001 — Demorei, mas vooooltei. 

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 Avery Grace

Bem-vindo a Legião

PERCY FRANZIU A TESTA ENQUANTO ENCARAVA o irmão de Hazel, o clima parecia estranhamente tenso, apenas reforçando a sensação de que algo estava errado.

— Eu... eu conheço você.

Nico ergueu as sobrancelhas.

— Conhece? — respondeu ele, e olhou para Hazel em busca de uma explicação.

Decidi responder por Hazel, que estava perdida.

— Percy perdeu a memória.

Então ela contou tudo o que tinha acontecido desde que Percy chegou.

— Então, Nico... — continuou ela, com cuidado — pensei... você sabe, você viaja por toda parte. Talvez tenha conhecido semideuses como Percy antes, ou...

A expressão de Nico ficou tão sombria quanto o Tártaro.

— Essa história sobre o exército de Gaia — disse Nico. — Você avisou Reyna?

Percy assentiu.

— Mas quem é Gaia, afinal?

Por um momento, achei que Hazel iria vomitar.

— É a deusa da terra. — Nico olhou para o chão como se pudesse ouvi-lo. — A deusa mais antiga de todas. Ela está em um sono profundo na maior parte do tempo, mas odeia os deuses e seus filhos.

A expressão no rosto de Percy me divertiu profundamente.

— A Mãe Terra... é má? — indagou Percy.

— Muito — eu expliquei, sorrindo para ele — Ela convenceu o filho, o titã Saturno a matar o pai, Urano, e dominar o mundo. Os titãs governaram por muito tempo. Até que os filhos deles, os deuses olimpianos, os derrotaram.

— Essa história me parece familiar. — Percy parecia surpreso, como se uma antiga lembrança tivesse emergido parcialmente. — Mas acho que ainda não ouvi a parte sobre Gaia.

Nico deu de ombros.

— Ela ficou furiosa quando os deuses assumiram o controle. Então casou-se de novo, com Tártaro, o espírito do abismo, e deu à luz uma raça de gigantes. Eles tentaram destruir o Monte Olimpo, mas os deuses finalmente os venceram. Pelo menos, da primeira vez.

— Da primeira vez? — repetiu Percy.

Um arrepio me atravessou ao lembrar do último verão.

— No verão passado — murmurei, aquelas memórias ainda me assombram — Saturno tentou retornar. Houve uma segunda guerra dos titãs. Os romanos do Acampamento Júpiter atacaram seu quartel-general no Monte Otris, do outro lado da baía, e destruíram seu trono. Saturno desapareceu...

Percy pegou a minha mão, demonstrando algum apoio ao perceber como aquele assunto me afetava.

— Hum, enfim — prosseguiu Nico — Saturno provavelmente voltou para o abismo. Todos nós pensamos que a guerra tivesse terminado. Agora parece que a derrota dos titãs agitou Gaia. Ela está começando a acordar. Ouvi relatos sobre o renascimento de gigantes. Se eles tiverem a intenção de desafiar os deuses de novo, provavelmente vão começar destruindo os semideuses...

— Você contou isso a Reyna? — perguntou Percy.

Fiz uma careta ao lembrar do momento em que Nico contou aquilo, a maior parte do senado riu da cara dele, sem acreditar.

— É claro. — Nico retesou o maxilar. — Mas os romanos não confiam em mim, Avery foi a única que acreditou em mim. Os filhos de Plutão... Bem, sem ofensa, mas somos considerados ainda piores que os filhos de Netuno. Damos azar.

— Eles deixaram Hazel ficar aqui — observou Percy.

— Isso é diferente — disse Nico.

— Por quê?

— Percy — interrompeu Hazel —, olhe, os gigantes não são o maior dos problemas. Nem... nem mesmo Gaia. Aquilo que você percebeu nas górgonas, o fato de elas não morrerem, essa é nossa maior preocupação.

Percy franziu a testa, havia uma expressão estranho em seu rosto.

— Nico e eu — disse ela com cuidado — nós acreditamos que o que está acontecendo é que... a Morte não está...

Antes que ela pudesse terminar, ouviu-se um grito ao pé da colina.

Frank vinha correndo na nossa direção, usando a camiseta roxa do acampamento e calça e jaqueta jeans. Suas mãos estavam cobertas de graxa de ter limpado armas. Ele alcançou o altar.

— Oi, Nico...

— Frank.

Nico sorriu.

— Reyna me mandou vir buscar Percy — informou Frank. — Octavian aceitou você?

— Sim — disse Percy, fazendo uma careta. — Ele sacrificou meu panda.

— Ele... Ah! O augúrio? É, os ursinhos de pelúcia devem ter pesadelos com aquele cara. Mas você está dentro! Precisamos levá-lo para se arrumar antes da inspeção noturna.

Só naquele momento percebi que o sol estava baixando acima das colinas. Como o dia tinha passado tão rápido?

— Você tem razão — disse Hazel — É melhor nós...

