5. Trabalho de história
Haviam se passado alguns dias, duas semanas para ser mais exato. Nesse meio tempo, Iris e o restante do seu grupinho realmente parecia ter resolvido deixar Noah e eu em paz. O que já não era tão estranho, dado que a mesma havia conseguido o que tanto queria: me ver finalmente bem longe de Finn.
Sadie, Noah e eu agora ficávamos no jardim da escola durante os intervalos, encostados em uma árvore, junto a alguns dos outros alunos que ficavam espalhados por ali conversando, dado que o castigo da ruiva de ter que limpar a biblioteca havia acabado.
Os dois ainda não haviam conversado. Estava claro que queriam falar sobre o que houve, mas nenhum de ambos tinham coragem, pelo modo como ficavam vermelhos sempre que estávamos conversando e eles acabavam tendo contato visual. Era até um pouco cómico de se observar. O que era uma pena, porque se via de longe que ambos se gostavam muito.
Finn, por incrível que pareça, não tentou mais nenhuma aproximação. Devo confessar que foi difícil as poucas vezes em que acabávamos trombando nos corredores, na própria sala de aula ou até mesmo quando eu tive que apresentar um trabalho na frente da sala e nossos olhares acabaram se encontrando. A verdade era que estava um verdadeiro inferno ter que vê-lo todos os dias. A única vez em que o cacheado tentou alguma coisa foi no dia em que eu voltei à escola após ter faltado dois dias. No final da aula, ele se aproximou como se fosse a coisa mais normal do mundo:
— Bom, vamos? — perguntou tão cinicamente que me surpreendeu, enquanto me olhava sugestivo. Como pode a voz de alguém lhe tirar do sério e, ao mesmo tempo, fazer seu coração falhar uma batida?
O olhei seriamente, questionando com o olhar se aquilo era realmente sério. Finn parecia que havia arranjado o primeiro motivo que viera à sua mente para vir falar comigo.
— Aonde? — questionei com sarcasmo, apesar de saber claramente à que ele estava se referindo.
— À biblioteca. — respondeu, sem se deixar abalar pela minha expressão. Parecia que ele não se importava nem um pouco se eu fosse gritar cosigo ou qualquer coisa do gênero, como se apenas desejasse se aproximar. Ou simplesmente me tirar do sério. Abafei um riso sem emoção por sua resposta atrevida enquanto o moreno continou, com um sorrisinho sem graça em seu rosto salpicado de sardas que eu sempre achei que o deixava ainda mais bonito: — Você disse que me ajudaria, lembra? Para que eu conseguisse a bolsa e tudo o mais...
— Fui clara com você ontem quanto à isso, Finn. Estude sozinho. Se me lembro bem, você é "alfabetizado e sabe muito bem ler e escrever", não é? — retruquei num tom duro, jogando as próprias palavras dele de meses atrás contra o mesmo.
Fiz menção de me virar, contudo o Wolfhard agarrou meu braço a tempo, sem usar força. E me olhou com uma mistura de tristeza e compreensão ao murmurar:
— Não faz isso, Millie.
E lá estava ele. O olhar intenso que conseguia tanto me prender quanto me confundir. Os olhos do cacheado pareciam tentar me dizer uma coisa que eu não conseguia compreender. Como se ele estivesse com medo de algo, que o fizesse se conter.
Sua expressão suplicante me desarmou, mas logo me desvencilhei dele.
— Eu não fiz nada, foi você que fez. — acusei, antes de sair porta à fora.
A partir de então pareciam que as aulas estavam incrivelmente mais monótonas. Chatas. Eu não conseguia me concentrar e, por vezes incontáveis, os professores chamavam minha atenção. Cheguei até mesmo a levar uma reclamação para casa. Dona Winona me bombardeou de gritos e questionou meu comportamento, afirmando que era por causa de Finn.
E, pra completar, meus pais afirmavam que eu não estava comendo. Tudo bem que eu estava sentindo menos fome do que normalmente, mas isso era um completo exagero.
Por causa de tudo isso, estava ficando meio frustrada nos últimos dias. Parecia que estudava mais em casa do que na escola, antes eu apenas revisava a matéria, mas parecia que agora eu vivia pedindo fotos do caderno de Noah para concluir as atividades que estavam pela metade em meu caderno.
Algo cutucou meu cotovelo e eu levantei a cabeça de cima de meus braços sobre a carteira. Acabei dormido no meio da aula vaga e Romeo havia me cutucado com o lápis. Seu olhar se tornou preocupado ao notar meus olhos vermelhos.
— Tá tudo bem, Millie? — perguntou ele em um murmúrio.
Resmunguei um sim ao esfregar meus olhos com as costas das mãos antes de pegar meus óculos ao lado do meu estojo para recolocá-los, no entanto Noah me cortou enquanto fazia alguns cálculos em seu caderno que foram passados como lição de casa na aula anterior:
— Ela não anda dormindo muito. — respondeu de forma simplista, sem desviar os olhos do que estava fazendo.
