
━━ 𖥔 ִ ་ ،𝟱𝟳. 𝗘𝗰𝗹𝗶𝗽𝘀𝗲 𝘁𝗼𝘁𝗮𝗹 𝗱𝗼 𝗰𝗼𝗿𝗮𝗰̧𝗮̃𝗼.
5.3K de palavras.
━━ Segunda parte da Grand Line, Novo Mundo ; Ilha de Porzellanpuppen, Cidade das Ruas de Kristalle.
ᘡElisabette, Anjo da Morte. ❪O ponto de vista Dela❫
Meus olhos se abriram lentamente e pisquei algumas vezes para tentar entender onde eu estava, também tentando identificar o que me segurava firmemente, até que reconheci seu rosto em meio ao embaçado da minha visão. Instantaneamente, um sorriso suave brotou em meus lábios ao ver Law-san adormecido, com seus braços envolvendo meu corpo nu e me mantendo segura e aquecida contra seu peito. Ele parecia tão tranquilo que eu poderia afirmar que aquela talvez fosse uma das poucas vezes em que ele dormia, de fato, profundamente. É um sentimento bobo, mas fico feliz por, talvez, proporcionar um pouco de paz a ele, mesmo em uma situação tão turbulenta quanto a nossa - esquecidos em uma ilha, sem previsão certa para retornarmos aos nossos companheiros.
Bocejei baixinho e, com cuidado, me afastei dele, notando que ele franzia levemente o cenho ao fazer isso. Isso resultou em uma de minhas sobrancelhas se arqueando enquanto, em silêncio e sendo o mais cuidadosa possível, comecei a me arrastar para a beirada da cama. Sentei-me na ponta e encarei o chão em silêncio, permitindo-me ser envolvida pela calmaria e pelo ambiente pacífico ao nosso redor para refletir e colocar a cabeça no lugar.
Senti o vento morno do meio-dia adentrar pelas pequenas frestas da janela e vir até mim, arrepiando minha pele e fazendo meus poros se dilatarem com a leve quentura que de repente me percorreu por inteiro.
Um suspiro escapou entre meus dentes e minha mão imediatamente foi até a boca, cutucando o espaço onde havia perdido um dente. Isso me levou a bufar e fazer uma careta mal-humorada pelo fato de ter levado uma surra boa o suficiente para arrancar um dente com tanta facilidade. Foi vergonhoso e, além de vergonhoso, humilhante, pois apanhei como uma estúpida fraca - era assim que me sentia desde que a Febre das Árvores começara a me corroer como uma praga se alastrando em uma plantação.
Tentei tanto evitar o que faria que fiquei desesperada ao descobrir que Kaminari estava contaminada com a Febre das Árvores. Não pensei duas vezes antes de eliminá-la, a fim de evitar que a doença se alastrasse pelo navio, contaminando meus companheiros e, principalmente, Luffy. A simples ideia de vê-lo adoecer e morrer por culpa daquela desgraçada me revirou o estômago de tal maneira que só consegui raciocinar depois que decepei sua cabeça e a joguei no mar, para enfim estourar seus ovos, sem deixar nenhum. Eu não poderia permitir que algo acontecesse com ele; nada de ruim poderia ocorrer com Luffy sem que eu pudesse impedir. Como sua subordinada, fiz o que deveria ser feito.
No entanto, isso me custou muito. Como diabos eu enviaria as malditas plantas para Skypiea? Como faria para que a Tenshi Tenshi no Mi fosse enviada com segurança para as mãos de Wyper? Manter Kaminari viva não adiantaria em nada; apenas pioraria a situação. Porém... por Deus, o que custava aqueles shandias imbecis me entregarem um Pássaro do Sul saudável? Se não fosse por Law-san, eu teria morrido muito antes; eu não estaria aqui agora.
Engoli em seco, levando as mãos à cabeça e sentindo o suor frio escorrer pelas bochechas enquanto virava minimamente o rosto para encará-lo por cima dos ombros. Observei em um silêncio tenso sua figura adormecida envolta nos lençóis, com um semblante cansado de quem não conseguia dormir há dias.