— Frank — interrompeu-a Nico — por que você não desce com Percy e Avery? Hazel e eu iremos em seguida.

Percebi que ele queria um momento a sós com Hazel, então apertei a mão de Percy.

— Vamos lá, Frank.

Percy olhou para Nico mais uma vez, como se ainda tentasse resgatar uma lembrança.

— Eu gostaria de conversar um pouco mais com você. Não consigo me livrar da sensação...

— Claro — concordou Nico. — Mais tarde. Vou passar a noite aqui.

— Vai? — Hazel deixou escapar.

Os campistas iam adorar essa notícia: o filho de Netuno e o filho de Plutão chegando no mesmo dia. Agora tudo o que faltava era alguns gatos pretos e espelhos quebrados, Reyna iria enlouquecer.

— Vá, Percy — disse Nico. — Acomode-se. Minha irmã e eu precisamos conversar.

FRANK HAVIA LEVADO PERCY PARA se acomodar e eu fui para o meu quarto, tomei um banho e me arrumei, enquanto tentava ignorar a sensação estranha que tinha dentro do meu peito desde que o garoto novo tinha chegado.

Saí do prédio da Quinta Coorte e caminhei calmamente na direção da inspeção, Reyna tinha uma expressão azeda em seu rosto. Ela estava montando em seu pégaso, Cipião — ou Skippy, como era chamado. Os cães de metal Aurum e Argentum caminhavam ao lado dela, a capa roxa de oficial ondulava atrás dela.

— Você parece prestes a matar alguém — murmurei, parando ao seu lado — espero não estar na mira do seu ódio, seria péssimo para a minha noite.

Sua expressão se suavizou ao me encarar e eu aproveitei para acariciar Skippy.

— Não gosto daquele garoto novo — admitiu baixinho — Nós já estamos em um péssimo momento, não precisamos de um maldito filho de Netuno para piorar tudo ainda mais.

Meu olhar acabou focando em Percy, que vinha caminhando junto de Frank, os dois estavam conversando amigavelmente, como se já fossem amigos próximos. Os cabelos de Percy estavam molhados por causa do banho e ele tinha vestido roupas limpas, mas ainda parecia tenso, ele era bonito, eu tinha de admitir.

— E se ele não tiver chegado para piorar tudo? Você ouviu o que Juno falou, talvez ele seja a solução milagrosa para todos os nossos problemas. Talvez Percy seja o semideus mais poderoso que já pisou nesse acampamento.

Reyna bufou.

— Avy, não perca o seu tempo, tenho certeza que assim que ele recuperar a memória, vai perceber que já tinha alguém em sua vida. Não quero que você se machuque e tenha esperanças por algo que não vai acontecer — ela sussurrou, séria — Sei que está lembrando daquilo que Vênus nos disse, mas ela não estava falando dele.

Senti meu rosto esquentar por ter sido pega, eu realmente estava pensando naquilo que Vênus havia nos dito, há meses atrás. A deusa do amor tinha me prometido um romance de tirar o fôlego, alguém que nunca mais teria olhos para outras pessoas, que me faria feliz para sempre, um jovem e poderoso herói, que eu o encontraria depois de perder algo importante.

Eu tinha perdido meu irmão.

As cornetas começaram a soar e toda a legião começou a se reunir, Reyna me cutucou, chamando a minha atenção.

— Ele não vale a pena, Avy.

— Estou esperando o momento que você vai me contar sua história com ele, na verdade.

Ela não me respondeu, as cornetas soaram novamente avisando que as Coortes começariam a chamada. Fui para o meu lugar e ajustei minha armadura, senti um olhar em mim e levantei os olhos, percebendo que Percy estava me encarando, acabei dando um pequeno sorriso para ele.

As primeiras quatro coortes, cada uma com quarenta membros, formavam filas diante de seus alojamentos nos dois lados da Via Praetoria. A Quinta Coorte reunia-se no fim, diante da principia, pois seu alojamento ficava escondido no canto nos fundos do acampamento, perto dos estábulos e das latrinas.

Dakota chamou meu nome, que era um dos primeiros e eu prontamente respondi, olhei ao redor e não vi nenhum sinal de Hazel. A chamada continuou e quando estava chegando no final, vi ela correndo na nossa direção, ela passou por Reyna e quase tropeçou, fiz uma careta com a cena, sabendo que aquilo só estava piorando a fama da nossa Coorte.

— Hazel Levesque — chamou Reyna, em um tom azedo — fico muito feliz que você tenha se juntado a nós.

Hazel deu sorte por ser a última da lista, Dakota estava justamente chamando o nome dela, então tecnicamente ela não estava atrasada ainda.

— Presente! — gritou ela.

Os Lares foram os últimos a entrar na formação. Suas figuras roxas tremeluziam enquanto eles disputavam seus lugares. Tinham o hábito irritante de ficar parcialmente dentro de pessoas vivas, de modo que as fileiras pareciam uma fotografia desfocada, mas enfim os centuriões conseguiram organizá-los.