Revirei os olhos e voltei a deitar a cabeça no meio dos braços sobre a carteira, procurando aliviar um pouco a dor de cabeça que estava sentindo. É claro que as conversas paralelas dos meus colegas de sala não ajudavam em nada.
— Como assim, por quê? — ouvi o outro questionar.
— Ela fica jogando de madrugada. — ouvi Noah explicar inocentemente.
— Na verdade — abri os olhos para fitar meu melhor amigo envergonhada. —, meio que faz bastante tempo que eu não jogo...
— O quê? — ele piscou os olhos, confuso. Eu dei de ombros, baixando meu olhar para o chão. — Millie, você me disse que não está dormindo porque passa a noite toda jogando. — afirmou, com um misto de amargura e preocupação na voz.
— É, eu sei. Me desculpa. — pedi.
— Por que não está dormindo? — quis saber, largando o lápis e virando seu corpo em minha direção.
Eu dei de ombros enquanto Romeo respondia por mim:
— Acho que a resposta tem nome e sobrenome...
— Eu fiquei até tarde estudando. É só isso. — falei rapidamente, tentando soar o mais natural que consegui, enquanto escondia meu rosto de novo.
Logo, o sinal tocou, indicando a troca de aula. O professor de história mal havia entrado em sala e já escrevera na lousa bem grande: SEMINÁRIO. Vários alunos fizeram exclamações de protesto, do qual eu quase participei, mas dependendo do tema eu poderia achar interessante e quem sabe me dar ânimo para alguma coisa.
O seminário seria em dupla, o que significava um problema, visto que agora tinha Sadie.
— Millie! — Noah me olhou, sem precisar dizer mais nada.
— Okay. — fiz sinal de que havia entendido.
No intervalo, nos separamos de Romeo que costumava ficar do outro lado da cantina junto com outros dois colegas de nossa sala e sentamos no jardim com Sadie.
— Millie, podemos fazer o trabalho depois da aula na minha casa. — Noah falou, enquanto retirava seu celular do bolso para jogar.
— Claro. Precisa de ajuda com o seu, Sadie? — me virei para a ruiva, oferecendo ajuda já que o tema era um pouco complexo.
— Nem pensar, tenho pânico só de pensar em ir na frente da sala apresentar. — a mesma negou, me arrancando um pequeno riso.
Noah também riu, focando os olhos na ruiva.
— Você nunca muda. — comentou de forma descontraída.
Eles se olharam por um tempo antes de desviarem os olhos e eu fiquei ali, os observando em silêncio, como se somente eu tivesse reparado no clima entre ambos.
Depois da aula mandei uma mensagem para Dona Winona apenas para prevenir visto que, de qualquer forma, ela estava no trabalho, avisando que estava indo para casa de Noah fazer um trabalho.
No caminho, ele aproveitou que estávamos sozinhos para questionar sobre hoje mais cedo, interrompendo totalmente nossa conversa sobre um dos filmes da Marvel:
— Então, o Romeo estava certo hoje cedo? — perguntou, segurando as alças da mochila em suas costas com as mãos enquanto acompanhava o meu passo.
— Como assim? — questionei, querendo que o mesmo fosse mais específico. Viramos em uma rua bem menos movimentada com casas de classe média praticamente idênticas, o que me fez supor que já estaríamos chegando.
— Que você não está conseguindo dormir por causa do Finn. — explicou Noah.
— ...Não precisa se preocupar, Noh. — assegurei após um instante de silêncio, sem saber o que lhe responder.
— Entendo que não queira falar sobre isso. Além do mais, só faz duas semanas. Apenas não deixe de fazer o que gosta por isso. — aconselhou. Balancei a cabeça assentindo, agradecida pelo mesmo não insistir no assunto. O acompanhei ao ver Noah cruzar o jardim da frente de uma das casas de cor branca. Subimos os degraus até a entrada e o mesmo retirou suas chaves do bolso da calça para poder destrancar a porta.
— Mãe, cheguei. — Noh anunciou ao entrarmos.
— Oi querido — a mesma respondeu do outro lado da sala, com uma assadeira que acabara de retirar do forno. O cheiro ótimo vindo de lá denunciava o frango assado que havia preparado para o almoço. Ao depositá-la sobre a bancada que separava a sala da cozinha e retirar as luvas térmicas, sorriu surpresa ao nos aproximarmos.
Era a segunda vez que eu a via, visto que conhecera os pais de Noah ao acompanhá-lo até o Hospital para ver sua avó que tinha sido diagnosticada com câncer.
— Mãe, lembra da Millie?
— Claro que eu lembro. Olá, Millie. Fique à vontade. Quer almoçar com a gente? — Karine ofereceu, me lançando um sorriso gentil idêntico ao do filho.
— Não, obrigada. Eu vim fazer um trabalho com o Noah. — expliquei, recusando educadamente.
— Está certo, não vou atrapalhar vocês. Mas não preferem comer alguma coisa antes?
Antes que eu pudesse respondê-la, Noh tomou a dianteira dessa vez:
— A Millie prefere sim, mãe. — afirmou.
