Funus: 003
— Ah, mas que saco, seu pamonha. Não acredito que realmente me obrigou a usar isso. Tsc, isso me deixa ainda mais estressada, só de pensar. Porque, no fundo, eu sei que é um exagero usar minha forma divina contra você.
— Hmm, forma divina, é? Isso é não é meio equivocado de se dizer, espelho meu? Embora esteja em harmonia com a energia da lendária lança Gungnir, a sua alma não é de um deus para alcançar uma forma divina. Mesmo assim, devo admitir que esse seu pico de poder realmente me deixou mais receoso sobre você ser a Transgressora da Obra dos Deuses.
Tezcatlipoca a olhou de cima para baixo. E eu a olhei de baixo para cima.
Com exceção de seus tênis de basquete e seu famigerado gorro cinza, as vestimentas de Yuna se transformaram por completo. Ou melhor dizendo, reduziram consideravelmente. Suas pernas que sempre estavam despidas, não permaneceram mais tão despidas assim. Em sua perna esquerda, cobrindo seu joelho, parte inferior de sua coxa e parte superior de sua canela, uma espécie de manguito carmesim tapava sua pele alva; no entanto, a perna direita ainda estava totalmente nua. Como o uniforme de basquete, 23° Tóquio, também desapareceu naquele show de luzes, basicamente, nossa querida Assassina de Youkais estava somente de lingerie, contudo, o material daquelas roupas íntimas não era o mais comum de se encontrar por aí. Cobrindo sua virilha e parte de seus glúteos firmes e volumosos, algo como uma calcinha de ouro maciço acobertava seu caminho até Jesus. Mais acima, passando por sua barriga lisa como uma pista de pouso e a singela divisa entre os gomos de seu abdômen, seu par de seios fartos era resguardado e segurado por um sutiã metálico sem alças também feito de ouro. No braço direto, assim como na perna esquerda, um manguito vermelho vestia seu cotovelo, parte do antebraço e parte do bíceps; já o braço esquerdo estava como veio ao mundo. E no pescoço, também dourada, uma gargantilha, como toque especial.
Definitivamente, senhoras e senhores, ela aparentava ser uma deusa da guerra e deusa da beleza em um único pacote.
— Olhando desse jeito, espelho meu, seu corpo é realmente incrível. Não só em formosura, mas também como máquina de combate. Eu serei muito feliz em tê-la como minha escrava. Aliás, essa sua armadura está mais para um traje de banho do que para uma proteção.
— Hmm, não é para me proteger, é para deixar meus movimentos o mais livres possíveis. — Respondeu ela, começando a se alongar sob aquela armadura reveladora. — Para ser sincera, eu me sinto bem melhor com meu corpo exibido dessa maneira já que me sinto bem mais flexível. E você se surpreenderia com o quão flexível posso ser. Claro que, parte desse sentimento de conforto deve vir do exibicionismo herdado de minha mãe. Bem, que seja. Eu não tenho muito tempo nesta forma, então vamos logo com isso, está bem?
— Hmm?
— Isso mesmo o que ouviu, deus-bichano, só não sei o porquê da surpresa. Como meu corpo não é divino, existe um período de tempo que ele suporta a magia divina em meus circuitos mágicos. Mas, geralmente, eu não costumo demorar muito tempo para vencer um duelo nesta forma.
Não só a aparência e poder de Yuna havia mudado com aquela transformação. A fúria que ela continha desde que chegou à quadra pareceu também se dissipar com a ascensão do Modo Odin. Agora, ela mantinha aquele ar despreocupado e confiante que ela julgava ser o melhor de sua personalidade.
No entanto, ainda que ela estivesse em sua forma mais poderosa ali, quem ela tinha como adversário ainda era o Senhor do Espelho Fumegante, e manter qualquer tipo de aspecto arrogante contra ele seria suicídio.
— Certo, espelho meu, não vamos perder tempo, se é assim que deseja. Eu também não pretendo estender isso por muitos minutos, apesar de querer sentir seu potencial ao máximo.
