar e confirmar o que acabara de escapar de seus lábios.
Emma solta uma risada, ecoa pelos corredores vazios, preenchendo a lacuna de sons que há, cortando a chuva e o som metálico vindo das calhas com tanta eficiência que a própria garota esquece que o mundo lá fora é apenas poças.
─ Para de rir, sua imbecil!─ Chiou um Atsumu de bochechas vermelhas, provavelmente cogitando empurrá-la para longe.
─ É que...─ Emma piscou os olhos e o olhou, ainda sorrindo.─ Eu sempre sou vômito de unicórnio, feiosa...
Atsumu revirou os olhos, mas as bochechas ainda entregam o seu constrangimento.
─ Seu nome é Emma.
─ Mas, você nunca chamou de Emma, Atsumu.
Ele deu de ombros como se não fosse tão importante. E de fato, não é, mas Emma viu algo naquilo, uma abertura que Atsumu nunca a permitiu ter algum acesso.
Talvez fosse o clima. Papai Miles costuma dizer que dias chuvosos abrem portas para mudanças. Emma precisava dar ouvidos à ele mais vezes.
Ela mordeu os lábios, incerta do que falar e lançou um olhar para o armário, franzindo o cenho quando enxergou uma foto pregada na porta, onde dois garotinhos iguais estão vestidos com um uniforme característico de vôlei, a única diferença são os olhos.
─ É de um acampamento de verão.─ Emma piscou ao ouvir a voz de Atsumu.─ Eu e Osamu conhecemos o Aran nele. Foi legal, mas não era muito famoso com os meninos de lá, pelo menos não como Samu.
─ E por que não?─ Ela perguntou, empurrando o joelho contra o dele.
Atsumu piscou os olhos e fez o mesmo movimento que o dela, os lábios esticando um pouquinho, quase num sorriso.
─ Porque sou melhor que eles.
─ Claro que sim.─ Ela revirou os olhos.─ Nosso levantador perfeito que nunca erra.
Emma o vê encolher os ombros por um momento, assumindo a mesma persona melancólica que encontrou ao chegar ali.
─ Se faço os levantamentos perfeitos, eles devem cortar e pontuar.─ Atsumu dá de ombros.─ Se não gostam de me ouvir, então que façam o trabalho deles.
Por tempo atrás, houve boatos que o antigo capitão incentivava certa hostilidade do time em relação a Atsumu por debaixo dos panos , o motivo sendo sua personalidade díficil que o tornava um obstáculo para a harmonização do time, principalmente quando não hesitava em ser grosseiro ao apontar os erros de seus atacantes. Ao que parecia, pouquíssimos tinham escolhido ficar no lado de Atsumu, um número que incluía Rintarou Suna e Osamu Miya. Agora, Emma vê que talvez não fossem só boatos...
Deveria ter sido solitário aquele primeiro ano com os veteranos atacando-o com palavras frias...
É a primeira vez que conversam verdadeiramente sem liberar qualquer farpa irritadiça com resquícios e Emma parece enxergar uma nova faceta de Atsumu. A assusta na mesma maneira que a atraí, a perspectiva de conseguir ver algo além dos olhares de desdém, aquele jogador perfeito que mais se parecia o próprio diabo diante de seus olhos.
Ela não tem ideia do que falar, mas, ainda assim, sorri e fala:
─ Levantadores são os maestros de uma orquestra e acho que você é um dos melhores por um motivo.
Atsumu não diz nada por um minuto, apenas tão lentamente possível vira-se para Emma, vasculhando as feições da garota, procurando por alguma coisa, talvez aquela costumeira irritação que ele desperta nela, um sinal que está apenas brincando com ele. Independente do que seja, Atsumu parece satisfeito ao manear com a cabeça e um gesto de seu pé fecha o armário, o som metálico combinou-se com os das calhas.
─ É, acho que você tá certa...─ Há uma pausa e, então, com um tom de voz mais suave que já escutara, continuou: ─ Emma.
Emma estava corando e o odiava por isso, como sempre. Mas, seu coração bateu forte, pois, em algum lugar dentro de si, as palavras do garoto soaram como um começo de alguma coisa que deveria desvendar e estava ansiosa.
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