Tivemos relações. Estive na cama com ele e me entreguei a ele sem mais nem menos, como se fôssemos algo mais do que aliados. Deixei que ele tocasse em mim como se eu fosse sua mulher. Não foi uma experiência negativa, mas também não sei dizer se foi a coisa certa a fazer. Quero dizer, eu gostei. Senti-me bem. Ele foi gentil. Nunca esperei que algum dia passaria por isso; nunca foi algo que almejava fazer e, mesmo assim, não sei o que pensar. Não foi algo... planejado, eu acho.
Suas mãos deslizavam pelo meu corpo como se estivesse me reverenciando, como se eu fosse algo maior do que sua aliada; seus olhos me admiravam como se nunca tivesse visto alguém igual a mim - como se eu fosse algo bom a ser visto, apreciado e adorado.
É um sentimento estranho, algo que sei identificar, embora não possa afirmar se sou digna de senti-lo ou... se sou digna de ser retribuída.
Não sou boba, tampouco ingênua. Sei o que acontece ao meu redor; vejo tudo, apenas não falo. E, se falo, é porque quero saber se realmente entendi e, caso permaneça em silêncio, é porque compreendi e prefiro manter para mim. Sei o que os homens desejam de mulheres jovens com um aspecto ingênuo e uma personalidade inocente, como pensam e julgam que eu tenho; eu simplesmente... não sou assim. Não sou burra. Sou inteligente; tenho plena consciência disso. Apenas nunca sei como expressar o que sei.
Eu simplesmente não sei se esse é o caso dele, se para ele eu sou isso. Não é algo que desejo ponderar ou acreditar; contudo, é tão estranho. Desde muito jovem, eu compreendia como funcionava uma relação sexual, como uma criança era concebida e gerada, e que, após algum tempo, ela nasceria e cresceria. Meu pai nunca me ocultou nada; sempre quis que eu soubesse me comportar como uma mulher da minha idade, que tivesse uma mente repleta de informações valiosas sobre a vida. Eu sabia muitas coisas, tantas que levaria dias para listar.
Eu apenas queria entender o porquê de me sentir assim quando estou com Law-san; por que sinto tanto nervosismo a ponto de agir como uma tola em sua presença, como se eu fosse realmente uma estúpida que não sabe de nada e apenas vê graça nas coisas... Não é medo, não mais. Deixei de temer sua presença quando ele estendeu a mão para mim ao oferecer ajuda sem hesitação, proporcionando-me o conforto de um tratamento duradouro que me fez acreditar que a vida ainda sorriria para mim.
Mas agora, ao olhá-lo depois de tudo o que vivemos em tão pouco tempo, não sei mais o que pensar ou como me sentir. Ao mesmo tempo em que quero senti-lo novamente, ter seu corpo junto ao meu, seus lábios nos meus com aquela agressividade possessiva como se temesse minha fuga de seus braços, também sinto que não deveria alimentar o que sinto; não deveria me deixar levar por um sentimento que alguém como eu - uma praga - sequer deveria experimentar.
O amor é... um sentimento muito bonito. É um sentimento doce e suave, do qual muitas pessoas desfrutam enquanto outras se veem amaldiçoadas por não terem o luxo de amar ou serem amadas... e meu caso é esse. Não posso afirmar que o amo, mas gosto dele sim; gosto muito... Entretanto, não posso garantir que o sentimento seja recíproco e, sendo honesta comigo mesma, é preferível que não seja. Com o realismo dominando tudo o que nos envolve, jamais seria recíproco.
Acho que estou com medo.
Por que você está com medo?
Eu não sei.
Você tem medo dele?
Do Law-san?
Sim.
Não mais.
Então, você tem medo do quê?
De mim.
Nunca sei o que pensar sobre mim mesma; nunca sei o que realmente sou ou o que desejo. É tão curioso que eu esteja ponderando sobre todas essas questões apenas após ter transado duas vezes, quando poderia ter feito uma reflexão dessas, com uma pitada de choque de realidade, por diversos outros motivos. Sinto que sou uma piada de mau gosto que a vida criou para o universo, que apenas se diverte e ri das minhas desgraças para evitar um clima constrangedor.
