┃ 𝟎𝟏 : 𝐁𝐀𝐂𝐊 𝐓𝐎 𝐓𝐇𝐄 𝐎𝐋𝐃 𝐇𝐎𝐔𝐒𝐄.
Trafalgar Law
Alguns dias se passaram desde o meu pedido de férias a Doflamingo, que rapidamente conseguiu me conceder um período de seis meses de hiato. Assim que o anúncio foi feito, minhas redes sociais foram inundadas por mensagens de fãs desejando-me um "bom descanso" e pedindo para que eu retornasse em breve. Sem mencionar as fãs que me enviaram diversas fotos íntimas por meio de DM's no Instagram, afirmando que aguardariam ansiosamente pelo meu retorno.
Eu não sabia para onde ir; desejava passar meus seis meses de férias em um local pacato onde pudesse encontrar paz. No entanto, qualquer lugar parecia desvantajoso para mim. Eu possuía casas de praia em Malibu, Ipanema e um apartamento nas Maldivas. Contudo, queria um local onde realmente pudesse ficar sossegado, um lugar onde tivesse certeza de que não acordaria com o tumulto das pessoas gritando na minha varanda para que eu aparecesse e conversasse com elas. Embora me sentisse satisfeito por ter tudo à disposição, era exaustivo ir a qualquer ambiente e não ter um único segundo de tranquilidade sem que alguém aparecesse para pedir autógrafos ou fotos ── sem contar os paparazzi, que pareciam sempre adivinhar onde eu estaria e com quem estaria.
*Bip* *bip*
Fui despertado de meus pensamentos ao ouvir meu celular vibrando sobre o criado-mudo. Rapidamente, peguei-o e verifiquei que se tratava de uma mensagem da minha irmã mais nova, Lammy.
Arregalei os olhos ao perceber que Lammy havia me bloqueado no WhatsApp. Um lampejo de pânico, raiva e frustração acelerou meu coração, que começou a disparar em meu peito ao constatar o tamanho das dificuldades que ainda ocorriam em minha vida devido às minhas atitudes de anos atrás. Por que essa galera simplesmente não esquece o que aconteceu e não me deixa ser feliz? Quanto mais eu tento superar, mais merdas surgem e me fazem sentir culpado por ter seguido meu sonho.
Suspirei e levei as mãos ao rosto, apertando os olhos. Joguei-me sobre a cama, encarando o teto e sentindo a cabeça latejar pela quantidade de estresse acumulada nos últimos sete anos.
Apesar de tudo, dentre todas as pessoas no mundo, a única com quem eu não queria perder o contato era minha irmã, que também foi a única que não me deixou de lado quando fiz o que fiz. E agora, cá estou eu, bloqueado por ela após receber um sermão de uma criança de 13 anos.
Quando Lammy nasceu, eu também tinha 13 anos, e foi estranho não ser mais a única criança na casa, especialmente porque deixei de ser visto como tal a partir do momento em que ela veio ao mundo. Foi estranho não ser mais o único, mas também não foi ruim. Lammy foi como um raio de sol em minha adolescência conturbada; apenas ao ouvir suas risadinhas de bebê ou as perguntas inocentes que ela me fazia, eu já sorria genuinamente e me sentia em paz comigo mesmo.
No entanto, desde que fui embora, nossa relação tornou-se estranha, e não a culpo por ser arisca e sempre me responder de forma defensiva nas poucas vezes em que conversamos. No fundo, eu não quero aceitar, mas sei que ela está magoada com tudo o que fiz. Afinal, Lammy era apenas uma criança quando viu seu irmão mais velho, a quem ela chamava de "melhor amigo", sumir sem se despedir ou dar notícias.
Nasci e cresci em Sandpoint, no Idaho, praticamente no cu do extremo norte do país, e ninguém parecia entender a minha frustração em querer crescer, em desejar ser alguém na vida, nem mesmo Lana. Eu sempre dizia a ela para irmos embora juntos, para tentarmos a vida em outro lugar, na cidade grande, e tudo o que ela sempre me dizia era: "Eu gosto daqui", contentando-se com isso. Lana queria ser atriz, desejava estrelar filmes, mas nunca fez nada para que esse sonho pudesse ser alcançado e, sinceramente, isso me irritava ── me irritava o quanto Lana era alheia à forma como ela mesma prejudicava a própria vida ao se prender a Sandpoint por apego.
