᠉ Twenty.
Estava novamente em outro quarto. Outro lugar que eu já havia frequentado bastante. A decoração já era conhecida, bem como o perfume que se impregnara no ar. A porta se abriu e Jungkook entrou. No auge dos seus treze anos ele era tão engraçado; ainda parecia uma criança.
Sentou-se na cama, colocando o copo que segurava em cima da cômoda e tirando da gaveta uma agenda e caneta, onde começara a escrever algo. Aproximei-me para ler as palavras.
"Queria ser tão bom em dizer as coisas como você, mas esse não é o meu forte. Não é fácil para mim te ter tão perto e tão longe ao mesmo tempo. Será que você gosta de mim também? Seu sorriso é tão lindo e eu gostaria de poder te beijar. Eu te amo, m...."
Ao ouvir passos se aproximando, ele abandonou a escrita, escondendo rapidamente a agenda embaixo do travesseiro.
- Você não ia sair hoje? – perguntou a mim, que entrava pela porta. Um pouco mais novo, eu também parecia uma criança, apesar da idade.
- E eu saí. – respondi, sentando-me ao seu lado. – Olha o que eu ganhei. – disse empolgado, entregando-lhe uma carta.
- Quem te deu isso? – ele olhou com desdém.
- Sabe quem é a Amy? – sorri satisfeito, sem notar o semblante fechado de Jungkook. – Ela disse que...
Num piscar de olhos, minha calça estava ensopada de suco, bem como a carta. Ri admirado por não ter percebido o quão proposital tinha sido aquela atitude há anos atrás.
- Me perdoe, Jimin. – ele pediu, fingindo culpa.
- Você é mesmo um idiota! – reclamei, sacudindo o papel, tentando salvar as palavras ali escritas.
- Me dá isso, eu seco pra você. – Jungkook fez menção de pegar, mas eu recuei.
- Não! Você já fez demais. Eu vou embora.
- Mas Jimin... – ele se aproximou, segurando em minha mão. – É só uma carta besta. – disse, olhando fixamente em meus olhos.
Como eu pude ser tão cego quando era mais novo? Como pude não notar que era recíproco tudo o que eu sentia?
- Fala isso porque já recebeu várias. – rolei os olhos. – Essa é a minha primeira e olha o que você fez. Idiota! Tchau.
Completei a fala, logo saindo e deixando um Jungkook triste para trás. Uma lágrima escorreu por meu olho, mas não era uma lágrima de dor. Eram tantos sentimentos naquele momento. Saudade, alegria, euforia. Amor.
Tudo começou a sumir lentamente frente a meus olhos e eu estava de volta ao lugar vazio e neblinado de antes. Não aguentava mais reviver todas aquelas lembranças. Qual o sentido de tudo aquilo? Eu precisava voltar.
- Jimin... – Michael começou. – Vou te dar uma chance.
- Chance? Como assim?
- De ajudar o Jungkook.
- Vou poder voltar? – perguntei esperançoso.
- Não exatamente, mas poderá fazer com que ele te sinta... Que saiba que você ainda está com ele.
- Isso não vai funcionar. Ele com certeza não vai sentir nada, é melhor esquecer. – abaixei a cabeça.
- O tempo está passando, Jimin. Tem certeza de que não quer tentar? De que não quer pedir ajuda?
- Como eu posso pedir ajuda? Você mesmo disse que eu estou em coma. Pelo amor de Deus! – dei de ombros.
- Soube que você sonhou com a sua mãe, pouco antes de vir para cá.
- Sim, mas eu não sabia que era ela, não me lembrava da sua voz e... Quer que eu...
- Faça o seu melhor... Você não pode esperar para sempre.
Jungkook's POV
- É, o natal está chegando. – Yoongi comentou, colocando uma porção de pipoca na boca.
- Pois é... – disse desanimado.
- Acho que vou para Daegu, porque parece que os meninos vão todos viajar.
- Os meninos ou Hoseok? – olhei para ele, que não me encarou de volta. – Até quando vai tentar esconder isso?
- Não tem nada para esconder, só desisti de ficar desmentindo coisas que você insiste em afirmar. Jeon Jungkook, o dono da verdade.
- Então 'tá bom. – ri, após tomar um gole de refrigerante.
- Você anda meio cabisbaixo esses dias, o que aconteceu? – perguntou, ainda com a atenção na televisão. Yoongi não gostava muito de conversas olho no olho.
- Estou com saudades do Jimin. – afundei-me ainda mais no sofá. – Quase dois meses que ele se foi...
- Imagino como deve estar sendo para você. – colocou a mão em meu ombro como sinal de conforto. – Também sinto falta dele.
- Que clima pesado. – Hoseok comentou, ao abrir a porta.