Em silêncio, levantei-me da cama e caminhei em direção ao armário, abrindo-o devagar para evitar ruídos desnecessários. Meu olhar imediatamente se fixou na minha bolsa, e a agarrei no mesmo instante, trazendo-a para perto do peito. Comecei a revirá-la em busca do Call Dial estilhaçado que eu havia guardado dentro de um pequeno saco, para não perder nenhum fragmento da concha e, assim, não comprometer meu meio de comunicação com as Ilhas do Céu. Não tardei a encontrá-lo embrulhado em um canto da bolsa; peguei-o bruscamente e o joguei novamente dentro do armário.
Ainda preciso de uma cola. Não posso demorar mais um único dia para falar com Wyper novamente e entender melhor a situação de Skypiea, desta vez sem que acabemos discutindo e eu faça uma ameaça ridícula. Santa Praga está morta, morreu junto com o império que Enel havia construído ao se autodenominar Deus. O que restou foi o Anjo da Morte, que deu seus primeiros passos ao navegar pela primeira vez pelos mares da Grand Line sob a bandeira dos Piratas do Chapéu de Palha.
Não sei o que levou o povo a começar a brigar entre si, especialmente alegando fazê-lo em meu nome! Céus, o país já estava uma bagunça devido à epidemia, e eles ainda resolveram guerrear uns com os outros por motivos fúteis? E pior, jogando a culpa em mim. Tudo que sei é que preciso fazer algo para resolver essa situação... de alguma forma.
Eu não tenho mais dinheiro. Tudo que eu tinha acabou quando comprei algumas coisas na feira. E agora? Eu realmente preciso de uma cola e não deve custar tão caro; deve ser apenas alguns berries, bem poucos, tão poucos... e eu só tenho duas moedas de prata. No entanto, parando para pensar um pouco, sei quem tem dinheiro de sobra e não vai sentir falta se eu pegar apenas algumas notas que não farão diferença alguma em sua carteira. E, mesmo que façam... eu o pagarei quando a dívida for quitada.
Sorrateira como uma cobra e silenciosa como uma lagarta, caminhei na ponta dos pés até o cabide onde as roupas de Law-san estavam penduradas, junto com as minhas, das quais eu nem lembrava quando haviam sido colocadas ali.
Cuidadosamente, enfiei a mão no bolso das calças dele para procurar sua carteira. Quando finalmente a encontrei, um sorriso travesso surgiu em meus lábios ao abri-la e ver o monte de dinheiro verdinho e cheirosinho brilhando em meus olhos, me persuadindo a pegar dez cédulas. Estava prestes a enfiá-las na bolsa da minha saia para vesti-la em seguida, quando ouvi um bocejo rouco e baixo vindo de trás de mim, o que me fez arregalar os olhos, empalidecer a pele e gelar o sangue, quase trincando as veias como gelo.
- Elisabette-ya... que horas são? - a voz de Law-san ecoou no silêncio do quarto, fazendo-me estremecer e engolir em seco.
- Acho que já é quase uma da tarde.
- O que está fazendo aí? - ele perguntou, ainda sonolento, enquanto me virei lentamente com sua carteira ainda em minhas mãos. Senti um frio na espinha quando ele franziu o cenho e arregalou os olhos ao notar o objeto que eu segurava. - Por que está com minha carteira!?
Assim como há dois anos, sem pensar duas vezes ou ponderar sobre as possíveis consequências dos meus atos, avancei em sua direção e desferi um chute certeiro em seu rosto, fazendo-o voar para o outro lado do quarto, totalmente desacordado.
- Não leve para o pessoal! Eu preciso do seu dinheiro bem rapidinho! - exclamei, desesperada, correndo novamente para onde estavam minhas roupas e vestindo-as o mais rápido que pude.
Já vestida, fugi pela janela e caí de bunda no chão. Foi uma queda de alguns metros, mas não morri porque sou quase indestrutível, dependendo do grau da pancada, e essa com certeza não foi forte o suficiente para me levar para o outro lado; apenas foi dolorida o bastante para que eu sentisse a bochecha das minhas nádegas arderem pelo impacto do meu corpo batendo com força e em alta velocidade no chão.
