Dois assassinos e uma criança fanática por sapos
—VOCÊ NÃO PRECISA SE ENVOLVER, COPIADOR.
Minato falou – não pela primeira vez – enquanto observava a frente do motel de aparência duvidosa. Como tudo no bairro da luz vermelha.
A voz estática do outro lado do comunicador respondeu, quase conseguia ver o rolar de olhos.
— Já me falou isso, Yondaime. Tenha cuidado, pode ser uma armadilha.
— Já me falou isso, Copiador. Sei me cuidar.
— Tenho certeza.
Caminhou de forma calma pela calçada, até chegar ao o fim da rua. A parte de trás dava para um bosque. Sabia por experiência que tinha uma cerca de metal que podia pular para o acesso dos casebres sem passar pela frente.
—E Bambi?
—Sentado onde deixou. Tem certeza de que não é seu filho? – A voz do outro era curiosa no comunicador.
—Tenho.
—Ele está sentado, enrolando o cabelo nos dedos com a língua para fora.
Bom, esse era um dos seus hábitos, sem dúvida.
—Muita gente faz isso.
—Estou falando de pessoas normais.
—Saudade de quando me respeitava. Agora calado. Falou com Obito?
—Mandou eu ficar calado.
Foi sua vez de revirar os olhos.
—Falei, ele vai retornar.
Apesar de ter o instinto de pegar o Bambi e proteger do mundo, Minato não havia sobrevivido tanto tempo por nada. E pegar aquele caso sem provas do que realmente estava acontecendo era uma forma de cair em uma armadilha rapidinho.
O menino não pareceu se ofender, bem ao contrário, ainda parecia tão grato que era doloroso de ver.
Era tão fácil invadir aquele lugar que parecia uma piada. Sabia também que as pessoas fechavam os olhos e ouvidos para o que acontecia ali. O garoto, Sai, sabia mesmo o que estava fazendo.
Quando chegou ao casebre, Minato percebeu de imediato que havia algo de errado. A porta estava entreaberta.
— Copiador, estou entrando. – Disse, checando sua arma em mãos e todas as outras escondidas.
—Tenho visão. – Veio a resposta pelo comunicador em seu ouvido.
Olhou para cima e viu o drone a uma certa distância. Nunca poderia dizer que Kakashi não sabia o que fazia.
Minato entrou. As luzes estavam acesas e a primeira coisa que viu foi o corpo no chão. Focou ao redor, a arma em punho, até ter a certeza de que não havia mais ninguém no quarto, incluindo no banheiro. O quarto estava todo revirado, gavetas fora da cômoda, roupas de cama espalhadas. Não havia malas, mochilas, ou qualquer item pessoal. Provavelmente tudo havia sido levado.
Tudo o que restara era o corpo e um cartão jogado de forma displicente em cima dele.
Minato se agachou perto do corpo, procurando um pulso, mesmo sabendo que as chances de encontrar eram bem pequenas. Havia sangue por todo lugar. Provavelmente de mais de uma pessoa. Pelas manchas no chão, havia mais corpos, mas estes haviam sido removidos antes que chegasse.
O garoto estava com um grande ferimento atravessado em sua barriga, provavelmente feito por uma katana. O sangue estava coagulado e o corpo já frio. Devia estar morto há pelo menos duas horas.
Suspirou, observando o rosto pálido. Era apenas um adolescente, 17 anos no máximo. E pela descrição de Kurama, aquele ali devia ter sido "Sai-nii".
—Yondaime, reporte.
—Livre. O garoto está morto.
Silêncio do outro lado. Podia imaginar que Kakashi estivesse olhando para Kurama. Não seria nada fácil olhar naqueles olhos azuis e dizer o que havia acontecido. Sabia que eles não haviam removido o corpo por uma razão.
Era um recado.
Pegou o cartão que foi jogado. Era simples, em branco a não ser por dois símbolos no meio formando uma palavra: Yako.
O guardou e se preparou para sair. Teria que fazer uma ligação para Shizune avisando sobre o corpo. Sabia que ela ao menos faria o possível para dar um fim digno a ele. Era o mínimo que podia fazer por alguém que havia morrido para salvar uma criança.
Só quando estava quase na porta percebeu algo. A posição do corpo não parecia ter sido mudada. Viu as manchas de sangue no chão e parecia como se ele mesmo houvesse se arrastado. E então havia a mão esquerda dele, que parecia apontar para algo no chão. Seguiu a direção indicada e viu que o carpete estava levemente erguido. Algo difícil de notar em todo o caos. Minato agachou-se novamente e com as luvas ergueu o que parecia ter sido um corte com uma faca no carpete.