— Hmm, perfeito, seu pamonha. Vamos ver como lida com isso aí.
Com isso aí?
Do que ela estava falando? Seria o que eu questionaria a seguir. Porém, na fração de segundo seguinte, como se a realidade tivesse falhado tanto para mim quanto para o deus asteca, uma segunda Yuna se aproximava com passos silenciosos às costas da divindade felina, enquanto a imagem de ela ainda se alongando diante dele se desfazia em cubículos de luz colorida.
Seus braços estavam baixados, mas os punhos que se cerraram de um momento a outro em sua aproximação da divindade deixaram claras as intenções de nossa querida Assassina de Youkais.
Quando Tezcatlipoca se deu conta de que estava encarando uma miragem há algum tempo, e olhou por sobre seu ombro antes de iniciar seu movimento de cento e oitenta graus para se virar, os braços baixados de Yuna começaram a se mover em um instante. Foi algo tão rápido que até parecia que ela já havia desferido cada um daqueles socos, que de repente, voaram consecutivamente como uma chuva de meteoros contra o corpo do deus asteca.
— Tsc...
A divindade recebeu aquela horda de socos, sendo alvejado como se estivesse sendo atacado por uma submetralhadora, só que com os projeteis tendo uma força de impacto bem mais devastadora.
A cada soco que colidia com o corpo verde-escuro do Senhor do Espelho Fumegante, uma espécie de estrondo sônico em miniatura acontecia no contato. E devida a velocidade daquela sequência de golpes vorazes, a pressão gerada ao redor deles, e dispersada por toda aquela quadra, durante aqueles três segundos que aquela ofensiva durou, foi o bastante para trincar todo o piso e as paredes, abalando brevemente a estrutura do edifício.
Ao final do ataque, onde os punhos de Yuna fumegavam, Tezcatlipoca, que foi capaz de se virar para se defender com os antebraços da rajada de socos da hanyou, teve seu corpo empurrado para trás como resultado de ter batido de frente com toda aquela tremenda pressão.
Seu corpo foi parar fora da linha lateral, e também fumegava por conta dos golpes; principalmente em seus antebraços, usados como escudo em X.
— Hmm, o que foi, seu pamonha? Não conseguiu segurar meus punhos dessa vez? Ou vai me dizer que está se segurando, achando que a vitória já está garantida?
— Hmph, a demonstração de poder que realizou agora há pouco foi de fato impressionante, espelho meu. Contudo, apesar da pressão gerada, seus socos mal foram capazes de amaçar a minha pele, somente criando um pequeno calor por conta do atrito. Pode até parecer funcional, mas só força física não será o suficiente para me deter.
— Está bem, não precisa dizer bobagens. Lembre-se que estamos com pressa, não estamos?
— Naturalmente, Transgressora. Acho que já chega de amaciar para o seu lado.
Assim, o deus asteca se moveu. Yuna também.
Igualmente, os dois sumiram de minha vista em um piscar de olhos, e no momento que se sucedeu, estrondos sônicos se formaram em sequência em diversos pontos daquela quadra. De repente, Tezcatlipoca e a Assassina de Youkais ressurgiram ao centro da arena, colidindo as palmas de suas mãos e entrelaçando os dedos uma na outra para começarem a medir suas forças de uma forma mais honesta.
— Hmm, suas capacidades físicas são realmente invejáveis, espelho meu. Conheço deuses em sua forma verdadeira que não seriam páreos para você no corpo a corpo.
— Você não acha que deveria estar preocupado consigo mesmo, seu pamonha? Mesmo que tenha me pedido, eu ainda não estou usando minha capacidade total.
— Ah, é verdade, é? E o que lhe faz pensar que eu estou sequer me esforçando por aqui?
— Tsc.
Com um forte sopro descontrolado, ambos divindade e hanyou soltaram as mãos, dando um breve passo para trás. Já no instante seguinte, os punhos também de ambos se fecharam com a firmeza de uma coluna de aço, e iniciando uma competição de destreza, força e resistência, ainda ao centro da quadra, dispararam um contra o outro um enxame de socos que desenhavam vultos verdes e dourados ao redor deles.