É, ele vai ficar bravo como na primeira vez, só que agora foi por uma boa causa! Eu preciso de uma cola e de um jeito de juntar os estilhaços do Call Dial. Caso contrário, terei que esperar até estar novamente no Going Luffy-senpai para pedir ao Franky que conserte para mim. Isso, se ele não tiver nenhum equipamento e me fizer esperar ainda mais até que estejamos em Zou, onde ele poderá usar as ferramentas de sua oficina, o que, sem sombra de dúvidas, é um milhão de vezes melhor e mais eficaz do que tentar arrumar a concha com cola, sabendo que as chances de voltar a funcionar são mínimas... e isso só pioraria minha situação com Law-san, que terá sido nocauteado em vão.
Em passos mancos, observei atentamente as casas e lojas ao meu redor, olhando curiosa para tudo o que havia na Cidade das Ruas de Kristalle.
Havia diversos estabelecimentos que vendiam uma variedade de itens elegantes, com aparência de grande valor, o que, de fato, eram. As roupas femininas nas vitrines, especialmente os vestidos, apresentavam detalhes de cristais no busto e babados nas mangas, alguns com desenhos em dourado que conferiam um ar de graça a quem os vestisse. Se o dinheiro que eu possuo não fosse tão precioso e fosse realmente meu... eu com certeza compraria vários deles e poderia ter um pouco de dignidade, em vez de usar bermudas que assam minhas coxas e fazem minha calcinha entrar dentro da bunda.
Enquanto passeava pela estrada de pedras cristalinas da pequena avenida, notei uma espécie de casinha de madeira com uma placa na entrada, o que me fez estreitar os olhos e me aproximar com cautela, enquanto cruzava os braços e encarava as letras embaralhadas.
A letra C, com a forma "ca"... com o R no meio entre as palavras, forma uma puxadinha engraçada, como se estivesse esbarrando, não é? Portanto, temos "car". A letra P com I forma "pi", "carpi"... Céus, não lembro qual é o som do N entre as palavras! Ah... acho... bem... e se eu entrar e perguntar? Talvez seja uma carpintaria! Ou uma loja de carpim. Não sei. Que inferno, só entrando para saber e, se for uma loja de carpim... já era. Vou ter que andar mais - ou mancar mais.
- Boa tarde. - falei em um tom de autoridade, enquanto erguia a cabeça e olhava de cima para um senhor que estava sentado em um pequeno banco de madeira, raspando uma tábua.
- Oh! Boa tarde, mocinha! - ele sorriu, sua gengiva quase à mostra pela falta de dentes em sua boca. - O que traz uma dama tão bonita a uma carpintaria caindo aos pedaços?
- Ah, aqui é uma carpintaria?
- Sim!
- Você faz de tudo?
- Tudo e mais um pouco!
- Então conserte isso. - ordenei, sem fazer mais perguntas, aproximando-me dele e arrancando o saquinho com os pedacinhos da concha do Call Dial. - Isso é um dial que funciona como um Den Den Mushi... só que melhor e mais prático.
- Hm... - ele pegou o saco das minhas mãos e jogou cuidadosamente as peças no chão para observá-las com mais atenção. - É uma gambiarra interessante essa aqui, mocinha. Você quem construiu?
- Não interessa. Pode consertar?
- Sim, sim. Sinceramente, vai ser bem rapidinho! - o senhor sorriu novamente e direcionou seu olhar para o meu. - Na verdade, isso aqui tem a mesma tecnologia usada nos Den Den Mushi; a diferença é que está tudo enfiado numa concha. O problema maior é que a concha quebrada não pode ser reutilizada porque está muitíssimo danificada e eu não tenho conchas aqui.
- Uff... se eu encontrar uma concha, você resolve isso para mim, moço? - cruzei os braços e agachei-me para ficar à sua altura. - E, a propósito, quanto fica?
- Não cobro de mulher bonita.
- Oh. - franzi o cenho, mas não pude evitar que um sorrisinho tímido brotasse em meus lábios. - Que gentil.