Havia algo lá dentro. Puxou o objeto e viu que parecia um pingente em formato de cristal. Provavelmente de Kurama. Por que esse esforço inteiro para guardar algo assim?
"Sai-nii...Ele é uma pessoa boa."
Aquele garoto tinha arriscado tudo pela criança. Mesmo sabendo que o mais possível destino fosse aquele.
Suspirou, guardando o pingente no bolso.
Deu uma última olhada no rosto sem vida do garoto, antes de virar as costas e sair.
..........
Como todo caçador que se prese naquela cidade, Minato tinha vários galpões diferentes. Mudava sempre que fossem comprometidos. A única pessoa que sabia a maioria deles era Kakashi. Podia dizer que Kakashi era a pessoa em que mais confiava, e sabia que era mútuo.
Foi Minato quem criou Kakashi desde os dez anos de idade, quando o pai dele havia morrido. Canino Branco era um caçador conhecido que havia feito seu nome muito rapidamente. Quando Kakashi nasceu, ele decidiu largar essa vida. Com alguns anos ele conseguiu finalmente sair e se mudou para as montanhas, tornou-se um professor. Na época, Minato ainda estava apenas começando e antes de se aposentar, foi Sakumo que havia o colocado de pé.
Quando do soube do suicídio, Minato foi buscar Kakashi no mesmo dia. Ele sabia que Sakumo havia feito muitos inimigos, que sem a proteção do pai, a criança não duraria uma semana.
Seu único arrependimento era que não conseguira dar outra vida a Kakashi. Ele crescera em meio a o ambiente de um caçador de recompensas. Antes da maioridade estava fazendo trabalhos. E desde então nunca havia parado. Ele mal havia alcançado a maior idade e já era tinha um nome feito no submundo de Konoha.
Quando chegou ao galpão onde sabia que Kakashi havia trazido Kurama, inseriu o código, desarmou as armadilhas, e se deparou com seu pupilo fazendo uma flexão com uma mão apenas no chão, um garotinho sorridente sentado em posição de lótus em suas costas.
—Eu...quer saber? Não quero saber o que estão fazendo. – Admitiu.
Kurama deu uma risada, que só aumentou quando o outro se ergueu abruptamente da posição, o erguendo junto em um movimento fluído. O capuz do casaco estava levantado cobrindo os cabelos loiros. Notou pela primeira vez que o casaco tinha orelhas de raposa. Teria sorrido se não fosse toda a situação.
—Tadaima.
—Okaeri
Kurama praticamente saltou dos braços de Kakashi e o fitou com os olhos grandes e azuis bem abertos em expectativa. Um sorriso grande, que logo diminuiu ao ver que estava sozinho.
Minato olhou feio para Kakashi, se dando conta que havia deixado as notícias para ele.
—Sai-nii?
Sentou-se no sofá, batendo do seu lado com a mão. O garotinho obedeceu, sentando-se do seu lado com corpo tenso, os olhos confusos.
— Kurama-chan...Eles chegaram antes de nós. Eu sinto muito.
Houve entendimento imediato nos olhos azuis. Minato pensou no quanto era errado ter aquele tipo de dor no rosto de uma criança. O garotinho desviou os olhos, se encolhendo mais no casaco e fitando as mãos.
Minato colocou a mão no bolso e tirou o cartão e o pingente.
—Havia isso com ele. Sabe o que significa? Kurama-chan?
O garoto não respondeu de imediato. Sabia que devia dar tempo a ele, mas não tinham esse tempo.
Olhos azuis voltaram para sua mão e fitaram os objetos. Ele estendeu a mão pequena e agarrou o pingente. O viu brincar com o objeto entre as mãos, e então o colocar no pescoço, em uma corrente que estava ali, provavelmente para isso.
—Arigatô. – A voz era muito baixa, ele ainda não o fitava.
—Sabe o que significa isso? – Mostrou o cartão. O viu franzir o nariz e o fitar confuso, pedindo permissão para pegar o papel e o examinar.
Ao ver o que havia escrito ele empalideceu terrivelmente, derrubando o cartão no chão. Antes que Minato pudesse entender o que estava acontecendo a criança havia engatinhado em seu colo, o abraçando com força no sofá. Os ombros pequenos estavam tremendo quando Minato retribuiu o abraço em tentativa. Por cima da cabeça dele, viu os olhos de Kakashi, preocupados.
—Me ajuda. – O menino murmurou, a voz cortada em seu ombro, as mãos agarradas ao redor do seu pescoço com força. – Não deixa ele me pegar, não deixa, Yondaime.
