Daylight
Aqui estou eu esperando, eu vou ter que ir embora logo
Por que eu estou esperando?
Nós sabíamos que este dia chegaria, nós sempre soubemos
Como chegou tão rápido?
ADRIEN
A quarta noite do mês de agosto tinha de tudo para ser perfeita, com horas e horas de danças e comemorações, mas havia sido arruinada antes mesmo de começar. Essa noite, esse pequeno intervalo de algumas horas, havia me dilacerado de dentro para fora e me transformado na casca de um homem que só queria poder desaparecer e perecer em uma poça de lágrimas.
Olhando de volta para o passado, era mesmo uma idiotice esperar que Shadow Moth desistisse de torturar os Parisienses por tempo o suficiente para que pudéssemos comparecer a uma festa. Era idiotice querermos ir a uma festa com tantos ataques acontecendo, mas não poderíamos ter previsto o futuro.
Não tínhamos como saber que tudo acabaria naquela noite.
Nino e Alya, comemorando o fato de que finalmente haviam deixado de enrolação e ficado noivos, tinham decidido dar uma festa para que todos os amigos e familiares pudessem compartilhar do amor e felicidade dos dois. Foi surpreendente eles tomarem essa decisão, até porque as pessoas da nossa idade ainda estavam começando a pensar no assunto, mas os dois já namoravam há tanto tempo que simplesmente fazia sentido.
A comemoração aconteceu no último andar de um dos prédios mais modernos de Paris, e eu e Marinette tivemos um lugar de honra na mesa, discursos e presentes surpresas para o casal. Participamos de algumas brincadeiras e acabamos até mesmo dançando uma quadrilha esquisita com todos os nossos amigos, mas eu deveria ter pressentido que algo aconteceria.
Sentido felino, qualquer coisa. Eu deveria ter percebido no ar que algo estava diferente. Deveria ter reparado que o clima estava mais frio e que a brisa gélida carregava a mágoa de um batalhão.
Os vidros do prédio estouraram em um baque no momento em que Marinette se levantou da mesa para ir até o banheiro. Os estilhaços fizeram as pessoas se abaixarem, desesperadas para desviarem das pontas afiadas, mas Mari estava perto demais para conseguir se salvar.
Me levantei em um pulo para chegar até ela, mas um estrondo me fez parar no mesmo lugar. O prédio inteiro começou a tremer, como se toda a sua fundação estivesse prestes a colapsar em poucos segundos.
Encarei Marinette, vendo o sangue escorrer pelo seu rosto e as engrenagens girarem por baixo de seus cabelos, e vi o momento em que ela passou a pensar como Ladybug. Todos os convidados correram para a escada de incêndio, mas eu e minha namorada corremos para a direção oposta, nos transformando e abandonando o prédio pelos enormes buracos que costumavam ser janelas.
O plano era tirar todos de dentro antes que a situação ficasse mais complicada, mas uma olhada para o edifício nos mostrou que não havia como. O prédio inteiro era cercado de vidro, então as explosões acabaram por danificar as fundações.
Não apenas isso, mas prédio atrás de prédio parecia fadado ao mesmo destino, como se Paris estivesse sendo assolada por um terremoto de grandes proporções.
Ladybug se lançou de volta em direção ao edifício em que estávamos, porém alguns andares para baixo, e pegou o ioiô nas mãos. Tentei acompanhar seu raciocínio, mas, como sempre, sua mente estava a um passo à frente da minha.
- Eu não deveria estar fazendo isso na frente de vocês, mas não tenho outra escolha - ela anunciou, recebendo nossos amigos no meio da fuga pela saída de segurança. - Eu preciso que vocês peguem os miraculous de vocês e preciso que me ajudem a tirar os civis dos prédios e das ruas. Não dá tempo de explicar agora, aqui.
Ela entregou o miraculous de cada um em mãos, vendo nossos colegas saltarem pelos buracos e se lançarem no perigo iminente. Eu sabia que seu peito estava apertado de ter que delegar esse risco, mas a situação atual pedia todos os reforços possíveis.
Conseguimos tirar as pessoas do nosso prédio e de um ao lado, mas assistimos de camarote Nino ser atingido por um pedaço de concreto e afundar com os escombros da construção.
O grito de Alya assombraria todos os meus pesadelos, se ainda houvesse espaço para mais tragédia nos meus sonhos.
Nós lutamos, sangramos e batalhamos, mas deveríamos ter desconfiado que aquela não era uma batalha comum. Era violenta até demais, de tal forma que se assemelhava aos ataques mais antigos de Shadow Moth.
Ladybug capturou o akuma, porém quando tentou usar o amuleto para que Paris voltasse ao normal, ela não voltou. Os prédios continuavam destruídos, sangue banhava as ruas e Nino continuava empalado por toneladas de escombros.