— Estandartes! — gritou Octavian.

Os porta-estandartes deram um passo à frente. Usavam capas de pele de leão e seguravam bastões decorados com os emblemas das respectivas coortes. O último a apresentar seu estandarte foi Jacob, o condutor da águia da legião. Ele segurava um longo bastão com absolutamente nada no topo. A função de porta estandarte supostamente era uma grande honra, mas era evidente que Jacob a detestava. Embora Reyna insistisse em seguir a tradição, sempre que o bastão sem águia era erguido eu podia sentir o constrangimento se espalhando pela legião.

Reyna fez seu pégaso parar.

— Romanos! — anunciou ela. — Vocês provavelmente ouviram falar da incursão de hoje. Duas górgonas foram arrastadas para o rio por este recém-chegado, Percy Jackson. A própria Juno o guiou até aqui e o proclamou filho de Netuno.

Os garotos nas últimas fileiras esticaram o pescoço para ver Percy. Ele levantou a mão e disse:

— Oi.

— Ele deseja se juntar à legião — prosseguiu Reyna. — O que dizem os augúrios?

— Eu li as entranhas! — anunciou Octavian, como se tivesse matado um leão com as próprias mãos e não rasgado um travesseiro em formato de panda. — Os augúrios são favoráveis. Ele está qualificado a servir!

— Ave! — gritaram os campistas.

Salve!

Reyna fez sinal para que os oficiais seniores avançassem — um de cada coorte. Octavian, como o centurião de patente mais alta, voltou-se para Percy.

— Recruta — disse — você tem credenciais? Cartas de referência?

Percy remexeu-se.

— Cartas? Hum, não.

Octavian franziu o nariz e eu revirei os olhos, Percy ter chegado acompanhado da própria rainha do Olimpo não era o suficiente para ele? A família de Octavian vinha mandando garotos para o acampamento por mais de um século. Ele adorava lembrar aos recrutas que todos eram menos importantes que ele.

— Nenhuma carta — disse Octavian, pesaroso. — Algum legionário irá apadrinhá-lo?

— Eu! — Frank deu um passo à frente. — Ele salvou minha vida!

Imediatamente ouviram-se gritos de protesto vindos das outras coortes. Reyna ergueu a mão pedindo silêncio e encarou Frank.

— Frank Zhang — ela disse — pela segunda vez hoje vou lembrá-lo de que você está em probatio. Seu pai ou mãe divino ainda nem sequer o reclamou. Você não é elegível para apadrinhar outro campista até que conquiste sua primeira divisa.

Suspirei baixinho e levantei a mão, chamando a atenção das pessoas. Reyna iria me matar.

— Eu apadrinharei Percy Jackson.

Reyna franziu o nariz, mas voltou-se para Octavian. Ele tinha uma expressão irritada no rosto, que rapidamente conseguiu disfarçar e deu de ombros.

— Muito bem — anunciou Reyna. — Avery Grace, você pode apadrinhar o recruta. Sua coorte o aceita?

Frank bateu o escudo no chão. Os outros membros da Quinta o imitaram, embora não parecessem muito animados. Seus centuriões, Dakota e Gwen, trocaram olhares sofridos, como se dissessem: Lá vamos nós de novo.

— Minha coorte se pronunciou — disse Dakota. — Nós aceitamos o recruta.

Reyna olhou para Percy com pena.

— Parabéns, Percy Jackson. Você se encontra agora em probatio. Vai receber uma placa com seu nome e coorte. Daqui a um ano, ou assim que realizar um ato de coragem, você se tornará membro efetivo da Décima Segunda Legião Fulminata. Sirva a Roma, obedeça às regras da legião e defenda o acampamento com honra. Senatus Populusque Romanus!

Toda a legião ecoou a aclamação.

Reyna se afastou de Percy com seu pégaso, como se estivesse feliz por encerrar seu assunto com ele.

— Centuriões — disse Reyna —, vocês e suas tropas têm uma hora para jantar. Depois nos encontraremos no Campo de Marte. A Primeira e a Segunda Coortes defenderão. A Terceira, a Quarta e a Quinta atacarão. Sejam afortunados.

Um grande viva soou — pelos jogos de guerra e pelo jantar. As coortes saíram de formação e correram para o refeitório.

Acenei para Percy e caminhei na direção dele, abrindo caminho no meio da multidão para o alcançar. Um dos guardas entregara a Percy sua placa de identificação de probatio, ele a prendeu em seu colar de couro com as contas estranhas.

— Obrigado, Avery — ele disse, dando um pequeno sorriso — Hum, o que exatamente isso significa... você me apadrinhar?

— Eu garanto seu bom comportamento — expliquei, dando de ombros— Ensino as regras a você, respondo suas perguntas, cuido para que você não desonre a legião.

— E... se eu fizer algo errado?

— Então eu sou executada com você. Está com fome? Vamos comer.