Não demorou para que o prédio onde nos encontrávamos começasse a reagir àquela pressão em seu topo. O piso que já estava bastante danificado criou fissuras consideravelmente preocupantes, que se estenderam até as extremidades do edifício, subindo e descendo pelas paredes e colunas.
Não daria outra. Conforme os socos se mantinham sendo desferidos incansavelmente, a pressão ao redor só aumentava e aumentava, assim como as rachaduras na edificação.
Segundos depois, o prédio começou a se despedaçar. Mas, os fragmentos daquele edifício não foram sorvidos pela boa e velha gravidade como deveria acontecer em uma situação como aquela. Diferente disso, sendo praticamente o oposto, os pedaços do prédio se mantiveram flutuando em pleno ar, como se ali a força da gravidade não tivesse poder algum.
E esse feito permaneceu enquanto mais fragmentos de edifício se separavam de seu todo, até que a parede onde meu corpo se encontrava preso também começou a flutuar, deixando Yuna e o deus asteca trocando seus socos em uma quadra suspensa no vácuo, cercada pelos destroços do que um dia foi a edificação que a suportava.
Eis que, enfim, aquela infatigável série de punhos sendo lançados em ataque bem acima da velocidade do som, cessou de maneira abrupta, com um estalo que ecoou por toda Tóquio desértica.
Yuna, com uma postura magnifica, havia levado a melhor naquela disputa de intermináveis socos, golpeando o rosto da divindade felina em cheio com um cruzado de direita, que não só empurrou sua face para o lado, como também entortou a postura de seu torso.
Na bochecha alvejada pelo punho impetuoso de nossa querida Assassina de Youkais, um pequeno corte, e uma pequena gota de icor dourado escorreu dessa ferida em Tezcatlipoca.
— Hmm, muito bom, espelho meu. Mas todo esse esforço para que somente me arrancasse uma gota de sangue?
Em resposta a provocação do deus asteca, Yuna cerrou os dentes, ao mesmo tempo que armava um novo golpe com o outro punho. No entanto, ao que um novo soco estava para ser disparado pela hanyou, a divindade consertou sua postura em uma fração de segundo, desferindo na sequência um chute reto contra o abdômen da Assassina de Youkais, a lançando para fora da quadra e na direção de um dos grandes pedaços do prédio que se fragmentou. Contudo, em pleno ar, Yuna se recompôs, girando seu corpo ao que ia se colidir com o fragmento, e se apoiando na vertical daquele destroço, grudando seus pés com gelo no concreto.
Focando seus olhos azul-escuros de volta em Tezcatlipoca no centro da quadra, aquela que detém o título de Assassina de Youkais moveu um de seus braços na direção do deus como se estivesse abrindo um longo pergaminho, e com isso, seis lanças de gelo surgiram apontadas para a divindade, não demorando muito para voarem como mísseis teleguiados contra o deus felino.
E havia um bônus naquele ataque. No meio do caminho até seu alvo, as lanças no estado sólido da água se tornaram invisíveis aos olhos.
— Hmph, um truque esperto, espelho meu. Mas você já se mostrou mais sagaz em outras situações em seu passado.
Com o final de suas palavras, uma redoma de fogo escaldante acendeu-se ao redor da divindade asteca, protegendo-a das lanças gélidas que foram possíveis de se assistir se transformando em neve ao que colidiram com todo aquele fogaréu súbito. Após isso, a fortaleza redonda de chamas dançou mudando seu formato, tornando-se uma serpente de fogo que se dirigiu na direção de nossa querida Assassina de Youkais.
A criatura de chamas não era tão veloz para que representasse algum perigo para Yuna, com ela somente saltando como uma aranha daquele fragmento flutuante de volta para a quadra suspensa no céu, passando por cima da serpente de fogo que se desfez ao se chocar com o destroço de onde a hanyou havia saltado.