Um suspiro novamente escapa de meus lábios, desta vez um suspiro que parece um rasgo em meu peito. Levanto-me da cama e caminho até a janela do meu apartamento, abrindo-a apenas para enfiar o rosto do lado de fora e puxar o ar fresco da noite gélida, sentindo um certo desconforto nos pulmões antes de soltar a respiração e apoiar os cotovelos sobre o batente da janela, com as mãos na cabeça, agarrando meus cabelos e puxando-os.
A imagem de Lana surge em minha mente, uma imagem borrada e quase distorcida de seu rosto, como se minha própria mente estivesse tentando me fazer apagá-la da memória, enquanto eu não permito, sendo meu próprio torturador ao lembrá-la em momentos de vulnerabilidade.
Se eu levar as palavras de Lammy a sério, se eu pensar em todos que permaneceram em Sandpoint após a minha partida, nunca terei coragem de voltar. Mas eu devo. Pelos meus pais. Pela Lammy. São sete anos. Sete malditos anos sem ver meus próprios pais, aqueles que me deram a vida e fizeram tudo por mim, até o momento em que eu fingi esquecê-los para ir atrás de Doflamingo em busca do que seria "uma vida perfeita". E me odeio profundamente por saber que nada disso é verdadeiramente perfeito, e tudo o que sinto ── a felicidade, a energia, a excitação e até mesmo o desejo ── são coisas com data e hora marcadas.
Afasto-me da janela e dou as costas para a lua e as estrelas, voltando para minha cama e deitando-me novamente sobre o colchão macio, puxando o edredom e permitindo-me ser acolhido e aconchegado em um falso calor, em um falso abraço.
Duas semanas se passaram desde que Lammy me bloqueou, e eu não conseguia contatá-la nem por ligação normal. Eu a havia inundado com mensagens e nada; enviei e-mails e nada. Até o momento em que simplesmente desisti de tentar e me vi obrigado a aceitar que minha irmã, de fato, havia se cansado das minhas desculpas e das minhas enrolações, finalmente colocando um ponto final na pouca intimidade que tínhamos. Nem mesmo o Instagram dela eu conseguia encontrar; nem com as contas fake que criei consegui localizar seu perfil, o que me leva a acreditar que ela me bloqueou até para futuras contas que eu viesse a criar. Honestamente, isso dói mais do que eu imaginei que pudesse doer, uma vez que nunca, nesses sete anos, pensei que ela fosse fazer algo assim.
Olhei para trás e vi Monet deitada sobre a cama, assistindo ao noticiário em silêncio, com seu olhar cansado e exausto após um dia inteiro marcando presença na inauguração das lojas de maquiagem de sua linha.
Nunca levei a sério os nossos términos, nem mesmo movi um único dedo para reatarmos, pois quem sempre volta atrás é ela. Monet vem, passa a noite comigo, surta com meus comportamentos, grita dizendo que está cansada, me xinga de todas as maneiras possíveis e, em seguida, aparece bêbada no meu apartamento, assim retornando ao nosso... namoro, caso ou sabe-se lá o que temos ou o que somos um para o outro.
Ao encará-la em silêncio, algo acendeu em minha mente: e se fôssemos para Sandpoint? Embora eu e ela possamos não ser a melhor combinação e ambos sejamos explosivos demais, problemáticos demais e mentalmente desgastados, ela ainda é a pessoa mais próxima que tenho. Sei que, assim como eu, a mídia também a sufoca, especialmente por ela ser uma das influenciadoras mais famosas. Assim, qualquer deslize que ela cometa... adeus à sua carreira. Estamos no mesmo barco.
Aproximando-me dela em passos lentos e leves, peguei o controle remoto de sua mão e o coloquei sobre a cabeceira, subindo por cima da cama e a prendendo com meus braços, envolvendo-a em um abraço forte e suspirando contra seu pescoço ao sentir que algo faltava.