- Desde quando ele entra aqui sem bater antes? – Taehyung perguntou, aparecendo logo em seguida.
- Desde que... – tentei falar, mas fui interrompido por Yoongi.
- Vocês se incomodam com tudo, não é? – rolou os olhos. – Somos todos de casa, praticamente irmãos e todos homens. Não é como se ele fosse entrar e encontrar uma mulher nua aqui.
- Gostaria que o Jimin estivesse aqui. Poderíamos ir para alguma boate ou coisa assim. – Jin comentou, fazendo-me notar a presença dele.
- Qual é o seu problema? – perguntei irritado.
- O que eu fiz? – tentou passar-se por desentendido.
- Você faz essas coisas de propósito ou é uma besta mesmo? Eu perdi o cara que eu gosto e... Não está sendo fácil, se quer saber.
- Aposto que fácil está sendo tirar a roupa da Lalisa todas as noites, não é mesmo? – arqueou a sobrancelha.
- Como é que é? – levantei-me.
- Opa! Acho melhor pararem por aqui. – Namjoon colocou-se entre nós dois.
- Serio mesmo que vocês estão acreditando nesse papo do Jungkook? Por favor, ele já superou o Jimin antes mesmo da morte dele...
- Não ouse falar dos meus sentimentos como se fosse o dono deles! – retruquei irritado. – Só não posso parar de viver porque ele morreu, estou tentando retomar a minha vida... Aos poucos.
- Você não precisa parar a sua vida, Jeon. – Jin começou e Namjoon saiu do caminho. – Só acho que você está indo rápido demais para um caminho que não deveria. Nem faz dois meses. Dois meses... Para quem reclamava da Lalisa há pouco tempo, vocês já estão familiarizados até demais. Ela passa todas as noites aqui...
- Acho que você já falou demais, todo mundo já entendeu. – Yoongi tentou pará-lo.
- Jimin era o meu melhor amigo e você está fazendo pouco caso da memória dele. Eu não te conheço mais... – concluiu e saiu pela porta que mal acabara de adentrar.
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Era natal. Desci do carro, com Lalisa em meu encalço. Me sentia estranho em voltar para Busan e não vê-lo mais por ali, ainda mais tendo que trazer alguém indesejado. Toquei a campainha, sendo recebido por minha mãe, que me envolveu num abraço.
- Que saudades de você! – ela disse, após soltar-me. – Quem é essa?
- Essa é a Lalisa, minha... Minha...
- Muito prazer! – se cumprimentaram. – Entre por favor. – ajudou, percebendo que eu não sabia muito com classificar.
Já dentro de casa, Lisa não deu uma só palavra. Ficou por um bom tempo próxima a suas malas, observando tudo.
- Vai continuar com essa cara? – a repreendi. – Sabe que eu só te trouxe porque você insistiu que queria passar o natal comigo.
- Desculpa, ok? Vou melhorar. – ela resmungou.
À noite, a casa estava cheia de gente; parentes e amigos. Lalisa se enturmou com algumas primas minhas e eu gostei disso, pois assim não ficaria no meu pé. Subi para o meu quarto e me tranquei lá. Sentei-me na cama e lembranças me vieram à mente.
"- Eu pensei que fôssemos jogar, Jungkook. – Jimin reclamou pela milésima vez.
- E vamos, mas primeiro preciso terminar essa atividade de história.
- Tem um papel aí? Quero desenhar... Ah, vou pegar na gaveta, ok? – assenti com a cabeça, só depois percebendo o silêncio que se instaurou no quarto.
- Me dá isso! – disse, tirando rapidamente a agenda de suas mãos.
- Ah, deixa eu ver! Estava gostando. – ele resmungou, fazendo bico. – Pra quem é?
- É pra... Um poema que eu fiz para a aula.
- Jungkook, a professora não pediu nada. – olhou-me ironicamente. – Ei! Isso é para uma garota, não é? – concluiu, mudando a feição.
- Não! – menti e ele me olhou confuso. – Quer dizer, é para alguém que eu gosto.
Jimin não respondeu mais. Fechou a agenda, guardando-a na gaveta novamente. Durante o resto da tarde, apenas me respondia monossilabicamente. E eu tolo demais, não percebi que era tudo culpa do ciúme..."
Abri os olhos, pensando na carta ainda não terminada, feita há anos atrás. Vasculhei a gaveta, procurando a tal agenda, encontrando-a e folheando com cuidado. Sorri sozinho ao reler as poucas linhas que havia escrito. Algo impedia que eu fechasse a agenda por completo e passando as páginas, encontrei uma foto tirada no dia em que Jimin fez quinze anos. Parecia injusto saber que só poderia vê-lo assim de agora em diante.