Yuna pousou com firmeza no piso da arena, flexionando levemente os joelhos, antes de ajeitar sua pose sem tirar os olhos do Senhor do Espelho Fumegante.
— E aí, deus bichano, o que é que vai ser?
— Como é?
— Não escutou? O que é que vai ser? Diga. Nós estávamos com pressa, não estávamos? Já era para esse confronto ter acabado.
— É, tem razão. Mesmo nessa sua forma, não há nada o que possa fazer contra mim, espelho meu. Talvez o correto seja pôr um fim nisto de uma vez por todas. Aqui, neste plano separado do principal, sou eu quem detém o controle. E também aqui, estou fora dos olhares dos outros deuses, o que me permite agir com alguma liberdade.
Nesse momento, eu senti um ar frio correr por dentro de meu corpo. Mais especificamente dentro de meu peito, como se os dedos de uma mão envolvessem meu coração, prestes a apertá-lo.
E como se Yuna soubesse o que se passava no interior de Vosso Humilde Narrador, estalando sua língua e estendendo seu braço na direção do Senhor do Espelho Fumegante, uma lança dourada e com um brilho radiante surgiu com o centro de sua haste envolvida pelos dedos de nossa amada meio-youkai.
Apontada contra Tezcatlipoca, a lendária lança Gungnir mudou a forma de como o deus observava Yuna.
— Hmm, muito perspicaz, espelho meu. Compreendeu que eu estava prestes a fazer algo com seu amigo humano e agiu rapidamente com um ultimato. Achei que permaneceria se contendo, mas enfim decidiu colocar sua maior arma para fora.
— Não permitirei que faça qualquer coisa que machuque o 3k1, seu pamonha. Seja você um deus ou não. Eu já perdi muito do que um dia amei, e não posso deixar que as coisas importantes para mim sejam danificadas tão facilmente.
— Ora, ora, sentimental, não? Você já foi uma pessoa mais fria, sabia? Talvez esse tempo todo que passou com essa sua vida lhe tornou mais humana do que youkai. Eu não sei se, com essa sua mentalidade de agora, será capaz de sobreviver como Transgressora.
— Hmph, não confunda as coisas, deus bichano. Minha natureza não pode ser alterada tão facilmente. Caso contrário, eu não estaria apontando uma das armas mais poderosas da história em sua direção. Se eu lançar Gungnir da forma correta, não importa onde seu corpo original esteja escondido, ela irá te encontrar e irá matá-lo. Não importa a distância, ou mesmo se está em uma dimensão paralela, você morrerá. E mesmo que me mate após a lança ser disparada, isso não anulará seu objetivo.
— ......
— Espero que não tenha ficado sem palavras por conta de algo que você já deveria ter ciência.
— Hmm... é claro que não. Eu não tenho medo, espelho meu, apesar de saber que os riscos são reais. A questão aqui é, você sabe mesmo como lançá-la para que isso aconteça? Ou só está dizendo isso com a intenção de blefar?
— Pois é, quem sabe? Será que sei ou será que não sei? De qualquer modo, acredito que já tenha dito isso, mas eu não tenho interesse nenhum em matar os deuses, ou mesmo de lutar com vocês. Mas, eu tenho um porquê de ter revelado esta lança, agora.
O clarão foi súbito, emanando em um piscar da ponta de Gungnir direcionada para a divindade asteca. E um raio de luz dourada foi disparado contra Tezcatlipoca, cortando o espaço entre Yuna e ele como um relâmpago corta as nuvens de tempestade.
Ao disparo de energia de ouro, o deus felino foi obrigado a agir rapidamente, dando um saltou para o lado para se safar da incisiva rajada de mana divina, que correu iluminando em ouro toda Tóquio até o horizonte, onde o raio diminuiu e se desfez em fagulhas.
— Hmph, então era só isso, espelho meu? Era esse seu grande plano... hã?
— Não, seu pamonha. Aquele era o meu grande plano.