Vi Marinette cambalear, vi seu rosto ficar branco como mármore e vi o peso de todos os acontecimentos se assentarem nos seus pulmões. De repente, ela não conseguia mais respirar, olhando para os céus como se ordenasse que seu amuleto retornasse e ela tivesse uma segunda chance de consertar as coisas.
Shadow Moth atingiu o chão como um pássaro obscuro vindo de uma tempestade, e imediatamente me coloquei na frente da Ladybug.
- Gostaram da minha nova invenção? - ele questionou, batendo seu pequeno bastão no chão enquanto um sorriso nojento tomava seus lábios. - Primeiro, consegui fazer com que aqueles amuletos criados para proteger os cidadãos parassem de funcionar. Foi difícil, mas abriu caminho para que eu conseguisse modificar mais coisas. Agora, o amuleto para de funcionar depois de ser usado... uma boa ideia, não acha?
Alya se lançou na direção do homem, somente para ser atingida pelo lado afiado do seu bastão.
- Ora, minha querida, não seja ingrata assim. Eu acabei de poupar vocês de terem que limpar tanta bagunça... o garoto tartaruga concorda comigo, não concord... oh não, ele não concorda com mais nada. Uma pena.
Queria tirar Ladybug dali, levá-la para um lugar calmo e seguro em que ela poderia pensar em uma solução, porém fui muito devagar. Os acontecimentos, Shadow Moth, Nino... me fizeram esquecer que tínhamos um tempo muito limitado para aquela conversa.
Os brincos de Ladybug apitaram pela última vez e, em um piscar de olhos, estávamos olhando para Marinette. Shadow Moth estava olhando para minha namorada como se ela fosse uma peça de quebra-cabeça particularmente difícil de encaixar, mas que finalmente havia encontrado no fundo da caixa para poder completar a imagem completa.
- Marinette Dupain-Cheng - as palavras soavam como chumbo em sua boca. Seu olhar era como fendas de ódio e malícia, porém se dissiparam em surpresa quando se direcionaram para mim. - Adrien?
Eu reconheceria aquele tom de voz em qualquer lugar. Aquela pronúncia do meu nome, tão raivosa e ainda assim desprovida de emoções. Tinha passado anos e anos tentando fazê-la soar diferente.
Meu corpo gelou e eu fiquei parado, congelado no lugar, enquanto meu pai me rodeava como se eu tivesse sete anos de idade. Assisti paralisado enquanto hordas de vilões tomavam o seu lado, outra batalha se iniciando e Marinette, sem conseguir retornar como Ladybug, estava presa como civil no meio de uma guerra. Ela parecia desolada, olhando para mim como se aquilo fosse uma despedida, e senti meu coração se estilhaçar.
Consegui me mover e até mesmo usei meu cataclismo em um dos monstros para que ganhássemos mais tempo, mas era inevitável. Pela primeira vez tínhamos perdido, e não havia nada que pudéssemos fazer. Nada, a não ser...
Não.
Ela me olhou como se estivesse se despedindo.
Não, isso não. Não.
Olhei para trás, apavorado ao ver que Marinette não estava mais parada, mas sim caminhando na direção de Gabriel. Tentei chegar até ela, mas, como se sentisse minha presença, ela voltou os olhos para mim e balançou a cabeça.
- A gente sabia que isso era só tempo emprestado, gatinho - ela afirmou, uma lágrima descendo pela sua bochecha. - Tá tudo bem. Só me promete, por favor, que vai se lembrar de mim. Nem que seja em um sonho, mas eu preciso que você me prometa.
- Marinette...
- Eu fiz paz com essa decisão ao longo do tempo, a gente sabia que ia terminar assim. Eu não tenho medo, eu juro.
Assisti horrorizado enquanto ela tirava os brincos, dispensando Tikki de sua função e vendo o kwami desaparecer.
- Eu, Marinette Dupain-Cheng, renuncio agora à caixa dos miraculous e nomeio Scarabella como a nova guardiã.
A única coisa que faria Paris voltar ao normal.
A decisão que traria Nino de volta, faria com que o sangue fosse lavado das ruas e permitiria que nossos amigos pudessem sair vivos desse confronto. A decisão que salvaria o miraculous da joaninha e todo o restante do mundo.
A decisão que faria com que ela se esquecesse completamente de mim.
Alix se apressou para pegar os brincos antes que Marinette desmaiasse, tomando cuidado para desaparecer no tempo antes que Shadow Moth conseguissem alcançá-la.
Enquanto Marinette caía inconsciente no chão, eu só conseguia pensar que nunca fiz a promessa que ela tanto precisava.
E que, mesmo que eu prometesse, ela ainda assim não se lembraria de mim.
Isso é muito difícil, porque sei que
Quando o sol chegar, eu vou embora
Este é o meu último olhar
Que em breve será só uma lembrança
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