Deixei as peças com ele e girei nos calcanhares para sair da carpintaria e seguir em direção à praia, onde encontraria conchas espalhadas pela areia. Bem... tudo parecia fácil se a praia não estivesse a quilômetros de distância da cidade, o que me tomaria pelo menos duas horas até que eu estivesse com os pés na areia e sentindo o vento forte da brisa marítima golpeando minhas bochechas sem piedade. Claro, eu poderia ir voando, mas minhas asas ainda estavam um pouco doloridas, e forçá-las a bater rapidamente só faria com que doêssem ainda mais. O que me restou foi apelar para minha perna manca fazer o trabalho.
Law-san ainda deve estar desmaiado no quarto depois do chute certeiro, e ele não imaginará que estou indo para a beira da praia caso acorde - ou melhor, caso ele acorde antes de eu voltar. Eu o chutei com tanta força e ele bateu a cabeça tão forte que, quando acordar, estará com tanta dor que não vai querer perder tempo me caçando como um maluco, igual fez em Sabaody... eu espero.
Talvez eu devesse fazer algo por ele ou oferecer alguma coisa para compensá-lo pelo trabalho que lhe dei há dois anos, assim como por tê-lo acertado com um chute e o desmaiado novamente. No entanto, o que será que ele gostaria? Eu não sei muito sobre ele, apenas o básico do básico do muito básico. Ele é bastante reservado e sempre me interrompe quando pergunto algo pessoal, mesmo que estejamos navegando juntos há tanto tempo... Já se passaram o quê? Quase dois meses, certo? Para mim, isso é tempo suficiente para que ele me visse como amiga ou... algo a mais, eu acho. Não sei o que ele vê quando me olha; não sei se ele me considera sua amiga, mas ele é meu amigo, sim! Gostando ou não, é meu amigo, querendo ou não, esse magrelo esquisito.
"Magrelo esquisito", não sei se esse termo ainda se aplica a ele. Há dois anos, quando nos vimos pela primeira vez e no pouco tempo que passamos juntos, ele era realmente bem magrinho, raquítico, e os ossos do rosto marcavam nas bochechas. Os olhos dele também estavam sempre vermelhos e com olheiras, como se não dormisse há dias! Não que agora ele não as tenha; contudo, naquela época, suas olheiras pareciam mais fundas e escuras... Hoje em dia, ele é... bonito? Bem, antes ele era bonito; um pouco estranho e bizarro? Sim, mas ele tinha um charme, embora eu não tenha prestado tanta atenção nele para poder afirmar.
Entretanto, se eu for pensar nele dessa forma agora... Law-san realmente é um homem muito atraente, tão atraente que me sinto uma boba por todas as idiotices que faço ou falo na presença dele. Ele deve me achar uma estúpida com peitos enormes.
Enfim, Law-san é lindo e considero isso incrível, pois ele é a combinação perfeita entre beleza e malignidade, como se fosse o próprio Anjo Caído das histórias que os monges contavam para as crianças em Birka - Lúcifer, o mais belo entre os querubins. Não que Law-san seja uma pessoa má; ele está longe de ser. O coração dele possui tudo: rancor, mágoa, desespero e um lampejo fraco de amor, mas não contém nada que possa ser considerado mal. Ele não é uma pessoa ruim; jamais seria, e isso soa tão irônico quando me pego a comparar-nos.
Os anjos são interpretados como criaturas belas, graciosas e perfeitas aos olhos de todos, com seus corpos delicados e aparência frágil, pele macia e suave, além de um par de lindas asas brancas em suas costas. Eles sempre apresentam uma aparência amorosa e gentil, seres aos quais as pessoas olharão e confiarão suas vidas de forma cega, sem qualquer dúvida. E eu, por mais mesquinho que possa parecer admitir isso, possuo essa aparência, essa figura de anjo descrita por essas pessoas, enquanto Trafalgar Law está distante de se comparar a essa imagem; aqui reside a ironia. Eu sou assim, aparentemente bondosa aos olhos de quem está ao meu redor, mas não sou. Desde o momento em que nasci, já era podre, suja e corrompida por aqueles que me conceberam e trouxeram ao mundo; já ele não.