Ao longe no horizonte, no mesmo ponto em que o raio de energia de Gungnir começou a se dissipar, uma fissura circular se fez no meio do céu, como se uma redoma de vidro tivesse sido alvejada por um disparo de revólver. E, em tese, era praticamente o que aquilo era. Do dano circular que se criou, fissuras começaram a surgiu a partir dele, preenchendo nossa visão do horizonte e logo se expandindo para um número maior.
— Como eu já disse, seu pamonha, eu não pretendo atacar deliberadamente nenhum de vocês, deuses. O único motivo de eu estar aqui é você ter raptado o 3k1, e como disse quando cheguei, eu só quero afastá-lo dessa situação. Prendê-lo dessa forma e ameaçar a vida dele é mais sujo do que a minha vida amorosa, e se você enxerga tudo com esse espelho no seu peito, entende do quão sujo estamos falando. E justamente por essa sua estratégia baixa que eu agi desse modo. Pelas coisas que seguiu dizendo conforme trocávamos palavras em nosso confronto, este plano é separado do principal e não é fiscalizado pelos deuses, o que o isenta das condições do Tratado de Valhalla e o permite que, como você mesmo falou, faça o que quiser. Então, para conseguir o que queria por aqui, meu único objetivo era escapar desse plano separado, para que pudesse garantir a segurança do 3k1, o que me levou a procurar compreender como funciona este plano. Bem, isso não foi muito complicado, para ser honesta. Quando o edifício começou a se despedaçar, eu logo notei que se tratava de um perímetro controlado do tipo reino invisível. Uma pequena linha temporal é criada a partir de um ponto X onde o conjurador tem o total controle daquela realidade. Uma bruxaria que somente um deus da magia seria capaz de fazer; o domínio de realidade e tempo em um perímetro controlado no tamanho de toda Tóquio. É impressionante à primeira vista, mas quando descoberta sua espécie, é fácil de derrubar. Infligindo dano magico contra a extremidade do perímetro, como qualquer outro perímetro, ele ruirá.
E as fissuras se estenderam como serpente ao redor de toda Tóquio, literalmente como se estivéssemos dentro daqueles globos natalinos que se encontra em Nova Iorque.
— Hmm, bravo, espelho meu, bravo. Não é à toa que lhe chamam de Cavaleira de Cristal.
— Ninguém me chama assim, além de vocês, e eu ainda não terminei por aqui, então vê se me escuta, está bem? Como derrubar seu perímetro não foi a única coisa que descobri. O mais intrigante nessa história é o verdadeiro motivo desse seu plano raptando o 3k1. Fora do olhar dos deuses, você poderia usar a segurança do 3k1 para me motivar a enfrentar os deuses por vontade própria. Acredito que seu plano era esperar eu me desgastar para depois matar o 3k1 na minha frente, forçando uma raiva emergir de meu interior para me colocar de vez no caminho como Transgressora. Só poderia ser esse o seu plano, não é?
— Hmm...
— Mas o porquê por trás disso, é o que ainda não descobri. A única coisa que é possível imaginar é que você tenha algum motivo em atacar os deuses, e quer me usar como ferramenta para isso.
— Hmm. Muitas teorias, espelho meu. Incrível como seu cérebro é a melhor parte de todo esse seu corpo escultural. Mas os motivos por eu ter agido dessa forma é só porque eu quero me divertir com você. Uma vitória incontestável. Sei que você me entende.
— Sim, entendo. Agora, eu também gostaria de uma vitória incontestável contra você. Mas isso ficará para depois, deus bichano. Como já disse, não é algo que eu faça questão.
Declarando aquilo, com o horizonte ao redor de toda a cidade de Tóquio se quebrando como se fosse vidro, a lança dourada Gungnir desapareceu da mão de Yuna se desfazendo em um instante com fagulhas de ouro. A hanyou, após isso, baixou o braço que segurava a haste da arma lendária e com um brilho cobrindo seu corpo por completo, sua armadura desapareceu, colocando de volta seu uniforme carmesim sobre sua pele.