Depois de alguns minutos, resolvi voltar para a sala. Guardei todos os objetos e desci. Lalisa agora conversava com mamãe e suas amigas. Abri a porta da frente e saí sem ser notado. A rua estava deserta, mas dois vultos me chamaram a atenção.
- Hey! – chamei e ambas me olharam ao mesmo tempo.
- Oi Jungkook. – Mel veio ao meu encontro, dando-me um abraço.
- Oi... – Amy cumprimentou um pouco sem jeito.
- Sozinhas na noite de natal? – tentei fingir animação.
- Minha casa não é o melhor lugar para ficar nessas ocasiões. – a morena rolou os olhos, fazendo-me rir.
- E você, Mel?
- Ah, não ando com cabeça para comemorações... Prefiro ficar pela rua mesmo. – fez uma pausa. – Posso te fazer uma pergunta?
- Claro!
- O que você acharia se eu disse que Jimin não morreu?
- Mel! – Amy a repreendeu.
- Ele precisa saber. – entreolharam-se, deixando-me confuso.
- Eu acharia que você está ficando louca. – respondi sem hesitar. – Vimos ele ser enterrado... De onde tirou essa ideia?
- Não sei... Só não consigo sentir que ele se foi.
- Você agora virou médium? – disse divertido e ela mudou a expressão negativamente.
- Então você acha engraçado... – parou de falar e voltou seu olhar para a porta, de onde Lalisa saía. – Ah, claro! Como fui boba de pensar que você sentiria saudades dele, não é mesmo?
- Mel, não é nada disso... – tentei explicar.
- Você não me deve explicações, já está tudo claro para mim. Jimin tinha razão... Tem coisas mais importantes para se preocupar. – ela deu as costas. – Vamos, Amy.
- Espera! – pedi, em vão.
- Fica esperto, Jeon. – a morena disse, antes de juntar-se à outra e descer rua abaixo.
Senti uma mão quente tocar o meu ombro e Lalisa apareceu na minha frente.
- Desculpe por isso. – pediu.
- Esquece, já passou. Vou me deitar, já está bem tarde.
- Também vou, estou cansada.
- Ok, já pedi para mamãe arrumar o quarto de hóspedes para você.
- Eu pensei que...
- Lalisa, eu e você não somos um casal. – respondi, já caminhando em direção à casa.
Alcancei o quarto após despedir-me da minha mãe. Estava prestes a deitar, quando ouvi batidas suaves na porta. Já estava pronto para reclamar com a loira mais um vez, quando notei a criança parada à minha frente.
- Mina, o que aconteceu? Que cara é essa? – perguntei, agachando-me à sua frente.
- Mamãe me deixou sozinha no quarto e eu não consigo dormir. – respondeu a menina de cabelos castanhos. – Posso dormir aqui com você? – pediu com a feição assustada.
- Claro que pode! – sorri, deixando-a entrar.
Mina era minha prima distante e raramente nos víamos. Sempre quieta e silenciosa, titia achava que ela poderia ter algum problema. Já nós, achávamos normal uma criança de seis anos querer viver em seu próprio mundinho.
- O que você tem aí? – perguntei sobre o livro que ela trazia agarrado contra o corpo.
- Meu livro de histórias... Conta uma 'pra mim?
- Conto sim. Qual você quer?
- Hm... – ela pensava, enquanto folheava as páginas. – Essa aqui.
- Você sabia que eu tinha um amigo que gostava muito dessa história?
- E onde está o seu amigo? – indagou curiosa.
- Ele agora está no céu, Mina. – sorri com a lembrança e ela acomodou-se no travesseiro.
Comecei a ler o conto, enquanto fazia carinho em seus cabelos. O vento que entrava pela fresta da janela, me causava arrepios vez ou outra. Meus olhos estavam começando a pesar e eu sentia que poderia dormir a qualquer momento.
- Kookie? Porque parou? – a pequena perguntou-me e eu notei que havia cochilado.
- Me perdoe, onde eu parei?
- Quando Aurora acordou...
- Ah, sim. – procurei o parágrafo onde havia pausado e continuei a ler. – A bela adormecida despertou e, junto com ela, todos os habitantes do reino. Naquela noite, Aurora dançou com Felipe. Mais tarde casaram-se e viveram muito felizes. – fechei o livro e sorri para Mina que me olhava fazendo um bico. – O que foi?
- Porque o príncipe conseguiu acordar ela e as fadas não?
- Porque ela só poderia ser acordada com um beijo do amor verdadeiro.
- E se ele não quisesse ir? – perguntou, em meio a um bocejo. – O que ia acontecer com a princesa?
- Se ele não chegasse, ela dormiria para sempre.
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