Seu olhar, sua personalidade e seu coração pesado; sua alma cansada e exausta dizem o contrário de sua aparência. Não sei o que ocorreu em sua vida, o que lhe fizeram ou quem tentou sujá-lo, torná-lo imundo pelas maldades do mundo. Contudo, não conseguiu porque, apesar de tudo - de sua revolta, de sua expressão fechada e de sua personalidade fria com olhar duro - Trafalgar Law, o famoso Cirurgião da Morte, possui um dos corações mais fortes e bons que já pude sentir em todos esses anos desde que aprendi a usar o Mantra.
Que pena. Talvez ele seja demais para mim. Bom... demais para mim. Fico feliz que ele pense que sou apenas uma bobinha conhecendo o mundo, ao mesmo tempo em que gostaria que ele soubesse quem realmente sou, o que fiz e... quem eu costumo ser de verdade, mas tenho medo. Tenho medo do que ele vai dizer, do que vai pensar e de como vai me olhar. Queria não ser complicada. Eu queria... ser normal.
Acabei me distraindo na costa e passei a tarde inteira jogando vôlei com algumas crianças que estavam na praia. No entanto, consegui pegar uma concha que serviu muito bem para reconstruir o Call Dial, e fiquei tão surpresa com a rapidez com que o senhor consertou para mim. Para evitar que Law-san brigasse tanto comigo - pois, com certeza, ele irá brigar - comprei um presente para ele: uma moldura decorada com conchas azuis e brancas. Assim, irei emprestar meu Vision Dial para que ele possa tirar uma foto de algo que goste e colocá-la lá! Se ele não gostar, já era... Porém, se gostar, terei tido sorte e conseguirei me livrar da sensação de estar sem cabeça outra vez.
Em passos suaves, cheguei à recepção do hotel e vi a recepcionista de antes lendo um livro. Acenei para ela e me dirigi ao quarto onde estávamos hospedados, notando que a porta não estava trancada, o que significava que Law-san já havia recobrado a consciência e provavelmente estava bufando como um touro raivoso do outro lado.
Respirei fundo e girei a maçaneta com cuidado, abrindo a porta e notando que o quarto estava com as lamparinas apagadas e a janela fechada, coberta pelas cortinas. Isso me fez erguer uma sobrancelha e suspirar. Por Deus, esse homem não se cansa de ficar nesse breu? Revirei os olhos e tranquei novamente a porta atrás de mim, caminhando devagar até a cômoda onde estavam a caixa de fósforos, para que eu pudesse acender ao menos uma lamparina e iluminar o quarto, mesmo que apenas um pouco.
- Desgraçada! - fui pega de surpresa ao sentir algo colidir fortemente com meus pés, fazendo-me cair de costas no chão. - Cadê a minha carteira!?
- AI! - gritei, assustada, ao sentir a lâmina gélida de sua nodachi raspando minha garganta e me fazendo engolir em seco. - MINHA BOLSA! DENTRO DELA! SÓ USEI QUATRO MOEDAS DE OURO! - exclamei, segurando firmemente seu pulso na tentativa de impedi-lo de decapitar-me.
- E por que você não pediu?
- Porque você não ia querer dar!
- Não mesmo, mas custava pedir? Maluca. - Law-san aproximou-se ainda mais de mim, e senti minha pele ser ferida levemente, mas o suficiente para que algumas gotículas de sangue descessem pelo meu pescoço e busto.
Arfei, mordendo os lábios enquanto o encarava assustada. Vi-o afastar a nodachi e agarrar minha blusa para erguer meu corpo, deixando-me sentada de joelhos em sua frente. Todos os pelos do meu corpo estavam arrepiados, e meus olhos estavam tão arregalados que eu poderia jurar que iriam saltar para fora do meu rosto a qualquer momento. No entanto, nada era mais arrepiante e tenebroso do que seu olhar frio e penetrante, que me fuzilava como se a própria morte estivesse ali, prestes a me assombrar e levar-me embora.
Minhas mãos trêmulas seguraram seus pulsos novamente; sendo honesta, eu poderia muito bem quebrá-los se quisesse. Eu poderia reverter a situação e torná-lo meu refém. Contudo, estar à mercê dele era algo que havia descoberto recentemente que me agradava mais do que poderia ser considerado normal. A maneira como ele me agarra, como me segura e age como se nunca fosse me soltar é algo que me desarma completamente, fazendo-me esquecer totalmente da força que possuo e como ela é superior à de qualquer ser humano normal que exista no Mar Azul.