— Eu vou te dizer, seu pamonha. Essa sua brincadeira aqui me deixou bastante irritada, e fazia muito tempo que não me estressava como me estressei. Mas como resolvi o enigma, eu direi que...
De repente, a sonoridade daquele lugar foi anulada, me impedindo de escutar o que Yuna estava dizendo para Tezcatlipoca. Logo depois, conforme as placas de vidro se quebravam junto daquele plano desconexo do principal, um espaço de escuridão, e apenas escuridão, me era revelado atrás dos limites daquele perímetro mágico. Então, a luz também deixou de existir, e quando me dei conta, eu estava de olhos fechados, sentindo minhas pálpebras se mexerem como se quisessem me acordar de um sonho ruim.
Elas não poderiam estar mais corretas.
Obrigado pálpebras, vocês são as melhores pálpebras que um homem poderia querer.
E ao que meus olhos abriram, eu estava com meu rosto estatelado sobre a mesa da cafeteria onde nos encontrávamos quando fomos atacados pelo deus-crocodilo, Sobek. Porém, os estragos que haviam sido causados pela batalha da divindade egípcia e nossa querida Assassina de Youkais não estavam mais ali.
Eu pisquei meus olhos fortemente por conta da luminosidade que vinha da rua, e levei meu olhar para o assento do lado oposto da mesa.
Recostada no estofado, com sua cabeça jogada para trás, Yuna cochilava de boca aberta para o teto do estabelecimento.
— Aquilo... foi real?
— Foi sim, seu pamonha.
— Quê?! Você está acordada?!
— Sim, mas sempre permaneço fingindo durante quinze segundos para o caso de precisar agir como elemento surpresa. — Ela ajeitou sua postura, estralando seu pescoço, e esfregou seus olhos antes de revelar ao mundo seu par de safiras. — Você deveria tentar esse negócio de fingir, ????. É bastante eficaz.
— É, talvez eu tente algum dia. Mas sobre o que aconteceu...
— Bem, basicamente, a magia criou uma nova linha do tempo a partir dessa, mas onde o deus bichano tinha total controle sobre a realidade. É um ato mágico realmente de proporções divinas, e eu não faço ideia de como ele realizou. Porém, sei mais ou menos como funciona, já que estudei sobre manipulação de universo no livro que o Mena me deu.
— M-Manipulação de universo?!
— Com todas as letras, seu pamonha. Ele criou um novo universo com base neste e todas as experiências que tivemos lá voltaram conosco para cá. Isso significa que se ele nos matasse lá, voltaríamos mortos aqui. Isso porque a magia destorce o tempo em uma espécie de nó. Então, por exemplo, se passarmos vinte minutos no plano desconexo, quando o perímetro for encerrado, rebobinaremos vinte minutos para o passado, mas com os resultados do que ocorreu nesse tempo. Na verdade, parando para pensar é bem mais complexo do que parece, porque, para o resto do mundo, o tempo ficou congelado nesse período.
— Então, não é como uma viagem no tempo?
— É, creio que não exatamente. Quero dizer, sim, é uma viagem no tempo, mas não é como se fossemos para o futuro e depois para o passado. É como se nós fossemos para o lado, considerando que o fluxo do tempo é uma linha reta.
Yuna falava com naturalidade sobre o assunto, mas não estava conseguindo esclarecer para Vosso Humilde Narrador como a mágica funcionava de fato. Claro que, é bem provável que meu raso conhecimento sobre artes místicas e artes das trevas estivesse dificultando bastante as coisas.
De todo modo, o que importava por ali é que tanto Yuna, quanto eu, estávamos sem nenhum arranhão, e que, aparentemente, o deus asteca havia batido em retirada com seu plano indo por água abaixo por conta da astúcia de nossa amada hanyou. E embora Yuna estivesse agindo de forma despreocupada como geralmente age em relação ao que havíamos acabado de vivenciar, eu sabia que, no fundo, ela estava se sentindo extremamente aliviada.