Olhei em seus olhos amarelos e a vi me observando com aquele olhar naturalmente sedutor ao qual já me acostumara. Seu semblante era sereno, e as olheiras, daquele ângulo, eram nítidas, assim como as linhas de expressão em sua testa, escondidas pela franja que agora estava presa com um broche em formato de carneiro. Levei minha mão até sua garganta e apertei suavemente, dando-lhe um beijo rápido nos lábios antes de soltá-la e me jogar ao seu lado na cama.
- Quer viajar? ─ murmurei, e, ao ouvir, Monet virou-se para me olhar com confusão.
- Viajar? Com você e o Doffy? Não, obrigada.
- Não. Apenas nós dois. ─ respondi de forma provocativa, e vi os olhos dela brilharem em surpresa, enquanto ela endireitava o corpo para apoiar os braços cruzados em meu peito.
- Só nós dois? Como... casal? ─ sussurrou, tão baixo que quase não a escutei; só tive certeza do que dissera pelo movimento de seus lábios sibilando a palavra final.
- Não exatamente...
- Ah...
- E então? ─ uma das minhas mãos foi até seus cabelos, segurando uma das mechas esverdeadas e enrolando-a entre meus dedos. - O que me diz? É uma cidade do interior do Idaho... Sandpoint, você conhece?
- Conheço... estou com uma parceria com uma escola de balé em Sandpoint... ─ disse Monet, um pouco descontraída, mas parecendo desconfiada. E eu não a julgo; não é todo dia que a convido para irmos para o meio do nada, sendo que tenho um apartamento nas Maldivas.
- Ótimo. Assim você acompanha de perto suas bailarinas e eu descanso a cabeça.
- Eu não disse que vou.
- Então eu irei sozinho.
Eu sabia que ela recusaria. Monet nunca abandonaria o conforto da cidade grande para se aventurar em uma localidade que mais se assemelha a um cenário típico de um filme de terror ambientado em um acampamento. Foi, portanto, uma tolice da minha parte imaginar que ela pudesse querer ir. Talvez eu apenas desejasse me convencer de que não precisaria encarar tudo aquilo sozinho, ansiando pela mera companhia dela ao meu lado. Mas, que se dane! Não preciso dela, nem de ninguém. Esta é uma jornada que posso percorrer sozinho, mesmo que a solidão me consuma a cada passo.
Monet apenas deu de ombros e ligou a televisão novamente, desta vez mudando o canal do noticiário para um dedicado exclusivamente a aulas de história, geografia e temas semelhantes. Eu sabia que isso era algo que ela realmente apreciava; se eu permitisse, passaria o dia inteiro com a atenção voltada para a televisão ou para o celular, estudando acontecimentos históricos, fatos científicos e questões sobre globalização.
Na verdade, Monet é uma mulher extremamente inteligente ── até mais do que eu, admito. Fico sempre impressionado quando ela compartilha curiosidades sobre qualquer assunto que esteja estudando ou que tenha estudado ao longo da vida. Lembro-me de quando a conheci, há dois anos, em uma boate; ela me apresentou uma palestra completa sobre o aquecimento global e o derretimento das geleiras, explicando como isso causaria problemas catastróficos e irreversíveis que levariam ao fim da raça humana e da vida na Terra. Naquele dia, eu estava tão drogado que me vi preso em suas palavras, prestando atenção em cada frase e tentando processar tudo o que dizia.
Não sei o que a levou a decair tanto, passando de uma estudante brilhante prestes a concluir o curso de química em uma das melhores universidades do país para se tornar apenas um rostinho bonito explorado pela indústria de cosméticos, reduzindo-se a alguém fútil que, assim que envelhecer, será esquecida.
Olhei de soslaio para ela novamente e notei seu olhar concentrado, seus olhos atentos a cada mínimo detalhe das informações apresentadas pelo professor na tela, que explicava como funcionava a migração dos pássaros e por que eles realizavam esse fenômeno. Minha única reação foi suspirar e pegar o celular sobre o criado-mudo para fazer qualquer coisa que não me estressasse com as "nerdolices" dela.