Ele aproximou-se lentamente de mim, e eu fechei os olhos, sentindo sua língua deslizar suavemente pela ferida aberta em meu pescoço, demorando-se no sangue que jorrava suavemente pela pele e deixava rastros vermelhos por onde passava. Um suspiro fraco foi a única resposta que pude lhe dar quando ele continuou lambendo meu sangue como se estivesse provando o mais saboroso e fino vinho, fazendo-me arrepiar mais uma vez e entregando-me ao deleite de estar em suas mãos. Quando parou, abri os olhos e o encarei, com as bochechas coradas e os lábios comprimidos de forma trêmula enquanto nos encarávamos fixamente - como sempre, como todas as vezes.
Foi então que, sem aviso prévio, ele me empurrou e bati com as costas no chão. Minhas pernas se ergueram instintivamente no ar enquanto ele se levantava e arrancava minha bolsa, caminhando em direção à cama para virá-la de ponta cabeça e derrubar tudo o que havia dentro sobre o colchão: sua amada carteira, o Call Dial, o Vision Dial, algumas pedras brilhantes que encontrei na rua, uma escova de cabelo, calcinhas, uma marmita com comida provavelmente mofada, o caderno de desenhos que ele havia me dado, um cartaz de procurado de Bellamy, o mais recente - recebendo dele um leve olhar de surpresa. Ah, e claro, por último e não menos importante: a moldura de conchas.
- Por que você fica deixando lixo entre suas coisas? - ele resmungou, abrindo o cartaz e fazendo uma bolinha para jogar em minha direção, acertando-me em cheio na testa. - E, a propósito, o que você comprou? - perguntou com rispidez, demonstrando uma agressividade passiva enquanto pegava o Call Dial e observava-o com atenção.
- Não é lixo! São coisas que achei interessantes e peguei para levar ao Sunny. Vou mostrá-las ao Chopper. - dei de ombros e me levantei, endireitando a bermuda para tirá-la de dentro da bunda e caminhei até ele. - Comprei uma moldura. - respondi enquanto cruzava os braços. - Cuidado com essas conchas, elas não podem se quebrar. Você é muito brusco com as mãos.
- Não sabia que você era acumuladora. - ele sorriu de canto de forma provocativa enquanto eu ergui uma sobrancelha, demonstrando minha confusão, e ele revirou os olhos. - Esquece. Enfim, para que diabos você comprou uma moldura, pirralha?
- Para isso. - peguei o Vision Dial e fotografei o rosto dele com um flash extremamente forte que o fez fazer careta.
- CACETE!
- Você não é nada fotogênico... - murmurei, observando-o pegar o dial da minha mão para examiná-lo melhor, desta vez mais atento aos detalhes incomuns da concha.
- Isso é como um Den Den Mushi, mas em formato de concha... É daquela sua terra, Skypiea? A tecnologia das Ilhas do Céu é bem interessante. - ele disse em um sussurro, concentrado na observação.
- Sim, é com isso que tiramos fotos dos criminosos para levá-los ao julgamento divino.
- Que seja. O que eu vou fazer com isso?
- Oh, você pode fotografar algo que gosta muito e colocar na moldura que comprei para você! É um presente de desculpas por ter chutado você e roubado seu dinheiro novamente. - dei um sorriso sem jeito enquanto o olhava com súplica, implorando em silêncio por sua aceitação.
- Deixe-me ver se entendi corretamente: você comprou um presente para mim a fim de me pedir desculpas... usando meu próprio dinheiro? - a sobrancelha de Law-san se ergueu e seu olhar se intensificou de uma maneira que me fez ponderar; minha pele ficou pálida e uma gota de suor escorreu pela bochecha. - Você precisa pensar duas vezes antes de agir.
- Mas eu pensei duas vezes!
- Certo, na próxima pense três.
Encolhi os ombros e permaneci em silêncio, apenas olhando em seus olhos sem pronunciar uma única palavra até o momento em que peguei a moldura de cima da cama e a enfiei entre meus seios, notando como ele me fitou confuso até que falei novamente:
- Se não gostou, posso devolver e pegar seu dinheiro de volta. - respondi calmamente, afastando-me em passos lentos até a porta; antes que eu pudesse tocar nas chaves, ele agarrou meu pulso.