Não por ela mesma, mas por mim.
— Certo, Yuna, acho que devemos deixar isso para depois. Sabe, toda essa explicação e tudo mais. Como você mesma disse, as experiencias do plano desconexo retornam conosco, o que me leva a declarar que estou um pouco enjoado de ter ficado flutuando em um pedaço de parede.
— Hmm, é justo. Meu corpo também está cansado de ter usado o Modo Odin por algum tempo. Vou precisar dormir um pouco para me sentir recuperada. Fora o estresse, tsc.
Assim, nossa querida Assassina de Youkais e eu nos levantamos de nossos assentos e nos movemos para acertar as contas da cafeteria.
Tivemos de ouvir certos comentários sobre termos dormido na mesa por alguns minutos, mas Yuna encerrou as discussões somente estreitando os olhos para os funcionários do local.
Ela sabia como ter a postura de uma yanki e como deixar claro somente com o olhar que danificaria o estabelecimento por inteiro se continuassem falando.
Após pagarmos nosso café, um breve período de tempo depois, estávamos seguindo de volta para o apartamento provisório onde Yuna, Ieda e Ulim estavam vivendo, quando decidimos cortar o caminho cruzando um longo beco que nos colocaria praticamente à frente do edifício residencial. E aos caminharmos por quase metade da viela, Yuna esticou um braço à frente de meu peito, fazendo-me frear instantaneamente, assim como ela. E logo após, seus ombros baixaram, acompanhado de um respirar fundo.
— Phew. Não acredito, francamente. Você ainda está atrás de nós, Hórus?
Descendo pela fresta que nos permitia ver o céu diurno naquele beco, uma luz dourada, como se um túnel fosse formado ligando a Terra a um plano superior, aterrissou à nossa frente com um brilho amarelado que, apesar de gradativamente, logo se dissipou. E dessa luminosidade, como Yuna disse, o deus egípcio Hórus se apresentou diante de nós.
Suas asas douradas estavam fechadas às suas costas formando algo parecido com um escudo em formato de losango, mas seu corpo, também de ouro, reluzia no centro da viela como uma lâmpada acesa.
— Não tire o olho disso, Cavaleira de Cristal. Eu não vim aqui com intenções maléficas contra você ou contra o humano ao seu lado. Diferente de metade dos deuses, eu acredito que você não seja ou tenha vontade de ser uma ameaça para minha espécie. Mas, como preciso responder às ordens da Cúpula considerando a posição em que estou, não pude me negar a ajudar Tezcatlipoca em sua artimanha.
— E você veio aqui com um pedido de desculpas bem fofo, imagino. Mas, como já disse, realmente eu não tenho nada contra vocês. Só que não vou apanhar calada de qualquer divindade que vier me aborrecer. Eu já apanhei calada uma vez, e até foi bem legal, mas era outra forma de violência que acredito não ser o caso por aqui.
— Se você agir em legítima defesa contra os deuses que lhe atacarem, como vem fazendo, eu não considerarei que você é perigosa como Alighieri é. Mas, meu líder, Rá, não pensa como eu, e mandará mais divindades para lhe derrotar, assim como Tezcatlipoca. Eu não posso impedi-los disso, mas posso alertá-la para que tome bastante cuidado e consiga se livrar desse título o quanto antes.
— Hmm. Certo, não precisa se preocupar comigo, acho que já tenho alguma ideia de alguém capaz de me livrar de tudo isso, seu pamonha. De qualquer forma, agradeço que tenha vindo se esclarecer. Eu respeito isso.
E com um aceno de cabeça para nossa querida Assassina de Youkais, o deus egípcio virou as costas para nós e alçou voo com o mesmo rastro de luz dourada em que desceu até nosso caminho.
Ali, naquele dia e local, Yuna Nate compreendeu de uma vez por todas o peso do fardo que ela carregava. E que não era somente a sua vida que estava correndo grave perigo.
A caça por sua cabeça havia apenas acabado de começar.
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