— Noah. — adverti envergonhada, fazendo-o rir. — Realmente estou sem fome, obrigada. Comemos na escola.
— Tem aquele bolo de prestígio ainda, pegue um pedaço pra ela. Eu não quero nada. — insistiu meu melhor amigo.
— Fazer trabalho escolar de estômago vazio não dá, certo? — Karine disse gentilmente, ao se afastar para retirar o bolo da geladeira e cortar um pedaço. — Aqui, querida.
Tudo o que pude fazer fora aceitar, visto que a intenção de meu melhor amigo era me ver comendo alguma coisa.
Apertei seu braço de brincadeira após subirmos até seu quarto com o mesmo rindo.
— Você não anda comendo como antes, pensa que não percebi? — disse o mesmo, ao cessar os risos e se jogar sobre sua cama.
— Até tu, Brutus? — revirei os olhos, rindo de forma descontraída.
Noah me acompanhou enquanto eu me sentei e dei uma garfada no bolo, que, inclusive, estava incrível.
— Mas é sério, Millie, você precisa comer. — afirmou o mesmo, se sentando ao meu lado.
— Certo... — assenti em um suspiro.
Noah me esperou terminar de comer e pegou duas cartolinas que estavam guardadas. Meu melhor amigo pesquisou nosso tema e anotou os tópicos importantes para que eu pudesse passá-los para as cartolinas. O mesmo se ofereceu para me ajudar, mas eu preferi fazer isso sozinha do que ter que ficar lendo os textos e separar o que iríamos apresentar. Contudo, o mesmo insistiu que faria os desenhos que deixariam a cartolina com um ar mais visual para que eu não fizesse tudo sozinha. E, de fato, Noh desenhava muito melhor do que eu. Enquanto o mesmo se dedicava a terminar nosso trabalho, eu zanzava por seu quarto. No quarto do garoto haviam coisas dos Heróis da Marvel assim como no meu, no entanto o que mais se destacava eram coisas do Harry Potter.
— Você tem os Funko Pop deles! — exclamei, ao encontrá-los sobre a prateleira. Eram simplesmente as coisas mais fofas do mundo.
Noah sorriu concentrado enquanto eu continuava olhando. Os livros da série tão amada estavam do outro lado junto a outros livros de ficção. Peguei um deles aleatoriamente, observando que era cheio de adesivos post-its de cores variadas.
— Por que tantos? — murmurei mais para mim mesma do que para Noah.
O garoto concentrou seus olhos em mim e sorriu antes de voltar a prestar atenção no que estava fazendo:
— Eu gosto de marcar as partes mais marcantes do livro. Os post-its azuis são as cenas tristes, os amarelos as engraçadas, e os roxos as frases de efeito.
Sorri surpresa, pensando em quantas vezes Noh deve ter relido os sete livros. Abri em uma página aleatória marcada com o post-it amarelo, soltando um risinho ao ler:
(...) — Então, Rony, já limpou o seu quarto?
— Por quê?! — exclamou Rony, batendo a colher no prato e olhando feio para a mãe. — Por que o meu quarto tem que ser limpo? Harry e eu estamos muito bem no quarto do jeito que está.
— Vamos festejar o casamento do seu irmão dentro de alguns dias, jovem...
— E eles vão casar no meu quarto? — indagou Rony furioso. (...)
Contendo outro riso fechei o sétimo livro, devolvendo-o à prateleira antes de Noah chamar minha atenção enquanto guardava sua caneta de volta ao estojo:
— Acabei.
— Já? — o fitei.
O mesmo assentiu sorrindo.
— Não demoramos muito, só levamos... — ele checou o horário em seu notebook antes de me fitar com um sorriso debochado. — Quatro horas.
Eu ri enquanto me aproximava. Mal vira o tempo passar pela primeira vez em dias. Não tenho saído com Noah ou Sadie desde que Finn e eu rompemos já que eu precisava ficar em casa copiando a matéria e resolvendo os exercícios que deveria ter feito na escola.
— Que tal uma partida de videogame antes de ir? — perguntou Noh, ao enrolar ambas as cartolinas.
— Faz tanto tempo que eu não jogo... — comentei num suspiro ao ceder ao seu pedido, assentindo com a cabeça.
— Então — o mesmo andou até a TV, pegando de lá um dos controles e metade da pilha de videogames e me entregou. — Você que vai escolher.
Conseguimos jogar até às cinco da tarde. Já que eu deveria voltar antes de escurecer, resolvi parar quando Noah havia conseguido sua revanche, visto que eu não conseguiria ir embora se jogassemos de novo e eu perdesse outra vez.
Noah me acompanhou até o primeiro andar. Me despedi de sua mãe, afirmando que havia sido um prazer revê-la.
— Você fica com as cartolinas? — perguntei para meu melhor amigo após o mesmo abrir a porta.
— Fico. Lembra do caminho de volta? Quer que eu a acompanhe?
Neguei gentilmente, saindo após dizermos um "até amanhã" para o outro.
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