- Se eu realmente for para Sandpoint, você poderia cuidar do Bepo para mim?
- Sem problemas, eu o levo para casa. ─ sussurrou ela, sem desviar a atenção da televisão. - Mas por que não pede às suas empregadas? Não que eu esteja reclamando de ficar com o Bepo; pelo contrário, eu até agradeço... ele é um fofo.
- Porque não confiarei meu cachorro àquelas preguiçosas. ─ retruquei, sentindo-a dar uma leve pancada com a palma da mão em meu estômago. - Sua...! O que deu em você?
- Você deveria tratar melhor as pessoas. Se não fosse por essas "preguiçosas", este apartamento seria um chiqueiro.
- Não fode, Monet...
- Não fode você, seu mimado!
Monet apenas aumentou o volume e se acomodou em meio aos cobertores, desviando seu olhar do meu e encarando a televisão com o cenho franzido.
Essa mulher só me causa dor de cabeça.
Eu irei para Sandpoint, com ou sem ela. Na próxima semana, assim que conseguir me preparar psicologicamente para enfrentar os tapas na cara dos meus pais e da minha irmã, assim como os xingamentos que provavelmente receberei de meus amigos e de Lana, caso ainda se lembrem de mim. Sendo honesto comigo mesmo, é certo que ainda lembram; todos eles devem lembrar. Afinal, eu fui uma parte da vida deles, assim como eles foram uma parte da minha.
Duas malas foram necessárias para que eu pudesse acomodar todas as minhas tralhas e roupas, incluindo cuecas, objetos pessoais e alguns dos meus mangás favoritos que costumo ler ── Berserk, Vinland Saga e Death Note ──, além do meu bloco de anotações e material para escrita. Porque, queira ou não, mesmo que eu estivesse indo para Sandpoint, ainda teria que compor as músicas que Doflamingo solicitou para o meu próximo álbum. Essas canções precisam fazer o mundo vibrar, viralizar e não serem um fracasso aos olhos do meu produtor e dos meus agentes.
Despedir-me de Monet e de Bepo foi um momento importante. Entreguei a ela uma lista detalhada de tudo o que era necessário para que pudesse cuidar dele adequadamente, além de orientações para mantê-lo estimulado e evitar que se tornasse um cachorro preguiçoso, garantindo que gastasse toda a sua energia durante o dia para que pudesse dormir tranquilamente à noite. A lista incluía desde a maneira como ela deveria banhá-lo, tomando cuidado com seus ouvidos sensíveis, até a necessidade de lavar bem suas patas, esfregar cuidadosamente seu pelo felpudo e secá-lo com um secador de cabelo ajustado para a potência média. Por fim, incluí também a recomendação de aparar suas unhas.
Organizei tudo dentro de um carro que havia adquirido utilizando uma identidade falsa e outros meios de pagamento, de modo que ninguém soubesse que eu era o responsável pela compra. Além disso, deixei tudo em perfeita ordem para que pudesse sair na madrugada sem ser percebido por ninguém em Manhattan.
A viagem de carro levaria cerca de 4 a 6 dias, dependendo do número de paradas que eu fizesse, e eu tentaria realizar o mínimo possível.
Assim que entro no carro, dou uma última olhada para o céu estrelado e meus olhos se fixam na lua, um lampejo das memórias dos dias em que passei a noite com Shachi, Penguin e Ikkaku, bebendo e comendo besteiras na loja de conveniências enquanto ríamos e nos divertíamos juntos, sem nos preocuparmos com nada. Aproveitávamos o início da nossa fase adulta, quando tudo parecia tranquilo e livre de preocupações, especialmente por vivermos em uma cidade pequena e pacata, estudando todos na mesma faculdade e ganhando a vida com shows modestos em bares.
Será uma viagem longa e cansativa; não sei nem onde ficarei ao chegar em Sandpoint, mas pelo menos terei tempo e silêncio suficientes para refletir sobre tudo antes de ter que lidar com todos eles.
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