- Não. Me dá.
- Você não gostou e está certo; o dinheiro é seu, então o presente não é realmente um presente e não estou desculpada.
Ele trincou os dentes e enfiou a mão na minha camisa, fazendo-me soltar um gritinho de surpresa que logo cessou ao ver a moldura de conchas sendo segurada por ele. Fiquei quieta novamente e o olhei com um misto de indignação e confusão, vendo-o virar o rosto para longe do meu campo de visão; quase podia jurar que suas orelhas estavam vermelhas, assim como parte das bochechas ainda visíveis para mim. Ele forçou a garganta e me encarou pelo canto do olho.
- Eu vou ficar com essa coisa só porque você se deu ao trabalho de ir comprar para não me deixar irritado. - Law-san falou e virou-se novamente, fixando seu olhar no meu.
- Oh, isso é bom. - dei um sorriso genuíno desta vez. - Então você me desculpa?
- Não.
- POR QUÊ?
Law-san permaneceu em silêncio, fixando seu olhar em mim. Quando eu estava prestes a me afastar novamente, um movimento ágil de seus dedos me fez compreender o que se seguiria. Num instante, encontramos nossos corpos colapsando sobre a cama, enquanto minhas pertenças se espalhavam pelo chão, empurradas por ele em busca de espaço no colchão. Minhas pernas se posicionaram de cada lado do seu corpo, e suas mãos firmemente se agarraram às minhas coxas, provocando um calor prazeroso que formigava em meu ventre e agitava as paredes do meu estômago com um vento frio. Eu me tornava uma verdadeira confusão ambulante de emoções reprimidas que se alojavam em minha garganta.
Suspirei ao sentir seus dedos suaves deslizarem por minhas pernas e adentrarem meu short. O volume de suas calças já roçava minha virilha, fazendo com que um gemido baixo escapasse de meus lábios ao perceber o quão duro e necessitado ele estava sob mim.
Inclinei-me ligeiramente até que nossos rostos ficassem a meros centímetros de distância, nossos lábios quase se tocando. Foi nesse momento que senti suas mãos agarrando com força minhas nádegas, desferindo um tapa contundente o suficiente para me fazer grunhir alto, enquanto tentava sufocar o grito estridente que quase escapou. Olhei em seus olhos e vi a sede ardente que neles habitava, a luxúria estampada em seu olhar. Diferente das duas primeiras vezes, desta vez eu não soube como reagir. Não consegui discernir se realmente estava satisfeita por estar ao seu lado - mas, mesmo assim, rendi-me e o beijei com toda a intensidade que meu ser era capaz.
Sua língua invadiu minha boca sem misericórdia, violando meus lábios como um animal faminto. Minhas mãos correram até seu rosto, segurando-o para impedir que se afastasse de mim, mesmo ciente de que aquela não era a nossa realidade.
Eu estava completamente consumida pela loucura, esgotada mentalmente; provavelmente meu corpo começaria a refletir o estado do meu espírito à medida que continuasse a me deteriorar diante de tudo que me atingia e envolvia, tanto direta quanto indiretamente. Não sabia mais se ao entregar meu corpo a ele da forma mais profana e pecaminosa ainda era eu mesma - ainda era Elisabette, o Anjo da Morte; ou Magni D. Elisabette, a Santa Praga. Talvez em todos aqueles momentos futuros nos quais eu me encontrasse daquele jeito por causa dele, eu pudesse esquecer quem realmente sou e permitir-me ser quem ele desejasse acreditar que eu era.
Afinal, não havia amor - pelo menos não da parte dele. Portanto, não havia razão para desejar algo inexistente e que eu não merecia: o amor de um homem que não me amava e nunca estaria disposto a fazê-lo. O que compartilhávamos era puramente carnal; isso era evidente. Contudo, se assim deveria ser, então assim seria: nas mãos dele, sendo usufruída de todas as maneiras possíveis por um homem com uma mulher. Eu aceitaria.
Porque se fosse para ser uma miserável, que ele também fosse miserável ao meu lado.
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