Não sabia o que fazer, apenas continuou o abraçando como fazia com Kakashi quando era criança e tinha um pesadelo, acariciando suas costas. Os soluços dele eram baixos, de alguém que havia se acostumado a chorar em silêncio.
Algo que nenhuma criança deveria saber.
...........
—Obito retornou.
Kakashi falou em voz baixa. Os dois homens estavam calados a um bom tempo, apenas sentados na mesa olhando o cartão a frente deles, tentando entender as pistas cada vez mais intricadas do grande mistério que aquele dia estava se tornando.
Kurama estava dormindo no sofá, onde havia pegado no sono depois de chorar até dormir. Minato havia colocado uma coberta sobre ele, observando-o agarrado com a mochila, o rosto ainda sujo de lágrimas, a expressão serena pela primeira vez desde que havia o conhecido.
—O que ele encontrou?
Kakashi não respondeu de imediato. Foi até a cozinha e voltou com sanduíches prontos. Pelas coisas no balcão viu que haviam sido feitos para Kurama também. Só esperava que o garoto tivesse comido antes de chorar até dormir.
—Não há nenhum registro, em lugar nenhum, de Danzou ter um filho. Nem mesmo adotivo.
—Bem...é esperado isso. Sendo quem ele é, mesmo que tivesse um filho ele o esconderia.
—Foi o que Obito falou.
—Sinto que há um "mas" por ai.
—E não há sempre? – Kakashi se perguntou, pegando o computador no balcão, digitando algo. – Ele disse que déssemos uma olhada nisso.
Quando o homem virou a tela, se deparou com uma foto de uma garota. Era um anúncio padrão de desaparecidos. Focou no rosto bonito e jovem, os cabelos vermelhos soltos. A face sorridente.
E sentiu que a conhecia de algum lugar. Algo nos olhos dela...no cabelo. Havia algo...espremeu mais os olhos, tentando lembrar. Tinha certeza de que conhecia esses olhos. Era como se a imagem e o nome dela estivesse quase a seu alcance e sumisse.
—Minato? – Se deu conta que Kakashi havia chamado sua atenção mais de uma vez. Os olhos dele preocupados. – Você a conhece?
Franziu o cenho, tentando se concentrar. Apenas quando sua cabeça já começava a doer com o esforço negou.
—Acredito que não.
—Saiu na TV por um bom tempo anos atrás. Essa, é Kushina Uzumaki. Herdeira do clã Uzumaki e desaparecida há pouco mais de 9 anos.
—Eu não lembro desse caso. – Admitiu
—Não era para lembrar. Foi bem na época em que...estava incapacitado.
Kakashi ficou desconfortável, como sempre ficava ao lembrar da situação. Eles não falavam sobre aquilo. Depois de um trabalho em que mordera mais do que podia engolir, havia ficado à beira da morte. Minato havia desaparecido por um mês, dado por morto. Foi Kakashi quem o encontrou e o levou para Tsunade.
Tsunade fora a razão pela qual estava vivo agora, ela o costurara de volta no lugar. Não podiam se quer o levar a um hospital, por ser procurado. Quando acordara depois de quase um mês, não lembrava de nada da missão. Kakashi estava dormindo na cadeira ao lado da sua cama. Mais magro, retraído e com uma cicatriz nova no rosto, quase tendo perdido um dos olhos.
Desde então Minato ficara muito mais cuidadoso.
— Nunca encontraram um corpo, mas foi feito um funeral. — Kakashi continuou interrompendo suas lembranças. — E uma das teorias na época, era justamente sobre Danzou estar envolvido. Nunca conseguiram provar nada, porque a teoria em si tinha bases pouco sólidas. No mínimo.
—Teoria?
— Ocultismo. – Kakashi voltou a computador para si, voltando a digitar. – Obito enviou as páginas dos fóruns. Aqui. – Ele apontou para a tela.
—Possessão de espíritos? – Ergueu uma sobrancelha cético. – Entendo a falta de credibilidade.
—Bem, sim. E pouco tempo depois praticamente o clã principal inteiro foi destruído em um incêndio. A única sobrevivente da família principal de que se tem notícia é a senhora Mito.
—Mito-sama?
A esposa de Hashirama e um dos três anciões de Konoha. Hashirama, Madara e Mito eram descendentes diretos dos fundadores de Konoha. Mito-sama também era a mãe de Tsunade. A havia encontrado apenas uma vez e nunca se sentira tão intimidado na vida. Tsunade havia herdado a personalidade da mãe, sem dúvidas.
Havia várias histórias ao redor dos três, boatos que rondavam a união dos Senjus, Uzumakis e Uchihas como clãs neutros. Incluindo que os três estavam juntos desde a juventude. Conhecendo Obito Uchiha, que possuía claramente características e personalidade Uzumaki, Minato tinha dúvidas se isso era apenas um boato. No entanto, nunca tivera coragem de perguntar a Tsunade se era verdade ou não.
— Ela é a única descendente direta dos Uzumaki em Konoha. Kushina era algo como uma sobrinha-neta dela ou algo assim. – Kakashi completou — Mas, vamos focar no interessante. Kushina Uzumaki desaparecida há pouco mais de 9 anos. Olhe bem para o rosto dela. – Kakashi apontou para a foto da ruiva. – Os olhos...formato da boca, o rosto delicado. Esse narizinho arrebitado...
Minato franziu o cenho. E então arregalou os olhos.
—Puta merda.
Kakashi assentiu, satisfeito: — Exatamente o que pensei. Kurama disse que vai fazer 9 anos logo. Não acho que seja coincidência.
Kushina Uzumaki, exceto pelas cores, era como olhar para Kurama.
—Acho que encontramos a ka-chan.
Os dois homens ficaram calados por quase um minuto, olhando a foto, e então o menino dormindo no sofá. Era uma teoria. Ao menos por enquanto.
Sentiu seu estômago embrulhar em revolta. Se Danzou tivesse mesmo raptado essa mulher, duvidava que a concepção de Kurama – ou qualquer fosse o nome verdadeiro do menino, estava esperando que logo ele confiasse o suficiente neles para contar —havia sido consensual. Provavelmente o menininho era fruto de um estupro. Imaginava o que aqueles olhos haviam presenciado durante todos esses anos? O quanto esse garotinho havia sofrido?
—Tem mais. Os anciões querem conversar com você. E disseram que levássemos o garoto.
—Obito falou para eles? – Perguntou preocupado.
—Você sabe de onde ele tira as informações que nos passa, Minato. Eles são clãs neutros, não vão entregar a gente.
—Eu sei, mas não sei se essa é uma boa ideia.
—Eu também não, mas temos que trabalhar em algo, certo? E confio em Obito.
—Eu confio em Obito, Kakashi, mas andar com um garoto procurado pelo o chefe da máfia não é exatamente seguro. Todo mundo o viu entrar naquele bar e sair com a gente.
— Eu sei, mas temos que ter algo. Não dá para ir ao chefe da máfia e dar um tiro nele fácil.
—Eu sei disso. — Rebateu em frustração, sabendo que era verdade. Isso não era um caso como costumava pegar.
Kakashi o fitou com olhos acinzentados penetrantes, as sobrancelhas franzidas, procurando algo em sua expressão. Minato sabia que não conseguiria fugir do escrutínio e o som de entendimento que saiu da garganta de Kakashi o deixou bem autoconsciente.
—Está envolvido. Emocionalmente.
—Como... – Minato riu sem humor. – Como não se envolver, Kakashi? Esse menino foi abusado, de formas que nem temos ideia ainda. Não sabemos a razão, não sabemos de onde ele veio. O que Danzou quer com ele. Como não se envolver com uma criança chorando em seu colo até dormir, chamando pela pessoa que acabou morta para salvar ele?
— Eu sei. – Kakashi concordou de forma silenciosa. —Ele é um bom garoto.
Minato colocou a cabeça entre as mãos e suspirou longamente. Sua cabeça estava lhe matando.
—Nós vamos nos encontrar com Obito amanhã e levá-lo. Com todos os protocolos de segurança. Os Uchiha me devem, e se uma coisa eu sei de certeza, é que eles levam isso a sério. Vou cobrar o favor.
—Vou avisar a Obito.
Kakashi concordou, algo como alívio em seu rosto, que apenas Minato podia identificar depois de anos. Era tão claro que Kakashi achava que não poderiam resolver aquilo sozinhos.
E ele não estava errado.
Pegou o cartão na mesa, olhando os dois símbolos escritos: — Yako...
O garotinho parecera tão...apavorado ao ler aquilo. Podia ouvir a voz baixa de Kakashi conversando com Obito no telefone no outro cômodo. Pegou o computador e foi a chave de busca.
Yako
1 (n) Raposa selvagem
2 Espírito de raposa da região de Kyushu capaz de possessão
3 Nogitsune
Mais ocultismo e sobrenatural. Que maravilha.
Quando a busca mais a fundo não o levou a nada mais do que isso, fechou o computador exasperado.
Minato comeu o sanduíche, os olhos na figura deitada no sofá.
Aquele havia sido sem dúvidas um dos dias mais longos da sua vida.
E sabia que essa bagunça estava apenas começando.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro